Pai Nosso que estás nos céus.
Dizer que Deus está no céu faz parte da nos-sa conversa cotidiana, mas raramente refle- timos sobre o significado de ter um Deus nos céus. Uma explicação se encontra nos pro- fetas do Antigo Testamento, que criticavam seus conterrâneos hebreus por adorarem imagens (idolatria). Para os idólatras, não era suficiente dizer que Deus criou céus e terra e livrou os cativos do Egito – Deus precisava ser imanente e imediato. Como já dizia o músico Chico César, todo mundo quer um “deus que faz a feira” e “cuida da nossa carteira”. Para os profetas, ter um Deus “no céu” significava que este Deus não poderia ser facilmente manipulado, pois Deus exige transformação e mudança em nossas vidas. Nós somos feitos à imagem de Deus, mas quando Deus é feito à nossa imagem, é idolatria.
Quando Jesus nos ensinou a orar o Pai Nosso, ele conhecia bem os ensinamentos sobre um Deus não manipulável. Mas Jesus também queria ensinar sobre um Deus próximo e acessível. Por isto usou a palavra Abba (pai, em aramaico) para se referir a Deus. Ao chamar Deus de pai, Jesus não usou o pater familias (como se chamava o pai no modelo patriarcal greco-romano), mas a linguagem íntima do vocabulário infantil, onde nos achegamos a Deus como crianças. Esta expressão da fala cotidiana familiar (Abba como “paizinho, pai querido”) é ampliada quando Jesus nos autoriza a tratar Deus da mesma maneira. Para se achegar a este Deus da graça e do Reino, precisamos ser como crianças.
Com o passar do tempo, a figura de Deus pai como Abba foi sendo substituída pelo pater familias do modelo patriarcal. O pai autoritário e distante servia melhor o modelo de igreja que seguia um jeito grego de pensar e um modelo romano de administrar. Os abusos chegaram a tal ponto que a teóloga Mary Daly concluiu, exasperada: “Se deus é pai, então pai é deus!” A ironia é que, com o termo “pai” caímos na mesma idolatria que os profetas já criticavam, pois reduzimos Deus ao nível do humano e utilizamos a imagem masculina de Deus para justificar o poder masculino na igreja e na sociedade.
Mas Jesus foi além. Jesus escolheu um ter- mo, Abba, que causou estranhamento por- que inverteu o conceito judaico do Deus distante. Ao chamar Deus de pai, Jesus resgatou familiaridade e intimidade no relacionamento humano-divino. Mas para impedir que este Abba virasse um ídolo, Jesus o colocou nos céus. Dizer “Pai Nosso que estás nos céus” traz uma tensão criativa: Jesus nos ensinou sobre um Deus que não pode ser manipulado porque não cabe na bolsa ou no bolso, mas que é também um Deus íntimo, próximo e familiar.
Pa. Dra. Wanda Deifeld - Delacorah – IA / USA
Oração
Deus que constantemente amplias nossos horizontes, nós te agradecemos porque tu te achegas a nós com carinho e bondade. Nós te agradecemos também porque tu nos desafias a crescer e a te entender melhor. Amém!
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