Os Dez Mandamentos - O Segundo Mandamento

Auxílio Homilético

03/03/1982

Não tomarás em vão o nome de teu Deus

Heinz Ehlert

I — Textos

Não tomarás em vão o nome do Senhor, teu Deus, porque o Senhor não terá por inocente o que tornar o seu nome em vão.

Que significa isto?

Devemos temer e amar a Deus e, portanto, em seu nome não amaldiçoar, jurar, praticar a feitiçaria, mentir ou enganar; mas devemos invocá-lo em todas as necessidades, orar, louvar e agradecer (Catecismo Menor).

Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão, porque o Senhor não terá por inocente o que tomar o seu nome em vão. (Ex 20.7 e Dt 5.11)

II — Considerações exegéticas

No contexto do Decálogo este Segundo Mandamento está na sombra do Primeiro. Depois da proibição de fazer imagens segue, logicamente, esta de usar o nome de Deus em vão. Deus confiou o seu nome a seu povo (Ex 3.13 ss; 6.3; Ap 1.4,8). Abusar do nome dele é falta de respeito para com a revelação. Usar em vão pode significar para a coisa nula. Esta nulidade resulta em maldade, o que equivale a servir ao maligno. Talvez numa acepção bem antiga, em vão poderia ter significado magia. Lutero, então, estaria certo ao introduzir a ideia da feitiçaria na sua interpretação.

No texto sobressai a mudança da primeira pessoa do singular Eu sou o Senhor, teu Deus... para a terceira pessoa ...o Senhor não terá por inocente...

Endereçado é o povo de Israel, não o indivíduo. O cuidado em proteger o nome contra abusos parte da concepção de que o portador do nome está, de maneira misteriosa, presente no próprio nome. Abusar do nome é abusar do próprio Deus. Alguém ou pessoas que conhecem o nome de Deus poderiam aproveitar-se do poder existente no nome para efeitos de bênção e maldição ou práticas ocultistas. O nome enunciado no contexto é Javé. Em vez de pronunciar o nome santo de Deus, os israelitas preferiam dizer, por respeito, Senhor.

Apesar desse mandamento, também Israel sabe que pode invocar o nome de Deus em todas as necessidades e para o louvor (2 Sm 22.4, 50; 1 Cr 16.8; SI 6.18; SI 20.7; SI 92.1; Is 25.1). Neste mesmo sentido Lutero interpretou o mandamento nos Catecismos. O abuso não impede o reto uso do nome de Deus. Lutero até recomenda que se crie o costume de confiar a família e os empregados ao nome de Deus na oração diária. Deve-se, segundo ele, ensinar a invocar o nome de Deus nas necessidades e no medo, para pedir auxílio e proteção, e para dar louvor quando coisas boas sobrevêm. Por outro lado, recomenda que sejam punidos os menores quando transgredirem este mandamento.

Nos seus dois Catecismos Lutero fez questão de assinalar que se trata de abuso quando pessoas mentem e juram falsamente, usando o nome de Deus. Mas com a mesma ênfase, no Catecismo Maior, destaca que é abuso quando pregadores espalham doutrinas falsas, apregoando suas ideias ou mentiras como palavra de Deus.

A ameaça de que o Senhor não deixará impune quem abusar do seu nome Lutero vê concretizada nas guerras, pestilências, carestias, incêndios e inundações, pelas quais o povo sofre. Seria uma espécie de castigo coletivo para culpa e pecado coletivo. No próprio mandamento o como e quando da punição fica aberto.

III — Meditação

O mandamento expressa que Deus se revelou, não apenas como poder, mas como pessoa, pois se comunica com o seu povo. Isto estabelece uma relação pessoal. Ele tem nome. É possível voltar-se a Deus e chamá-lo pelo nome. É verdade que a iniciativa nesta comunicação parte de Deus. A nossa parte é reação, resposta. Deus quer esta resposta. Por isso o mandamento é tão sério e o modo como o povo e seus membros se portam diante dele, tão importante.

O Segundo Mandamento quer proteger o nome de Deus contra o abuso, mas não coibir o reto uso.

Um povo como o nosso, que desde a infância respira religião, não se pode comparar com um povo secularizado que não tem sequer o nome de Deus na boca, nem com os adeptos de uma ideologia ateísta, que nega a existência de Deus. O nosso povo é religioso, o que, em muitos casos, pode ser sinônimo de supersticioso. O nome de Deus está em sua boca.

Em vão: o uso do nome de Deus para uma nulidade, invocação impensada. Num linguajar que não o leva a sério. Como naquela piada, em que perguntaram a um cidadão pela sua religião e este respondeu: Sou ateu, graças a Deus!

A explicação de Lutero quanto ao abuso do nome de Deus ainda hoje é atual.

Amaldiçoar: também hoje pessoas se sentem atemorizadas, porque acham que quem utiliza fórmulas de maldição com o nome de Deus poderia castigá-las. Há os que procuram vingar-se de um mal ou ofensa recorrendo a Deus para que castigue o ofensor. (Veja também: Deus te dê em dobro o que me desejares em tabuletas de escritório).

Jurar: lembramos as incontáveis vezes que ouvimos (ou dizemos), no dia a dia, este abuso de Deus. Seu nome é invocado para tornar mais confiáveis as nossas afirmações. Jesus só queria o Sim e o Não (Mt 5.33-37).

Em ambos os Catecismos (Maior e Menor) Lutero lembra a prática da feitiçaria como abuso do nome de Deus. Mas mesmo no Catecismo Maior, com suas explanações mais longas, não encontramos maiores detalhes sobre o tipo de prática ocultista a que se refere. Em nossos dias, no entanto, não haverá dificuldades em identificar esse tipo de abuso do nome de Deus. Basta lembrar as diferentes práticas de benzimento. O próprio termo benzimento (benzedeira, benzedura) ainda lembra o recurso a Deus. Só que o uso foi pervertido por práticas e fórmulas da magia.

Em nível semelhante estão certas práticas de pessoas ou grupos que abrem uma capela da bênção ou capela da cura pela oração. Isso também vale para programas de rádio com a mesma intenção. O nome de Deus é invocado como meio mágico para alcançar o fim apregoado pelo dirigente.

Na explicação da Primeira Petição do Pai Nosso, Lutero afirma, no Catecismo Maior, que propagar doutrinas e heresias é, em sua época, um abuso muito difundido. O que dizer das teologias de diferentes matizes, hoje, às vezes inspiradas em ideias e ideologias humanas? Não seriam também abuso do santo nome de Deus?

Segundo Lutero também se trata de abuso do nome de Deus quando a conduta dos pregadores, em palavra e ação não corresponde à sua pregação. Penso também em membros que levam constantemente o nome de Deus na boca, mas cuja vida e conduta espelham antes orgulho e amor próprio do que obediência à Palavra.

Além da proibição, o mandamento contém uma ameaça: O Senhor não terá por inocente. Tal advertência é coerente com o zelo de que laia Ex 20.5. A advertência mostra quão sério é o assunto. Usar o nome de Deus para uma nulidade ou maldade é, em última análise, desprezo ao nome de Deus.

A experiência, ontem e hoje, confirma que Deus leva a sério a sua própria advertência? Lutero, em seu tempo, não teve dúvidas em identificar as guerras, pestilência e calamidades como castigo pelo desrespeito também a este mandamento. E hoje?

Falamos em culpa coletiva e pecado social. Não devemos, então, aceitar um castigo coletivo? Pelo menos, deixemo-nos questionar e conduzir ao arrependimento.

Exemplos da prática pastoral mostram que pessoas estão apavoradas e são incapazes de orar, estão avessas ao nome e à Palavra de Deus quando se deixam envolver por práticas ocultistas. O coração endurecido não é um castigo também?

Lutero sentiu corretamente que a proibição não impede o reto uso do nome de Deus. Não podia ser diferente em vista do testemunho bíblico l As explicações do Pai Nosso são ricas em estímulos e encorajamento para o uso correto do nome de Deus. Quando Jesus nos ensina a chamar Deus de Pai, introduz um elemento encorajador: podemos superar o temor e substituí-los pela confiança e pelo amor. Até uma certa intimidade caracteriza, agora, o relacionamento dos fiéis com seu Senhor. Esta è a tônica da oração no Novo Testamento e poderá ser a característica do povo que hoje pretende seguir a Jesus.

Importante é que a adoração no culto público e na oração pessoal em nenhum momento se esqueça da santidade do nome de Deus. Por outro lado, a conduta deve corresponder à vontade de Deus.

IV — Escopo homilético

O Deus santo que se revelou em Jesus Cristo como Pai nos compromete a respeitar seu nome, a fim de não cairmos em abusos, mas praticarmos o uso apropriado de seu nome, por palavras e ações.

V — Indicações para a prédica

1. Introdução

Temos um missionário no Acre, entre os índios de lá. Talvez adorem divindades da tribo! Será que entenderiam o Segundo Mandamento? Conosco é diferente. Por quê? Ele se revelou!
Será que hoje há o risco de ferir o mandamento?

2. Os abusos

Citar dois exemplos: uma experiência de prática de feitiçaria ou do uso leviano do nome de Deus; uma outra experiência, onde nem a pregação em nome de Deus nem a conduta estão em consonância com o Evangelho. Sugerir que tais experiências sejam refletidas em estudos bíblicos ou grupos de reflexão.

3. Castigos

Desobediência traz consequências. A advertência é séria. Sofrimentos e endurecimentos podem ser a consequência. Por causa de Cristo há a possibilidade da volta. Arrependimento sincero é o início da libertação. O perdão de Deus estabelece novo começo.

4. Sinais de vida nova: Oração e louvor.

O Santo Deus é Pai por Jesus Cristo. Isto anima para uma vida de oração e louvor: cultos, oração doméstica, círculos de oração.

VI — Subsídios Litúrgicos

1. Intróito: Louvai o nome do Senhor, louvai-o, servos do Senhor, vós que assistis na casa do Senhor, nos átrios da casa do Senhor, nosso Deus (SI 135.1-2).

2. Confissão de pecados: Santo Deus, confessamos a nossa falta de respeito para contigo. Em tua presença sentimos embaraço. Não somos dignos nem de abrir a boca. Apelamos para a tua misericórdia. Tem piedade de nós, Senhor!

3. Absolvição: Não temas, porque eu te remi; chamei-te pelo teu nome, tu és meu (Ts 43.1).

4. Oração de coleta: Senhor, a tua Palavra santa é como luz brilhante. Às vezes até ofusca. Faze com que hoje ela nos alumie e aqueça! Que nos mostre bem claro nossa situação e nos faça enxergar possibilidades de servir-te! Dá-nos ânimo para prosseguir! Amém.

5. Leitura Bíblica: Isaias 6.1-8.

VII — Bibliografia

ECKSTEIN, R. Das Leben aus dem Glauben. 4.ed., Berlin/Grunewald, 1959.
JENTSCH, W. e outros, ed. Evangelischer Erwacksenenkatechismus. Gütersloh, 1975, pp. 234-250.
KRAUSS, M./LUNDBECK, J. Die vielen Namen Gottes. Stuttgart, 1974.
LUTERO, M. Catecismo Menor. (10. ed., São Leopoldo, 1980).
LUTHER, M. Der kleine Katechismus. Der grosse Katechismus. In: Die Bekenntnisschriften der evangelisch- lutherischen Kirche. Gõttingen, 1952.
NOTH, M. Das zweite Buch Mose (Exodus). In: Das Alte Testament Deutsch. Vol. 5. Göttingen, 1959.
RAD, G. von. Das fünfte Buch Mose (Deuteronomium). In: Das Alte Testament Deutsch. Vol. 8. Gõttingen, 1964.
THIELICKE, H. Das Gebet, das die Welt umspannt. 11. ed., Stuttgart, 1963, pp. 39-52.


Proclamar Libertação – Suplemento 1
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia


Autor(a): Heinz Ehlert
Âmbito: IECLB
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1982 / Volume: Suplemento 1
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 7280
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Cada qual deve se tornar para o outro como que um Cristo, para que sejamos Cristos um para o outro e o próprio Cristo esteja em todos, isto é, para que sejamos verdadeiros cristãos.
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