#2: O filho mais velho | Lucas 15.23-32

3º Domingo após Epifania

23/01/2022

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Amados irmãos, amadas irmãs,

na semana passada nos debruçamos a aprender sobre o filho mais novo desta parábola. Aprendemos muito. Se você perdeu, volte lá e assista a pregação da semana passada, pois ela é muito importante para que você consiga entender a pregação de hoje. Fato é que estamos crescendo muito através da Parábola do Filho Pródigo.

Apenas para rememorarmos um pouco, na semana passada vimos os três estágios da vida do filho mais novo: primeiro, ele era feliz e não sabia; depois, ele era infeliz e não sabia, e então, ele se tornou feliz e sabia disso. Terminamos na semana passada com um convite ao arrependimento e mudança de vida. Acredito que o Reino dos Céus se encheu de festa se o nosso duro coração foi quebrantado pela Palavra do Senhor, causando arrependimento e vontade de abandonar o pecado. Essa é a minha oração.

Se continuarmos a leitura da parábola, perceberemos que nem tudo acontece como imaginamos. Nem todos são cristãos o suficiente para compreenderem o arrependimento, o perdão, enfim, a graça de Jesus. Os julgamentos podem vir de todos os lados, especialmente daqueles que se consideram mais justos e santos (quando, na verdade, não passam de pecadores desgraçados como todos os outros).

Era isso o que estava acontecendo com Jesus. Ele estava anunciando o evangelho aos pobres, caminhando com os pecadores e tendo refeições com “gente da baixa sociedade”. Jesus caminha com aqueles que ninguém queria por perto. Ele não está nada interessado na aparência religiosa dos fariseus e escribas. Não! Jesus não quer o que se acha, mas o perdido. É por isso que o apóstolo Paulo vai dizer mais tarde em 1 Coríntios 1.27-29: “Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para orgulhar as fortes. E Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são, a fim de que ninguém se glorie na presença de Deus.”

E então, existe quem quer saber mais que Deus. Existe quem quer dizer para Deus quem deve ser salvo e quem deve ser condenado, quem é digno e quem não é digno, quem é bom e quem é mau. Essas pessoas não deixam Deus ser Deus, mas, continuamente, procuram assumir o lugar de Deus, fazendo juízo às outras pessoas. Se Deus julgasse o mundo da mesma maneira como nós julgamos, estaríamos condenados e não haveria salvação para ninguém.

Às vezes, alguém da própria casa (ou seja, da própria igreja) pode ter uma atitude de exclusão para com aqueles que Jesus inclui. É o caso do filho mais velho. Nem sempre a história deste personagem é olhada com atenção. Então, hoje vamos dar uma olhada apenas para ele. Há lições valiosas a nós nesse lado da história.

Enquanto o filho mais novo se tornou rebelde e voltou arrependido, o filho mais velho nunca saiu de casa. Era um filho exemplar. Administrava os bens do pai e não teve a mesma ousadia do seu irmão que pediu a parte da herança antes do pai falecer. O filho mais velho não vivia em orgias e farras. Estava sempre preocupado em trabalhar para o seu pai. O filho mais velho é a imagem do filho certinho, que tira boas notas na escola, vai bem na faculdade e arranja uma boa profissão.

Porém, a parábola nos mostra o filho mais velho com mais profundidade: ele é alguém que está perdido dentro de casa. Mesmo fazendo tudo certo e sendo exemplar em suas atividades, ele está tão perdido quanto seu irmão que gastou tudo mundo afora. Mas, pastor, por que ele está perdido mesmo estando em casa e sendo uma pessoa boa?

 

1    ELE VIVIA NA CASA DO PAI, MAS NÃO OBEDECIA AOS MANDAMENTOS DE DEUS

 

Os principais mandamentos de Deus falam sobre amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. O filho mais velho não amava a Deus e muito menos o seu próximo. Isso se provou quando seu irmão mais novo voltou. Ao invés de acolhê-lo como o pai amoroso fez, o filho mais velho se encheu de ódio, indiferença e rebeldia. Talvez, ele estivesse bem sozinho em casa. Quem sabe, o filho mais velho estava feliz com a ausência de seu irmão. Isso justifica a sua frustração quando seu irmão retornou ao lar.

Muitas vezes, há pessoas que estão na igreja há anos, mas não tem nenhum amor a Deus e aos perdidos. Julgam as outras pessoas. Sentem-se melhor que as outras pessoas por causa do trabalho e das obras que realizam, seja na igreja ou fora dela. Estão há anos na igreja, mas nunca trouxeram alguma pessoa perdida para ser membro. Aliás, mais facilmente expulsam pessoas da igreja do que acolhem pecadores. Às vezes, a expulsão não é realizada oficialmente, mas na construção de uma indiferença, nas fofocas e na exclusão. Assim como aquele filho mais velho, muitos cristãos cumpriram tudo certo desde o começo das suas vidas, mas ainda não aprenderam a amar de verdade a Deus e ao próximo, a amar os perdidos ao ponto de falar do Salvador a eles.

 

2    ELE VIVIA NA CASA DO PAI, MAS CONFIAVA NA SUA PRÓPRIA JUSTIÇA

 

O filho mais velho era perspicaz em olhar os pecados dos seus irmãos. Porém, ele não enxergava os próprios pecados. Foi rápido em condenar o seu irmão, mas devagar em olhar para os seus próprios erros. Exteriormente, considerava-se uma pessoa obediente; interiormente, estava tão perdido quanto àquele irmão que estava voltando.

O filho mais velho acreditava que seria salvo por suas obras. Não via defeito em si mesmo, pois era orgulhoso demais para isso. Enxergava bem aos outros, mas estava cego em relação a si mesmo. Achava que conhecia a Palavra de Deus, mas não leu o Salmo 51.5 onde Davi nos diz: “Eu nasci na iniquidade, e em pecado me concebeu a minha mãe”. Não enxergava que por mais que se considerasse uma pessoa boa, sua vida também estava naturalmente manchada pela desgraça do pecado.

Quando – na Igreja – nós começamos a nos comportarmos como esse filho mais velho, estamos inevitavelmente invertendo a lógica do Reino de Deus. Jesus nos revela que a nossa própria justiça de nada vale para a nossa salvação. Não somos salvos pelo que fazemos ou somos, mas por graça. O filho mais velho traz a nós exatamente o imaginário existente em torno da errada concepção de salvação por obras. Ele era tão pecador quanto o seu irmão, mas precisava se dar conta disso. Vivia na casa do pai, mas confiava mais em si mesmo do que na graça de Deus.

 

3    ELE VIVIA NA CASA DO PAI, MAS NÃO SE SENTIA LIVRE

 

O filho mais velho não vivia uma espiritualidade libertadora, mas uma religiosidade opressora, rígida e que o tornava escravo. Sua motivação era totalmente errada. Ele fazia suas tarefas não por amor ao pai, mas para ganhar elogios. Ele não tinha uma intenção pura em seu coração. Ele era filho, mas se comportava como um escravo.

Talvez isso aconteça também na igreja. Pessoas esquecem que são filhos/as de Deus e vivem como se fossem escravos/as de Deus, temendo o juízo divino e fazendo de tudo para não serem condenadas, mas aceitas. Uma espiritualidade assim não é libertadora, mas sufocante. Assim nos diz o pastor presbiteriano Hernandes Dias Lopes: “Está na igreja, mas não tem prazer. Obedece, mas não com alegria. Está na casa do Pai, mas vive como escravo. Está na casa do Pai, mas não tem comunhão com o Pai”1. Muitas vezes, os próprios cristãos usam a igreja como escravidão a si mesmos, trabalhando não em alegria, mas por obrigação.

 

4    ELE VIVIA NA CASA DO PAI, MAS ESTAVA COM O CORAÇÃO CHEIO DE AMARGURA

 

Sua amargura é decorrente de algumas coisas: ele se sente melhor que o seu irmão: estava tão escravizado pela sua religiosidade que só sabia arrotar exclusão e discriminação. Achava que era o único que prestava em casa; ele se sente injustiçado pelo Pai: estava tão escravizado pela sua religiosidade que só acreditava no mérito pessoal e não na graça. Ele acreditava na religião da lei, do legalismo, da moralina e não na graça de Jesus. Por isso, palavras como “misericórdia” e “perdão” não fazem parte do seu vocabulário. Ele não chama seu irmão de “irmão”, mas de “esse seu filho”, como se não tivesse ligação alguma com ele. Porém, o pai o corrige ao lhe responder: “este seu irmão”. Se tem algo que mata o amor, a empatia, a solidariedade, a disposição ao perdão e a paz, é a amargura. Um coração amargurado faz mal para a própria pessoa e para os que estão perto dela. Apenas Deus pode curar as feridas de um coração assim.

 

5    ELE VIVIA NA CASA DO PAI, MAS SE RECUSOU A FAZER PARTE DA FESTA DO PAI

 

Algo interessante aconteceu. O filho que estava fora entrou para a festa, enquanto o filho que estava dentro saiu da festa. O filho mais novo se humilha e é recebido. Já o outro caminha para fora da casa do pai, para longe da festa e com o seu coração profundamente amargurado e triste. Todos estavam alegres com a volta do filho perdido, menos o seu próprio irmão.

A lógica do Reino de Deus é completamente oposta à nossa lógica de mundo. E pode acontecer da lógica do Reino de Deus se tornar insuportável a alguns ouvidos, especialmente aqueles com corações orgulhosos por tudo o que fazem. A mensagem da graça cutuca aqueles que acreditam na meritocracia, que se acham “bonzinhos” diante de Deus e das outras pessoas sem, no entanto, ver o próprio pecado em suas vidas. Suas vidas são um peso para si mesmos e acabam se tornando um peso também para as outras pessoas.

 

Amados irmãos, amadas irmãs,

mas não é preciso desesperar-se. Há salvação também para estes. Se você se identificou com o filho mais velho, então a graça de Deus é para você também. Deixe que ele limpe toda a amargura que está em seu coração. Deixe-o mudar a sua vida, retirar a arrogância, o ódio, a indiferença. Não vá embora, como fez o filho mais velho. Ao contrário, a festa é para você também. Então, o que vais fazer do lado de fora?

O pai não foi injusto com seu filho mais velho. Foi o filho mais velho que foi injusto com o seu pai ao não compreender o perdão e a misericórdia. Não sejamos injustos com Deus. Jesus morreu na cruz para salvar os pecadores cujo nós mesmos somos os principais. Se somos aceitos por Deus, porque vamos julgar e excluir outras pessoas, tanto fazendo o que fizeram? Deus te chama hoje ao arrependimento e ao perdão.

E tenha certeza: no próximo Domingo, nós vamos conhecer o personagem principal dessa história: o pai amoroso. Espero você lá.

Amém.


3º DOMINGO APÓS EPIFANIA | VERDE | CICLO DO NATAL | ANO C

23 de Janeiro de 2022


P. William Felipe Zacarias


Pregações da Série Amados & Aceitos:

#1: O filho mais novo - 16/01/2022

Link: https://luteranos.com.br/conteudo/ofilhomaisnovo

#2: O filho mais velho - 23/01/2022

Link: https://luteranos.com.br/conteudo/ofilhomaisvelho

#3: O Pai amoroso - 30/01/2022

Link: https://luteranos.com.br/conteudo/opaiamoroso


1 Cf. DIAS LOPES, Hernandes. Lucas. São Paulo: Hagnos, 2017. p. 467. Edição do Kindle.


Autor(a): P. William Felipe Zacarias
Âmbito: IECLB / Sinodo: Rio dos Sinos / Paróquia: Sapiranga - Ferrabraz
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Natal
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 15 / Versículo Inicial: 23 / Versículo Final: 32
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 65828
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