O uso da Bíblia em Jesus

17/06/2016

Vale a pena examinar como Jesus, ele mesmo, manuseou a Bíblia. Talvez haja quem estranhe essa proposta. Pois Jesus não tinha Bíblia como a temos hoje. Ainda não haviam sido escritos os evangelhos, e ninguém cogitava em algo semelhante a um Novo Testamento. Mesmo assim, Jesus trabalhava com uma Sagrada Escritura. Era aquela que, para nós, é o Antigo Testamento. A ela se refere frequentemente. Viu nela a documentação da vontade e a depositária das promessas de Deus. Assim como Lutero, assim também Jesus era de certa forma “professor de Bíblia”. Não veio para dissolver a lei e os profetas, e, sim, para cumprir (Mateus 5.17).

Com efeito, é impossível entender Jesus sem esse pano de fundo. Sua atuação pública inicia na sinagora de Nazaré com a leitura de uma passagem do profeta Isaías, comentada por ele com as palavras: “Hoje se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir (Lucas 4.21). A mensagem da proximidade do reino de Deus, sua atividade terapêutica, o resumo da vontade de Deus no duplo mandamento do amor, todo agir e falar de Jesus emana da história de Deus com seu povo, registrada na Escritura. Também para Jesus ela era a suprema norma de vida.

O quanto isso é verdade percebe-se na rejeição da “tradição dos anciãos” por parte de Jesus (Marcos 7.8s). Essa tradição era uma tradição paralela à Escritura, de origem rabínica, composta de 613 leis. Elas especificavam os preceitos da “torá”, ou seja, da lei de Moisés. Detalhavam a obrigação de santificar o sábado, por exemplo, em 39 minuciosas prescrições, de modo que não mais havia dúvidas quanto ao proibido e permitido naquele dia. Jesus acusa os fariseus e escribas de invalidarem a vontade de Deus mediante esse tipo de legalismo. Trata-se de tradição humana, sem nenhum valor. Autoridade é apenas a Escritura. Jesus defende, já em seu tempo, o princípio do sola scriptura (somente a Escritura).

Mas também na Escritura Jesus faz distinção entre a letra e o Espírito. Ele não aceita a permissão do divórcio em Deuteronômio 24.1. Enxerga nela antes uma concessão de Moisés à dureza do coração do homem (Marcos 10.5). A vontade de Deus é outra. Ele revoga a lei da retribuição “olho por olho, dente por dente”, interceptando assim a espiral da vingança (Mateus 5.38s). Acaba, não por último, com a lei da pureza e impureza. Se nada há fora do homem que o possa contaminar perante Deus, já não há razão para discriminar pessoas com base nessa lei (Marcos 7.14s). Jesus reformula a lei do AT pelo princípio do amor.

Seja lembrado que Jesus quer cumprir, não abolir a lei. Mas para tanto importa distinguir entre a vontade de Deus e a lei escrita. A esta podem ter-se misturado interesses humanos. Para Jesus, autoridade última não é o texto, e, sim, o propósito de Deus. A Escritura continua sendo portadora da palavra divina, sim. No entanto, ela é autoridade apenas penúltima. Há que se buscar a vontade de Deus por trás das palavras. Deus ama a sua criatura e quer a sua vida. Este é o critério a que também a Escritura fica sujeita.

Pastor Dr. Gottfried Brakemeier, em “Por que ser cristão?”, Editora Sinodal

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