O luto nos permite curar, lembrar com amor em vez de dor.
É um processo gradativo.
Uma a uma, você vai soltando as coisas que se foram e lamenta por elas.
Uma a uma, você mantém as coisas que passaram a fazer parte de quem você é e constrói de novo.
- Rachael Naomi Remen*
A pesquisadora foi às ruas. Entrevistou passantes por sete anos perguntando se o amor é eficaz para diminuir a dor de quem está atravessando um período de crise ou trauma, que pode ser uma doença terminal, uma desilusão ou mesmo o luto.
Concluiu que é fácil sentir-se totalmente tragado pelo amor quando você está em um novo relacionamento romântico. Mas a verdadeira questão é: como se demonstra o amor a um familiar ou um amigo quando você mesmo está cheio de preocupações e medo com assuntos relacionados à morte?
Entre as centenas de respostas, um educador, cujo amigo estava morrendo, disse que amar é entender o que a outra pessoa precisa e encontrar maneiras de fazer isso acontecer. Sim, de repente algumas pessoas não acreditam mais no amor. Provavelmente poderemos ajudar melhor quando compreendemos com mais precisão os processos do luto, tanto quanto nos for possível compreendê-los.
Compreender os processos de luto após a morte, é um exercício que começa no início da vida. Para nós sempre é importante lembrar e afirmar que uma vida de fé estabelecida na graça salvadora de Cristo Jesus é o início dessa caminhada de confiança. Afirma o amigo Paulo que “… para poder permanecer firme na fé no ínterim entre batismo e morte, o cristão luterano recebe vários exercícios espirituais que perfazem a praxis pietatis reconhecida e consensual em nossa igreja: o culto, onde a palavra é pregada; os sacramentos – batismo, confissão e santa ceia – como meios de graça, e a poimênica fraterna nas diversas situações existenciais”. (Dr. Paulo Afonso Butzke, Aspectos de uma espiritualidade luterana para nossos dias Estudos Teológicos, v. 43, n. 2, p. 104-120, 2003.)
Podemos aprofundar a compreensão deste cuidado a partir da fé, observando a diversidade da vivência de lutos.
Segundo o autor James William Worden (Aconselhamento do Luto e Terapia do Luto : um manual para profissionais da saúde mental [tradução Adriana Zilberman, Leticia Bertuzzi, Susie Smidt]. - São Paulo : Roca, 2013), temos a figura do luto não autorizado. Ele acontece onde pessoas enlutadas não são convidadas a participar de um funeral por impedimentos sociais e relacionais (como numa relação extraconjugal, por exemplo). Com isto esta pessoa dificilmente terá o suporte social e mesmo espiritual necessário para superar traumas e tristezas. Outra maneira de vivenciar a dor da morte é através do luto dos laços continuados. A separação causada pela morte tenta ser superada com uma associação de fatos que poderiam significar a continuidade da vida. Locais e objetos supostamente poderiam dar alívio a esta dor. Em outras ocasiões o luto é vencido através da construção de significados. A pessoa subitamente se vê privada de conviver com seu ente querido e, para sobreviver ou superar desafios, reaprende a fazer desde as mais básicas tarefas em um mundo sem esta referência.
A lista continua. Outra forma de viver o luto é o que Worden chama de resiliência. Quando houve uma boa e agradável convivência com o ente falecido, quando as referências com a pessoa que agora está ausente são positivas e construtivas, a capacidade de superar o trauma da separação se torna absolutamente normal. Se dá, sim, com tristeza e saudades, mas sem sobressaltos e desesperos. Ao contrário deste, temos luto traumático. Com o aumento da violência urbana, da violência nas estradas e o aumento de catástrofes naturais — inclusive pandemais — aumenta também a ruptura violenta na convivência das pessoas. Traumas que advém destas situações evidentemente exigem um cuidado mais intenso e continuado para com as pessoas sofredoras.
Desta forma, entendendo as diversas formas de luto — certamente outras ainda poderiam ser arroladas — podemos perceber como o amor e os cuidados podem ajudar a diminuir dores.
A pesquisadora que mencionei no início, Karen Sorensen, chegou a algumas conclusões simples e, ao mesmo tempo, complexas sobre como podemos agir de forma amorosa para aliviar dores como a do luto. São complexas porque exigem atenção e cuidados.
• Se nada puder ser feito, apenas ouça. Estar com um ente vivo que está doente ou de luto é desconfortável, mas é importante colocar os seus próprios sentimentos de desconforto de lado e concentrar-se sobre ela.
• Estar presente, mesmo quando é doloroso. É fácil se ver pego em sua própria dor e lamúria, quando se deveria centrar na dor da outra pessoa. É importante “desfrutar” a dor dos outros nos momentos que você se dedica a alguém que está em sofrimento.
• Crie ambientes positivos e restauradores. Luz e cores ajudam a colocar a mente de quem está sofrendo em uma outra frequência, mais confortável, de tal forma que possa vencer suas dores com mais tranquilidade.
• Quando a pessoa enlutada quer ficar sozinha, respeite. Pessoas que estão de luto, por vezes, não querem que outras as vejam vulneráveis e na dor. Transfira sua atenção e cuidados para outro familiar, demonstrando interesse e compaixão para com todos.
Diante da morte e do luto, amor é tudo!
O apóstolo Paulo registra com toda autoridade: “...se não tiver amor, nada serei. (1 Co 13.2). E, finalmente, o sujeito deste amor: “Porque Deus amou ... de tal maneira que deu o seu Filho unigênito”, Jesus Cristo, Senhor e Salvador.
Após nos analisarmos pessoalmente diante de Deus, o que nos resta? O amor que tem por base a fé, e não apenas o altruísmo. É pela fé que nos tornamos confiantes na obra salvadora de Deus através de Cristo Jesus. Por este intermédio podemos confiar em nosso período de luto que o ente que perdemos descansa em paz até o dia em que o Senhor novamente a chamar para vida com Ele na eternidade. Assim conseguimos ressignificar nossas perdas.
Vocês não sabem como será a sua vida amanhã, pois vocês são como uma neblina passageira, que aparece por algum tempo e logo depois desaparece. O que vocês deveriam dizer é isto: 'Se Deus quiser, estaremos vivos e faremos isto ou aquilo.'” (Tiago 4:14-15 NTLH)
Que nos conserve Deus em Seu caminho, caminho que se chama Jesus, a Verdade e a Vida. E assim, multipliquemos o amor e colhamos mais amor.
Pr. Rolf Rieck
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* citada por Worden, J. William. op.cit
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