O Lamento de Jeremias, profeta do SENHOR - Jeremias 20.7-13

Autoria Pa. Adriana Kuhn Busch

21/06/2020

 

“Ó Senhor Deus, tu me enganaste!” Assim começa a oração do profeta Jeremias, que mais uma vez derrama diante de Deus suas queixas e lamentos: “Estou cansado e não posso mais aguentar.” A situação de Jeremias parece insuportável. Ele responsabiliza Deus pelo seu sofrimento. Aqui vale lembrar que não foi Jeremias que escolheu ser profeta. Pelo contrário, quando Deus o chamou para ser seu mensageiro, Jeremias resistiu, dizendo que era muito jovem, que não tinha o dom da palavra, que era inexperiente. Mas Deus não aceitou suas desculpas, convocando-o e enviando-o mesmo assim para pregar juízo e destruição a um povo que se afastava cada vez mais da vontade de Deus. Missão nada fácil, que atraiu sobre Jeremias desprezo e lhe trouxe uma boa dose de aborrecimento, problemas e sofrimento. Alguns deles mencionados em nosso texto: “Todos zombam de mim, caçoando o dia inteiro”; “Eles me desprezam, porque anuncio a tua mensagem”; “Até os meus amigos íntimos querem que eu tropece”; E não foi somente pelas palavras que Jeremias sofreu.

Em outros trechos do livro, conta que Jeremias ainda foi perseguido, açoitado e colocado no tronco, jogado em uma cisterna, sequestrado e levado contra a sua vontade para o Egito. Tudo isso ele sofreu por causa do seu ministério. Por levar uma mensagem que por assim dizer descobria a sujeira do povo e de suas lideranças. Jeremias, assim como muitos profetas, era porta voz de uma mensagem que nem sempre as pessoas queriam ouvir. E por isso, ele é perseguido de todas as formas.

Jeremias expressa diante de Deus a sua dor. Em alguns momentos, temos a impressão de que o profeta até mesmo briga com Deus. Suas palavras se assemelham as muitas orações nos Salmos. Elas mostram que a relação com Deus também inclui altos e baixos; que mesmo uma pessoa assim tão próxima de Deus, não está isenta de sentir medo, angústia, desespero, frustração. A oração de Jeremias também nos ajuda a se aproximar de Deus, a expressar a dor, a colocar diante dele nosso lamento e a sobreviver em meio às situações de sofrimento.

O “lamento”, o gesto de lamentar-se, tornou-se comum entre nós, especialmente nesses últimos meses. Lamentamos a perda de vidas para a pandemia do coronavírus. Lamentamos a perda do convívio com as pessoas e de pequenos gestos como um aperto de mão ou um abraço. Lamentamos, às vezes até de forma furiosa, não podermos participar presencialmente no culto. Lamentamos a perda de uma rotina, de um estilo de viver. Lamentamos a perda, por parte de muitas pessoas, de sua vaga de trabalho e às vezes até mesmo de empreendimentos de uma vida inteira. Lamentamos o caos na situação política de nosso país. Lamentamos a violência em nosso mundo contra mulheres, crianças, pessoas negras. É muita dor, é muito sofrimento. E assim como Jeremias nos fazem dizer: “estou sem forças, não aguento mais”.

Jeremias, porem não fica preso ao lamento. Embora a queixa e o lamento sejam o tom da maior parte de sua oração, Jeremias não deixa de agradecer e de louvar a Deus. E o seu louvor vem da fé e da confiança de que Deus não o abandona: “Mas tu ó Senhor, estás comigo e és forte e poderoso.” Contrário a todas as aparências, Deus não o desamparou, Deus não deixou de ser o “Deus Emanuel”, o “Deus conosco”. Deus não deixou de cumprir sua promessa que fez quando chamou o profeta: “Não tenha medo, pois eu estarei com você” (Jeremias 1.8).

A confissão do profeta acompanha também um pedido de ajuda: “Deixa que eu veja a tua vingança contra os meus inimigos, pois coloquei a tua causa nas tuas mãos”. Mais uma vez, percebemos o quanto Jeremias está machucado, abalado, entristecido e enfurecido com a surdez e a insensatez do seu povo. No entanto, Jeremias não faz justiça com as próprias mãos. Ao entregar para Deus o seu desejo de revanche, Jeremias abre mão de qualquer atitude de vingança contra os seus inimigos. Jeremias não deixa de sentir raiva. Mas ele entrega a sua raiva a Deus. Ele não transforma essa raiva em uma ação. Ele não fere o próximo como ele é ferido. Ao entregar a Deus sua raiva e seu desejo de vingança, o profeta desiste dela.

Semelhante atitude encontramos em Jesus Cristo que após sofrer por causa de sua pregação e missão, foi preso e crucificado. Desprezaram sua mensagem, desprezaram a palavra de Deus. Junto à cruz, em sua injusta e dolorosa punição, diante de seus executores, Jesus roga a Deus pedindo: “Pai perdoa-os, pois não sabem o que fazem”. E assim, o pecado, a dor e a morte não levaram a vitória. Pois Deus ressuscitou Jesus. Na manhã de Páscoa, o crucificado triunfou sobre o seus inimigos.

Querida comunidade que nos assiste. O texto de hoje traz a oração de quem se viu esgotado em sua missão de proclamar a palavra de Deus, ao mesmo tempo, de alguém que não deixou de experimentar o sustento de Deus. Não somos como Jeremias. Jeremias recebeu um chamado especial para ser profeta. Mas a sua experiência é comum a todas as pessoas que se sabem comprometidas com a fé em Deus e com o chamado de ser discípulo e discípula de Jesus. Nesta caminhada, assim como Jeremias, não podemos nos conformar com o mundo assim como ele está, não podemos ser indiferente aos sofrimentos e as dores dos mais pequeninos. Não podemos deixar de anunciar e promover a vida que Deus quer para a sua criação. E de levantar protesto ao que fere a boa vontade de Deus. Pode ser que essas atitudes nos venham a trazer sofrimento e angústia. Em Cristo Jesus, porém temos a divina promessa de que Deus não nos abandona. E isso nos faz louvar e dizer com Jeremias: “Cantem ao Senhor Deus, louvem o Senhor porque ele livra os pobres do poder dos maus.” Amém.
 


Autor(a): Pa. Adriana Kuhn Busch
Âmbito: IECLB / Sinodo: Rio Paraná / Paróquia: Maripá (PR)
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Testamento: Antigo / Livro: Jeremias / Capitulo: 20 / Versículo Inicial: 7 / Versículo Final: 13
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 57387
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