Marcos 11.1-11
(Leitura do texto)
Muitas vezes Jesus havia recomendado aos seus discípulos e a outras pessoas que ele curava, que não dissessem isso a ninguém. Isso foi assim, porque Jesus considerava que ainda não era hora de ele se revelar.
Agora é diferente. Jesus está ponto para cumprir com o seu destino. Jesus decide que já é hora de mostrar – publicamente – o objetivo de sua presença no mundo. E isso está simbolizado de maneira especial na sua entrada em Jerusalém. Jesus organiza uma espécie de procissão, u cortejo, uma aclamação popular ao estilo do que escreve o profeta Zacarias:
Alegre-se muito, oh povo de Sião,
Moradores de Jerusalém, cantem de alegria,
pois o seu Rei está chegando.
Ele vem triunfante e vitorioso,
mas é humilde,
está montado num jumento,
jumentinho filho de jumenta. (Zc 9.9)
O povo se entusiasma, parece mesmo um sinal dos tempos. Seu caminho não está coberto de ricos tapetes, mas de panos velhos, as vestes de um povo sofrido e empobrecido. Roupas de gente peregrina, suarenta. Improvisaram galhos de árvores, folhas de palmeiras, galhos cortados na última hora, arrancados às pressas. A multidão grita, cheia de esperança, HOSANA (que quer dizer SALVA-NOS), aclama-o enquanto supõe que ele se ajusta a seu imaginário de um ídolo messiânico. A ocupação romana, a exploração econômica parece que chegaram ao seu final. Jesus é o novo rei.
Mas, poucos dias depois dessa cena jubilosa, o mesmo povo vai condená-lo quando percebe que ele não corresponde ao que se esperava dele. Os que antes gritaram HOSANA, agora gritam CRUCIFICA-O.
O que aconteceu? Do mesmo coração que nasce a acolhida calorosa, vem também a rejeição mais violenta. Como foi possível que Jesus perdesse a popularidade em tão poucos dias? Ele entra em Jerusalém como rei e poucos dias depois sai da cidade carregando uma cruz. O que aconteceu?
Num processo democrático, quem perde reconhece elegantemente a derrota e quem ganha mostra magnanimidade face ao derrotado. Mas não foi esse comportamento civilizado que triunfou. Desde a ressurreição de Lázaro, a crescente popularidade de Jesus representava a derrota dos fariseus e dos líderes religiosos do tempo de Jesus. Por isso, esses líderes religiosos procuraram por todos os modos deslegitimar aquele euforia do povo com Jesus e fizeram de tudo para garantir uma reviravolta política que atendesse a seu projeto. Por isso, eles ficaram esfregando as mãos esperando que surgisse alguma situação que fizesse que Jesus entrasse em choque com as expectativas populares. E o choque foi quando Jesus não assumiu a expectativa popular de restabelecer o Reino de Davi e de lutar militarmente contra os romanos. Essa negativa de Jesus foi a crise que eles estavam esperando e em pouco tempo Jesus perdeu toda a sua popularidade.
Analistas políticos dizem hoje que as pessoas que melhoram de vida, também vão perdendo a memória. Por isso, a transformação social deve estar acompanhada de formação política. Melhorar a vida do povo sem vincular essa melhora a um projeto político de organização de uma base social de massas, esse parece ser a grande debilidade da mudança. E a euforia dos do povo no tempo de Jesus como a indignação - essas coisas não são um movimento social. São estados de ânimo que podem desaparecer com facilidade.
No Antigo Testamento, essa formação política tinha como foco a própria família. A educação familiar deveria passar de pai para filho. Assim diz Deuteronômio 6.20ss
No futuro os teus filhos perguntarão: Porque foi que o Senhor nosso Deus, nos deu estes mandamentos e estas leis? Ai vocês responderão: Nós éramos escravos do rei do Egito, mas o Senhor, com grande poder, nos tirou de lá, nós vimos com nossos olhos os grandes milagres e as coisas espantosas que Deus fez contra os egípcios e contra o seu rei e toda a gente de seu palácio. E Deus nos tirou do Egito para nos trazer aqui e nos dar esta terra, como havia jurado a nossos antepassados. Se obedecermos os seus mandamentos, ele nos guardará de todo mal, como tem feito até hoje. (Dt 6.20-25)
Quando isso não é assim, sem conservar a memória do passado, as pessoas viram massa de manobra que em um momento fazem o povo grita HOSANA e em pouco tempo esse mesmo povo gritará CRUCIFICA-O.
Para os líderes religiosos essa entrada triunfal de Jesus em Jerusalém foi a oportunidade que eles estavam esperando para reverter a história. Por isso eles denunciaram a Jesus aos romanos, como alguém que está ameaçando o senhorio romano sobre Israel.
Apesar de que o povo via em Jesus um líder político, eles mesmo não assumiu a expectativa de ser um líder político que pudesse liderar uma luta contra os romanos. Para Jesus, o povo de Deus já não era um povo ou uma nação. Para Jesus, o povo de Deus ainda não está pronto, mas está em constante processo de construção. Mais e mais pessoas precisam entrar nesse povo. E Jesus chama a tod@s, não somente os mais dignos. E nesse povo de Deus, Jesus enfatiza que é necessário recriar as condições para a convivência mútua.
Nós sabemos que a convivência humana entra em crise quando a ambição e o fanatismo cegam o amor ao próximo, quando os indivíduos adotam posições radicais, sem querer enxergar o lado do outro, quando há carência de diálogo, quando acúmulo de situações mal resolvidas, ressentimentos, mágoas, rancor e até outros sentimentos piores; quando construímos barreiras intransponíveis em nossa mente, pois aquilo que pensamos um do outro, muitas vezes, é o maior obstáculo ao bom relacionamento; enfim quando as palavras bonitas estão presentes na boca das pessoas, mas ausentes no coração.
Jesus em toda sua pregação propõem então a reconstrução da convivência humana. Isso significa que cada pessoa deve ser capaz de compartilhar o pouco que se tem com o outro(mesmo que sejam 5 pães e dois peixes), cada qual deve ser capaz de perdoar o outro, de dar mais atenção as pessoas que as coisas ou as leis, de ser capaz de renunciar e de entregar, mesmo sabendo que o outro está equivocado e que ele tem a razão.
A história demonstrou que esse projeto político de Jesus - que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei. (João 15.12) – tem sido mais duradouro que qualquer partido político. A proposta de Jesus, rejeitada no seu início, provou ser a melhor proposta – que resistiu e resiste a séculos. E como seguidor@s de Jesus ainda hoje, também nós somos chamados a praticar essa proposta diante de nossa realidade atual, em meio a campanhas de ódio coletivo e de luta de classes.
Deus seja louvado. Amém.