Mandar ou servir?

10/12/2021

 

Tempos atrás, certo autor cristão afirmou que, via de regra, o maligno tenta o ser humano em três áreas específicas: Sexo, dinheiro e poder. Sendo que a maioria das pessoas têm seu ponto fraco numa dessas áreas. Por isso, o chamado ao compromisso e à fidelidade são decisões que ajudam na área da sexualidade. A consagração dos talentos e a prática do “dízimo” ajudam no controle financeiro. Sobre a questão do poder, somos convidados a refletir sobre uma história bem conhecida que revela também um pouco do nosso caráter. O evangelista Marcos apresenta a seguinte situação.

TIAGO E JOÃO SE APROXIMARAM DE JESUS E DISSERAM: MESTRE! QUEREMOS QUE FAÇA O QUE VAMOS TE PEDIR. O QUE VOCÊS QUEREM? PERGUNTOU O MESTRE. OS DOIS RESPONDERAM: NA TUA GLÓRIA, QUE NOS ASSENTEMOS UM À TUA DIREITA E O OUTRO À TUA ESQUERDA! DISSE-LHES JESUS: VOCÊS NÃO SABEM O QUE ESTÃO PEDINDO. SERÁ QUE PODEM BEBER O CÁLICE QUE EU ESTOU BEBENDO OU SER BATIZADOS COM O BATISMO COM QUE SEREI BATIZADO? PODEMOS! RESPONDERAM JUNTOS. ENTÃO, JESUS LHES DISSE: VOCÊS BEBERÃO O CÁLICE QUE ESTOU BEBENDO E SERÃO BATIZADOS COM O BATISMO COM QUE ESTOU SENDO BATIZADO. CONTUDO, O ASSENTAR-SE À MINHA DIREITA OU À MINHA ESQUERDA NÃO ME CABE CONCEDER. TAIS LUGARES PERTENCEM ÀQUELES A QUEM DEUS PREPAROU. QUANDO OS DEMAIS DISCÍPULOS OUVIRAM A CONVERSA, FICARAM INDIGNADOS COM OS DOIS. JESUS REUNIU TODOS E ESCLARECEU: VOCÊS BEM SABEM COMO DOMINAM OS GOVERNANTES. MAS, HÁ OUTRAS PESSOAS MAIS IMPORTANTES QUE EXERCEM PODER SOBRE ELAS. NÃO SERÁ ASSIM ENTRE VOCÊS. PELO CONTRÁRIO, QUEM QUISER SE TORNAR IMPORTANTE DEVERÁ SERVIR. QUEM QUISER SER O PRIMEIRO DEVERÁ SER ESCRAVO DE TODOS. NEM MESMO O FILHO DO HOMEM VEIO PARA SER SERVIDO. MAS, PARA SERVIR E DAR A SUA VIDA EM RESGATE POR MUITOS (MARCOS 10.35-45).

Por três anos, Tiago e João estavam caminhando ao lado de Jesus. Conheciam o estilo do Mestre, que jamais procurou a glória humana. Minutos antes, Jesus tinha esclarecido em detalhes os seus objetivos: Vamos para Jerusalém. Eu serei condenado pelos sacerdotes, os quais me entregarão aos soldados. Eles vão me castigar. Serei cuspido, açoitado e depois morto. Mas, no terceiro dia vou ressurgir (Marcos 10.32-34). O Mestre jamais escondeu a sua missão redentora. De repente, os dois se achegam de maneira totalmente equivocada. Entendo que eles meteram os pés pelas mãos. Todavia, me vejo muitas vezes na mesma situação, quando desejo determinar que Deus faça o que eu quero. Ao invés de me colocar à disposição dele para servir, parece que quero fazer de Deus meu empregado. Os meninos disseram: Vamos te pedir algo. Mas, queremos ser atendidos! Um “senão” ainda ficou no ar. Senão, o quê? Se Deus não fizer o que eu quero, vou deixar de crer e de segui-lo? Eita gente abusada.

Como sempre, Jesus não foi grosso, muito menos estúpido. Ele sabia bem certo o que se passava naquelas mentes e naquele pedido descabido. Mas, o Mestre usa o limão para fazer uma limonada. Do desejo pecaminoso, passa uma lição de vida à sua equipe de outrora. Mas, a lição também serve aos atuais discípulos. Quando Jesus esclareceu que subia para Jerusalém, eles escutaram apenas isso. Na mente ladina deles, o Mestre seguia à capital para tomar o poder e reinar, pois eles reconheciam que tinha poder para tal. Sabiam do que ele era capaz. Mas, desconheciam (ou não queriam aceitar) a sua entrega pelos pecados da humanidade. O pensamento deles se limitava somente ao poder temporal. Então, sem o menor remorso, solicitaram: Senhor! Chegando lá, tomando o poder, permita que sejamos os teus primeiros ministros. Noutras palavras, queremos ter poder. Jesus sempre carregou perto de si os discípulos Pedro, Tiago e João no desejo de prepará-los à liderança da igreja, jamais para serem candidatos ao governo civil.

Ainda hoje, se equivocam as igrejas e os ministros religiosos que atentam ao poder. Por direito, como cidadãos, até podem. Mas. Deveriam se desvincular totalmente da função sacerdotal. Quem almeja o poder facilmente mistura religião e política, incorrendo na tentação do maligno de usar o poder em benefício próprio ou de sua religião. Lutero deixou muito claro que há dois reinos, do mundo e dos céus. Cabe ao governo civil determinar o andamento da sociedade, independente dos credos particulares. Cabe à igreja e seus servos pregar o Evangelho. Como cristãos, cabe-nos ser sal e luz na sociedade. Na realidade, de maneira sutil, aparece de novo aqui o tema do último sermão, onde Jesus deixou bem claro de que não há como servir a Deus e ao dinheiro (Mateus 6.24), onde as riquezas desvirtuam o sujeito fazendo com que governe em benefício próprio em detrimento do bem-estar da população.

Mais triste é que os demais discípulos também se revoltaram com o pedido. Incomodaram-se, mas não com o pedido em si. Eles acharam que mereciam o poder mais ou tanto quanto os outros. Ou seja, cada um pensando em si mesmo. É uma vergonha que, após 3 anos de caminhada, eles ainda apresentavam anseios errados. Mas, Jesus usa o momento para ensinar. Então, questiona os meninos: Vocês desejam mesmo passar pelo que vou passar? É óbvio que eles pensaram apenas na glória temporal ao responderem afirmativamente. Então, o Mestre aponta ao cálice do sofrimento e ao batismo de sangue. Inconscientes, eles dizem “sim”, assumindo o sofrimento. Não que eles, naquele momento, fossem levados à cruz com Cristo, ficando um à direita, outro à esquerda como ocorreu com os criminosos na cruz. Eles roeram a corda e fugiram da cruz. Mas, depois assumiram o ministério apostólico, sofrendo o martírio pelo Evangelho. Todavia, posteriormente, a consciência já era outra. Eles criam e viviam sob o signo da ressurreição.

Em seguida, Jesus começa a colocar dar contornos finais à sua lição. Inicialmente, ele não nega a importância e a necessidade do poder e da autoridade. Jesus não é um anarquista. Contudo, lembra que aqueles que mandam sempre terão sobre si outra autoridade. Quem manda sobre tudo e sobre todos é o próprio Deus. Por maior que sejam os poderes de alguém, ainda assim sua vida está nas mãos do Senhor. Jamais podemos esquecer disso. O próprio Tiago, mais adiante, afirmou: “AOS QUE DIZEM HOJE VAMOS FAZER ISSO, AMANHÃ AQUILO OUTRO... NÃO ESQUEÇAM QUE A VIDA NÃO PASSA DE UMA NEBLINA QUE ESTÁ AÍ, MAS LOGO SE DISSIPA” (Tiago 4.14). Enquanto vivemos, precisamos ter consciência, tanto das nossas limitações, quanto do nosso chamado ao serviço.

Eis a grande lição, com a qual encerro o sermão. Se Deus te concede oportunidade, tempo, dons, inteligência, criatividade e recursos é para servir ao Reino dele. Como se responde ao chamado? Tanto no serviço às demais pessoas, quanto no serviço à igreja e à sociedade. Se as pessoas olhassem mais umas às outras, as riquezas seriam melhor distribuídas, a fome não existira, pessoas não seriam mais exploradas, a violência acabaria. Eu sei e você também sabe que tal situação não faz parte da nossa natureza. Em mim impera o mal. Sou egoísta desde o nascimento. O único capaz de me transformar é Jesus. Por isso, é preciso sempre de novo focar nossos olhos nele, aprender com ele e imitá-lo. Que nos abençoe. Amém!

Com Carlos Magrão, “Aqui Estou Para Cantar”...
 


Autor(a): P. Euclécio Schieck
Âmbito: IECLB / Sinodo: Norte Catarinense / Paróquia: Garuva-SC (Martinho Lutero)
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 10 / Versículo Inicial: 35 / Versículo Final: 45
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Meditação
ID: 65527
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