Lucas 7.11-16

Prédica

Lucas 7.11-16 - 16º. DOMINGO APÓS TRINDADE

No dia seguinte, Jesus partiu para uma cidade chamada Naim. Seus discípulos e muita gente o acompanharam. Ao se aproximarem da porta da cidade, vinha saindo o enterro do filho único de uma viúva; e muita gente da cidade a acompanhava. Quando o Senhor viu a viva, teve pena dela e lhe disse: Não chores! Aproximou-se, então, tocou o esquife, e os que o conduziam pararam. E Jesus disse: Rapaz, eu te digo, levanta-te! O morto sentou-se e começou a falar. E Jesus o trouxe à sua mãe. Todos se amedrontaram e louvaram a Deus, dizendo: Um grande profeta surgiu entre nós! Deus visitou o seu povo! 

Prezada comunidade! 

Normalmente, o ser humano morre de medo da morte. A morte é para ele uma grandeza absoluta, definitiva, irrevogável. E, como consequência direta desta circunstância, também a vida passa a ter um valor absoluto. E essa tensão entre o valor absoluto da morte e o valor absoluto da vida pode levar o homem ás raias da loucura. 

Via de regra, a morte é para o homem um buraco, um precipício, um abismo sem fundo, é o fim absoluto, que não permite retorno. Algo que talvez só se compreende, quando se perde uma pessoa muito chegada e se começa a pensar, então, seriamente, no sentido da sua vida. É esta, certamente, uma das perguntas que mais comovem o ser humano que pensa: O que restara de mim, depois da minha morte? Ainda serei lembrado por certo tempo? Ou minha lembrança se apagará em breve, como se eu nunca tivesse existido sobre a terra? 

Quem tiver a hombridade de ser sincero consigo mesmo chegara, por si só, á dura e insuportável realidade: A minha morte no deixara sobra nenhuma. Ser a um fim definitivo. Mesmo entre os que eu mais amei e os que mais me amaram, minha lembrança passará com um sopro. Em poucos anos, só se lembrarão de mim no dia do aniversario de minha morte; e com o passar do tempo até disso os homens se esquecerão. Esta é a realidade, meus amigos. E esta realidade é um osso duro de roer. É um galho inquebrável. Mas a maioria procura quebrá-lo. E conseguem - temporariamente. Assim como um bêbado se embriaga para esquecer sua sorte; assim o ser humano se embriaga, procurando afogar, esquecer o fantasma da morte/abismo. Ele se embriaga no trabalho excessivo, no idealismo desenfreado, numa religiosidade deturpada, na ostentação exibicionista, no luxo, na farra. E tanto pior é a ressaca - quando a morte bate à porta, pondo fim a embriaguez, lembrando, implacável, que ela no pode ser olvidada, que ela é uma realidade para cada qual. 

O pior, em tudo isso, é que a morte é inatingível, indestrutível, que me acompanha como uma possibilidade constantemente latente desde o meu primeiro segundo devida. — Como a minha sombra, da qual não posso fugir e que eu não consigo destruir. É um jogo atroz, esse jogo entre o homem e a morte. Por causa da total impotência do homem e da infinita superioridade da morte. Como um gato que se deleita em brincar com o ratinho, antes de devorá-lo.

É assim que a morte normalmente se apresenta ao ser humano. E é justamente por isso que o homem se agarra a vida com unhas e dentes e se esvai e se esgota para fazer algo deste palmo de tempo que lhe resta. E, apavorado com a morte, o homem acaba destruindo o que lhe resta de vida, só pela preocupação de perdê-la. Como alguém que tem nos braços uma grande, linda e finíssima bola de cristal; e agarra a bola de medo que alguém a tome; e de tanto agarrar, de tanta ânsia, acaba quebrando a bola. 

Esta é a vida normal dos homens. Uma vida dominada pela morte em todos os sentidos, em todos os aspectos, em toda sua extensão. Uma vida, que na verdade nem é mais vida, mas: vida debaixo da morte! Tudo isso, porque a morte representa um abismo sem fundo, absoluto, irrevogável. Enquanto isso acontecer, o homem não pode encarar tranquilamente o fim, e em consequência, também não pode viver uma vida tranquila, equilibrada e bem aproveitada.

II

Os senhores devem ter percebido que falei muito em normalmente. Sim, porque tudo o que foi dito até aqui não aqui no é válido para o cristão. O homem que conhece e crê no Deus de Jesus Cristo é o único capaz de enfrentar tranquilamente a sua morte e, por isso, também o único capaz de viver uma vida tranquila. Acontece que o homem que conhece e crê no Deus de Jesus Cristo sabe muitas coisas que o ser humano normal desconhece. 

Ele sabe, antes de mais nada, que a morte-abismo, a morte definitiva e irremediável, a morte-fantasma, é produto do pecado; é algo que o homem provocou por sua oposição a Deus. Ele sabe, portanto, também, que a rigor o problema reside no pecado, provocador da morte, É o pecado, portanto, que tem de ser resolvido. Sabe mais, este homem, que nós, por nós mesmos, não conseguimos resolvê-lo. Nós podemos, quando muito, retocar aqui e ali, remendar um pouco: mas o pecado permanece. Ele sabe que, se é que há solução para o pecado do homem, esta tem que vir de fora. Mais precisamente: a solução tem que vir daquela instância que julga o meu pecado. 

Este homem, que crê no Deus de Jesus Cristo, sabe que o problema do pecado só será resolvido se esta instância, que o julga e o condena, desistir de condená-lo; se esta instância perdoar o pecado. Então sim, perdoado o pecado, estará resolvido o problema da morte. Assim, desaparecerá a realidade da morte — como algo absoluto, irrevogável, definitivo: algo que carimba um sinal negativo à frente da nossa vida. Se aquela instância, à qual compete julgar e condenar o pecado, desistir da condenação, a morte absoluta dará lugar a outra realidade, mais importante, maior, uma realidade positiva, que carimba um sinal positivo ã frente da nossa vida. 

III

Prezada comunidade, é disto, precisamente, que fala o trecho lido há pouco, a história sobre a ressurreição do filho única da viúva de Naim. Ela não tem um fim em si própria. Não quer meramente narrar o feito excepcional de um milagreiro. Assim como se costuma contar um causo. Ela nos diz, isso sim, que Jesus deu, em sua vida, uma demonstração, um sinal do seu poder sobre a morte; poder este que viria a se revelar de maneira cabal em sua própria pessoa, na sua Ressurreição.

Nesse sentido, a história sobre a ressurreição do filho da viúva de Naim nos diz duas coisas muito importantes. Importantes para nós, que nos defrontamos com o problema da morte. 

Quando o Senhor viu a viúva, teve pena dela e lhe disse: No chores! Jesus teve pena. E isso é diferente. Assim como, por exemplo, num acidente de trânsito; alguém é atropelado e está deitado na rua, com uma veia rompida, se esvaindo em sangue. É uma diferença se eu passar por perto e sentir pena ou se passar por perto um médico, sentir pena e estancar o sangue. A sua pena vale muito mais do que a minha. Assim também a pena de Jesus. 

Ele sente pena e consola - Não chores! - como quem tem autoridade. Como aquele que se solidariza conosco na nossa culpa, no nosso pecado, provocador da morte. Se solidariza ao ponto de morrer por este pecado, justamente ele, que não conheceu pecado. E, com essa solidariedade, ele deu o primeiro passo decisivo: resolveu o problema do nosso pecado, conquistando o seu perdão: o perdão do pecado que é a causa da morte absoluta e irrevogável.

O outro ponto importante da história é o seguinte: Jesus disse: Rapaz, eu te digo, levanta-te! Foi a prefiguração do seu poder sobre a morte, do seu poder da ressurreição. Ressurreição esta, pela qual ele mesmo passou, abrindo o caminho, e a qual ele oferece a todos os que nele confiam. Levanta-te! Jesus foi o primeiro a levantar-se deste esquife da morte, que sem ele seria e é um abismo sem fundo.

Suponhamos que o Taimbezinho não tivesse seus 200 e tantos metros de fundura, mas que fosse uma fenda até as entranhas da terra. Imaginemos mais: uma estrada conduz diretamente ao Taimbezinho. Poucos quilômetros antes ela se bifurca. Um braço da estrada termina no precipício; diante dele só há buraco, vazio. O outro braço leva a uma ponte, que passa por cima do abismo. Do outro lado, continua a planície, porém com uma grande diferença: do lado de cá, s planície é um campo de batalha semeado de escombros; do lado de lá, é um parque, um jardim a perder de vista. 

A ponte da ressurreição esta aí. É o único jeito de vencer o abismo sem fundo da morte. A ponte esta ai e nela não se exige pedágio. Só que nem todos a encontram. Para encontrar a ponte da ressurreição é preciso: reconhecer o pecado, que levaria à morte-abismo; aceitar o perdão do mesmo; confiar na vontade e capacidade de Jesus de construir uma ponte sobre o abismo. 

IV 

Meus caros presentes, para quem confia nesta ponte da ressurreição, a morte passa a ter bem outro valor; perde seu caráter absoluto, abismal, irrevogável; não é mais aquele fantasma aterrador e invencível que apavora. E para quem confia na ponte da ressurreição, também a vida per de seu valor absoluto. Não é mais aquela bola de cristal — que não quero largar e a qual me agarro com unhas e dentes. Eu não enlouqueço se a perder, pois sei que depois da ponte a planície continua, e muito melhor do que deste lado. 

Antes de finalizar, não posso deixar de abordar ainda um ponto muito importante. Muitos acusam o Cristianismo de provocar, justamente com sua fé na ressurreição e na vida eterna, um desprezo pelo vida atual, entravando inclusive com isso a melhoria da situação dos pobres e necessitados. Lamentavelmente, muitos cristãos parecem agir realmente de acordo com esta acusação. Mas, quem assim o faz, ainda não desconfiou de que se trata. Se eu não crer na ressurreição por Jesus e a morte for, então, para mim, um abisme sem fundo, um fim absoluto de tudo, eu vou procurar fazer tu do da minha vida, enquanto der; eu serei o egoísmo personificado. Se, no entanto, eu crer na ressurreição como a ponte sobre a morte, e encarar esta minha vida como uma peregrinação, então sim, e só então, me torno suficientemente livre de mim mesmo, da minha vida para dar algo dela a outros, para procurar plantar um canteiro neste campo de batalha. E se a terra for seca e a — minha bola de cristal da minha vida estiver cheia de água, eu terei até a liberdade de quebrá-la, espontanea e deliberadamente, para regar o canteiro. 

Esta mensagem que Deus nos dá hoje, prezada comunidade, é uma mensagem de graça. A sentença inicial deste sermão dizia que normalmente, o ser humano morre de medo da morte. Graças a Deus, a sentença final pode ser esta: Jesus Cristo venceu a morte para nas; ele construiu a ponte da ressurreição; por isso, podemos morrer tranquilos e viver tranquilos, pois em Cristo morte e vida adquirem o valor que merecem. Amém. 

Oremos: Gratos te somos, nosso Deus, por teres resolvido para nós o problema da morte, perdoando-nos os nossos pecados. Ajuda-nos a compreender esta tua maravilhosa dádiva, para que possamos enfrentar tranquilamente o nosso fim e levar uma vida igualmente tranquila, dedicada não mais a nos, mas ao nosso próximo. Por Jesus Cristo. Amém.

Veja:
 Nelson Kirst
Vai e fala! - Prédicas
 Editora Sinodal
 São Leopoldo - RS


 


Autor(a): Nelson Kirst
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 17º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 7 / Versículo Inicial: 11 / Versículo Final: 16
Título da publicação: Vai e fala! - Prédicas / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1978
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 20323
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