Lucas 24.36b-48

Auxílio Homilético

15/04/2018

 

Prédica: Lucas 24.36b-48
Leituras: Salmo 4 e 1 João 3.1-7
Autoria: Vera Maria Immich
Data Litúrgica: 3º. Domingo da Páscoa
Data da Pregação: 15/04/2018
Proclamar Libertação - Volume: XLII

As marcas do amor

1. Introdução

O Salmo 4 revela confiança em Deus e clama por sua fi delidade, mesmo na adversidade; fala em irar-se e não pecar, em consultar o travesseiro. Esse salmo chama para a prudência e a renúncia, assim como a confiança em qualquer circunstância.

O texto de 1 João 3.1-7 lembra-nos de nossa filiação divina através do batismo, nossa justificação por graça e da transformação que o conhecimento de Deus opera em nós. Quem o conhece não vive pecando, e quem vive pecando é porque não o conheceu. A fé em Deus redunda em transformação.

O Evangelho de Lucas 24.36b-48 ensina, através das marcas que o amor deixa na carne de Jesus, o seu compromisso conosco: apalpai e verificai. Ele não desiste. Ele ensina. Ele se revela humano e real: pede para comer. Ele anuncia mais uma vez a extensão do seu amor: todas as nações.

Um ponto comum aos três textos é o relacionamento de Deus conosco,permeado pelo amor que caminha junto e que não desiste. Neste período posterior à grande celebração da Páscoa e da Quaresma, não menos marcada por momentos litúrgicos bastante significativos, temos um período de acomodação de eventos. Caminhamos para o Pentecostes, mas ainda temos passos para dar nessa direção. Assim como os discípulos de Jesus são preparados para esse novo evento, assim também nós precisamos abrir nossos corações e mentes para aceitar e vivenciar a Páscoa da ressurreição em nossa vida.

2. Exegese

A saudação “paz seja convosco” é uma tradicional saudação israelita, com a qual Jesus se revela àquele grupo reunido, gerando dúvidas, uma vez que não sabem se se trata de um fantasma ou se verdadeiramente é Jesus quem está com eles. Mas Jesus está disposto a provar defi nitivamente sua ressurreição, pois carrega em seu corpo as marcas físicas da cruz, nas mãos e nos pés. Ele carrega os cravos de um amor único: bom, fiel e redentor. Um amor que transcendeu a morte, confirmando-se na ressurreição. Ele mostra as marcas em seu corpo.

Segundo Luís Carlos Ramos, Lucas insere esse encontro com o Ressurreto no quadro maior do caminho de Emaús, que ficou lembrado por dois estágios marcantes: o primeiro, ao redor da Palavra, enquanto Jesus expunha as Escrituras, caminhando ao longo da estrada; o segundo, à mesa, quando se dá a experiência reveladora, no partir do pão, já na aldeia de Emaús. Na mesma noite, em Jerusalém, reunidos os discípulos (e discípulas, por suposto) no cenáculo (cômodo reservado para as refeições), Jesus teria se apresentado colocando-se “no meio” (gr. meso, v. 36). Dessa raiz grega, passando pelo latim (medus e mensa), herdamos a palavra “mesa”.

A construção da cena fica mais clara quando, para superar a incredulidade dos que estavam no cenáculo, Jesus pede algo para comer. A mesma experiência reveladora de Emaús se repete: A seguir, Jesus lhes disse: importava se cumprisse tudo o que de mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos. Então, lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras (v. 44-45). 

Desde então, a igreja entendeu que a vida cristã se estrutura sobre dois pilares (a palavra e a mesa), e vive fundamentada na comunhão da palavra e do alimento físico, na Santa Ceia e na singela comunhão de mesa e partilha (ágape), tantas vezes experimentada na vida comunitária. Cristo se revela quando nos reunimos ao redor da sua palavra encarnada e quando repartimos o pão da solidariedade numa mesa inclusiva.

3. Meditação

Jesus aceita as marcas em seu corpo não para benefício próprio, mas por amor ao pecador. Ele ressuscita e carrega as marcas da sua dor para que os discípulos também possam curar-se das suas dores e da sua incredulidade. Ele aceita as marcas que essa aprendizagem deixa em seu corpo (marcas da experiência e da frustração, marcas da traição) e faz-se instrumento para aprendizagem de outros. Essas marcas levam ao crescimento na fé e na confi ança de um Deus que se doa, que se entrega sem restrição. São marcas do amor incondicional de Jesus pelo mundo e por cada um de nós.

Jesus pede algo para comer. Será que o ressurreto está com fome? Acredito que não. Acredito ser a prova definitiva de que não é um fantasma, mas o próprio ressuscitado. Ele come um peixe e um favo de mel. Ele é real. A ressurreição é real. Jesus revela-se ao seu grupo da maneira como sempre viveu: ensinando com amor e à exaustão, sempre de novo e quantas vezes forem necessárias; antevendo situações e especulações sobre a qualidade dessa aparição. Por isso ele se alimenta, não deixando margem nenhuma que está aí de maneira real e concreta. Não é um fantasma. Fantasmas não se alimentam, ou melhor, nem existem. Ele responde à incredulidade daquela época e também à nossa incredulidade.

A escolha de alimentar-se também remete ao valor sagrado do ágape, da partilha com o forasteiro, com quem necessitar. É o “paz seja convosco” materializado na comunhão de mesa e no olhar para as misérias do outro como fonte inesgotável de testemunho e fé. É a humildade de falar das minhas misérias e reconhecer que necessito do amor de Jesus e da acolhida do outro para seguir adiante. As marcas que permanecem no corpo de Jesus são a prova real que ele venceu a realidade da morte e cruz. Ele chama os presentes para apalpar suas marcas, olhar e sentir a superação das amarras de dor e sofrimento.

Através das marcas de suas feridas curadas, ele ensina que também as nossas feridas podem ser curadas. Que essas também deixarão marcas no corpo e em toda a nossa existência, em nossa história. Serão as marcas da superação e da vitória, da persistência e da fé. Dores e sofrimentos não são apagados nem esquecidos. São superados e fazem parte da história de vida e de fé, de nossa esperança e confiança, de nossa busca incansável pela cura de nossas angústias e enfermidades, de nossa falta de fé e humildade para aceitar o ressurreto com suas chagas. O texto de 1 João 3 fecha a pregação com a chave do amor: o grande amor de sermos chamados filhos e filhas de Deus através do batismo, que vai fazer diferença em nossa vida. Pertencemos a uma nova família, a da fé, devemos viver com essa família e nos deixar conduzir por ela pelas veredas da vida, resistindo às suas tentações e nos fortalecendo nas tribulações.

4. Imagens para a prédica

Em nossa vida crescemos e amadurecemos nossos conceitos e nossos conhecimentos. Nossos corpos também testemunham essas mudanças. Crescemos e ficamos fortes, e muitas vezes gozamos de uma boa saúde. Opções e a própria vida deixam marcas indeléveis. Verdadeiras cicatrizes. Às vezes cirurgias que auxiliam a vencer uma enfermidade; às vezes uma cesariana, aliada a um parto complicado, possibilita o romper de uma nova vida. Cicatriz ou flacidez, ou ambas, continuam a testemunhar o acontecido. Muitas pessoas mostram suas cicatrizes, outras ocultam.

Há filmes que exibem marcas de tiros pelo corpo de seus personagens como troféus de resistência, de força, de coragem e de determinação, assemelhando-se a Jesus, por também marcar o corpo e permitir uma comprovação. No entanto, enquanto alguns o fazem para exibir força própria e promover-se, Jesus o faz motivado por amor e obediência a um projeto. Ele não exibe as marcas, mas as mostra e permite que os incrédulos toquem-no para auxiliar na fé. Seu corpo passa a ser prova real desse projeto e objeto didático para a fé. Ele não se promove, mas promove o amor e a fé. As marcas no seu corpo são marcas do amor que quer ensinar de maneira concreta, sem margem alguma para dúvida. São uma prova indelével desse amor.

5. Subsídios litúrgicos

Poesia de acolhida: A todos e todas que nesta manhã chegam à casa de Deus para lhe render graças e louvor, saúdo com uma oração de Tomás de Aquino, que diz o seguinte:

Que eu chegue a ti, Senhor,
Por um caminho reto e seguro,
Caminho que não se desvie entre prosperidades ou adversidades,
De tal forma que eu te dê graças nas horas prósperas
E nas adversas conserve a paciência
Não me deixando exaltar pelas primeiras,
Nem abater-me pelas outras.
Que nada me alegre ou entristeça,
Exceto o que me conduz a ti ou o que de ti me separe.
Que eu não deseje agradar ou não receie desagradar a ninguém senão a ti.
Tudo o que passa torne-se desprezável aos meus olhos por tua causa, Senhor,
E que tudo o que te diz respeito me seja caro,
Mas tu, meu Deus, mais do que o resto.
Dá-me, Senhor Deus,
Um coração vigilante.
Que nenhum pensamento curioso arraste para longe de ti,
Um coração nobre que nenhuma afeição indigna debilite;
Um coração reto que nenhuma afeição inequívoca desvie;
Um coração firme que nenhuma adversidade abale;
Um coração livre que nenhuma paixão subjugue.
Concede-me, Senhor, meu Deus,
Uma inteligência que te conheça,
Uma angústia que te procure,
Uma sabedoria que te encontre,
Uma vida que te agrade,
Uma perseverança que te espere com confiança
E uma confiança que te possua, enfim, quando a derradeira hora chegar.

Bênção celta:

Que o caminho venha ao teu encontro.
Que o vento sempre sopre às tuas costas
e a chuva caia suave sobre teus campos.
E até que voltemos a nos encontrar, que Deus te sustente suavemente
na palma de sua mão.
Que vivas todo o tempo que quiseres e que sempre possas viver plenamente.
Lembra sempre de esquecer as coisas que te entristeceram,
porém nunca esqueças de lembrar aquelas que te alegraram.
Lembra sempre de esquecer os amigos que se revelaram falsos,
porém nunca esqueças de lembrar aqueles que permaneceram fiéis.
Lembra sempre de esquecer os problemas que já passaram,
porém nunca esqueças de lembrar as bênçãos de cada dia.
Que o dia mais triste de teu futuro não seja pior
que o dia mais feliz de teu passado.
Que o teto nunca caia sobre ti
e que os amigos reunidos debaixo dele nunca partam.
Que sempre tenhas palavras cálidas em um anoitecer frio,
uma lua cheia em uma noite escura,
e que o caminho sempre se abra à tua porta.
Que vivas cem anos, com um ano extra para arrepender-te.
Que o Senhor te guarde em sua mão, e não aperte muito seus dedos.
Que teus vizinhos te respeitem, os problemas te abandonem,
os anjos te protejam e o céu te acolha.
Que as bênçãos do Santo Espírito te contemplem.
Que teus bolsos estejam pesados e teu coração leve.
Que a boa sorte te persiga,
e a cada dia e cada noite tenhas muros contra o vento,
um teto para a chuva, bebidas junto ao fogo,
risadas que consolem aqueles a quem amas,
e que teu coração se preencha com tudo o que desejas.
Que Deus esteja contigo e te abençoe, que vejas os filhos de teus filhos,
que o infortúnio te seja breve e te deixe rico de bênçãos.
Que não conheças nada além da felicidade, deste dia em diante.

Bibliografia

RAMOS, Luiz Carlos. A comunidade da ressurreição ao redor da mesa. Disponível em: .


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Autor(a): Vera Maria Immich
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Páscoa
Perfil do Domingo: 3º Domingo da Páscoa
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 24 / Versículo Inicial: 36 / Versículo Final: 48
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2017 / Volume: 42
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 50152
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