Prédica: Lucas 2.1-7
Leituras: Isaías 11.1-9 e Romanos 1.1-7
Autoria: Geraldo Graf
Data Litúrgica: Noite de Natal
Data da Pregação: 24/12/2015
Proclamar Libertação - Volume: XL
E se o Natal fosse hoje?
O culto da véspera de Natal costuma reunir muitas pessoas, sobretudo crianças. Em muitas comunidades, realizam-se o teatro de Natal e a distribuição de doces. Por isso sugerimos como mensagem uma encenação natalina para esta ocasião, com o objetivo de sensibilizar as pessoas para o verdadeiro sentido do Natal. Recomendamos a leitura do auxílio homilético preparado pela pastora Sisi Blind no Proclamar Libertação v. 30, p. 24-30.
Personagens: Locutor, José da Silva, Maria da Silva, fazendeiro César Augusto Romano, capataz, secretária, empresário Heródio Pontes Pilates, agente de empregos, gari 1, gari 2, gari 3.
Época: Natal de 2016.
LOCUTOR: Hoje nós celebramos a véspera de Natal. As igrejas ficam lotadas, e as pessoas entoam a todos os pulmões os belos hinos que falam da vinda do Salvador. As pessoas enfeitam suas casas com multiformes cores e luzes. Presentes são dados e recebidos. Jantares reúnem as famílias. Mas será que isso tudo refl ete e transmite a verdadeira mensagem do Natal? Essa mensagem diz que Deus veio ao mundo por intermédio de uma criança, frágil e ameaçada, e desceu à mais profunda fraqueza humana justamente para nos resgatar, nós que vivíamos afastados de seu amor por causa do pecado. Tanto assim Deus nos amou, “que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16).
Conseguimos dimensionar esse amor? Temos a capacidade de compreender a profundidade desse gesto? E se acontecesse hoje entre nós, perceberíamos o sinal da salvação? Quando Lucas escreveu o seu evangelho, os cristãos estavam sendo perseguidos porque se negavam a endeusar o imperador romano, que se declarava o salvador do mundo. Lucas contrapôs esse culto ao imperador com outra história: a história de uma criança, nascida pobremente na longínqua província da Palestina. Essa, sim, era o Salvador do mundo. Deus escolheu reconciliar a humanidade consigo mesmo por meio de uma criança, humilde, frágil e ameaçada, mas que mudaria para sempre a nossa relação com Deus. Nós não queremos celebrar o Natal apenas como uma data que remete a um acontecimento esquecido lá no passado. E se o Natal fosse hoje? Reconheceríamos na criança recém-nascida o Salvador do mundo? Para refletirmos sobre essas perguntas, vamos assistir a uma encenação que bem poderia ser a história do Natal transportada para os nossos dias, para a nossa cidade.
ATO 1
CENA 1
(na casa de José e Maria)
MARIA: José, meu esposo, qual foi o recado que nosso patrão, o senhor César Augusto Romano, mandou a você?
JOSÉ: Pois é, Maria, o patrão mandou avisar que eu vá ainda hoje à sede da fazenda. Sei não... Coisa boa não é.
MARIA: Tem “caroço nesse angu”.
JOSÉ: Do jeito que ele é ganancioso... Desde que você ficou grávida, ele vem jogando indireta, dizendo que nós só lhe damos prejuízo. Só que ele não reconhece que você não pode trabalhar neste estado em que você se encontra.
MARIA: Você acha que ele vai tomar uma atitude contra nós? Só porque eu estou grávida? Ele não pode fazer isso!
JOSÉ: Poder, ele não pode, mas faz! Ele até manda no prefeito e no delegado. Quem pode fazer alguma coisa contra ele? Tenho um péssimo pressentimento quanto à nossa permanência aqui na fazenda. Bom... Eu vou ver o que o patrão está querendo comigo.
MARIA: Ficarei ansiosa aguardando a sua volta. Espero que você traga boas notícias. Meu estado adiantado de gravidez dificulta uma mudança agora. Eu preciso de repouso.
JOSÉ: Estou indo. Ore a Deus pedindo que tudo dê certo.
MARIA: Que a vontade de Deus seja feita!
CENA 2
(na casa do fazendeiro)
CAPATAZ: Boa tarde, José!
JOSÉ: Boa tarde! O Dr. César Augusto mandou me chamar. Ele pode me atender agora?
CAPATAZ: Vou ver se o coronel tem tempo. Espera um pouco. Mas não mexe em nada, viu? (falando ao público) A gente precisa ficar de olho nessa gentalha, senão eles acabam aprontando alguma coisa. (vai para a outra extremidade do palco) Patrão, com licença, chegou aquele seu empregado, o José, aquele que o senhor mandou chamar. Posso dizer que ele entre?
FAZENDEIRO: Sim. Manda aquele traste entrar. Quanto antes eu o despachar, melhor.
CAPATAZ (chama José): Pode entrar. Mas tira o chapéu. Mostra um pouco de respeito na presença do patrão...
JOSÉ (cabisbaixo): Mandou me chamar, patrão? Eu vim o mais depressa que pude.
FAZENDEIRO: Minha conversa com você é rápida. Não precisa nem sentar. Vamos direto ao assunto: andei reparando que, quanto mais cresce a barriga de sua mulher, menos você trabalha. Por isso eu vou mandar vocês embora. Vocês só me dão prejuízo. Aliás, a sua dívida no armazém da fazenda está bem grande. Vou ter que descontá-la do dinheiro que eu lhe devo. Acho que não vai sobrar quase nada. Isso se você não ficar devendo.
JOSÉ: Patrão, eu nem compro tanto assim. O problema é que os preços no seu armazém são exorbitantes. E o senhor não nos deixa fazer compras lá na cidade... Além disso, o salário que o senhor paga não é lá grandes coisas...
FAZENDEIRO: (esmurra a mesa) Agora você deu para me afrontar? Fica agradecido por eu não colocá-lo na cadeia por causa da sua insinuação e da sua dívida. Só não o mando prender em consideração à gravidez da Maria.
JOSÉ: Desculpe, patrão, eu não quis ofender. Eu imploro: não nos mande embora. Nós não temos para onde ir, e a nossa criança está para nascer. Prometo trabalhar dobrado para compensar os dias parados...
FAZENDEIRO: Não tem mais nem menos! Você está despedido e ponto final. Mas para mostrar que eu sou bonzinho, eu lhe dou uma carta com a qual você pode procurar emprego na firma do meu compadre Dr. Heródio Pontes Pilates, lá na cidade de (inclua a sua cidade). Quem sabe, ele tem uma vaga de faxineiro ou de auxiliar de serviços gerais para você. Mais do que isso vocês não sabem fazer.
JOSÉ: (apanha a carta) Está bem, patrão. Desculpa qualquer coisa. Passar bem! (sai)
FAZENDEIRO: Passar bem! (depois se volta para o público) Passar bem, ora essas... Esse já vai tarde.
ATO 2
CENA 1
(no escritório do Dr. Heródio)
JOSÉ: Bom dia, com licença, aqui é o escritório do Dr. Heródio Pontes Pilates?
SECRETÁRIA: O que vocês querem? Já vou logo avisando: se é para pedir esmola, bateram na porta errada!
MARIA: Não, senhora, nós somos pobres, mas somos honestos. Viemos a mando do Dr. César Augusto Romano, nosso ex-patrão. Ele nos mandou procurar emprego aqui.
JOSÉ: Temos aqui uma carta de recomendação. O seu patrão, Dr. Heródio, pode atender?
SECRETÁRIA: Bom, se é uma carta do Dr. César Augusto, então eu vou ver se ele pode recebê-los agora. (sai)
MARIA: Será que vamos conseguir o emprego? Estou muito preocupada. Esta cidade é muito grande. Onde encontraremos um lugar para morar? Ainda mais agora que nosso neném está prestes a nascer.
JOSÉ: Eu confio em Deus. Ele vai nos socorrer. Com a carta do Dr. César Augusto, o Dr. Heródio vai nos contratar.
SECRETÁRIA: (na sala ao lado – outro lado do palco) Dr. Heródio, está aí um casal que trouxe uma carta do seu compadre, Dr. César Augusto. O senhor vai atendê-los? É um casalzinho bem “simplório”.
HERÓDIO: O que o meu compadre César Augusto me arranjou desta vez? Ele simplesmente está transferindo seus problemas para mim. Mande-os entrar. Vou ver o que eles querem, mas só de curiosidade.
SECRETÁRIA: (volta) O Dr. Heródio vai recebê-los. Podem entrar.
JOSÉ: (entram) Bom dia, Dr. Heródio.
MARIA: Bom dia.
HERÓDIO: Bom dia? Péssimo dia. Então aquela raposa velha mandou vocês embora? E vocês acham que eu tenho emprego para vocês?
JOSÉ: Nós precisamos muito desse emprego. Veja o estado de minha esposa!
HERÓDIO: Lamento muito. Não tenho nenhum serviço para vocês. Se ao menos tivessem um diploma ou uma especialização. Mas assim, sem curso, não dá. E o pior. Com essa barriga a senhora não vai achar emprego fácil. Ninguém contrata para o empregado ficar à toa. Esse negócio de licença-maternidade é só para dar prejuízo para a gente. Mas procurem por aí. Quem sabe alguém precisa de uma capina de quintal, uma faxina ou algo semelhante...
MARIA: Mas, Dr. Heródio, o Dr. César Augusto garantiu que o senhor arranjaria emprego para nós.
HERÓDIO: Nada feito! Não tenho nenhum compromisso com vocês. Depois eu me entendo com o Dr. César Augusto. Agora vão embora. Tenho mais o que fazer do que ouvir as lamúrias de vocês.
JOSÉ: Desculpe, doutor, nós não queríamos importunar. Até logo. (saem)
CENA 2
(na agência de empregos)
AGENTE: Já falei e repito: não temos emprego para gente desqualificada. Nem currículo vocês trouxeram! O que vocês querem aqui na cidade? Aqui não basta saber puxar uma enxada. Aqui é preciso ter diploma. Diploma! Entenderam?
MARIA: Por favor, dê mais uma olhada em sua lista. Nós fazemos qualquer coisa, pegamos qualquer serviço. Nós precisamos arranjar um emprego, pois temos uma criança prestes a nascer, para alimentar e abrigar...
AGENTE: E eu com isso? Isso não é problema meu. Botar filho no mundo para pedir esmola, isso é problema de vocês. Não tenho emprego para vocês. Se quiserem, procurem abrigo lá no albergue da prefeitura.
JOSÉ: Vamos embora, Maria. Já vi que estamos perdendo tempo. Vamos continuar procurando. Em algum lugar encontraremos serviço e abrigo. Eu confio em Deus, e ele não haverá de nos abandonar. (saem)
ATO 3
NA ÚNICA
(sob o viaduto, durante a noite)
GARI 1: (varrendo) Gente, como as ruas ficam sujas neste tempo de Natal! Só para dar mais serviço para nós. E quando a gente pede “caixinha”, as pessoas acham ruim e nos chamam de vagabundos.
GARI 2: É. Eu já me acostumei com tanta ofensa. Hoje parece difícil conseguir terminar nosso serviço no horário. E eu que hoje ainda não vi minha esposa e meus filhos. Quase nunca conseguimos passar o Natal juntos. O nosso serviço sempre dobra durante o Natal.
GARI 3: É verdade. Natal sempre é muita correria. É gastança, é festa. O verdadeiro significado do Natal fica esquecido.
GARI 1: No Natal, nós celebramos a vinda do Salvador. Nós nos alegramos por causa do maravilhoso presente que Deus nos dá. Só que tudo isso costuma fi car esquecido. Todos falam do Papai Noel e quase nunca do Salvador Jesus.
GARI 2: Amanhã cedo, quando meus filhos acordarem, contarei essa história do amor de Deus para eles. É o presente que eu posso dar a eles.
GARI 3: (ouve o choro de um bebê) Ouçam! Parece o choro de uma criança. E vem dali, debaixo do viaduto. Olhem! Ali tem um casal com uma criancinha recém-nascida.
GARI 2: E a criança está dentro de uma caixa de papelão. Será que eles não têm onde ficar? Eles não parecem moradores de rua. Deve ser gente que veio de longe.
GARI 3: (falando para José e Maria) Quem são vocês e o que fazem aqui tão tarde da noite e, ainda por cima, com uma criança recém-nascida?
JOSÉ: Meu nome é José, e esta é minha esposa Maria. Nós somos do interior. Nosso patrão nos despediu, e viemos tentar a sorte aqui na cidade. Procuramos muito e em todos os lugares. Mas ninguém nos contratou. Também não temos dinheiro para pagar um hotel. O jeito foi achar um lugar coberto aqui debaixo deste viaduto. Foi então que o menino nasceu.
MARIA: Nós não sabemos para onde ir.
GARI 1: Não se preocupem. A gente dá um jeito nisso. Lá em casa tem um puxadinho. Vocês podem ficar lá até conseguir um emprego.
GARI 2: Nosso chefe comentou que precisa de mais gente para dar conta do serviço neste fim de ano. José, você não se importa de trabalhar como gari? A gente pode conversar com o chefe e pedir a vaga para vocês.
MARIA: Nós aceitamos. Viu, José, Deus não nos abandonou.
GARI 3: O menino deve estar com frio. Aqui, peguem! Cubram-no com meu casaco. Aqui, peguem! Tenho uma garrafa térmica cheia de café quentinho e também um lanche. Acho que vocês ainda não comeram nada no dia de hoje.
JOSÉ: Muito obrigado. São os presentes mais valiosos que poderíamos receber, especialmente a solidariedade de vocês. E tudo isso na noite de Natal!
GARI 1: (pega o celular) Eu vou ligar para o SAMU. Só para garantir que está tudo bem com a criança.
GARI 2: Se eu contar esta história, ninguém vai acreditar! Ela é parecida com a história do Natal.
GARI 3: E vocês já escolheram um nome para o menino?
LOCUTOR: E foi assim que nasceu a criança, sem ter um lugar para ficar. Os primeiros visitantes foram pessoas que exerciam uma profissão nem sempre reconhecida e valorizada. Os garis assemelham-se aos pastores de ovelhas do primeiro Natal. Foi mais ou menos assim a história do primeiro Natal. O Salvador veio ao mundo como uma criança humilde, pobre e ameaçada. Nasceu num curral porque não tinha lugar para ela. As primeiras testemunhas foram pastores de ovelhas, gente pobre, que exercia uma profissão desprezada e mal valorizada. Foi assim que Deus escolheu para revelar o seu infinito amor à humanidade. Ele desceu à mais profunda pobreza e dor para manifestar seu desejo de salvar todas as pessoas. E começou bem por baixo, ali onde as pessoas sentiam-se mais desprezadas e abandonadas. Pessoas continuam abandonadas, sem um teto, sem um lar, sem emprego e sem pátria. Continuam ameaçadas e perseguidas. Crianças continuam nascendo sem ter um lugar. Tudo isso lembra-nos que Deus escolheu a fraqueza do mundo para revelar-se através de Jesus Cristo e oferecer seu profundo amor à humanidade. Que nos sensibilizemos com a gratidão a Deus por seu infi nito amor e nos motivemos ao amor fraterno e solidário para com o próximo. Então é Natal!