Joel 3.1-5 - PENTECOSTES
Meus amigos!
Quando estive preparando esta prédica, fiquei muito surpreso com uma observação. O tema da nossa reflexão de hoje é esperança. Então, eu comecei a me perguntar o que é que o homem de hoje, o homem de todos os dias espera. E cheguei á conclusão de que ë muito pouco, quase nada. Até o cristão ... A gente vive numa labuta, num corre-corre, de um dia para o outro, de um mês para o outro - no máximo de um ano para o outro. E o horizonte da nossa expectativa ou esperança alcança até o próximo salário, até o próximo exame, até o próximo encontro com o namorado, o noivado ou o casamento, até o nascimento do filho, até a promoção na firma - ou talvez só até o descanso do próximo fim de semana.
E, com essa nossa visão tão pequena, nós temos uma enorme dificuldade em falar de esperança. Esperança da grande. Mesmo nós, cristãos, presos que estamos ao dia-a-dia, não temos imaginação e criatividade para conceber, formular e alimentar grandes esperanças.
Por isso vale a pena recorrer ao texto indicado para o domingo de hoje. Ele talvez nos ajude a ver como a esperança pode ser grande e concreta. Ele talvez nos ajude a formular e alimentar a nossa esperança. Trata-se de Joel 3.1-5:
Depois disso, eu derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, de modo que os vossos filhos e as vossas filhas se tornarão profetas, os vossos velhos sonharão sonhos e os vossos rapazes verão visões. E também sobre os servos e sobre as servas derramarei, naquele dia, o meu Espírito, E eu colocarei prodígios nos céus e na terra: sangue e fogo e colunas de fumaça; o sol se transformará em escuridão e a lua em sangue, antes que chegue o dia de Javé, o grande e temível. E todo o que invocar o nome de Javé será salvo, pois no monte de Sido e em Jerusalém haverá salvação, conforme Javé falou, e com os salvos estarão aqueles que Javé chamar.
Um texto antigo, cheio de palavras estranhas, difícil de entender, assim à primeira vista. Para evitar delongas, vou concentrar-me logo naquelas partes que me parecem ainda atuais e relevantes para nós.
O trecho começa com depois disso. Uma indicação de tempo muito vaga. Joel projeta para o futuro a imagem de uma realidade nova; ele tem ideias bem definidas sobre essa realidade,' mas o seu tempo, a sua data, estão no ar. Assim como para nós a segunda vinda de Cristo, que esperamos.
Como é que vira aquela realidade nova? Eu derramarei o meu Espirito sobre toda a carne, diz Joel em nome de Javé. O Espírito de Deus é, para o antigo israelita, algo que é dado a pessoas que estão em relação especialmente estreita com Deus. É uma força que aumenta a capacidade de vida de uma pessoa e a leva a dizer coisas e realizar feitos extraordinários. Apenas pessoas bem especiais, como profetas e grandes líderes, são contemplados com o Espírito de Deus.
Mas agora, Joel olha para a frente e diz: Naquela realidade que eu antevejo Deus derramara o seu Espírito não sobre um ou outro privilegiado, mas sobre toda a carne, sobre todos os homens. Como veem, a esperança de Joel já começa a assumir certos contornos. E esses contornos se tornam cada vez mais claros:
De modo que os vossos filhos e as vossas filhas se tornarão profetas, os vossos velhos sonharão sonhos e os vossos rapazes verão visões. Percebem o que isso significa? Todos, absolutamente todos, filhos, filhas, velhos, rapazes, todas as faixas de idade, de ambos os sexos todos se tornarão profetas, sonharão sonhos, verão visses. Todo mundo terá. uma relação tão estreita com Deus, tão face a face, como só os profetas a tiveram.
Este é um aspecto da esperança de Joel que combina com a nossa fé cristã e que pode nos ajudar. É possível ser mais concreto? E mais audacioso e criativo? Isso aí é a perspectiva de um dia em que você e eu, minha mulher, meus filhos, cada um dos meus amigos, cada um daqueles que passam na frente da minha casa todos os dias, cada um que eu vejo no jornal e na TV, um dia em que cada um andara de braço dado com Deus. Vai ser demais! Eu vou perguntar e entender, finalmente, por que Deus deixa o homem fazer guerras, por que ele deixa que o homem devore o homem. Vou compreender Deus, vou senti-lo aqui dentro, não terei mais dúvidas, e ele estará tão perto de mim que eu farei a sua vontade com naturalidade, espontaneamente, com prazer. E assim todo mundo, cada um. Não vou mais depender de ninguém para saber a respeito de Deus, não precisarei mais de escola dominical, culto, pastor, ensino confirmatório, faculdade de teologia, livros e professores - nem da Bíblia. Não dependerá de mais ninguém e, graças a Deus, ninguém mais dependerá de mim para saber de Deus. - Não é concretíssima esta esperança? Procure comparar a sua existência atual com essa fantástica perspectiva. É difícil de conceber, não é? Mas é esta a esperança que nos cabe, e no podemos deixar por menos.
Mas, observem mais um detalhe: Deus vai derramar seu Es pirita sobre filhos e filhas, sobre velhos e rapazes. Em termos mais modernos: Não haverá diferença de sexo ou idade. Mulheres e homens, crianças, jovens, adultos, idosos, todos iguais na sua relação intima com Deus. Vai ser tão maravilhosamente diferente de hoje: As crianças não precisarão curvar-se as manias, às arbitrariedades, à boa ou má disposição dos mais velhos. Os velhos não serão mais trastes sem uso jogados num canto. Crianças e velhos terão a mesma posição, o mesmo valor que aquele que produz e sustenta a família. A mulher não será mais a empregada do homem, ter a as mesmas chances, será igual, no lar e fora dele.
E ainda não para por ai a concreticidade da esperança de Joel. E também sobre os servos e sobre as servas derramarei, naquele dia, o meu Espirito. Naquela nova realidade cairão as barreiras não só de idade e do sexo, mas também das classes sociais. O operário igual ao executivo, a empregada igual à patroa. Sem privilégios, sem concentração da renda, palacetes para uns e barracos para muitos, automóveis para uns e pés descalços para muitos. Todos iguais, naquele dia.
Esta é a esperança de Joel para o dia em que Javé derramar seu Espirito. Nós, que temos nossa criatividade imaginativa embotada pelo horizonte limitado do nosso dia-a-dia - não são um auxílio para nós essa palavras do profeta? Não podemos fazer nossa a sua esperança? Não temos, em Jesus Cristo, base para esperar tudo isso: um mundo novo em que todos vero Deus face a face, terão uma relação direta e perfeita com ele, em que não haverá diferenças e opressão entre as idades, os sexos e as classes sociais?
Sem dúvida, esta esperança tão concreta nós podemos alimentar, graças a Jesus Cristo. E agora, a partir daqui, eu gostaria de ressaltar três pontos:
1º. - Quando esperamos algo do futuro, é sinal de que não temos aquilo no presente. Se quisermos ser coerentes com a nossa esperança e se quisermos ser fiéis ao Deus, no qual depositamos tal esperança, temos que agir no sentido de que esta esperança aponta. Ou seja: temos que derrubar barreiras, aqui e agora. Temos que derrubar barreiras de idade, de sexo e de classes sociais.
Muitos cristãos não se dão conta disso. Não tiram consequências de sua esperança. Para esses, não poderíamos ficar por aqui; teríamos que insistir até que lhes zunissem os ouvidos, até que percebessem: a esperança tem consequências práticas.
2º. - Outros cristãos, uns poucos, sofrem com a situação ao seu redor, martirizam-se, acusam, agem e se empenham. Muitos se acabam fisicamente - e não raro se fecham numa posição de auto-justiça, a partir da qual julgam impiedosamente a hipocrisia dos outros.
A estes Joel diz uma coisa importante: Aquela mudança vai ocorrer, não porque homens desenvolveram geniais teorias sociais e as seguiram, não porque oprimidos se ergueram contra seus opressores, não porque pessoas se sacrificaram, estragaram sua saúde, deixaram a família de — lado e viveram a escassez na solidariedade aos pequenos. Aquela realidade maravilhosa vira, diz Javé pela boca de Joel, porque eu derramarei o meu Espírito. É essencial que entendamos isso: que nós podemos, pela graça de Deus, colocar marcos de esperança, sinais da realidade nova, ao nosso redor, mas que a realidade final e definitiva virá pela mão de Deus. Este é o ponto em que muitos cristãos deveriam confiar mais em Deus do que em si.
3º. - Para nós, que nos entregamos à vida da igreja, cabe ainda uma observação. Nós às vezes nos enterramos nas comunidades, na igreja, nas nossas funções, no estudo e ensino da teologia, com uma seriedade tão exagerada, obtusa e bitolada, como se o futuro do mundo dependesse dessas coisas. Então não percebemos que tudo isso é apenas veículo da mensagem da esperança. Veiculo provisório, passageiro. Na realidade que esperamos não vai ter igreja, nem pastor, nem teologia, nem mesmo Bíblia. Tudo isso será dispensável e até indesejável. Quando a igreja e os que trabalham em suas fileiras lutam às vezes pela sobrevivência desses veículos, alguns já rígidos e calcificados, isso é sem duvida também uma atitude de falta de confiança em Deus. Nós serramos mais profundos, mais fiéis e mais tranquilos se nos conscientizássemos do caráter provisório e passageiro dessas coisas que para nós parecem tão tremendamente importantes.
Bem, é isso aí. Talvez foi demais, não sei. Mas eu espero que essas palavras de Joel nos ajudem a formular e alimentar esperança, a esperar com maior concreticidade, a esperar com arrojo e imaginação, a confiar que Deus é capaz e realizará o impossível. Que elas nos ajudem a agir no dia-a-dia. Que elas nos ajudem a reconhecer como é modesto e provisório aquilo que podemos fazer e que achamos importante. Que elas nos ajudem a depositar tudo nas mãos do nosso Deus de Jesus Cristo. Amém
Oremos: Senhor, dá-nos criatividade e imaginação para esperar O impossível. Mostra-nos a tua intenção para conosco por meio de Cristo, para que possamos captar e viver do amor que nos dedicaste, para que possamos jogar todo futuro e toda esperança nas tuas mãos. Amém.
Veja:
Nelson Kirst
Vai e fala! - Prédicas
Editora Sinodal
São Leopoldo - RS
