João 15.1-7 - Permanecendo em Cristo

Prédica

11/02/1979

PERMANECENDO EM CRISTO
João 15.1-7 ( Leitura: Salmo 37.1-11) 

Há várias maneiras pelas quais os autores do Novo Testamento expressam a união que existe entre Cristo e os que lhe pertencem. Pedro, em sua primeira epístola (cap. 2), fala do templo espiritual, no qual Cristo é a pedra angular, pedra que vive — e no qual os cristãos são as outras pedras, igualmente vivas, que formam um só santuário com seu Senhor. Paulo usa a parábola do corpo. Ele diz em 2 Coríntios 12: «Vós sois o corpo de Cristo, e individualmente membros deste corpo.» Os membros, diferentes entre si, são unidos em Cristo. Servindo a ele, servem uns aos outros. A dor de um é a dor do outro. A sua união com Cristo é também o vínculo que os une uns aos outros. 

No evangelho de João, o próprio Jesus usa a parábola da videira e dos ramos para expressar a comunhão de vida, que existe entre ele e os seus discípulos: «Eu sou a videira verdadeira, e meu Paié o agricultor. Todo o ramo que, estando em mim, não der fruto, e ele o corta; e todo que clã fruto, ele o limpa para que dê mais fruto ainda.» 

Nos altares de muitas de nossas igrejas, bordada em antepêndios (panos), se vê a figura da videira, com os ramos carregados de uvas. É a figura da comunidade de Jesus. Da videira é que vem a força dos ramos. Dela é que vem a vida, o suco que os alimenta, que os torna capazes de dar fruto. Dar fruto isso é sua função. Eles estão aí para isso. E o fruto não é nenhuma coisa artificial. Não é produto de um esforço especial do ramo. Frutos não são colocados nos ramos, assim como se colocam globinhos de vidro numa árvore de Natal. Frutos crescem. As uvas vêm por si, quando a videira vai brotando, na primavera. Elas nascem dos ramos, junto com as folhas, porque é a natureza da videira dar uvas. O agricultor, que é uma figura para Deus, limpa os galhos, ele os vai podando — para que tragam mais fruto. 

Veja: Esta figura da videira e dos ramos ela fere um bocado o nosso orgulho. Acaba com nossas idéias de que somos alguma coisa por nós mesmos. Acaba com nossos sonhos de que possamos fazer, produzir, criar alguma coisa perante Deus, como a dizer: Deus, eu fiz a minha parte; agora faze a tua! O ramo separado da videira não tem nenhuma chance. Se for cortado, se não permanecer no tronco, vai secando, e para nada mais serve, senão para ser queimado. É bom para o fogo para nada mais. Então: A única chance que o ramo tem para viver e trazer fruto, é permanecer onde se encontra: na videira. Oito vezes, em nossa passagem bíblica, Jesus usa a palavra «permanecer»: «Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós. Não pode o ramo produzir fruto de si mesmo, se não permanecer na videira; assim nem vós podereis dar fruto, se não permanecerdes em mim.» Só o que permanece nele, e só aquele no qual Jesus permanece, ele dá muito fruto. E se alguém não permanecer em Jesus, será lançado fora e secará. E Jesus termina, dizendo que os discípulos que permanecerem nele e que deixarem as palavras de Jesus permanecer neles, vão pedir o que quiserem, e lhes será feito. 

Valerá a pena refletirmos por alguns minutos sobre esta palavra-chave de nossa passagem; «permanecer». E mais: Valerá a pena encostarmos o ouvido nesta palavra e ouvirmos o próprio Senhor falando, convidando, lembrando: Permanecei em mim! Talvez nós nem entendamos mais direito esta palavra e este convite. Sabemos que «permanecer» significa o mesmo que «ficar». Ficar onde estamos; no caso, ficar com Cristo. --- Será, então, fincar pé, não arredar do lugar onde a gente se encontra? Será ser conservador, ser contra toda e qualquer mudança, em questões de fé e de vida? Parece que, em nossos dias, mais e mais se vai fazendo esta colocação: Há cristãos conservadores, e há cristãos progressistas. Os conservadores querem deixar tudo como sempre foi; não querem mexer na doutrina, nas tradições, nas formas de culto. Eles fincaram pé para valer mesmo, e defendem sua posição com unhas e garras. -- E os progressistas, então? Eles querem ir para frente. A qualquer preço. Querem acompanhar o mundo, em sua evolução. Neste mundo «em rápidas e constantes transformações» eles não querem ficar sobrando.

Será que «permanecer em Cristo» é o mesmo que «ser conservador»? Ou será que é o contrário? Porque Cristo, como dizem, anda pelos tempos, ele está lá onde acontecem as transformações, e é lá onde os cristãos se têm que engajar e se meter para ficarem nele .. . 

A palavra de Deus nos alerta e nos previne: Ser conservador, ou ser progressista isto, por princípio, são atitudes do velho homem. Atitudes do homem que olha para a direita e para a esquerda (direitistas e esquerdistas. . ), mas que não se orienta no Reino de Deus. Assim, «permanecer em Cristo» não deve ser trocado com atitudes que nascem da natureza humana, natureza que nos jovens costuma ser fogosa e inconformada, levando os moços a serem progressistas, a quererem forçar mudanças -- e que nos velhos costuma ser mais calma ou mais cansada, levando-os a se acomodarem, a não quererem mais nenhuma mudança a serem conservadores, afinal. — Não. Permanecer em Cristo, não é atitude que possa ser comparada com atitudes políticas ou com posições que se assumem frente à moda ou a certo estilo de vida. Permanecer em Cristo, antes de tudo, tem uma condição: Só podemos permanecer nele, se chegamos a existir nele, se chegamos a ter comunhão de vida com ele. Assim, não adianta apelar a ninguém: «permaneça em Cristo!» -- se ele não está em Cristo. Entendemos que esta palavra foi dita a discípulos. E antes que possamos pregar aos homens para permanecerem com Cristo, precisamos chamá-los para se converterem a Jesus, para serem seus discípulos, seus aprendizes e alunos. Antes de podermos permanecer em Cristo, precisamos «pegar» nele, precisamos ser implantados nele, precisamos experimentar o milagre da nova vida em Cristo, o milagre do «novo nascimento», como diz Jesus a Nicodemos. O «permanecer», então, é o dia-a-dia da vida do cristão, é a continuidade de sua vida com Cristo. É o caminho que segue à sua conversão, à entrega de sua vida a Cristo. 

E é neste ponto que precisamos dizer duas coisas indispensáveis. Primeiro: O cristão não permanece em Cristo, assim como uma pedra permanece em sua posição — pedra pesada e imóvel, que, devido à própria inércia, devido à sua «preguiça de pedra» não se move do lugar, resistindo a qualquer tentativa de tirá-la de sua posição. Quando Jesus diz que o ramo deve permanecer na videira, ele fala de algo bem diferente: O ramo não permanece «por inércia» — isto é, pela sua imobilidade, por seu peso morto. Não: ele permanece, participando da vida, do movimento, da floração, do brotamento, da frutificação da videira. O ramo, ao permanecer na videira, não fica no mesmo lugar. Ele se ergue com a videira, crescendo, botando folhas, botando flor, botando cachos de uvas. Nenhum dia é igual ao dia anterior. Só que as mudanças pelas quais o ramo passa não são ditadas por fora. Ele não imita os espinheiros ou os pés de sombra que se acham nas proximidades. Ele muda — mas conforme a natureza da videira. Para falar sem figura: O cristão que permanece em Cristo, não finca pé no lugar onde está, agarrado ao que ele é: Ele cresce, ele se modifica, ele aprende, ele sofre o ato de podar (e como a poda pode_ ser dolorosa! Existe uma canção alemã: «Heilges Winzermesser, schneide tief hinein»: Lâmina sagrada do viticultor — vá cortando fundo! . . ). Ele traz frutos. Com outras palavras, ele vai agindo. Vai praticando sua fé. Vai vivendo sua fé. Sua vida é uma evolução, é um caminho. O discípulo não nasce pronto. Que bom — ele cresce, Deus quer que ele cresça e se desenvolva. Mas não se trata de um crescimento e de uma evolução ao acaso. Trata-se de um crescimento e de uma evolução que dependem da natureza da videira. É um crescimento e uma evolução em Cristo.

E precisamos apontar para um segundo fato: Permanecer em Cristo, não é uma coisa que simplesmente acontece conosco, sem que nós participemos ativamente. Se, no começo, afirmamos que complementar esta afirmação, deixando claro que «permanecer em Cristo» — é permanecer em sua palavra. Não é um permanecer mudo e passivo. A palavra de Cristo, o evangelho, então, é essencial para esta nossa permanência. E palavra de Deus não é rua de mão única, Ela parte de Cristo — mas nunca é uma palavra que vai num sentido só. É palavra que pede resposta. E a resposta é a oração. Nosso permanecer em Cristo, assim, tem por base que ouçamos o evangelho — não só de mês em mês, ou de domingo em domingo mas dia por dia. O discípulo, em verdade, nunca deixa de ouvir a palavra de seu Mestre. Ele vive com ela e vive ela. E ele lhe responde em oração. O apóstolo Paulo escreve aos Romanos (cap. 12): «Orai sem cessar.» Este diálogo ininterrupto com Deus em Cristo, este receber constante, e este responder obediente e grato -- é o segredo do permanecer em Cristo. Ouvir o evangelho — e responder ao evangelho em oração: Isto é o respirar da nova criatura de Deus em Cristo. Este respirar a torna capaz de agir e de servir. 

Então, ser cristão não é nenhuma coisa biológica, nenhuma coisa da natureza humana. Por exemplo: A gente não vai herdando a fé em Cristo dos seus pais. Ter pais cristãos — isso é algo de precioso. Mas vale a palavra de conhecido evangelista: «Deus não tem netos. Ele só tem filhos.» E os filhos — ele os cria por sua palavra, pelo evangelho da salvação e da nova vida, que há em seu Filho Jesus Cristo. 

Quem encostou o ouvido em nossa mensagem de hoje, quem ouviu assim como ouve um discípulo, ele agora vai compreender a grande e maravilhosa promissão que Jesus faz aos ramos que permanecem na videira, aos discípulos que permanecem em Cristo e que deixam sua palavra permanecer neles: Que eles vão pedir o que quiserem, e lhes será feito. À primeira vista parece algo que não pode ser: Pedirmos o que quisermos? Isso não será imaginação? A realidade não prova que Deus não atende todas as nossas orações? Entendamos bem: Jesus diz: «Se permanecerdes em mim e minhas palavras permanecerem em vós — então pedireis o que quiserdes e vos será feito.» Quer dizer que quem permanece em Cristo, ele está tão ligado a seu Senhor, que ele só pedirá o que for da vontade de Deus — e a vontade de Deus sempre se cumpre. «Pedireis o que quiserdes»: O segredo da oração atendida é que o discípulo quer o que seu Senhor quer. Não há mais aquela contradição do antigo homem, que só pode orar contra a vontade de Deus, e cujas orações, assim, não tem a promissão de serem atendidas. 

Permanecer, ouvir, orar, servir, obedecer. Tudo em Cristo. Isto é que nosso Senhor nos pede hoje, através de sua parábola da videira e dos ramos. E ele nos faz a promissão que ele permanecerá em nós. E esta promissão é a base de tudo mais. 

Oremos: Senhor amado. Tu nos lembraste hoje de um fato que tantas vezes esquecemos: Que sem ti nada podemos fazer. Senhor: Fortalece nossa união contigo. Faze tua palavra ser o poder que nos move e que nos faz trazer frutos de justiça. Que possamos permanecer em ti, e que nossa oração seja de teu agrado. Amém.

Veja:

 Lindolfo Weingärtner

Lançarei as redes - Sermonário para o lar cristão

 Editora Sinodal

 São Leopoldo - RS
 


Autor(a): Lindolfo Weingärtner
Âmbito: IECLB
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 15 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 7
Título da publicação: Lançarei as redes - Sermonário para o lar cristão / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1979
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 19706
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