Isaías 40.27-31 - JUBILATE
Prezada comunidade! Ano de 587 antes de Cristo. Oriente Médio. Palestina. Nabucodonosor, líder dos neo-babilônios, aperta o cerco em torno de Jerusalém, o último reduto israelense de resistência contra as forças invasoras. E o cerco se fecha e estrangula. A cidade cai e se esvai em chamas. O templo é saqueado, tudo o que é sagrado e de valor é carregado. E a camada liderante, bem como grande parte da população, ê deportada para a Babilônia, a centenas de quilômetros da pátria. É o fim de Israel como realidade política. Com isso, começa o período mais negro, mas vexaminoso e humilhante da história de Israel. Com isso, torna-se pavorosa realidade o que os profetas vinham anunciando ao longo dos séculos: Israel sofrera o castigo, por se ter afastado do seu Deus.
A nova situação não era apenas vexaminosa e negra do ponto de vista político. Mas também sob o aspecto religioso. Para se entender isso, é preciso que se compreenda o significado de Jerusalém e, em especial, do templo naquela cidade. Para os israelitas, o seu Deus era o Deus de Israel e de mais ninguém. Era o Deus que atuava e se dava a conhecer unicamente àquele povo, dentro dos limites geográficos daquela nação, e em nenhum outro lugar. Mais ainda: Contato direto com Deus só existia no santuário central, no templo de Jerusalém. Era só no templo que o israelita podia apresentar suas súplicas e seus louvores a Deus; e era só no templo que ele recebia resposta de Deus.
Mas, que era feito deste templo? Estava lá, reduzido a cinzas. Nada mais restava. E, como se isso no bastasse, para muitos não havia mais nem mesmo a possibilidade de comparecer aquelas ruínas para procurar o diálogo com Deus, em meio aos escombros. Pois grande parte do povo estava lá, na Babilônia, em solo pagão, em chão que não era sagrado e que, portanto, não merecia a presença do seu Deus. E agora? Estaria Deus morto para os judeus na Babilônia? Teria Deus esquecido aquela gente por completo? Tudo parecia indicar isso mesmo. E, segundo a Sibila, o desespero e protesto daquela gente se expressava nessas palavras: Meu caminho está oculto ao Senhor, e meu direito passa desapercebido ao meu Deus! O Senhor não se importa com o meu destino, não defende mais os meus direitos. Os israelitas exilados se sentiam abandonados, largados ao léu, sem Deus.
Foi neste ambiente que se ergueu um homem impressionante, dono de Uma linguagem quase poética, portador de uma novidade quase inacreditável. Não conhecemos seu nome. Sabemos apenas que as suas palavras se encontram registradas na parte final do livro do profeta Isaías. Por isso, costuma-se chama-lo de Deutero-Isaías, o segundo Isaías. Este Deutero-Isaías veio a mando de Deus para dizer àquela gente o seguinte: Vocês, que estão cansados, abatidos, o o seu Deus me enviou para dizer-lhes que está terminando o seu tempo de exílio, que em breve haverá um grande retorno para Jerusalém. Vocês já pagaram suficientemente pela sua culpa. Aqui estou eu, mandado por Deus, para anunciar este fato. Então, vocês acham mesmo que Deus os esqueceu, que Deus não vem até aqui, até a Babilônia, importar-se por vocês? Enganam-se!
Levantem os olhos para o alto, e vejam. Quem criou essas coisas? Aquele que faz sair o seu exército de estrelas, todas bem contadas, as quais ele chama pelos seus nomes. Por ser ele grande em força e forte em poder., nem uma só vem a faltar. Então, por que e que você, Jacó, fala e você, Israel, diz: Meu caminho está oculto ao Senhor, e meu direito passa desapercebido ao meu Deus? Você no sabe ou não ouviu: Um Deus eterno é o Senhor, que criou os fins da terra! Ele não se cansa nem se fatiga; não se pode perscrutar o seu entendimento. Ele da força ao cansado, e multiplica as forças do que não tem vigor. Os jovens se cansam e se fatigam, e os guerreiros cambaleiam e caem. Mas os que esperam no Senhor recebem forças sempre novas, ganham asas como águias, correm e no se cansam, andam e não se fatigam.
II
Para aqueles israelitas, o exílio era a completa alienação, o completo afastamento de Deus. E como não havia em vista qualquer possibilidade de voltar à pátria, esta alienação, este afastamento haveria de continuar para sempre. O seu futuro era um futuro sem Deus. E Deutero-lsaías leva a sério as suas perguntas, as suas queixas, nesta hora: Deus não vê e não se interessa pelo que se passa conosco; ele prometeu que seria o nosso Deus, e nas, o seu povo; mas agora que o negócio é sério, ele não defende os nossos direitos!
O que responde Deutero-Isaías a essas acusações? Ele diz: Minha gente, que história é essa? Então vocês não conhecem mesmo o seu Deus? Já se esqueceram quem ele é? Já não sabem mais que ele é o Criador do Universo, de tudo o que existe? Que ele fez até as estrelas e lhes dá as suas funções, chamando-as pelos seus nomes? Esse Deus de vocês e um ser tão extraordinário, tão fundamentalmente diferente de tudo e de todos que vocês conhecem, que não se pode perscrutar o seu entendimento. Vocês não têm autoridade de afirmar que ele os esqueceu. Vocês no sabem o que se passa em sua mente. Aliás, quem esqueceu a aliança fixada entre Deus e vocês não foi ele? Vocês é que vêm quebrando esta aliança há séculos. E agora reclamam?
Mas, ainda assim, o que eu tenho a lhes comunicar é isso: Mesmo aqui, na Babilônia, Deus não os deixa na mão. Apesar de vocês não o merecerem, ele é suficientemente grande para poder se dar ao luxo de vir ao seu encontro, de encarar a sua culpa como paga, de vir tirá-los do seu cansaço e abatimento, de anunciar-lhes o retorno à sua terra.
Deutero-Isaías o anunciou, e foi o que realmente aconteceu, algum tempo mais tarde.
III
Alienação, afastamento de Deus. Ausência de Deus. Futuro sem Deus. Cansaço. São coisas que todos conhecem, não é verdade? Todos já devem ter pensado mais de uma vez, à vista do que se passa hoje por aí: Mas será mesmo? Será que não é tudo conversa fiada? Será que Deus existe de fato? E, se ele existe, não terá cardo no sono? Não estará cochilando em algum lugar, enquanto tudo por aqui vai à breca?
Quem, aqui dentro, ainda não teria levantado perguntas como essas? Perguntas provocadas pelas mais diversas observações da nossa realidade atual. Alguns dirão: Esta imoralidade, que toma conta por aí, nas revistas, no cinema, no teatro, entre a juventude; onde é que isso vai parar? Onde é que está Deus, para dar um jeito nessas coisas? - Já outros observam o que se passa no cenário internacional: as guerras idiotas, que matam dezenas, centenas de milhares de crianças e mulheres que não têm nada a ver com o assunto, para que os fabricantes de material bélico possam encher ainda mais seus bolsos recheados. Onde está Deus? E a mortandade em Biafra? E os milhões que morrem de fome, enquanto países abastados jogam suas sobras ao mar? E os maltrapilhos, os analfabetos, os desempregados? Onde é que está Deus, que faz ele, se é que existe? - Outros vêem as fraquezas da igreja: Da igreja, que gosta de inclinar-se diante de quem não deveria, que gosta de seguir seus interesses, que lhe são alheios, que não atende os que precisam de sua atenção; da Igreja com seus párocos fracos, pregadores e curas d'alma que deixam muito a desejar; da Igreja com seus membros calcificados, parados, testemunhas vacilantes e caladas. Onde é que está, o que faz o Deus desta Igreja? Esta instituição periclitante quer ser a precursora do Reino de Deus?
IV
São perguntas sérias que se impõem. Perguntas, para as quais não existe urna resposta fácil. Por isso, não pensem que agora vou dar a palavra-chave, que num abrir e fechar de olhos resolve todas essas questões. Estas perguntas têm que ser levadas a sério, assim como Deutero-lsaías levou a sério as preocupações de seus contemporâneos. Deus ainda tem futuro? Ou a confusão deste mundo continuará aumentando sempre mais, até que um belo dia tudo voará pelos ares? Deus se esqueceu dos homens?
Eu creio que aqui, prezada comunidade, devemos buscar ajuda na resposta daquele homem, que já se defrontou com uma situação semelhante: Deutero-Isaías. A primeira coisa que ele disse, daquela vez, foi isso: Minha gente, vocês não conhecem Deus! E isso é a primeira coisa que também nós deveríamos lembrar: nós, na verdade, não conhecemos a Deus. Ele é fantástico demais, diferente demais, para podermos entender ou adivinhar suas intenções, seus planos. Este Deus é o totalmente outro; é o que criou tudo o que existe, que colocou as estrelas no seu trajeto. Como posso eu me arrogar o direito de analisar, julgar e condenar seus atos? Como posso eu insinuar que ele tivesse se afastado da humanidade?
Outra coisa que deveria ficar inequivocamente clara é isto: A confusão que reina no mundo, a fome, os assassínios em massa, afinal tudo o que se vê de abominável e horrível por aí, não correm por conta de Deus. A bíblia não deixa dúvidas nesse ponto: O culpado de tudo isso é o homem. Deus criou o mundo bom, perfeito. Foi o homem que introduziu a desordem, a luta entre irmãos, a luta entre criaturas, com seu primeiro ato de desobediência. Isto quer dizer: Se as coisas estão do jeito que estão, a culpa é nossa. E não temos a mínima autoridade de reclamar algo de Deus.
No terceiro e último ponto não podemos acompanhar Deutero-Isaias. Ele anunciou a volta do povo a Jerusalém, para fora da alienação da Babilônia. Anunciou, portanto, que Deus estava aí e entraria em ação. Hoje, Babilónia e Jerusalém não nos interessam mais. Mas eu posso, como Deutero-Isaías, assegurar-lhes que Deus está ai, que ele não está cochilando, que ele vai entrar em ação. Embora não pareça, ele está aí. Quando se revelou em Jesus Cristo, também parecia impossível que Deus estivesse presente naquele homem, que acabou sendo crucificado. Parece impossível que Deus esteja presente nas palavras dos homens, que anunciam a boa nova. E, no entanto, é o que realmente acontece, e ha pessoas que ouvem e chegam à fé. E, no mais, pode este Deus, que se engajou pela humanidade a ponto de se entregar por ela, pode este Deus cochilar e deixa-la entregue ao seu próprio destino? Não pode ser! Deus tem futuro! E os que nele crêem têm futuro: O futuro mais fantástico que se possa imaginar. O seu futuro é o Reino de Deus, que esta por vir. Não sabemos como nem sabemos quando. Se olharmos ao nosso redor, parece impossível que isso venha a acontecer algum dia. Mas vai acontecer! Jesus Cristo é que o disse. E vai acontecer sem que nós percebemos como. Pois o Reino de Deus é assim como se um homem lançasse a semente à terra, depois dormisse e se levantasse, de noite e de dia, e a semente, germinasse e crescesse, não sabendo ele como. E um dia ele esta ai. Deus tem futuro! Nós dormimos e levantamos, e olhamos ao nosso redor e achamos que não pode ser. Mas seu Reino vem, no sabendo nós como. Deus tem futuro! E nós temos futuro com ele! Amém.
Oremos: Não deixes que nos cansemos, que nos deixemos desanimar pelas aparências. Dá-nos sempre de novo a certeza de que tu estás aí, de que teu Reino vir, de que tu tens futuro e nós temos futuro contigo. Senhor, venha a nós o teu Reino. Amém.
Veja:
Nelson Kirst
Vai e fala! - Prédicas
Editora Sinodal
São Leopoldo - RS