Homens fortes

Artigo

06/08/2004


No calendário anual, a sociedade mercantilizada habituou-se, entre os muitos dias dedicados a pessoas ou a eventos histórico-culturais, a destacar também o Dia dos Pais. O segundo domingo do mês de agosto está sendo lembrado como Dia dos Pais. Embora vivendo numa sociedade conhecida antes como a dos pais ausentes, o mercado investe, com força, nessa data..

A partir da teoria dos arquétipos, segundo o psicólogo Carl Gustav Jung, nada se opõe a promover o renascimento da figura do homem forte. A literatura mitológica, suas lendas e histórias, seus contos e suas fábulas ajudam a redescobrir a figura do homem, símbolo da força e na dimensão de fonte gerando energia positiva. A teoria dos arquétipos destaca as figuras: 1) do rei: ele ocupa o lugar da autoridade, simboliza a sociedade organizada, é protótipo de toda postura ordenada; 2) do guerreiro: é pessoa vigorosa e ativa; a aplicação das suas forças acaba tendo conseqüências positivas; 3) do mágico: é ele quem induz outras pessoas a penetrarem nos mistérios da vida; 4) finalmente, do homem-amante: sinaliza a personificação da energia que reconcilia, une quem estiver separado e edifica pontes que aproximam gente distante. Gerar a vida e construir uma existência cheia de prazer, nisso consiste o arquétipo do homem-amante.

Mudando o que deve ser mudado: em razão do dia especialmente dedicado aos pais, sinto-me motivado a rascunhar traços acerca do homem-pai, em especial, quanto a sua inserção na vida eclesial e comunitária, bem como no tocante à sua sensibilidade espiritual. É lugar comum, na sociedade humana, tecer comentários críticos sobre a participação acanhada dos homens na vida eclesial. Em sua grande maioria, são as mulheres que se engajam ativamente na comunidade cristã, participam de suas celebrações, estão presentes nos grupos de reflexão, de oração, são ativas na assistência social. A presença masculina, isto sim, é notória, preferencialmente, nas posições de liderança e de mando nas igrejas.

Será que a fé é desinteressante e exerce pouca atração sobre a índole masculina? Qual é a importância da fé na vida masculina? São os homens, os pais, desde que estes nasceram, menos religiosos do que as mulheres, mais emotivas e fervorosas? Será a fé um assunto de interesse só para mulheres? A fé cristã nos coloca sob a dependência de Deus. Assuntos relativos à fé, facilmente, são reprimidos pelo homem. Enfim, ele é sexo forte. Homens fortes independem da companhia orientadora e do apoio que procedem de fora, de Deus. A defesa do homem diante da realidade da fé, dádiva divina, pode ser o resultado da educação experimentada em casa, em especial, quando no convívio doméstico prevalece o modelo da sociedade paternalista. Muitos homens refletem pouca sensibilidade e demonstram poucas emoções diante da fraqueza alheia. São antes conhecidos pela racionalidade, pelo espírito competitivo e por sua vontade de constituir uma existência autônoma. O homem dá-se a conhecer como sexo forte. Evidencia capacidade e competência, é guerreiro, vive o autocontrole. Ainda que experimente medo e ansiedade, o homem manifesta a necessidade de manter o domínio próprio.

A fé cristã desafia o ser humano a um novo jeito de vida. É vida nova que dá prioridade ao perdão, à bondade, à humildade e paciência, ao amor, à confiança. Atributos dessa natureza tendem a ser considerados, na sociedade materialista e machista, qualidades femininas. Homens identificados pela nova postura de vida, face à confiança em Deus, são tachados de fracos e covardes.

O apóstolo Paulo, embora fruto de uma sociedade religiosa de cunho machista, deposita toda a sua vida, seu corpo e sua alma, de modo exemplar, nas mãos de Deus. Anuncia que a graça de Deus basta. Aos olhos da fé, tanto na vida de mulheres como de homens, é realidade prioritária que a graça de Deus seja abundante. A graça divina transforma gente forte e guerreira em pessoas verdadeiramente humanas. É a bondade de Deus que valoriza o humano e permite que homens e mulheres convivam com suas fraquezas e fracassos e saibam aceitá-los. A graça de Cristo nos anima a apostar em mudanças. Em busca de uma nova compreensão de vida, o homem descobre que, em sua existência, não precisam prevalecer acima de todos os sentimentos e também acima da fé, a coragem, o autocontrole e a força guerreira!

Manfredo Siegle
pastor sinodal do Sínodo Norte-catarinense
da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB)
em Joinville - SC

Jornal ANotícia - 06/08/2004

 

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A fé não pode aderir ou agarrar-se a qualquer coisa que tem valor nesta vida, mas rompe os seus limites e se agarra ao que se encontra acima e fora desta vida, ao próprio Deus.
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