História de vida de Rosane Philippsen

10/03/2022

 

Nome: Rosane Philippsen

Tempo de participação na IECLB desde o Batismo

Paróquia Evangélica de Confissão Luterana no Vale do Paraíba/SP

Sínodo Sudeste

 

Mulheres, quem conta nossa história? Este foi um tema do Fórum de Reflexão da Mulher Luterana e, confesso, que por mais que tenhamos trabalhado com as mulheres presentes este tema, a minha história ainda não registrei.

Tal como remexer a velha mala de papelão, cheia de fotos antigas, talvez seja assim, ao contar a nossa história. Gosto de ver fotos assim, na “misturança”, muito mais do que na ordem dos álbuns. Na minha memória, passam muitas imagens, especialmente na vida comunitária e na vida de IECLB. Nestas fotos antigas, vejo o pai, Peter Philippsen e a mãe, Ilse Henschel em seu casamento.

O pai era de origem menonita e de profissão, mecânico. A mãe era luterana e era costureira. Ambos vieram da mesma região de Santa Catarina, Alto Rio Krauel (Witmarsum) e (Gustavo Richard) Dona Emma, mas foram se conhecer em Curitiba, nos bailes como na Sociedade “5 de Julho” ou no “Wolf” no Boqueirão. Falo dos bailes, porque era a explicação do motivo pelo pai casar-se na denominação da mãe e não o contrário como seria habitual nos anos 60. Dizia que o pai cantava em coral e gostava de bailar, mas ele pertencia a igreja dos Irmãos Menonitas, mais rígida nos costumes e por isso se casou na luterana.

Nasci em uma manhã fria de São João no ano de 1967. Dizia a mãe, que era tão frio, tão frio, que se não fosse o pai me botar na cama junto com eles, talvez eu não sobrevivesse. Fui batizada em 29 de outubro daquele ano, na Comunidade Evangélica Luterana de Curitiba, Cristo Redentor, pelo P. Richard H. Wangen e o versículo que recebi foi João 15.16

Casa de madeira, terreno grande na cidade, cercado de pinheiros, plantados pelo pai, que nos serviram como alimento e árvores de natal por muitos anos. Continuam lá, cinquenta e tantos anos depois. Quintal grande, muitas flores, árvores, galinhas, patos e gatos. Esta bicharada está nas muitas fotos que o pai tirava de mim, enquanto era pequena. Fui privilegiada de ter muitos registros desta época, que foram bruscamente interrompidos com a morte dele. Esta lembrança não está registrada no papel, mas está numa das primeiras memórias de uma criança de seis para sete anos. Eu acompanhava a mãe nos hospitais, pelos quais meu pai ficava internado e presenciei sua morte em meio a um choque hemorrágico. Minha mãe tinha vinte e oito anos. Eu mal tinha entrado na escola, e mal sabia falar português.

Mexo no baú e pulo para as fotos da Confirmação. Antes disto, tenho poucas lembranças de igreja. Lembro-me de festa no Centro Luterano da qual saí com um livro para pintar e uma caneca, que ganhei na pescaria. Depois disso, lembro-me do culto em memória do pai. Foi a primeira vez que me recordo de ter participado do culto infantil, pois ganhei uma figurinha de flores e um exemplar do Amigo das Crianças, que era no formato de um jornalzinho.

Sou filha única e, ao entrar para a Doutrina, foi maravilhoso! Eu queria saber tudo. Minha primeira Bíblia eu li de ponta a ponta, como se fosse um romance. Os hinos – sim, decorávamos hinos e versículos – tenho na ponta da língua até hoje. Ensinos do P. Friedrich Genthner que permanecem até hoje. Ali, na Comunidade Mellanchton, começou de fato a trajetória do amor da minha vida. Amei aprender sobre Cristo, sobre a Igreja, sobre o povo de Deus e sua história... a convivência com outras meninas e outros meninos... todos eram como eu e não somente uma “protestante” ou “crente” como eu era na escola pública. Se antes amava ir para a escola, no ensino confirmatório aprendi a amar os sábados de aprendizado na fé.

Depois da Confirmação, passei a frequentar a Juventude Evangélica na Comunidade da Cruz, na mesma Paróquia Sul, na época. Lá fundamos o grupo GAMA – Grupo Amor Mais Amor e muita história levo comigo e com tantas pessoas queridas que hoje também são membros ativos, lideranças, ministros e ministras.

Os anos 80 foram muito especiais e difíceis também. À medida que a adolescência avançava, os dilemas sobre as escolhas do futuro, a situação de abuso familiar que sofria por parte do padrasto, o medo, a culpa, tudo isto me empurraram para uma indefinição profissional. Eu tinha me formado no magistério, porque a mãe conseguiu estudo para mim no Colégio Pe. João Bagozzi, através da diretora que prometeu que assim que saísse a bolsa eu poderia fazer Secretariado. A bolsa nunca saiu, e fiquei no magistério. Com tudo isso, a grande alegria era participar da JE. Além da escola, era o único lugar que eu podia ir. Não podia ir na casa de amigas, nem elas vinham lá em casa, só se fosse pra fazer trabalho de escola. Acho que, com todas estas questões e mais este isolamento, me levaram a um casamento precoce com um jovem, que também fazia parte da mesma JE e com o qual temos a Nádia Philippsen Fürbringer, nossa primeira filha e que hoje nos deu a primeira neta, a Serena!

Neste meio tempo, a indefinição profissional tinha que dar lugar à sobrevivência. Trabalhei de auxiliar de escritório na Füller S.A. e fazia faculdade de Matemática, na UFPR. Na época, acompanhei o Armin em seu vestibular e acabei passando em Pedagogia, também na UFPR. Nesta época passei a trabalhar em escola particular como professora de Ciências e Matemática. A união não foi muito adiante, mas ficou no lugar uma bonita relação entre nós, a despeito da mudança da trajetória comum. Sou grata a Deus por termos um cordial “ex-casamento” e uma bonita amizade entre as famílias.

Naquele período, fiz concurso público para o Banco do Estado do Paraná, e passei a fazer parte do quadro funcional. De novo eu não tinha sintonia entre o que estudava e com o que trabalhava. As demandas de uma filha pequena, as responsabilidades com a mãe, e mais o padrão como professora municipal e funcionaria de banco me exigiram muito. Não dei conta. Desisti no terceiro ano do curso de Pedagogia. Foi uma época bem ruim, estava muito mal, e não participava mais da igreja. Muitas amizades ruins, pessoas que se aproximavam para tirar proveito, muito rigor da parte da mãe e a presença próxima de uma pessoa que me causava muito asco. Era muito difícil. Mas Deus estava comigo, mesmo assim, em todos os momentos. Ele não permitiu que eu não levantasse de novo e de novo.

Quando a filha foi para a primeira série, ela entrou no Colégio Martinus e, fez amizade com uma menina chamada Andréa. Logo, as duas se tornaram muito amigas, e nas idas e vindas de aniversários conheci a Maria Eliana e seu esposo, o P. Jorge. Logo fui visitar a Comunidade Bom Pastor de Curitiba e rapidamente passei a participar e me integrar nos grupos como Coral e Presbitério. Foi como tirar uma pessoa que se afogava de dentro da água: novo fôlego e nova vida.

Na convivência comunitária, novas (e antigas) amizades foram feitas e retomadas. Reencontrei muitas pessoas conhecidas dos tempos de JE e, dentre estas, a família Mog. Era interessante, porque éramos vizinhos de bairro, onde morávamos a menos de 300m uma família da outra, porém, participávamos de comunidades diferentes. Nesta família, eram quatro irmãos: três rapazes e uma moça. A gente se conhecia da vizinhança, nossas mães frequentavam a casa da mesma manicure. No tempo de juventude a gente se encontrava nas atividades dos grupos GAMA e JEBOPA, na UP e no antigo Distrito Sul Paraná. Cheguei a ir à festa de quinze anos da jovem Ingrid e tinha amizade com o Dárvin e Flávio. Só o irmão mais velho que tive pouco contato porque na época da juventude ele estudava no ITA, em São José dos Campos/SP.

Uma vez, minha mãe me deixou ir afesta com eles, porque eram “de família”. Eu nem ousava conversar com o Gérson pensando que um universitário não iria querer falar comigo, que só tinha dezesseis anos. Era aquela coisa platônica mesmo. Mas, a vida dá voltas e nestas, a gente volta a se encontrar! Nos encontramos anos depois, numa nova situação: ele como professor e empresário e eu, bancária, divorciada, mãe de uma filha de sete anos.

Nesta época, o pastor nos convidou a compartilhar, no grupo de JE, como foi no nosso tempo de juventude. Tínhamos muitas histórias para contar, porque nossos grupos fizeram história nos anos 80 e 90, em Curitiba. Depois disso, não demorou muito para algumas pessoas – “cupidos de plantão”, sugerir que Gérson e eu tínhamos tudo a ver um com o outro. Era estranho pensar nisso, porque a gente se conhecia do tempo da JE. Sempre fomos amigos e nunca houve nada além de amizade. Bem, com tantos incentivos começamos a namorar e um ano depois, nos casamos.

Passados 25 anos de casados, estamos aqui, em São José dos Campos escrevendo a nossa história. São mais uma filha e um filho: Heilike e Victor. Finalmente me formei em Teologia, turma 2008 da Faculdade Evangélica do Paraná e depois, fiz o Mestrado na tão sonhada Faculdades EST, no Programa de Gênero e Religião.

Somos família na comunidade e a comunidade é nossa família e, graças a Deus, temos servido voluntariamente nesta Paróquia no Vale do Paraíba, Sínodo Sudeste. Aqui, tenho a graça de poder compartilhar aprendizados do grupo MEL, com o Projeto Almofadas do Coração para mulheres com câncer de mama e aprendido a ser OASE junto com as demais mulheres. Tenho participado de Presbitério em diversas funções e representado a Paróquia no Sínodo e este, em conselhos e comissões na IECLB. Amo ser parte desta igreja e por Deus ter me chamado a servi-lo a partir dela.


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