Domingo de Ramos - João 17.1-8

Prédica

04/04/1971

DOMINGO DE RAMOS

Tendo Jesus falado estas cousas, levantou os olhos ao céu, e disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que o Filho te glorifique a ti; assim como lhe conferiste autoridade sobre toda a carne, a fim de que ele conceda a vida eterna a todos os que lhe deste. E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste. Eu te glorifiquei na terra, consumando a obra que me confiaste para fazer; e agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo. Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. Agora eles reconhecem que todas as cousas que me tens dado, provêm de ti; porque eu lhes tenho transmitido as palavras que me deste e eles as receberam e verdadeiramente conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste. - (João 17.1-8)

Se alguém de nós ficasse sabendo, um dia, que vai morrer em breve, qual seria sua atitude? Indiferença? Angústia? Desespero? Alívio? Seria um atropelo geral, para pôr tudo em ordem? Haveria tentativas meio constrangidas de reconciliação com velhos inimigos? 

Nós acabamos de ouvir as palavras que um homem dirige a seu Deus, nos últimos momentos de vida. Este homem sabia que iria morrer. Sabia até que tinha de morrer. Sabia que dentro de poucos instantes seria preso. E que então viriam interrogatórios e torturas. E a farsa de um processo forjado, porque a sentença já estava combinada com antecipação: pena de morte. 

Sabendo tudo isso (e deve ser difícil saber tudo isso antes!), Jesus faz uma espécie de testamento, uma espécie de avaliação de sua obra no mundo, entre os homens. Sim, chegou a hora. Mas que hora é essa? 

Em sua última oração melhor: meditação, reflexão em voz alta — Jesus diz que essa é a hora da glorificação. 

Meus irmãos: todos os que já se acostumaram com Deus, Jesus, a Igreja perceberão muito pouco do que isso significa. Nos cultos fala-se tanto em glória e glorificação...

Mostrando esse mesmo texto a quem está por fora de tudo isso, a reação foi rápida: não entendo nada! E, diante da pergunta: por que não? — a resposta também veio logo: 

Desde quando a morte (e ainda por cima esta morte) pode ser glorificação? 

Aí está, meus irmãos. Estamos iniciando a semana que alguns chamam de santa — e que seria preferível chamar de semana da paixão. Semana de muito peixe e de pouca penitência. Semana de muito ovo, muito coelho e de pouca meditação. Semana de um dia muito silencioso feriado, superstição. E quantas costureiras vão ficar o dia inteiro na máquina, para aprontar os vestidos do baile no dia seguinte? 

Diante de tudo isso, as últimas palavras de Jesus se tornam efetivamente muito difíceis de compreender. É como se todos já estivessem prontos para chorar, e o candidato à morte declara: chegou a hora de minha glória! É como se alguém fracassasse completamente, no empreendimento mais importante de sua vida, e dissesse aos amigos que viessem consolá-lo: essa foi a minha maior vitória! 

Quem for realmente honesto consigo mesmo, só poderá confessar: eu não entendo mais coisa nenhuma! Porque as últimas palavras de Jesus são uma espécie de soco no olho da gente. São palavras que falam de glorificação e de autoridade, num instante em que tudo — mas tudo mesmo — indica humilhação e subordinação. 

E Parece-me que, de fato, essa é a lição que precisamos apresentar, durante mais uma semana da paixão. Precisamos aprender a fazer uma comparação perigosa. Que comparação? Por que perigosa? 

Olhemos à nossa volta. Examinemos as pessoas que são ou que desejam ser importantes. Escutemos, uma vez, com atenção, o que elas dizem. Observemos o que elas fazem. São pessoas que, às vezes, têm autoridade. São 'Pessoas que, às vezes mi quase sempre, gostariam de ser glorificadas.
Que é que está por trás dessa autoridade e glorificação? As respostas podem ser muitas: poder, dinheiro, influência, sorte, sexo, o direito da força...
E agora, a comparação: a glorificação de Jesus é bem diferente. Porque é Deus quem está sendo glorificado, através daquela morte infame (infame na opinião dos homens!). Isso em primeiro lugar. Em segundo lugar, a glorificação de Jesus começa no momento em que as outras glorificações chegaram à estaca zero: na morte. 

Todos sabemos (e quem não sabe, é bom ir se acostumando com a ideia!) que, com a morte. acabam justamente o poder, o dinheiro, influência, sorte, o sexo, e o direito da força... O mais solene e pomposo dos enterros (ou dos túmulos perpétuos...) não consegue esconder esses fatos. Com Jesus a coisa é completamente diferente, porque nosso Senhor não construiu „sua glorificação sobre essas coisas que nos parecem tão importantes e decisivas.

E ai reside o perigo da comparação. De repente, tudo isso que é tão importante para nós e para as pessoas importantes de nosso tempo, se transforma no pó, na relatividade — vira coisa passageira. Isso é perigoso porque destrói ilusões. E é perigoso porque mostra as verdadeiras dimensões e proporções de tudo e de todos... Aquele que sabia que tinha de morrer — porque assim o exigia a glorificação dos homens — põe a nu essa humana glorificação. E quem fica nu, ligeiro se tapa com as mãos, não é mesmo?

E por que a glorificação de Jesus é tão esquisita, tão diferente, tão destruidora da vaidade humana? 

Para que a gente se desprenda de toda essa papagaiada, justamente nesta semana da paixão. Para que não fiquemos tão impressionados com discursos, monumentos, realizações grandiosas e túmulos luxuosos. Para que fiquemos livres para bem outra coisa: livres para descobrir o que é vida; livres para estabelecer um contato com Deus (e não só com a televisão). 

Precisamos ficar livres para isso. Porque as glorificações dos homens entre si conduzem a uma série ele caminhos sem saída. (Exemplos!) Além disso, a falta de liberdade sempre conduz a dois erros igualmente humanos e — idiotas: de um lado, o erro dos que querem viver sem mundo como se já fossem anjinhos. (E o que esses anjinhos fazem, todos sabem): de outro, os que querem ser iguais ao que todo mundo faz ( e onde isso acaba também se sabe!). As últimas palavras de Jesus, porém, abrem um horizonte maior: Tu, Pai, me deste autoridade sobre todos os homens, para que eu conceda vida eterna a todos. Chegou a hora! Este é o convite! Este, o horizonte maior da semana da paixão! 

(Juiz de Fora — 4-4-71) 

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É preciso considerar que um dia teremos de morrer. Porém, mais do que isso, nós já podemos viver! 

(Ressurreição — Sup. n.° 4 — pág. 7)
 


Autor(a): Breno Arno Schumann
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste / Paróquia: Juiz de Fora (MG)
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Natureza do Domingo: Quaresma
Perfil do Domingo: Domingo de Ramos
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 17 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 8
Título da publicação: Esperança - Centro Ecumênico de Informações / Editora: Tempo e Presença Editora Ltda. / Ano: 1974 / Volume: Suplemento Número 7
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 22288
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João 14.6
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