Doentes terminais merecem respeito

01/12/1999

Doentes terminais merecem respeito

• Priscila Schneider •

Como acompanhar pessoas com doença terminal ou em situação terminal? Esse tema traz em si uma questão inicial: O que é o acompanhar? Segundo o dicionário de Aurélio B. de H. Ferreira (1964), acompanhar significa ¨ir em companhia de; ...seguir a mesma direção de; observar a marcha, a evolução de; ...participar dos mesmos sentimentos¨. Tal definição associa-se à necessidade de conhecer a pessoa que se quer ou está acompanhando, assim como o que e como vive, a fim de relacionar-se com ela.

Então, primeiramente, são pessoas com doença terminal, que vivem situação de confronto com sua finitude. Essas pessoas sofrem de acordo com a consciência que possuem ou que não possuem do que está acontecendo. Esta é realmente uma questão delicada, que traz à tona os direitos e a dignidade do paciente em saber de si. A consciência da possibilidade da morte iminente impõe um processo de adaptação emocional a essa condição, que, em nossa cultura, é dificultada pela inaceitação ou negação da morte.

Crise

Sendo assim, o doente tem de lidar com limites gerados por sua condição física e de relações, incluindo-se aqui as mudanças e a tensão na família. O sofrimento ante o enfrentamento de sua situação é influenciado por sua história de vida, o tipo de dores e perdas que viveu, de como suas feridas cicatrizaram ou foram curadas, pelo próprio suporte para lidar com suas dificuldades e o apoio que tem dos que lhe estão próximos.

Esse processo de adaptação e aceitação do diagnóstico que aponta para a morte é vivenciado como uma crise. Vários sentimentos são experimentados, como raiva, medo, tristeza, solidão, esperança, culpa, fracasso, entre outros. Cabe aos acompanhantes abrirem espaço em que a pessoa seja aceita, sem que, para tanto, lhe sejam impostas condições, principalmente quanto à expressão de seus sentimentos e pensamentos. Do mesmo modo, também é importante que não haja recriminação ou culpabilização. Aliás, é comum uma cobrança do doente consigo mesmo, o que lhe é um peso e, às vezes, precisa ser confrontado com cuidado. É frequente acontecer que o paciente em sua busca por algo que o tire de seu sofrimento concreto imponha-se condições ou negocie com Deus, prometendo-lhe algo em troca. Neste ponto, é importante que o cristão permita que o paciente expresse esse seu desejo, porém não compactue com a mesma dinâmica (o que seria, por exemplo, prometer-lhe que se ele aceitar a Jesus, ficará curado). Esta é uma defesa natural e ¨necessária¨ nesta fase, por ser este o jeito possível do paciente relacionar-se com sua condição. Logo ele percebe que é impossível lutar contra a morte.

Suporte

Assim como a pessoa doente, todos os que lhe estão próximos experimentam sentimentos próprios de um processo de adaptação à morte, ou a perda, necessitando observar qual é o seu suporte para estar junto à pessoa que está sofrendo. Ou seja, é importante que tenham claro ou fiquem atentos a como se sentem com o doente, como estão enfrentando a perda gradual dessa pessoa, se desejam defendê-la da morte ou do sofrimento ou deprimem-se a ponto de buscar apoio nela. Estas questões estão diretamente ligadas às motivações do acompanhante, que, muitas vezes, estão mascaradas para ele próprio, com um discurso cristão, por exemplo. Trata-se do para que estou junto deste doente? ou o que ganho acompanhando-o? e, ainda, quais são meus limites junto a essa pessoa?

Estas perguntas devem ser confrontadas com o que o doente necessita e o que ele pede especificamente, seja em palavras ou gestos. Nesse ponto, há uma questão central, que é o respeito como valor humano e cristão importante nessa caminhada. O respeito implica ter clareza para não misturar as próprias necessidades com as do outro. Elas devem ser atendidas, mas não em função do doente. Esse respeito contribui para que não seja invadido o espaço dele, não lhe seja tirado o chão e, consequentemente, o suporte, mas permita que ele se expresse e SEJA, o que, aliás, é o propósito de Deus para seus filhos.

Segundo as Escrituras, Deus fez a pessoa à sua imagem e semelhança, e humana. Apesar do sofrimento, é possível resgatar essa dignidade de SER HUMANO, acatando o plano de Deus de relacionar-se com a pessoa e dando-lhe esta característica de ser relacional. Viverem relação consigo, com o próximo e com ele, já ou ainda, neste mundo.


A autora é psicóloga e atua na área clínica e no Hospital Universitário da UFSC, em Florianópolis, SC


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Autor(a): Priscila Schneider
Âmbito: IECLB
Área: Missão / Nível: Missão - Acompanhamento e consolação
Título da publicação: Anuário Evangélico - 2000 / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1999
Natureza do Texto: Artigo
ID: 33074
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