Cristo venceu a morte – bendita a nossa sorte! Acabou! A morte perdeu o seu poder! Um novo dia nos anuncia! Uma nova esperança nos é presenteada! Uma nova vida nos é possibilitada! A vida venceu! Os que trouxeram a morte a Jesus foram derrotados! Tentaram vencer a Jesus através do poder humano; mas não contavam com a vitória do poder de Deus!
No alto da cruz, Jesus gritou: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mateus 27.46). Agora, o anjo serenamente anuncia: “Não temais; porque sei que buscai Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui; ressuscitou, como tinha dito. Vinde ver onde ele jazia.” (Mateus 28.5-6). O grito de desespero e dor agora foi trocado pelo cântico de triunfo. Não tenham medo! Não se desesperem! Não se angustiem! Jesus Cristo foi crucificado; mas agora ele já ressuscitou – e a morte já não tem mais poder sobre ele!
Em nossa vida, somos confrontados com a realidade da morte. Com o tempo, vamos percebendo cada vez mais claramente a realidade de que a nossa vida possui um limite. Talvez, comecemos a nos dar conta da morte quando os cabelos começam a esbranquiçar, ou conforme os nossos movimentos vão ficando mais lentos, ou quando começam a surgir dores em nosso corpo que não havia antes. E assim, com o passar do tempo, vamos descobrindo que, como seres humanos, somos mortais. E descobrir que somos mortais significa descobrir também que não somos Deus! A eternidade não é um atributo natural do ser humano; ao contrário, o atributo natural do ser humano é a morte! Ser humano é ser confrontado com a morte e tentar desesperadamente escapar dela a todo custo. A consciência da morte é um fenômeno ameaçador![1]
A nossa vida é envolvida desde sempre pelo mistério da morte – envolvimento que surge através de dúvidas, questionamentos ou até a negação do limite da vida.
Em meio à certeza da morte, Deus decidiu nos presentear com a certeza da ressurreição! Cristo está vivo! Aleluia! Louvado seja o Senhor! Jesus voltou à vida. Foi ressuscitado pelo Pai na força do Espírito Santo. Sua sepultura permanece vazia. Não há corpo em sua sepultura, pois Jesus não ressuscitou apenas em espírito, mas corporalmente. A vida do Jesus ressurreto é uma vida real, completa, em corpo, alma e sangue. Aquela vida que foi arrancada, destruída e aniquilada na cruz voltou a pulsar novamente – embora, claro, de uma forma nova e transformada[2]. Não é um simples espírito; não é uma mera ressurreição da alma. É a ressurreição do corpo – inclusive com as marcas da crucificação!
Em toda a vida de Jesus estava presente a força da ressurreição. A vitória de Jesus sobre a morte estava presente em cada sinal que ele manifestou. Por isso, para Jesus a morte não tem o mesmo significado que para nós: para nós, a morte significa um limite; para Jesus, a morte significou apenas a passagem para a ressurreição e para a vitória sobre a morte. Para Jesus, a morte é um “trâmite” cheio de dor para que acontecesse a ressurreição.
Mas, como isso pôde acontecer? Como alguém que foi morto de maneira tão cruel pôde voltar à vida? Como um falecido reviveu? Na perspectiva humana, a resposta seria que isso é impossível. Muitos vão dizer que isso não passa de um mito! Outros vão dizer que a ressurreição aconteceu apenas na imaginação dos discípulos. Outros ainda vão dizer que o importante é o significado da mensagem da ressurreição. Mas então, o quê de fato aconteceu? O que de fato aconteceu é que Jesus de fato ressuscitou! E não foram apenas as mulheres ou os discípulos que testemunharam disso: “E apareceu a Cefas e, depois, aos doze. Depois, foi visto por mais de quinhentos irmãos de uma só vez, dos quais a maioria sobrevive até agora; porém alguns já dormem.” (1 Coríntios 15.5-6). Não são apenas um pouco mais de uma dúzia de pessoas que testemunharam a ressurreição; são mais de 500 pessoas que viram Jesus Cristo vivo! E não apenas eles, mas também Lucas, médico e historiador, após acurada investigação, também testemunhou sobre a verdade da ressurreição de Jesus. E não apenas Lucas, na Bíblia, mas até mesmo Flávio Josefo, um historiador judeu, falou sobre a ressurreição de Jesus na sua obra “História dos Hebreus”. Como a ressurreição aconteceu? Não pela medicina humana; não pela ciência humana; não pelos estudos humanos; mas pelo agir de Deus – que foge à compreensão e atividade humanas! “Na perspectiva da Bíblia, o que é historicamente possível é sempre examinado dentro do horizonte de um mundo sempre aberto para a atividade do Deus vivo”[3]. Conforme a Bíblia, o que aconteceu ou não independe da atividade humana; ao contrário, depende tão somente do agir poderoso de Deus. E Deus ressuscitou o seu Filho Unigênito para a nossa esperança e salvação.
A ressurreição de Jesus significa que ele está presente conosco. A Igreja é o Corpo de Cristo. Portanto, sim, também a Igreja – nós – é a presença do Cristo ressuscitado no mundo em que vivemos a partir do envio do Espírito Santo em Pentecostes. Cristo está vivo! Ele ressuscitou! Isso é Páscoa! O dia de hoje é o dia mais importante do Calendário Cristão e da qual depende a própria fé cristã! Estamos aqui reunidos/as porque cremos na mensagem da ressurreição e confessamos que Jesus venceu a morte! Estamos aqui reunidos/as porque confessamos, conforme o Credo Apostólico, que cremos “na ressurreição do corpo”! Estamos aqui reunidos/as porque ensinamos a Presença Real de Jesus através da sua Ressurreição!
No terceiro dia, aconteceu a Páscoa! Sobre este terceiro dia começa uma nova história para a humanidade![4] Agora, também a nossa história não é marcada pelo limite da morte; também a nossa história não está mais determinada apenas pela finitude; também a nossa vida tem esperança. Também nós, somente em Cristo, alcançaremos a Ressurreição do corpo – sim, do corpo, e não somente da alma!
Essa é a mensagem da Páscoa! É a proclamação de que a vitória já aconteceu. É a proclamação de que a vida já venceu! É a proclamação de que a vida já triunfou sobre a morte! Acabou! A morte perdeu! O jogo acabou! A morte perdeu! A guerra acabou! A morte perdeu! Há esperança! Porque ele vive podemos crer no amanhã! Jesus venceu a morte! E nele, nós também a venceremos! Não deixaremos de passar pela morte. Mas teremos o conforto da esperança quando precisarmos passar por ela.
Gosto muito do hino de Páscoa composto por Martinho Lutero, chamado “Christ lag in Todesbanden” (Cristo estava preso nas amarras da morte). De maneira única e profunda, Lutero descreveu bem nesse hino como Jesus venceu a morte. Lutero diz:
Ninguém conseguia subjugar a morte
entre os filhos dos homens.
Culpado disso é nosso pecado;
não se conseguia encontrar inocência.
Daí logo veio a morte
e passou a nos dominar
mantendo-nos presos em seu reino.
Aleluia.
Foi uma guerra assombrosa,
quando morte e vida se degladiaram.
A vida alcançou a vitória,
ela tragou a morte.
A Escritura anunciou
como uma morte devorou a outra,
a morte virou motivo de escárnio.
Aleluia.[5]
Não havia quem conseguisse vencer a morte! Mas, de onde veio a morte? “Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Romanos 6.23). Por causa do pecado, a morte passou a dominar o ser humano e toda a Criação. Tudo está marcado pela morte! Mas então aconteceu a “guerra assombrosa quando a morte e a vida se degladiaram”, diz Lutero. A morte perdeu. A vida venceu a morte! A morte passou a ser nada para o cristã. Tornou-se motivo de deboche: “Tragada foi a morte pela vitória. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão? O aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei. Graças a Deus, que nos dá a vitória por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Coríntios 15.54b-57).
Por isso, hoje é dia de festa! Em uma festa, há sempre fartura! Na festa da Páscoa, celebramos a fartura da graça de Deus. Dissipou-se a escuridão! Espantou-se o medo! Afugentou-se o inimigo! Celebramos a luz de Deus! Celebramos a esperança! Celebramos a vida e vida em abundância! E essa celebração acontece especialmente na refeição da Ceia do Senhor – Presença Real de Cristo sob os elementos do pão e do vinho. Celebremos a fartura da graça! Celebremos a esperança da vida eterna! Celebremos a vitória de Cristo sobre a morte! Celebremos a presença de Jesus entre nós!
Quero concluir relembrando a última estrofe do já mencionado hino de Páscoa de Lutero:
Nós comemos e vivemos em fartura
com o verdadeiro bolo pascal.
O velho fermento não deve
ficar misturado à palavra da graça.
Cristo quer ser o alimento
e nutrir sozinho a alma,
a fé não quer viver de outro.
Aleluia.[6]
Na Quaresma inteira omitimos o “Aleluia” nas liturgias do culto. Hoje é o dia de dizer “Aleluia” a plenos pulmões! Louvado seja o Senhor: Aleluia! Há fartura de graça em Jesus. Isso significa que nada precisa ocupar o lugar do Jesus ressurreto em nossas vidas. Ele é suficiente! Sozinho, consegue nutrir nossa fé e nossa esperança!
O mundo vai mal. O mundo está marcado pela morte: guerras em diversos lugares com grande perda de vidas inocentes; crise climática com consequências fatais em diversos lugares como nunca visto antes; doenças como a Dengue e outras ameaçando a nossa vida constantemente; fome, miséria, pobreza; as ameaças da morte infelizmente continuam bem presentes em nosso mundo.
Páscoa significa também esperança na vida! Cessem as guerras para que haja vida e vida em abundância; cesse a exploração predatória da Criação de Deus para que haja vida e vida em abundância; cesse o descuidado humano para que a Dengue e outras doenças sejam controladas – inclusive através da vacinação. Cessem a fome, a miséria e a pobreza!
Em meio às ameaças da morte tão presentes no mundo; em meio aos medos que habitam em nós; em meio ao desespero pela nossa finitude; em meio a tudo isso, recebamos com alegria essa mensagem de Páscoa que diz: Cristo está vivo, aleluia! Rejubilemos! Exultemos. O grito de desespero da cruz agora dá lugar ao canto de triunfo! Ele é o motivo da nossa fé! Ele é o fundamento da nossa esperança! Ele é vida e vida em abundância. Deus abençoe a nós nesse dia com firmeza nessa esperança – a esperança da ressurreição do corpo e da vida eterna – amém!
[1] SCHWARZ, Hans. “Escatologia”. in: Cf. BRAATEN, Carl E.; JENSON, Robert W. (ed). Dogmática Cristã. v. 2. São Leopoldo: Sinodal, 1995. p. 561-563.
[2] Cf. GUARDINI, Romano. O Senhor: reflexões sobre a pessoa e a vida de Jesus Cristo. São Paulo: Cultor de Livros, 2021. p. 585.
[3] BRAATEN, Carl E. “A pessoa de Jesus Cristo”. in: BRAATEN, Carl E.; JENSON, Robert W. (ed). Dogmática Cristã. v. 1. 2 ed. São Leopoldo: Sinodal, 2002. p. 533.
[4] Cf. BARTH, Karl. Esboço de uma Dogmática. São Paulo: Fonte Editorial, 2006. p. 173.
[5] LUTERO, Martinho. Christ lag in Todesbanden - 1524. in: LUTERO, Martinho. Obras Selecionadas: Vida em Comunidade: Comunidade - Ministério - Culto - Sacramentos - Visitação - Catecismo - Hinos. v. 7. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2016. p. 522-524.
[6] LUTERO, 2016. p. 523-524