Dia das Bruxas: ¨carnaval¨ anglo-americano
Allan Krahn
Mais e mais, a cultura norte-americana está invadindo as outras sociedades e culturas. Um exemplo é o tão filmado ¨Halloween, Dia das Bruxas¨. Mas o que é esta festa? É importante para nós?
Parece que cada cultura precisa do seu dia de avessos. Um tempo de brincar com as coisas sérias, as coisas assombrosas, as coisas que dão medo. Um tempo para encarar, de um modo lúdico, as coisas difíceis de enfrentar, até os nossos próprios demônios. Nós tentamos viver vidas racionais dentro das leis e dos costumes da sociedade, mas sabemos que existem dentro de nós forças poderosas e irracionais. Para lidar com isso sem perder o controle, as culturas criam momentos rituais e lúdicos como válvulas de escape, reconhecendo as forças irracionais sem deixá-las destruir a organização social.
Na Idade Média, existia o Festival dos Bobos, onde, por um dia, o rei virava mendigo e o mendigo virava rei. Hoje, não existe um exemplo melhor disso do que o carnaval do Brasil.
Tradição puritana
Nos Estados Unidos, existe o Halloween, ou o que nós chamamos de ¨Dia das Bruxas¨, que, em realidade, não somente inclui bruxas, mas também bruxos, esqueletos, demônios e fantasmas. Aqui vemos a tradição puritana com seu medo do diabo e de seus servos e suas servas, e ainda seu medo da sexualidade.
A palavra Halloween vem do inglês All Hallows' eve (véspera do Dia de Todos os Santos). Assim como o carnaval está ligado a seu contrário, a Quaresma, o Dia das Bruxas está ligado ao Dia de Todos os Santos.
Sua origem vem da cultura inglesa pré-romana, a cultura celta. Com a morte da natureza no começo do inverno, eles celebravam o senhor da morte, Samhain. Os celtas acreditavam que as almas dos mortos voltavam à terra nesta noite. Com a entrada dos romanos, isso foi ligado com a festa romana da morte, Feralia. Cerca do ano 800, os cristãos adaptaram o festival celebrando o Dia de Todos os Santos em 1° de novembro e, depois, dia 2 para Finados, dia de todas as almas. O Halloween foi celebrado de várias maneiras nas regiões da Inglaterra, Irlanda, Escócia e Gales, e ficou popular nos Estados Unidos nos anos de 1800 com as imigrações da Irlanda e da Escócia.
Crianças fantasiadas
Atualmente, Halloween é um dia para as crianças saírem fantasiadas pedindo doces e dinheiro de porta em porta e fazendo pequenas malandragens, como passar sabonete nos vidros dos carros. Também se fazem festas de fantasia onde as pessoas se vestem de bruxas, diabos, esqueletos, piratas. A festa cristã do Dia de Todos os Santos quase não é celebrada nos Estados Unidos, especialmente entre os protestantes. Os luteranos lembram a Reforma, mas isso não tem nada a ver com a festa, agora totalmente secular, do Halloween. O que fica nesta festa, numa maneira lúdica, é a questão da morte e o medo de um mundo sombrio e desconhecido.
Por que importar este costume para o Brasil? Parece que a razão é que é ¨americano¨ (estadunidense), e tudo dos Estados Unidos deve ser importado. O Brasil tem uma das maiores e mais conhecidas festas do mundo: o carnaval. Por que importar uma festa menos rica e que não tem ligação com a nossa cultura, com os nossos -anseios? Nem o nosso protestantismo (com exceção da parte importada dos Estados Unidos) combina com o protestantismo puritano que permeia a cultura dos Estados Unidos.
Podemos perguntar como brasileiros e brasileiras podem aproveitar a nossa festa, o carnaval, de uma maneira saudável, que enriquece nosso povo. Todos nós temos um lado irracional, passional. Como pessoas cristãs, podemos usar (e não só reprimir) esta parte de nós, que também é criação de Deus, para enriquecer nossas vidas. Mas essa discussão necessita um outro artigo.
O autor é pastor da IECLB e atua na Escola Superior de Teologia da IECLB, em São Leopoldo, RS
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