Prezada Comunidade
Hoje os textos bíblicos falam da hospitalidade, isto é, sobre receber bem os viajantes e os peregrinos, dar-lhes um momento de descanso, oferecer-lhes alimento – isso fazia parte dos 613 mandamentos da Torá. Para um viajante israelita ser tratado com hospitalidade pelos seus compatriotas, bastava sentar-se na praça pública da cidade e esperar um convite.
O texto de Gênesis nos diz que Abraão recebe a visita de 3 pessoas. Quando Abraão vê que eles estão cansados, convida-os para que fiquem em sua casa para lavar os pés (equivalente hoje a tomar um banho) e alimentar-se e dormir algumas horas antes de continuar sua jornada. Como recompensa por sua generosidade, Abraão recebe a promessa da fecundidade de Sara, - que estava escutando a conversa e reage com risos,- pois Abrão e Sara já eram muito velhos e Sara já havia passado da idade de ter filhos.
O texto de Evangelho também fala de uma visita de Jesus à casa de Marta e Maria. Marta sabe muito bem o que é preciso fazer. Uma visita deve ser bem atendida. E dentro dessa preocupação de servir bem, de oferecer o melhor possível, que Marta não consegue entender a atitude passiva da irmã Maria. A seus olhos, Maria é uma irresponsável. Fica a fazer sala, quando há tantas tarefas a cumprir em função dos hóspedes que são Jesus e seus 12 discípulos. Era um tanto de gente para atender. Era preciso buscar água para lavar os pés e também preparar comida para que eles se alimentassem. E Marta - sozinha - não estava dando conta. Isso faz surgir a tensão entre as irmãs, que vai explodir no v.40b. E quando acontece, a explosão de Marta se dirige também ao próprio Jesus. Então ele não vê que a irmã está sendo irreverente até? . Maria fica aos pés de Jesus e ouve os seus ensinamentos. A posição de ambos indica a relação professor aluno (cf. At 22.3). Segundo o costume judaico, porém, um professor não deve ensinar uma mulher. Jesus deveria saber disso. E será que Jesus não vê que Maria está fazendo falta na cozinha? Será que não nota que Marta precisa de ajuda?
Senhor, não te importas de que minha irmã tivesse deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me.
Vejam bem. Marta não se dirige a Maria. Dirige-se a Jesus em sua crítica. Marta quer que o Senhor reconheça a sua atitude como correta. Quer que Jesus a valorize em seu trabalho responsável. Quer que Jesus faça valer sua autoridade, chamando também a irmã à responsabilidade.
Senhor, não te importas . . . ? Marta pergunta.
Mas não espera resposta. Sua posição é prefixada. Ela tem certeza de que está correta. Maria está errada. E Jesus, como homem justo e íntegro, há de lhe dar razão. Por isso, segura de si, ela diz: ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me.
Posições prefixadas tornam surdos os ouvidos. Marta não é mais capaz de ouvir. Ela não está mais aberta para rever posições. E por isso ela não consegue entender uma coisa: Jesus está na casa. Jesus, o Senhor, é quem serve. Maria se deixa servir. Marta, com suas preocupações, está fechada ao serviço de Jesus.
Maria se deixou servir. Sentou-se aos pés do Senhor para lhe ouvir os ensinamentos. E, mesmo que ela fosse mulher, mesmo que a tradição permitisse a Jesus ignorá-la, ele a serviu. Jesus a serviu porque Maria foi receptiva. Ela teve ouvidos abertos. Entendeu que nada teria a dar, se Jesus não lhe enchesse as mãos vazias. Jesus veio para servir e, por isso, quando nos visita, só há uma maneira de relacionar-se com ele: abrir-se e deixar-se presentear.
Esta situação não se alterou nos dias de hoje. Jesus continua a visitar. Apenas de maneira diferente. Ele não bate pessoalmente às portas. Seu convívio com os seres humanos não acontece mais pessoa a pessoa. Mas ele continua a visitar e a falar. E suas visitas assumem diversas formas. Elas se multiplicam através da palavra escrita e falada pelos discípulos que enviou.
Assim, Jesus me visita, quando paro para refletir sobre sua palavra. Na simples leitura de um texto, ele está aí e fala. Ele me visita no culto, cujo principal objetivo é deixá-lo falar. Ele se infiltra em minha vida e em minha casa. Ele me encontra na rua, por intermédio de pessoas chamadas por ele e falar. Sim, ele atesta a sua presença através de símbolos mudos que me lembram de que ele quer me falar. Ele não pára num lugar só. Ele caminha, visita e fala.
No entanto, algumas pessoas dizem:
- Se Jesus é assim tão presente, porque eu não consigo vê-lo, porque eu não consigo ouví-lo? Se Jesus veio para servir, porque eu não percebo a sua ajuda?
Geralmente quando eu peço a ajuda de Deus, quando eu oro a Deus pedindo a sua ajuda, na verdade eu já sei o que Deus deveria fazer. E eu espero que Deus faça o que eu quero. Que ele faça o que eu acho que eu preciso. E eu preciso que as pessoas sejam mais atenciosas, mas responsáveis, mais tolerantes comigo. Eu preciso de mais oportunidades, de mais dinheiro. Preciso que Deus alivie meu stress.
Algumas pessoas no seu desespero dizem que parece que Deus as esqueceu, porque as coisas não estão dando certo na sua vida e que já se cansaram de tanto pedir a ajuda de Deus e não acontece nada daquilo que ela precisa.
Talvez Deus seja uma um ancião e por isso é bastante lento para nos atender. Nós, no entanto, no meio de nossa agitação, de nossas tarefas, de nossos anseios – não temos tempo. Por isso, de um Deus mais rápido, mais conectado (antenado) para ver o nosso esforço e nos servir.
Por isso, se Deus ajuda, por que então não consigo sentir e ver a ajuda de Jesus na minha vida?
Talvez a resposta seja bem simples. Jesus não vai nos ajudar naquilo que nós não estamos fazendo bem. Geralmente nós queremos que as outras pessoas mudem, mas isso não está dando certo. A gente não consegue mudar ninguém. A gente – com muito sacrifício – consegue mudar só a gente mesmo. Então quem precisa mudar somos nós. Se as coisas não estão dando certo do nosso jeito, então peçamos a Deus que ele nos ajude a ver o jeito de Deus. E nos textos bíblicos de hoje temos algumas respostas:
Jesus não me esqueceu. Ele me escuta e muitas vezes até vem me visitar. Mas quem não o reconhece sou eu. Para que eu o reconheça, para conseguir ouvir e ser servido por Jesus é preciso reservar espaço. É preciso parar, é preciso relativizar minhas verdades, minhas certezas, minhas conviccões e procurar um lugar tranquilo, ter tempo para escutar. Do contrário, não poderei ser servido por Jesus - e em meio a tanta agitação da vida hodierna vai perdendo “a boa parte”.
Esse tempo para Jesus, isso acontece através do culto dominical, da comunhão com os irmãos na fé, na Santa Ceia, mas também na devoção diária, da leitura sistemática da Palavra de Deus. Quem dedica tempo e atenção para Deus, quem se dispõem a mudar – essa pessoa vai escutar a voz de Deus e também vai descobrir que – além das suas tarefas diárias - ainda sobrará tempo para dedicar-se a servir ao próximo. Isso requer sabedoria , humildade e renúncia. Martim Lutero há 500 anos atrás dizia: Hoje eu tenho muitas coisas para fazer, portanto, terei que dedicar bastante tempo para me acalmar e buscar a orientação de Deus.
Assim é o nosso Deus. Um Deus que sente saudade da gente e, por isso, é capaz de descer do céu e vir ao nosso encontro. Aliás o ministério de Jesus é o ministério dos encontros. É o divino que vem ao encontro do humano, é a Misericórdia que vem ao encontro de nosso desesperado, é o perdão que vai ao encontro do pecador.
Se Deus é assim conosco, porque nós não fazemos o mesmo indo ao encontro e acolhendo as pessoas a sua volta. Se Deus écapaz de romper fronteiras, quebrar barreiras e dar o primeiro passo para re-aproximar-se dos/as afastados/as, porque nós não fazemos o mesmo?.
Em Jesus, Deus veio nos visitar. Ele veio do céu ao nosso encontro. Mas se quisermos ouvir a sua voz, se quisermos sentir a sua presença e entender o que Jesus nos quer dizer, é preciso que nós mesmos mudemos nossas atitudes e nossas prioridades. Deus quer nossa atençao, quer que lhe dediquemos tempo. Quem se dispõem a isso, vai ver que Deus o aconselhará dia e noite e poderá confirmar as palavras biblicas que dizem:
Não deixem de receber bem aqueles que vêm à casa de vocês; pois alguns que foram hospitaleiros, sem o saber, receberam anjos (Hb. 13.2)
Que a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus nosso Pai e a comunhão do Espírito Santo permaneçam no meio de nós.
Amém