Cuidar da juventude: tarefa de todos

03/10/2017

Cuidar da juventude: tarefa de todos

Para que se possa falar em juventude, é preciso entender, primeiramente, qual período da vida está sendo referido. Nos dias de Lutero, a velhice era conhecida já aos 30 anos de idade. A expectativa de vida era muito menor do que agora. Por isso, se observa que, ao se casar com Catarina von Bora, o monge era considerado fora da idade. Ele tinha 42 anos quando se uniu à ex-freira. Ela tinha 26. Atualmente, a Organização das Nações Unidas define como jovem a pessoa com idade de 15 a 24 anos e idosa a partir dos 60 anos.

Tardio para o matrimônio, Lutero sempre correspondeu às demandas respectivas à sua idade no campo dos estudos. Como explica o historiador Martin Dreher (2014) no livro De Luder a Lutero: uma biografia, aos cinco anos já frequentava a escola latina de Mansfeld. Ele ia “na garupa de um parente, pois as perninhas não aguentavam a caminhada”. Aos 14 anos, estava em Magdeburgo – onde permaneceu por um ano. Por ali também passaram o teólogo e humanista Erasmo de Roterdã e o astrônomo e matemático Nicolau Copérnico. Lutero foi para Eisenach aos 15 anos, onde se preparou para a universidade. Depois foi a Erfurt, onde ingressou aos 17 anos. Aos 19, conquistou o título de bacharel em Filosofia e aos 22 se tornou mestre em Artes. Seu professor de grego e aluno de Teologia, Filipe Melanchthon, lecionava grego e hebraico aos 17 anos de idade.

Lutero foi um intercessor a favor dos jovens. Criado com severidade, promoveu uma inversão na pedagogia do ensino e da aprendizagem. Certa vez, apanhou da mãe e do pai até sangrar. O motivo? Havia pegado de cima da mesa uma noz sem pedir permissão. Em outro dia, na escola, recebeu 15 varadas do professor em uma única aula. Aprendia, portanto, a partir dos castigos físicos comuns à época e que se faziam presentes tanto em casa quanto no ambiente escolar – onde era preciso decorar o conteúdo transmitido em latim pelos professores.

Talvez a rigidez vivida em sua infância o tenha feito um pai mais compreensivo. Nota-se que, já em seus primeiros escritos sobre a educação, exige que se construam e mantenham escolas que ensinem meninos e meninas. Além disso, preconiza a ludicidade. No escrito Aos Conselhos de todas as cidades da Alemanha, para que criem e mantenham escolas (1524), questiona: “Ora, a juventude tem que dançar e pular e está sempre à procura de algo prazeroso. [...] Por que então não criar para ela escolas desse tipo e oferecer-lhe essas matérias?”. Para ele, as atividades escolares deveriam ser prazerosas a fim de atrair e conservar firmes os estudantes.

Exemplo de como o lúdico lhe era importante para instruir é uma carta que escrevera, durante viagem, para seu filho Joãozinho – de quatro anos. Eis um trecho, no qual descreve o Reino dos Céus: “Eu conheço um jardim muito lindo e divertido, onde andam muitas crianças, vestidas de roupa dourada e que recolhem bonitas maçãs debaixo das árvores, e peras, cerejas, nêsperas e ameixas, cantam, saltam e estão contentes. Também têm belos cavalinhos com arreios de ouro e selas de prata. [...] Portanto, querido Joãozinho, estude e ore sem vacilar e diga isso a Lipe e Justo também, para que também eles estudem e orem, que assim vocês vão entrar juntos no jardim” (19 de junho de 1530). Nessa mesma perspectiva de ludismo, Lutero utilizava a música como ferramenta de aproximação ao universo das crianças e dos jovens. À sua filha Madalena, compôs os hinos Num berço de palhas dormia Jesus e Eu venho a vós dos altos céus.

Devido às pestes e doenças de seu tempo, criança não contava. Afinal, não se sabia se vingaria ou não. Lutero pensou diferente e apostou nos pequenos, reservando-lhes o espaço escolar. Aos mais velhos, propôs uma reforma universitária, sugerindo ampliação dos conteúdos. Indicou a inclusão do ensino da Matemática, da Geografia, da História e de línguas. “Assim poderiam ter logo diante de si, como um espelho, a natureza, a vida, conselhos, objetivos, sucessos e fracassos do mundo inteiro. Isso serviria de orientação para seu pensamento e para posicionar-se no curso do mundo”, como explica no escrito Aos Conselhos de todas as cidades da Alemanha, para que criem e mantenham escolas (1524).

Interveio pelos jovens ainda em outro aspecto: em tempos de casamentos arranjados, procurou amenizar os conflitos familiares. Disse que os filhos não deveriam ocultar de seus pais o noivado, mas os pais também não deveriam obrigar os filhos ao matrimônio – ideia embrionária no que tange à liberdade de consciência e revolucionária em termos de relação entre genitores e descendentes.

De modo geral, seu olhar sobre a juventude orienta para o ensino amplo, que ultrapassa as temáticas religiosas, com o intuito de preparar os jovens para a vida e para o mundo. Ademais, discute os limites hierárquicos dos pais e professores, recomendando conversa e aproximação com os mais novos. Aos jovens, especificamente, garante o direito de questionar e estudar – fazendo uma nova leitura do quarto mandamento do Decálogo. Com isso, está sugerindo diálogo entre as gerações – o que é novidade para seu tempo e servirá de orientação para o futuro, incluindo-se os nossos dias.


 

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