Crianças e Ceia do Senhor

Artigo

02/02/2002

Através de decisão conciliar (1990), a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) estimulou suas comunidades a estudar e ensaiar a prática da Ceia do Senhor com as crianças. Os concílios distritais posicionaram-se frente ao assunto durante os dois anos seguintes. Constatando que já havia comunidades que incluíam as crianças na celebração da Ceia'do Senhor e que seguidamente surgiam constrangimentos diante da exclusão de crianças desse sacramento, a principal conclusão dos distritos foi a de que há grande consenso em que o assunto é importante, mas carece de maior estudo nas Comunidades. Sugeriram, então, que a IECLB se manifestasse a respeito com clareza. Isto aconteceu em 1992, quando o XVIII Concílio Geral emitiu um posicionamento sobre o tema celebração da Santa Ceia com nossas crianças.

O núcleo central desse posicionamento trata dos aspectos fundamentais da Santa Ceia. Neste sentido, aponta a oferta da comunhão de mesa como característica das mais importantes na atividade de Jesus. Foi comunhão de mesa primordialmente com as pessoas que os dirigentes religiosos da época consideravam impuras, indignas. Jesus, sem impor condições prévias, reuniu essa gente pecadora e com ela comungou e se solidarizou.
O documento conciliar afirma que essa comunhão de mesa proporcionada por Jesus foi interrompida pelo acontecimento da Sexta-Feira Santa. Interrompida, porém não eliminada! As palavras que Jesus proferiu ao distribuir o pão e o cálice apontaram para um novo tipo de comunhão: não mais a comunhão de mesa em si, mas comer e beber [do pão e do cálice] como tais passam a ser os meios da comunhão com Jesus. Ali, na Ceia do Senhor, ao comer o pão, beber do cálice e ao ouvir as palavras sobre eles proferidas, Jesus se dá a si mesmo como aquele que morreu por todos.

Como Jesus congregou todos, o documento conciliar aponta o lugar das crianças na comunhão eucarística: Deus quer colocar toda a humanidade em uma nova relação consigo (Jr 31.31), sendo impossível excluir as crianças. Afinal, ao comungarem no corpo e no sangue de Jesus Cristo, os cristãos sabem que lhes é possibilitada comunhão de uns com os outros. E as pessoas são inseridas nessa comunhão através do batismo. A Santa Ceia é a ceia da comunidade de fé, da qual nos tornamos membros através do batismo. Os sacramentos são comunitários por definição. Destinam-se a todos os seus membros, também às crianças e aos excepcionais.

Ao aprovar esse documento, a IECLB não deixou de reconhecer que há argumentos e práticas convencionadas que tiraram as crianças da comunhão na Ceia do Senhor. Uma é a exigência da maturidade na fé. Outra, o rito da confirmação. Sobre a primeira, o documento afirma que é um erro querer-se afastar as crianças da ceia sob o argumento de que não tenham atingido o grau de fé dos adultos ou que já tenham na palavra pregada toda a dádiva que a ceia oferece. Tais argumentos dão maior valor à razão do que ao Espírito Santo e querem impedir que o Deus encarnado habite pessoal e fisicamente entre nós. No que se refere à confirmação, o questionamento conciliar é bem claro: Nossa prática da Santa Ceia não deveria ser presa à confirmação. Não há base teológica para tal relacionamento. Na prática do ensino confirmatório, no entanto, já deveria ser celebrada a Santa Ceia.

Baseado nesses argumentos, o documento conciliar propôs que as comunidades da Igreja iniciassem um processo de aprendizagem que conduza à participação eucarística plena de todos os membros. Indica, como passos pedagógicos, o convite à reflexão sobre o tema, feita no círculo familiar e em todos os níveis e grupos da comunidade. Insiste que a discussão precisa priorizar com fôlego a dimensão teológica do assunto, pois tem que ficar claro que não há motivos teológicos contra a Santa Ceia para as crianças; que na Bíblia não há argumentos contrários à Santa Ceia para crianças.

Romeu Ruben Martini é pastor da IECLB e professor da Escola Superior de Teologia.

 

A PRATICA DA CEIA DO SENHOR NÃO DEVERIA SER PRESA À CONFIRMAÇÃO.

O Conselho Mundial de Igrejas (CMI), uma comunidade fraterna que congrega aproximadamente trezentas Igrejas, emitiu, através de sua Comissão de Fé e Constituição, suas convergências teológicas significativas. Isto aconteceu, após décadas de estudo e discussão, na reunião desse conselho em 1982, através do documento intitulado Batismo, Eucaristia, Ministério (BEM).

Sobre a temática que envolve a participação das crianças na Ceia do Senhor, BEM destaca que as Igrejas que batizam crianças, mas recusam-lhes a comunhão na Eucaristia antes de um tal rito [confirmação], deveriam interrogar-se se terão ou não avaliado e aceito plenamente as consequências do Batismo1. O Batismo deve ser sem cessar reafirmado. A forma mais natural de uma tal reafirmação é a celebração da Eucaristia2. É na Eucaristia que a comunidade do povo de Deus é plenamente manifestada. As celebrações eucarísticas estão sempre em relação com a Igreja inteira, e toda a Igreja está implicada em cada celebração eucarística. Neste sentido, complementa: Em muitas Igrejas hoje discute-se a questão das crianças batizadas como comungantes na Eucaristia3.

AO FALAR DO CULTO DA COMUNIDADE, LUTERO DISSE QUE SE DIRIGIAM À MESA DA COMUNHÃO HOMEM, MULHER, JOVEM, VELHO, SENHOR, ESCRAVO, ESPOSA, EMPREGADA, PAIS, CRIANÇAS, COMO DEUS ALI A TODOS NOS REÚNE.

Lutero: Von der Winkelmesse und Pfaffenwei/ie (WA 38,247:10).


1 COMISSÃO DE FÉ E CONSTITUIÇÃO DO CMI, Batismo, Eucaristia, Ministério, 2.ed., Rio de Janeiro : CEDI. 1984, p. 21 .b.

2 Idem. ibid., p. 21 .c.

3 lbid., p. 30, 19.


DEUS QUER COLOCAR TODA A HUMANIDADE EM UMA NOVA RELAÇÃO CONSIGO, SENDO IMPOSSÍVEL EXCLUIR AS CRIANÇAS.

Os sacramentos são comunitários por definição. Destinam-se a todos os seus membros, também às crianças e aos excepcionais.
 

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Autor(a): Romeu Ruben Martini
Âmbito: IECLB
Título da publicação: Crianças na Ceia do Senhor / Ano: 2008
Natureza do Texto: Artigo
ID: 14003
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É mais consolador ter Deus como amigo do que a amizade do mundo inteiro.
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