Artes plásticas em nossas igrejas

01/12/2000

Artes plásticas em nossas igrejas

• Sônia Ingrid Kanitz •

Algo está acontecendo conosco, luteranos brasileiros: estamos começando a dar maior importância às artes plásticas no espaço do culto cristão. Nas artes têxteis, são muitos os grupos que se organizam para a criação e renovação de paramentos. Há comunidades que pedem seminários para tratar do assunto, não só como uma proposta de trabalho manual, mas também para compartilhar os conhecimentos da história e do sentido teológico da utilização desses artefatos e símbolos litúrgicos na igreja. Os obreiros da IECLB estão elaborando e renovando sua vestimenta litúrgica. Muitas igrejas têm crescente preocupação em preservar a arte da luz colorida em seus vitrais. A arte plástica deixa agora de ser uma herança meramente decorativa de outrora, mas serve como testemunho de fé em nossas celebrações.

A pintura ainda é uma possibilidade, em nossa realidade, para os que não sabem ler, conhecer o conteúdo da Bíblia. Do mesmo modo, nas artes gráficas utilizam-se obras de arte para ilustrar e, ao mesmo tempo, provocar o interesse para a leitura. Na arte litúrgica surgem mais pessoas interessadas em estudá-la e dispô-la para o culto cristão. O artista plástico se sente convidado para retornar a seu meio comunitário e explorar brechas para expressar sua vocação e a sua fé. Os historiadores aproximam-se da arte das igrejas e reconstituem a história do povo que habita ao seu redor. Pela necessidade surge uma nova profissão: os restauradores de arte. E assim percebemos que de fato as artes plásticas estão recebendo maior importância em nossas comunidades.

Como somos uma igreja luterana que passou por um processo reformatório protestante, podemos dizer que, também no que se refere às artes, ainda hoje sentimos essas influências de outrora. Lutero, por sua vez, não condenou o uso da pintura e da escultura, porém advertiu para não fazer delas imagem de adoração e confiança. Pressupõe-se que, na época, as imagens e as gravuras nas igrejas exerciam um grande poder religioso e desviavam do alvo verdadeiro da salvação. Porém, Lutero não tomou posicionamento claro diante daquilo que era visual nas igrejas. Temos conhecimento de que se relacionava bem com Dürer e Cranach, pintores da época, e que nas obras destes se percebe a influência da teologia luterana. Também sabemos que Lutero recorria às artes gráficas para ilustrar seus escritos.

No entanto, houve movimentos paralelos na Reforma, de outras pessoas super-radicais (Bodenstein de Karlstadt e Müntzer de Stolberg), que promoveram a iconoclastia (destruição de imagens). E, dessa forma, chegaram ao Brasil, com a colonização alemã, diversas influências desse processo reformatório. Isso explica porque algumas de nossas igrejas luteranas brasileiras possuem dentro delas tão pouca motivação visual da expressão de fé. E outras, no entanto, são tão preciosas no aspecto visual. Sem dúvida, por falta de um posicionamento claro da parte de Lutero sobre as artes plásticas nas igrejas e por ele ter descoberto (felizmente!) que a nossa salvação vem de Deus (da Palavra) e de graça (sem merecimento), nós hoje podemos verificar que, através dos tempos, nossas igrejas tiveram, entre outras, menos preocupação com aquilo que os olhos vêem ou o tato sente ou o nariz cheira ou o que a boca degusta. Já o sentido da audição teve seu papel principal tanto nas prédicas como na música.

Estudos recentes comprovam que a cor e a forma são estímulos que o ser humano capta e retém com melhor eficácia. De todos os estímulos que nos cercam diariamente, 80% deles são percebidos pela visão, destes 60% são referentes à cor e 20% à forma. Somente 10% são absorvidos pelo ouvido. Permito-me fazer uma especulação sobre isso: Se Lutero tivesse conhecimento disso na sua época, teria se dado o tempo para se posicionar mais firmemente a respeito do que era visual nas igrejas. Mas podemos dizer que, graças a sua teologia, as comunidades luteranas utilizam-se de um critério muito importante, qual seja, tudo o que está na igreja é para glorificar e santificar unicamente Deus. Lembrando sempre o seu evento máximo com a humanidade, que, tornando-se humano como nós, restabelece a aliança conosco para sempre na ressurreição da vida sobre a morte. E para os grandes feitos de pessoas dedicamos outros espaços na comunidade, porém definimos que a igreja é o espaço para enaltecer somente o trino Deus.

A arte plástica, quando bem elaborada, quando consegue captar nosso olhar interior ao ser contemplada, chama-nos para o culto a Deus. Através dela conseguimos tornar visível quem está presente, porém não vemos. Assim como uma fotografia traz à memória uma pessoa querida, assim a arte traz a presença não-visível de Deus. Que bom que sabemos apreciá-la!


A autora é artista plástica e obreira catequista da IECLB, e reside em São Leopoldo, RS


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Autor(a): Sônia Ingrid Kanitz
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Liturgia
Título da publicação: Anuário Evangélico - 2001 / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2000
Natureza do Texto: Artigo
ID: 32946
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