Apelo — não se desviem da promessa
O profeta Jeremias, autor e personagem deste livro, tem como característica em seu escrito destacar a centralidade da família. Pessoalmente sempre se vê ligado a tragédias e infortúnios e, não responsabiliza outros pelas mazelas; se inclui nelas. O rei Josias, seu contemporâneo, havia feito uma reforma religiosa trazendo o povo de volta ao culto do Deus único (Jahweh), mas com sua morte brusca cabe a Jeremias ser o arauto da vontade de Deus. Isso traz a Jeremias — que descende de uma linhagem sacerdotal — amigos e inimigos. Se coloca junto no problema e na solução, como família, como clã, olhando para o passado de relativização da vontade de Deus e apontando para o futuro de esperança, à medida que as famílias retomem um posicionamento de respeito e obediência a Deus. Tudo isto acontece por volta do ano 586 a.C. onde Jeremias aponta que o caminho da graça só é possível mediante o juízo de Deus. E este juízo está presente por causa da idolatria, do abandono das famílias à centralidade da vontade de Deus.
Modo de atuar
Deus se coloca como modelo — tipo — e se dispõem a ser comparado em Seu procedimento dos descendentes de Israel, antes conhecido como Jacó. Deus diz: comparem o que vocês escolheram, seguindo a outros deuses, com o que eu fiz em favor de vocês. Deus, o Pai, se sente traido pelas escolhas erradas destas famílas que compõe toda a nação. Ou seja, as escolhas particulares repercutem nas famílias, nos clàs e, por fim, na nação inteira.
Pelo fato de as famílias — que eram patriarcais — terem sido conduzidas para continuar seu afastamento do Deus da promessa, neste momento não restava nada mais que o juízo divino. A condução errada era fruto do desvio dos próprios sacerdotes, que não mais honravam ao Deus único, apesar da recente reforma cultual do rei Josias.
Como voltar a ser fiel?
O apelo do profeta, dirigido às famílias, tem um claro objetivo: comparar, reconsiderar e fazer a opção correta. Evidentemente toda a cadeia de formação de opinião está incluída, também os sacerdotes que eram relacionados com pessoas do campo sócio-político. Como já disse anteriormente, a característica de Jeremias é a de se incluir no problema e na solução. Nem ele se exclui!
Podemos apontar, a partir do texto, dois passos concretos para a volta: ouvir e perguntar.
a) Ouvir! Escutar! Atentar! Não é só aquilo que as ondas sonoras são capazes de informar, mas o que os olhos também podem constatar. 2 Crônicas 35 relata que nunca se celebrou em Israel tal Páscoa como Josias e os sacerdotes e todos os levitas, todo Judá e Israel, todos os habitantes de Jerusalém, celebraram. Por que esquecer isso? Por que deixar de ouvir sobre a libertação ocorrida, libertação de cultos e deuses falsos?
b) Perguntar! Pedir informações! Interpelar! Se os sacerdotes, que aqui são colocados contra a parede, não se perguntam sobre o Deus Único, como o povo pode saber da verdade e do único caminho? Se os sacerdotes confundem, como o povo poderá ter clareza? “Porque os pastores se tornaram tolos e não buscaram o Senhor; por isso, não prosperaram, e todos os seus rebanhos se acham dispersos.” (10.21) Esta é a triste constatação do profeta Jeremias.
O retorno ao caminho da fidelidade à Deus e, consequentemente, o retorno das bênçãos, implica em escutar e perguntar. Buscar as informações corretas nos ambientes corretos e confiáveis.
Visibilidade da ação de Deus
Em uma linguagem muito própria e contextualizada com a realidade da época, o profeta Jeremias aponta para as evidências irrefutáveis da ação de Deus em favor dos seus. Depois de terem passado por terras àridas, cheias de covas, terras secas e cheias de sombras da morte, terras onde não morava ninguém, eu os trouxe para uma terra fértil, para que vocês comessem o seu fruto e as coisas boas que ela tem” (v.7). Essa é a providência de Deus ao libertar seu povo da escravidão: lhe dá prosperidade e cuidados paternos.
Mas, este mesmo povo, mal conduzido pelos sacerdotes e não questionados pelos pais de famílias, vai atrás da “nulidade (v.5 - ARA) dos ídolos, tornando-se nulos como eles. A palavra expressa “nada”, “bolha ou até “hálito”. Um ídolo não é apenas vaidoso (impotente e vazio), mas a própria vaidade. Seus adoradores adquirem seu caráter, tornando-se vãos como são. O caráter de um povo nunca se eleva acima do de seus deuses, que são sua maior e melhor expressão de ideal.
4 Os ídolos das nações
são prata e ouro,
obra de mãos humanas.
5 Têm boca e não falam;
têm olhos e não veem;
6 têm ouvidos e não ouvem;
têm nariz e não cheiram;
7 têm mãos e não apalpam;
têm pés e não andam;
som nenhum lhes sai da garganta.
8 Tornem-se semelhantes a eles
os que os fazem
e todos os que neles confiam.
(Salmo 115 - NAA)
Qual Deus, tal povo!
O Evangelho por detrás do juízo
O texto do profeta não contém Evangelho. Apenas juízo decorrente da idolatria. Mas ele nos remete diretamente às palavras de Zacarias, em Lucas 1. O pai de João Batista, e forma profética, aponta para o fim das trevas através do nascimento do Messias Jesus.
A adoração descrita no texto de Lucas 1, só é possível, a partir da percepção da nova aliança deflagrada por Deus: a salvação pela cruz de Cristo. Livres dos poderes sedutores dos ídolos e livres do temor do diabo, o povo pode agora seguir o novo rumo.
Da mesma forma como o sol resplandece no amanhecer — cantamos o hino no início deste culto — removendo toda escuridão, assim diz Zacarias (v.78), todo império das trevas é removido e a luz da salvação é alçada ao seu ponto mais alto e brilhante: Jesus.
Uma palavra aos papais
Acredito que esta passagem do profeta Jeremias nos fornece, a nós pais, boas ferramentas para uma ação responsável na nossa sociedade. Primeiramente, tenhamos a disposição de sempre ouvirmos o que a palavra de Deus tem a nos dizer. Em segundo lugar, façamos as perguntas corretas e sábias que vão direcionar nossas decisões e ações de forma justa, correta e fraterna. Nesse contexto, não esuqeçamos jamais de atentar para aquilo que Deus já fez e ainda poderá fazer em nossa vida e na vida da nossa família. Em terceiro lugar, deixemos que as evidências do agir de Deus marquem a vida da nossa família e nossos descendentes. Para o lugar número quatro destaco a liberdade que temos, a partir do amor de Jesus, em amar, amar, amar sem a necessidade de colocar o machismo ou a violência como prova de autoridade. Estamos livres desse império machista das trevas e violência. E, em quinto lugar, nos comparemos aos melhores, e não a ídolos. Somos livres para seguir os ensinamentos únicos de Deus, sem idolatrias e sem medo de errar. Claro, tudo isso, com ações e atitudes fraternas e amorosas, com o Jesus nos ensina.
Amém.