Alocução no Sepultamento de Homero Severo Pinto -

24/04/2010

Alocução no sepultamento de Homero Severo Pinto, pastor primeiro vice-presidente da IECLB, Portão / RS, 24/04/2010


Minhas irmãs, meus irmãos, comunidade de fé, em especial família enlutada, muito em especial Denize, Catarina e Leandro, Mateus e Natália!

Nossa comunidade de fé não se restringe às pessoas que lotam este templo e nas muitas que se congregam lá fora, ela abrange as comunidades da IECLB Brasil afora e em irmãos e irmãs em muitos lugares do mundo. Já nessas primeiras horas após o falecimento do pastor Homero recebemos numerosas mensagens de condolências do Brasil e do exterior. Muitas outras, por certo, seguirão. Vocês, familiares, receberão todas elas. São palavras de consternação, palavras de solidariedade, palavras de conforto e, em meio à dor, palavras de esperança. [Aqui foram listadas as mensagens até então recebidas.]

Em Filipenses 3.7-11, o Apóstolo Paulo escreve: “Mas o que, para mim, era lucro, isto considerei perda por causa de Cristo. Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a Cristo e ser achado nele, não tendo justiça própria, que procede de lei, senão a que é mediante a fé em Cristo, a justiça que procede de Deus, baseada na fé; para o conhecer, e o poder da sua ressurreição, e a comunhão dos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte; para, de algum modo alcançar a ressurreição dentre os mortos.”

Quando o apóstolo Paulo pronunciou estas palavras, encontrava-se na prisão, e precisava contar com a possibilidade de que viesse a ser condenado à morte. E isso por causa de seu destemido testemunho em favor de Cristo.

Elas nos ajudam e confortam em nossa perplexidade. Perplexidade, sim, porque é impossível que não nos perguntemos por que deveria acontecer o que de tão trágico aconteceu. Que Homero, o qual com tanta paixão pretendia, acima de tudo e em todas as circunstâncias, servir a seu Senhor Jesus Cristo, tenha precisamente no exercício de seu ministério contraído insidiosa enfermidade que o colocou numa senda de sofrimentos e, por fim, à morte! Por que, Deus nosso?

Um hino que, em nossas reuniões, da Presidência com a pastora e os pastores sinodais, cantávamos com alguma frequência e que aqui também entoamos agora antes da pregação, o hino 221 do HPD, afirma:

“Senhor, porque me guarda a tua mão confio em ti.
Porque bem sei que teu querer é bom confio em ti.
Tu dás coragem, vences o temor;
louvor a ti, por teu imenso amor!”

Não é fácil confirmar tais palavras, quando estamos tão perplexos. O hino termina:

“Por me guiares, não preciso ver, nem mesmo sempre tudo entender!”

Que profundidade da fé, que percepção aguda dos insondáveis mistérios de Deus!

Paulo se transformara de perseguidor da Igreja em seu maior missionário. E, conforme a tradição da Igreja Antiga, sofreu, ao final, o martírio. Ao se transformar em seguidor de Cristo, descobriu também que passaria a compartilhar os seus sofrimentos, que, como diz nosso texto, viria a conhecer, sim, o poder da sua ressurreição, mas igualmente experimentar a comunhão dos seus sofrimentos, com o que assumiria em sua vida e na sua morte a forma do próprio Cristo. E não sem essa experiência haveria de alcançar a ressurreição dentre os mortos.

Em outra parte, a saber, em Romanos 8, Paulo também iria manifestar sua convicção de que nada, nada neste mundo, nem mesmo a morte, pode nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus. Nessa mesma fé, Homero viveu; essa mesma fé ele testemunhou; essa mesma fé também o leva da morte para a ressurreição. Mais uma vez, com palavras do apóstolo Paulo:
“Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. Quer, pois, vivamos ou morramos, somos do Senhor.” (Romanos 14.8)

Foi um tempo de provação.

Foram 40 dias na UTI do Hospital São Lucas, da PUC, em Porto Alegre. Foram dias de provação para ele, para vocês familiares. Quarenta dias nos fazem recordar os 40 dias da tentação de Jesus no deserto. Lembram-nos também os 40 anos em que o povo de Israel peregrinou pelo deserto, em direção à terra prometida. Qual Moisés que do alto do Monte pôde divisar a terra prometida em toda a sua extensão, mas lhe foi vedado adentrá-la, também Homero, em seus tão poucos 57 anos, divisou o futuro, sonhando e lutando por uma IECLB comprometida com a missão, cuidadora de seus ministros e ministras, e pastoral e espiritualmente dedicada a seus membros e comunidades, mas veio a falecer no limiar de uma nova fase na história da IECLB. Sabemos que ele teve consciência da gravidade de sua doença e, com ela já em estado severo, ainda se preocupou com sua família, manifestando cuidado para com ela.

Vocês familiares foram submetidos a uma extraordinária demanda física e emocional. Responderam a ela com extrema dedicação e encontraram energias para, através de comunicados sóbrios, com muita dor mas sem rancores – ao contrário, repletos de confiança em Deus –, fortalecer uma comunhão de solidariedade e oração na IECLB e em muitos lugares do mundo.

Experimentamos dolorosa perda.

Com o falecimento de Homero, vocês familiares sofrem uma perda incomensurável. Bem sabemos o quanto lhe valia a esposa e companheira, a família. Falava de vocês não apenas com amor e carinho, também com orgulho pelo que vocês foram para ele, pelo que vocês são. E perde a IECLB um de seus pastores mais sensíveis e dedicados. Sabia ouvir, sabia mediar, sabia consolar. Se o tema da IECLB no ano passado e neste é “Missão de Deus – nossa Paixão”, podemos atestar aqui que a missão de Deus era, para Homero, verdadeiramente uma paixão.

Homero não foi um luterano “de berço”, como inapropriadamente se diz. Como jovem se envolveu na Juventude Evangélica, ainda católico foi presidente de grupo de JE – esta, sua experiência fundante de ecumenismo de vida – e, movido em seu coração por obra evangelizadora na IECLB, livremente dela se tornou membro. E, sem claudicar, era na IECLB que pensava também em todo e qualquer embate interno nesta igreja e em todos os cargos que veio a ocupar e em todos os órgãos de que participou. Para mim, como Pastor Presidente, foi um companheiro de notável lealdade, sempre disposto a assumir tarefas, sem medir se eram atribuições suas ou a ele delegadas. Me farão tanta falta suas ponderações, suas sugestões, também suas perguntas, que as tinha muitas, suas palavras de apoio e encorajamento, igualmente seus conselhos, enfim sua amizade, seu companheirismo e sua comunhão fraterna.

Expressamos gratidão e vislumbramos os frutos.

Nem por tudo que até agora dissemos a palavra “perda” é totalmente apropriada, como uma das mensagens de condolências recebida bem observa. Os serviços que prestou nos são, isso sim, motivo de gratidão, gratidão que já não podemos expressar a ele, mas que elevamos ao próprio Deus, abrigado em quem ele se encontra. Obrigado por sua dedicação, obrigado por seu serviço, obrigado por seu testemunho, obrigado – por sua vida!

A vida também brota aqui. Catarina e Leandro, a vida da filha que vocês esperam seja símbolo dessa realidade, dádiva divina. Sem poder ainda ter noção do que entre nós se desenrolou, Letícia, muito antes de nascer, já foi a alegria do avô. O apóstolo Paulo conheceu o poder da ressurreição através da comunhão dos sofrimentos de Cristo, tornando-se conforme com ele na sua morte, para, como diz, “de algum modo, alcançar a ressurreição”. Se nossa fé, se limita a esta vida, somos as criaturas mais infelizes; contudo, cremos na ressurreição. Assim, Homero passou da morte para a vida.

Uma palavra ainda a respeito de Moçambique.

É um nome que nos evoca experiências tão dolorosas. Lá Homero contraiu a enfermidade que veio a vitimá-lo. Há seis anos atrás, a Irmã Doraci foi lá brutalmente assassinada. Mas Moçambique é um nome que queremos colocar na perspectiva de Deus. Após a trágica morte da Irmã Doraci, tive oportunidade de, em certa ocasião, expressar a esperança, o voto e a convicção de que esse evento doloroso não teria sido em vão, que as sementes que ela deixara no centro-norte de Moçambique, na região de Nampula, particularmente em Moma e outras localidades, haveriam de brotar e, a seu tempo, dar bons frutos. Homero retornou da recente ida a Moçambique alegre e animado. Ele foi testemunha do crescimento das comunidades que surgiram com o testemunho e o serviço da irmã Doraci, participou naquela localidade tão pobre da inauguração da clínica de saúde dedicada a ela, a ela que tanto se dedicara ao cuidado com a saúde para aquele povo sofrido, ouviu relatos comoventes de pessoas sumamente gratas a ela e por causa dela assumiram ou se preparam para o ministério. Também as sementes que Homero semeou em solo brasileiro e em outras terras continuarão germinando, as plantas crescerão viçosas e, a seu devido tempo, darão abençoado fruto.

Os caminhos de Deus são muitas vezes insondáveis, mas suas maravilhas, sempre grandiosas!

Esta é a boa nova da ressurreição.

Amém.

Walter Altmann
Pastor Presidente da IECLB


Autor(a): Walter Altmann
Âmbito: IECLB / Instância Nacional: Presidência
Testamento: Novo / Livro: Filipenses / Capitulo: 3 / Versículo Inicial: 7 / Versículo Final: 11
Natureza do Texto: Liturgia
Perfil do Texto: Alocução
ID: 11575
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