Alocução no Sepultamento de Doraci Edinger

06/03/2004

Comunidade de Cristo, em especial irmãs da Casa Matriz e muito em especial Dona Angelina, Sr. Libório, irmãs e irmãos, demais familiares da Irmã Doraci!

O assassinato da irmã e missionária Doraci Edinger constitui o episódio mais doloroso da vida da IECLB, mas sua atuação junto às comunidades pobres de Moçambique, as quais ela tanto amava, selada por sua morte, constitui também a página mais dignificante de toda a história da IECLB.

Duríssimo golpe para os familiares, para a irmandade a que ela pertencia, para sua igreja, para a igreja que a recebeu, para a comunhão de igrejas luteranas no mundo e para as igrejas de nossas relações ecumênicas. Foi golpeada também a causa da solidariedade entre os povos.

Dentre as numerosíssimas mensagens de condolências que recebemos, também de pessoas individualmente, incluindo-se obreiros, membros da IECLB e de outras igrejas, também políticos, desejo mencionar as seguintes em particular as Igrejas e entidades do país e do exterior:
Na declaração da Igreja Evangélica Luterana de Moçambique (IELM) que também exige das autoridades moçambicanas o total esclarecimento do crime, sua autoria e suas motivações, como o exigem também a IECLB, a Federação Luterana Mundial e o próprio Governo Brasileiro, nessa declaração da IELM é destacado também o compromisso de vida que a irmã Doraci tinha com as comunidades rurais que ela atendia. Lá consta que no interior ela havia construído uma choupana, igual àquelas que são utilizadas pela população local, como sua residência quando de suas visitas e atuação junto às comunidades. O crime que sofreu em Nampula revelou que ela estava muito mais segura nessa choupana junto à comunidade e à congregação que ela tanto amava, do que na cidade, no apartamento gradeado, no prédio com proteção de guardas.

É significativo: o amor aos pequeninos e o amor desses pequeninos para com ela, foram para ela toda sua razão de viver nesses últimos seis anos, como também o foram em toda a sua trajetória diaconal e missionária, também na IECLB. Ela verdadeiramente se doou sem restrições, ainda quando se sentia só e com insegurança. Como o pastor que ela seguia, Jesus Cristo, também ela deu sua vida pelas ovelhas que estavam a seu cuidado (João 10.15).

Coube-me a tarefa espinhosa – a mais dolorosa de minha vida – de acompanhar a investigação policial em curso em sua fase inicial em Moçambique e fazer os encaminhamentos necessários ao caso. Muito haveria a mencionar em relação a esses dias e, em particular, na sexta-feira da semana passada quando estive em Nampula. Aos familiares relatei detalhadamente acerca de meus contatos, minhas observações e minhas gestões. Quero assegurar aos familiares e à irmandade que lá e aqui estive permanentemente tomado pelo sentimento de solidariedade com o sofrimento tão grande pelo qual vocês têm passado pela irreparável perda e pela lamentável demora no traslado do corpo da irmã Doraci. Junto com minha solidariedade, recebam a imensa gratidão da IECLB pelo inestimável serviço prestado por Doraci, selado com sua própria vida. Com autorização das autoridades, trouxe comigo alguns pertences, álbuns com fotos, vestimenta e algum artesanato, para sua recordação. A generosidade da família deu à IECLB um dos crucifixos que a irmã Doraci tinha em seus aposentos. Esse crucifixo já se encontra ornamentando uma das paredes da Presidência da IECLB, para que esta Igreja e sua liderança não se esqueçam jamais de seu testemunho de vida.

Também trouxe comigo o relatório de suas atividades de 2003, que ela preparara com tanto carinho para em minha pessoa entregar à IECLB, como por providência divina ao final do dia me confirmou a funcionária da loja fotográfica e de fotocópias em que ela realizara o trabalho. “A irmã Doraci estava tão contente porque viria alguém do Brasil com quem ela iria se encontrar e a quem queria entregar o relatório.” Pois o relatório, irmã Doraci, com tuas atividades e tuas fotos, chegou à IECLB e haveremos de fazer dele um CD ou outro programa para ampla divulgação, e para que sirva de constante inspiração para a ação missionária desta Igreja.

Estimado Bispo Molefe, quero lhe dizer também que neste relatório, em anexo, a Irmã Doraci presta contas da generosa doação em alimentos e vestuário que o irmão dedicadamente coletou em comunidades da África do Sul para o trabalho da Irmã Doraci. Que belo gesto de fraternidade entre igrejas de diversos países. A IECLB lhe agradece.

Irmã Ester, no domingo passado estivemos juntos no culto celebrado na comunidade de Beira, em Moçambique, domingo em que as comunidades da IECLB intercederam em lembrança da irmã Doraci e intercederam também por tua Igreja, a Igreja Evangélica Luterana em Moçambique. Naquele culto em Beira, no canto, nas orações e nas palavras comovidas, consternadas, abaladas das lideranças, pude sentir fortemente porque a irmã Doraci amava tanto a tua igreja e as comunidades que atendeu. Neste momento de dor, ainda não esclarecida a autoria do crime, não sei de que forma nossa cooperação entre igrejas poderá continuar. Mas eu sei que a vida e a morte da irmã Doraci nos irmanou no sentido mais profundo da palavra.

Nesse mesmo culto, como estava previsto, coube-me a pregação. Alterei o texto previsto e preguei sobre I Coríntios 15.19: “Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes dos seres humanos.” A esperança da irmã Doraci definitivamente não se limitava a esta vida, a esperança da irmã Doraci estava ancorada em Deus. Nele sempre encontrou forças. Sua fé lhe deu um extraordinário vigor e liberdade interiores para enfrentar todas as situações. O relatório da irmã Doraci termina com uma prece: “Trino Deus, obrigado por Tua presença!” A irmã Doraci encontra-se agora na presença desse misericordioso Deus.

Irmã Ester, você me confidenciou ainda que a irmã Doraci em certa ocasião havia se referido à possibilidade de ao fim de sua vida ser sepultada em terras africanas e que desejava uma árvore junto a seu túmulo para lhe dar sombra. Sua vida foi tragicamente abreviada e sua sepultura estará aqui, junto à irmandade que ela escolheu e que a enviou, sempre a sustentando generosamente com dádivas, com visitas e com orações. Temos hoje também o sol, tão abundante em teu país. E as árvores que lhe dêem sombra em seu eterno repouso ela aqui também terá.

Irmã Doraci, a paz de Deus esteja para sempre contigo.
Amém.

Walter Altmann
Pastor Presidente da IECLB


Autor(a): Walter Altmann
Âmbito: IECLB / Instância Nacional: Presidência
Natureza do Texto: Liturgia
Perfil do Texto: Alocução
ID: 11576
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