Ao ler sobre o convite de Jesus para descansar, ter comunhão com ele e aprender dele (Mateus 11. 28-30) lembrei-me da Rua 7 de abril do centro de São Paulo, paralela à rua da sede do Sínodo. Durante o dia, a rua e as calçadas estão sempre cheias de pessoas, quase todas paradas ou sentadas, isoladas ou conversando em pequenos grupos. Naquela rua estão situados grandes conjuntos de escritórios de prestadoras de serviços, o maior deles é de uma empresa de telemarketing. Os funcionários dessas empresas, nos momentos de intervalo fogem do seu espaço de trabalho, geralmente pequeno, controlado e individualizado, e vão para a rua, onde encontram um ambiente público que, mesmo precário, oferece oportunidades com traços de liberdade, alternativas ao do ambiente de trabalho.
Estou certo de que o descanso, a comunhão e o aprendizado não combinam com trabalho, obrigações, regras, controles, exclusão e anulação das emoções, da subjetividade e do espírito das pessoas – dons, identidade, cultura, história, sonhos e experiências de vida. Certamente por isso associei o apertado espaço da rua 7 de abril, ocupado por uma multidão sedenta de liberdade, de leveza, de um “novo ar”, de amizade e de comunhão com o convite de Jesus. “Venham a mim, todos vocês que estão cansados de carregar as suas pesadas cargas, e eu lhes darei descanso. Sejam meus seguidores e aprendam comigo porque sou bondoso e tenho um coração humilde; e vocês encontrarão descanso. Os deveres que eu exijo de vocês são fáceis, e a carga que ponho sobre vocês é leve.”
O convite de Jesus indica um deslocamento de um espaço carregado, pesado, estonteante, para um outro lugar, onde são possíveis a tranqüilidade, a partilha, a solidariedade, o consolo, a cura, o aprendizado e os compromissos com a vida. Sabemos que nem tudo pode ser deslocado ou separado, também os nossos valores e a nossa espiritualidade não podem ser separados dos ambientes e espaços de trabalho, de tristeza, de doença, de perda e de morte. Mas, espaços alternativos e definidos podem ser criados para facilitar e fortalecer a nossa liberdade, a nossa paz, a nossa esperança e nossa participação no Reino de Deus, na missão de Deus. Às vezes não há alternativa, mas o bom é tomar banho no banheiro e cozinhar na cozinha.
Proponho avaliar os nossos espaços e aspectos do quotidiano da nossa vida. Em nossas comunidades são oferecidos espaços para abrigarem o convite de Jesus? E em nossas casas e apartamentos, ainda permitimos neles um pedacinho da rua 7 de abril? Arrisco mencionar que em algumas residências tudo é tão certinho, organizado e controlado que não há espaço para descanso, comunhão e aprendizado. Geralmente os seus moradores estão sempre em busca de alternativas. Em outras casas tudo está tão apertado, improvisado, congestionado e perigoso, tal como a Avenida Brasil, que também não conseguem abrigar o sublime convite de Jesus. E não podemos esquecer daqueles e daquelas que não tem casas e nem abrigos, que estão sempre em movimento pelos corredores e elevadores, longe do trabalho e da rua 7 de abril.
Guilherme Lieven, Pastor Sinodal - Sínodo Sudeste, IECLB