Num certo sentido, Deus nos fala sem cessar e, por outro, parece que raramente se manifesta; ou seria a nossa descrença que nos impede de acreditar em milagres mesmo quando inegavelmente estão diante de nós?
No Antigo Testamento, no livro de 1 Samuel 3, lemos: “As palavras de Deus se manifestavam raramente nesse tempo e as visões não eram freqüentes.” Ainda assim, mais adiante no texto é a voz de Deus que é ouvida pelo ainda adolescente Samuel que estava morando no templo para ser educado nas coisas de Deus pelo velho Eli.
Hoje muitos reclamam: “Deus já não se revela como nos tempos bíblicos”. Muitos desejariam ver uma grande mão descendo sobre a terra e fazendo a justiça que não somos capazes de fazer.
Em busca de Deus fazemos peregrinações, romarias, vamos ao Himalaia, à Santiago de Compostela, à Lurdes, à Jerusalém ou à Assis. Não estou certa de que Deus esteja mais nos cumes do que aqui em baixo na planície; mais nas cidades “santas” do que ao meu e ao teu lado. Na verdade, quando resolvemos empreender tal saída da rotina acabamos tendo tempo para nós mesmos, para silenciar, para encarar nossas mais profundas feridas e olhar nossos mais verdadeiros desejos.
O principal milagre da peregrinação é o encontro com alguma parte perdida de nós mesmos. Isso prova porque os que empreendem, por exemplo, uma jornada dessas em busca de cura e não a alcançam voltarem, mesmo assim, mais amigos de Deus e de si mesmos. É porque naquele tempo de peregrinação, de caminhada pausada e silêncios puderam deixar as suas tarefas cotidianas e ouvir o som da voz de Deus que brota de dentro de cada um.
Queremos grandes manifestações divinas. No entanto, em um outro texto do Antigo Testamento (1 Reis 19.12) somos lembrados que Deus vem “num cicio tranqüilo e suave”. Os antigos muito bem sabiam disso. Tanto a palavra hebraica Ruah; como Pneuma, do grego, são palavras que foram traduzidas para o português como Espírito e querem dizer “vento que sopra”, ou um hálito – um sopro leve.
O que acontece quando fechamos todas as portas e janelas de nossa casa? O vento não consegue entrar e o mofo se multiplica por todos os cômodos. Que as portas e janelas de nosso coração e da nossa vida estejam abertos, escancarados, para que possa soprar ali a Ruah e desanuviar nossos sonhos e pensamentos mais íntimos. Que nos possa fazer sentir que Deus está tão próximo que podemos senti-lo mexer em nossos pensamentos.
Pa. Vera Cristina Weissheimer - Pastora da IECLB, Capelã do Hospital Osvaldo Cruz, São Paulo/SP