Neste 07 de setembro celebra a nação brasileira 200 anos de independência. Um jubileu importante.
A IECLB, por sua vez, celebra 198 anos desde a chegada das primeiras famílias imigrantes.
As duas datas podem ser correlacionadas ou é somente uma coincidência? Arrisco uma reflexão.
O trabalho nas fazendas de café e cana-de-açúcar no Brasil era feito pela mão de obra indígena e, especialmente, escrava. A lei do ventre livre é promulgada em 1871. A abolição da escravatura no ano de 1888. São o auge de um movimento abolicionista em curso. Estas leis não são meras liberalidades do Império brasileiro. Vários fatores contribuem para colocar fim à escravidão. Lembro tão somente dois deles: o Império brasileiro é pressionado pela Inglaterra para que o tráfico internacional de escravos e escravas tivesse fim; as ondas abolicionistas por toda a América Latina assustam a oligarquia brasileira, que teme contínuas revoltas e a perda do poder político e econômico.
Para evitar ainda maiores prejuízos na venda do café, definir novas relações de trabalho é importante. Uma iniciativa dá-se na Fazenda Ibicaba, no município de Limeira/SP (hoje Cordeirópolis), de propriedade do então Senador do Império Nicolau Vergueiro, o maior produtor de café do Brasil. Adapta o modelo inglês de parceria e incentiva a vinda de imigrantes ao Brasil. A ideia vendida era a da contratação no sistema de “parceria”, mas, de fato, a relação de trabalho era a “escravidão branca” (termo usado por Theodoro, filho do atual proprietário da fazenda Ibicaba, em visita no ano de 2015). Celso Furtado descreve assim esta relação de trabalho:
“Com efeito, o custo real da imigração corria totalmente por conta do imigrante, que era a parte financeiramente mais fraca. O Estado financiava a operação, o colono hipotecava o seu futuro e o de sua família, e o fazendeiro ficava com todas as vantagens. O colônio devia firmar um contrato pelo qual se obrigava a não abandonar a fazenda antes de pagar a dívida em sua totalidade.” (apud. PRAZERES, Írley A. C. et alii. Manual de Direito do Trabalho. São Paulo : Rideel, 2018, p. 28)
Em 1852 chegam a Limeira 80 famílias e em 1857 já eram mais de duas mil pessoas. Forma-se uma mão de obra para o trabalho nas fazendas de café em substituição à escrava.
Como os custos da imigração eram por conta do imigrante, cria-se neste processo uma dívida que se torna impagável. A falta de perspectivas por conta da dívida causam revoltas. Por primeiro num observador alemão que, no ano de 1867, apresenta à Sociedade Internacional de Emigração de Berlim uma exposição na qual revelava que os colonos emigrados ao Brasil viviam uma “escravidão disfarçada”. Mas também os próprios trabalhadores e trabalhadoras locais se revoltaram no que ficou conhecido como a “Revolta dos Parceiros”. O Império foi forçado a continuar a busca por relações de trabalho mais dignas.
A imigração ao Brasil de muitos povos e etnias, no início do século XIX, está neste contexto. Muda o povo trabalhador (índio, negro, imigrante, assalariado, pequeno comerciante), mas não a exploração do ser humano pelo ser humano. Com ela não é possível se conformar.
A busca por melhores condições de vida, dignidade para a família e um lugar para viver a fé é motivador para as famílias migrantes. Não se conformar com a situação da forma como se apresenta e lutar para que melhores condições de vida sejam concretizadas é característica humana. Mas é também, no caso do protestantismo, expressão da fé e parte de seu DNA.
Ao celebrar os 200 anos da independência do Brasil e os 198 anos da presença da IECLB no Brasil é necessário constatar que este objetivo ainda não é realidade para muitas famílias. IECLB e Independência do Brasil não se unem pelo grito de Dom Pedro às margens do riacho Ipiranga, mas no sonho de nação independente, com liberdade, justiça e vida digna para todas as pessoas.
Seja esta uma relação a melhorar a nação e a vida de nosso povo.
Pastor Sinodal Marcos Jair Ebeling