2 Tessalonicenses 3.6-13

Auxílio Homilético

17/11/2019

 

Prédica: 2 Tessalonicenses 3.6-13
Leituras: Salmo 98 e Lucas 21.5-19
Autoria: Vera Lucia Engelhardt
Data Litúrgica: 23º.  Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 17 de novembro de 2019
Proclamar Libertação - Volume: XLIII

Enquanto o dia não chega...

1. Introdução

Estamos quase lá! Fim do ano da igreja, início de tempo novo! O fim é marcado pela esperança de iniciarmos o novo. A comunidade cristã de Tessalônica aguardava o completamente novo: Jesus vem logo. Está chegando! O que fazer nesses últimos dias enquanto aguardamos e ele ainda não chegou? Como viver nesses últimos dias?

O Salmo deste domingo convida-nos a louvar ao Senhor. Convida toda a criação a bater palmas e cantar. O motivo é que o Senhor vem governar a terra. E esse governo de Deus será um governo justo, de acordo com o que é direito.

O evangelho ajuda-nos a entender que quando o fim está perto, esse tempo também é a hora oportuna para anunciar o evangelho. Nada é perdido enquanto vivemos o penúltimo. Melhor é anunciar a esperança do que preocupar-se com a época em que isso vai acontecer.

O texto dirigido à comunidade dos tessalonicenses traz uma orientação para o tempo de espera: não ficar cansado de fazer o bem, tampouco abandonar o trabalho e tornar-se estorvo e peso a ser carregado pelos irmãos e irmãs da comunidade. Temos aqui uma dica para uma situação que está ameaçando a comunidade: cada qual deve continuar trabalhando em vista da expectativa da parusia de Cristo, sem tornar-se um peso para os outros.

2. Exegese

Nosso texto foi abordado no Proclamar Libertação (PL) 24, no contexto do Penúltimo Domingo do Ano Eclesiástico e, ainda, no PL V, numa abordagem para o Dia do Trabalhador. Encontram-se ali muitas considerações exegéticas que enriquecem o estudo e a preparação da pregação.

De acordo com estudiosos do Novo Testamento, as duas cartas aos tessalonicenses fazem parte dos escritos mais antigos do apóstolo Paulo. Caso a segunda carta realmente seja paulina, é possível que ela tenha sido escrita não muito tempo depois da primeira, que é a mais antiga do apóstolo e foi escrita no início da década de 50. Já em 1 Tessalonicenses 4.11 a questão dos que querem viver sem trabalhar é tematizada. Agora o assunto ganha novo destaque, indicando que o problema havia ficado maior. A carta foi escrita de Corinto. A carta é dirigida “à igreja dos tessalonicenses” (2Ts 1.1), a quem Paulo reiteradamente chama de irmãos (2Ts 1.3; 2.1; 3.1 e 3.6).

A autoria da carta é de Paulo, Silvano (Silas) e Timóteo (2Ts 1.1), um trio de missionários itinerantes. Em Atos 17, temos o relato do início da comunidade, ocorrida na segunda viagem missionária do apóstolo Paulo. Os três foram de Filipos para Tessalônica, isso por volta do ano 50. Depois de pregar na sinagoga local, eles sofreram perseguições da parte de judeus e incrédulos. Tiveram de deixar a cidade às pressas, mas uma igreja ali permaneceu, uma comunidade de irmãos. No tempo em que permaneceram na cidade, eles se sustentaram através de árduo trabalho próprio (1Ts 2.9 e o nosso texto mostram isso). Atos 17.2-4 afirma que participavam da comunidade judeus, gregos piedosos e “muitas distintas mulheres”.

Tessalônica era a capital da Macedônia. Ocupava um lugar estratégico, tanto que três estradas romanas cruzavam a cidade. Como cidade portuária, era também um centro comercial, que explorava as riquezas agrícolas e minerais da Macedônia. Em 2 Coríntios 8.1-4 Paulo escreve sobre a pobreza dos cristãos da Macedônia.

A comunidade é nova, recém-fundada, quando recebe a carta de Paulo. Ela vive num ambiente adverso. Precisa ser fortalecida em sua fé diante de tribulações. É preciso manter-se perseverante no sofrimento e não perder o ardor inicial. Na situação de sofrimento e perseguições, a fé viva levou a comunidade a esperar ansiosamente a vinda de Jesus. Em vista da espera pela volta de Jesus para muito breve, surgiram compreensões equivocadas. Essas compreensões precisavam ser corrigidas. Dessa compreensão equivocada resultou que algumas pessoas deixaram de trabalhar e passaram a viver à custa de outros irmãos da igreja ou de seus parentes, passando a viver de forma desordenada, como Paulo qualifica a atitude. Esse problema havia sido informado a Paulo (2Ts 3.11). Ele procura então uma solução. Sua intenção é restaurar o bom convívio entre todos e não punir os que vivem desordenadamente.

O versículo 6 inicia nosso texto para pregação. Os três missionários não fazem apenas um pedido, senão ordenam a partir de sua autoridade apostólica que é preciso se afastar daqueles que andam desordenadamente ataktos (fora de ordem, sem trabalhar). A ordem é dada em nome do Senhor Jesus Cristo e na convicção de que a comunidade a cumprirá. O afastar-se desses irmãos possui intenção pedagógica: para que eles modifiquem sua conduta. A comunidade já havia recebido instrução sobre isso, mas os que viviam desordenadamente parecem tê-la deixado de lado, com o argumento de que Cristo voltaria logo.

Os missionários utilizam o exemplo da própria conduta para exortar os preguiçosos: quando estiveram na cidade, eles não se portaram de modo desordenado (v. 7). A comunidade sabe que Paulo trabalhou com as próprias mãos para se sustentar. O versículo 8 continua a argumentação: em labor e fadiga, com trabalho árduo e esforço é que os missionários se sustentavam, obtendo pelo trabalho seu alimento e suprindo suas necessidades. Assim, não se tornaram um peso para ninguém. A carta diz que eles teriam o direito de viver do anúncio do evangelho, mas que eles preferiram não utilizar esse direito, antes trabalharam dia e noite. Em Atos 20.33-35, temos uma fala de Paulo sobre esse trabalho árduo. Seu objetivo é sustentar-se a si próprio e não ser pesado aos pobres, além de coibir a cobiça aos bens de outros. O tema do trabalho voltará à tona em 1 Coríntios 9.

Em 2 Tessalonicenses 3.9 a comunidade novamente é lembrada de que os apóstolos teriam o direito de viver dos recursos ofertados pelos cristãos, podendo assim dedicar-se ainda mais ao ministério de anunciar o evangelho. O próprio Cristo assim havia ensinado (Mt 10.10; Lc 10.7). O trabalho com as próprias mãos trazia liberdade a eles. Na medida em que não deviam favores a ninguém, eles podiam pregar livremente o evangelho da liberdade. Trabalhar com as próprias mãos era exemplo a ser seguido.

No versículo 10, temos um dito popular conhecido do judaísmo e do Talmude, inspirado em Gênesis 3.19: quem não quer trabalhar, também não coma. Assim Paulo quer coibir os abusos que se verificam na comunidade. A palavra trabalhar é repetida cinco vezes em nosso texto. É assunto importante, que se transformou em tradição repassada para a comunidade (2Ts 3.6). No mundo grego e romano, ao contrário, o ideal propagado era poder viver sem trabalhar. Quem trabalhava eram os escravos. As pessoas livres não sujavam as mãos no trabalho. Essa tradição não deve ser seguida!

Inverte-se tudo na visão cristã: trabalhar para viver, e não viver à custa de outros! Não explorar os outros e sustentar-se do próprio trabalho. A comunidade sabia que devia imitar os apóstolos e não os opressores, que viviam à custa do trabalho de outros. Não deviam, por isso, entrar nessa onda. Muito menos ainda usando o argumento de que a vinda de Cristo é iminente. Outra constatação muito importante: nada é falado aos que não podem trabalhar. A esses cabe fazer o bem.

O versículo 11 diz que os apóstolos foram informados da situação. Há quem não trabalhe e anda se intrometendo na vida dos outros. Tempo é o que não lhes falta. O problema é que essa intromissão atrapalha a vida dos outros.

No versículo 12, com muita ênfase novamente, os desordeiros são exortados “no Senhor Jesus Cristo” para que trabalhem tranquilamente e comam do seu pão. Trabalhar tranquilamente é o contrário de viver desordenadamente. Finalmente, encerrando a argumentação e dirigindo-se a toda a comunidade, ela é exortada e encorajada a não se cansar de fazer o bem, a não desanimar de fazer o bem.

3. Meditação

Conforme 2 Tessalonicenses 2, algumas pessoas estavam dizendo que o Dia do Senhor já havia chegado. Parece que a informação foi veiculada através de uma carta por alguém que se fez passar por Paulo. Por isso o apóstolo lembra a comunidade dos ensinamentos que lhes foi trazido, seja presencialmente ou pela carta anterior, para que persevere firme e guarde aquela verdade.

Por conta da compreensão de que o Dia do Senhor já havia chegado, algumas pessoas acharam que não era mais necessário trabalhar, ou que se podia viver desordenadamente à custa de outros, intrometendo-se na vida deles. Com base em seu próprio exemplo, os apóstolos exortaram essas pessoas a trabalhar tranquilamente e a comer o seu pão do seu próprio trabalho.

Trabalhar tranquilamente remete a relações de trabalho justas. De dois modos havia exploração ali: primeiro, os que detinham o poder econômico exploravam o trabalho escravo. Dentro da comunidade a exploração era de outra ordem: havia os que deixaram de trabalhar por conta de uma esperança equivocada, tornando-se um peso para outros, além de intrometer-se em suas vidas.

Os jovens aqui da comunidade onde exerço o ministério, bem como as famílias, mulheres e homens adultos, estão no mundo do trabalho. Cria-se uma situação muito difícil quando há o desemprego. O estudo e a escolha profissional consomem todo o tempo dos jovens. Causa-lhes angústia a decisão pela escolha profissional e, por fim, a entrada no mundo do trabalho também gera estresse. Trabalhar tranquilamente não é algo fácil. Há exploração, insegurança, salários menores para mulheres, entre outras situações injustas nas relações de trabalho.

A situação de não trabalhar não é motivo para excluir nenhuma pessoa. São irmãos e irmãs. Quem vive a situação de desemprego precisa, sim, de suporte da comunidade, pois quer trabalhar tranquilamente e comer seu pão com o fruto de seu trabalho. Mas não é dessas pessoas que o texto fala. Ele se dirige a pessoas que, baseando-se numa compreensão equivocada da vinda do Senhor, querem viver sem trabalhar, tornando-se um peso para os outros. Para o apóstolo, a esperança cristã não pode servir de pretexto para preguiça, inércia ou exploração dos outros. Pelo contrário, a esperança é fonte para renovar as energias éticas do ser humano, de modo que passe a viver de acordo com aquilo que espera.

4. Imagens para a prédica

Lembro-me de como meu pai encarava o trabalho: ele gostava de trabalhar. Era agricultor e fazia com alegria todo tipo de trabalho que envolvia a agricultura. Na sua lógica, ele não conseguia compreender quem tem forças e condições de trabalhar, mas não se dispunha a fazê-lo quando havia oportunidade.

Lembro-me também da gratidão de poder comer do pão feito pelas próprias mãos, partilhando-o com as filhas e o filho. Tem sabor e cheiro de vida, proporciona comunhão e saciedade do corpo.

Enquanto o fim não chega, enquanto o novo não vem, nosso desafio é fazer o bem, viver tranquilamente, comendo do próprio pão. Fazer o bem implica colocar os dons recebidos de Deus no trabalho que dignifica o próximo. Fazer o bem implica buscar relações justas no trabalho e trabalhar para que todas as pessoas possam comer o próprio pão.

Uma dica é utilizar um pão como imagem para a pregação. Eventualmente, pode-se envolver a própria comunidade para fazer o pão. Como se faz pão para
os eventos comunitários? Ele é doado? Como conseguimos ter o pão? O que ele gera de novidade de vida nas relações? Aguardamos que ele chegue à mesa ou ajudamos a servi-lo? Tecer a pregação de modo que a comunidade possa sentir o cheiro e o sabor do Dia do Senhor – a alegria da salvação.

5. Subsídios litúrgicos

– Acolher a comunidade com o refrão do hino De bons poderes. “Por bons poderes muito bem guardados, confiantes esperamos o que há de vir. Deus é conosco sempre em noite e dia. Assim é certa hoje sua alegria” (Livro de Canto da IECLB 399).

– A leitura do salmo do dia em responsório pela comunidade.

– Anunciar o perdão com o versículo de Romanos 8.39: Em todo o universo não há nada que possa nos separar do amor de Deus, que é nosso por meio de Cristo Jesus. Não são correrias, nem estresse de fim de ano, nem falta de saúde que nos separa de Deus. Nada mesmo nos separa de Deus, ele nos ama e nos perdoa.

– Hinos para o culto do Livro de Canto da IECLB: Em tuas mãos – 15; A mesa posta – 271; Sim, vale a pena viver – 559; Bênçãos virão – 301.

Bibliografia

CHAMPLIN, Russell Norman. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São Paulo: Millennium, 1983. v. V.
SILVA, Valmor da. Segunda Epístola aos Tessalonicenses – Não é o fim do mundo. Petrópolis: Vozes; São Leopoldo: Sinodal, 1992.


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Autor(a): Vera Lucia Engelhardt
Âmbito: IECLB
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2018 / Volume: 43
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 50320
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