1 Tessalonicenses 5.16-18

Prédica - Culto de abertura do XXVII Concílio da Igreja

20/10/2010

 

Culto de abertura do XXVII Concílio da Igreja.
Foz do Iguaçu (PR)

Prédica proferida pelo pastor presidente da IECLB Walter Altmann
20-10-2010

I Tessalonicenses 5.16-18 – Dar graças em tudo?


Cara comunidade, conciliares, autoridades, hóspedes ecumênicos, estimadas irmãs, estimados irmãos!

Regozijai-vos sempre.
Orai sem cessar.
Em tudo, dai graças,
porque essa é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco
.

Tomemos essas exortações apostólicas, endereçadas aos membros da Comunidade de Tessalônica, como endereçadas a nós hoje reunidos para a abertura do XXVII Concílio da IECLB. Para mim, pessoalmente, este concílio não deixa de ser certo encerramento. Não do ministério pastoral conforme ordenação recebida, muito menos do discipulado de Cristo, que não cessa nunca em nosso viver, mas ao final deste ano termina meu mandato como pastor presidente da IECLB e terei cumprido o tempo previsto em nossos atuais regulamentos para a passagem à aposentadoria de seus ministros e ministras. De certo modo, é momento de balanço do ministério exercido até esta data.

Para reportar-me às exortações do Apóstolo, testemunho ter incontáveis razões para regozijo, para perseverar na oração e para dar graças. Tive oportunidade de usufruir de boas condições de formação teológica numa Faculdade de Teologia que se consolidava, a de São Leopoldo, hoje Faculdades EST, participar de intercâmbio estudantil na Faculdade Luterana de Teologia em José C. Paz, Buenos Aires, Argentina e, em nível de pós-graduação, na Universidade de Hamburgo, Alemanha. Exerci atividades pastorais já como estudante na Comunidade de Santa Maria/RS e, posteriormente a meus estudos na Alemanha, na Comunidade de Ijuí/RS, períodos não extensos, mas cuja rica experiência me empenhei por preservar e ter sempre em mente nas funções que posteriormente exerci. Somado o período de assistente na Faculdade de Teologia, antes do estudo de pós-graduação no exterior, com a docência nela exercida a partir de 1974, fui corresponsável pela formação teológica de futuros ministros e ministras da IECLB por 30 anos, de modo que ainda hoje a vasta maioria deles também me teve como professor em sala de aula. Experiências ecumênicas, pude coletar em grande número desde o tempo de aluno em escola secundária, no país e no exterior. O tempo de Presidência do Conselho Latino-Americano de Igrejas – CLAI foi para mim uma verdadeira escola de ecumenismo. Responsabilidade, que daí advieram, mais recentemente, ainda prosseguirão, Deus mediante, nos próximos anos, até a próxima assembleia geral do Conselho Mundial de Igrejas.

Pude participar ativamente de comissões, projetos e cargos na EST e na IECLB, sendo a honra maior a de integrar as três posições na Presidência. Nessa condição, pude visitar todos os sínodos e conhecer muitas das comunidades, de lideranças e membros da IECLB, desde Boa Vista e Pacaraima/RR, esta na divisa com a Venezuela, até comunidades do Sínodo Sul-Rio-Grandense e do Sínodo Centro-Campanha-Sul no extremo sul do país, desde Rondônia a São Luíz/MA e o sertão nordestino. Em programação da Juventude Evangélica, como estudante, também conheci quem haveria de se tornar minha esposa e com quem tive quatro filhas e com quem hoje desfruto de três netos e duas netas. E sempre tive a meu lado e pude contar com colegas, amigas e amigos dedicados, francos, leais e solidários.

Portanto, todos, todas vocês haverão de concordar comigo que tenho muitas, muitas razões para me alegrar e para agradecer. Quantas bênçãos! Recebam esse testemunho como exemplo pessoal de quão válidas são as exortações do apóstolo Paulo. Não que não tivesse havido sempre de novo também dificuldades e dissabores, por certo também limitações e muitas falhas minhas, igualmente episódios de tensão e sofrimento tanto na vida pessoal e familiar, quanto em âmbito da IECLB. Nada disso, porém, deve dar vazão para queixas, pois foi generosamente coberto pelo manto da magnanimidade de Deus.

Com esse exemplo pessoal quis ilustrar as exortações apostólicas, mas de modo algum simplificá-las ou banalizá-las. Pois elas não são tão simples e fáceis. Voltemo-nos a elas, pois, um pouco mais em profundidade.

Regozijai-vos sempre.”

“Sempre”, disse o apóstolo. Quem de nós seria capaz disso? Compreenderíamos bem a exortação do Apóstolo se ele tivesse dito algo como “aproveitem bem os momentos de alegria que vocês têm”, mas “regozijai-vos sempre”? Não temos em nossa vida também tempos de tristeza, às vezes profunda? Um exemplo banal poderia ser tomado de competições esportivas, como a Copa do Mundo que tivemos este ano. A televisão nos mostrou muitas cenas de pessoas vitoriosas pulando de alegria e outras tantas mudas de tristeza pela derrota sofrida. “Regozijai-vos sempre”?

Não precisamos, porém, nos ater aos sentimentos associados a um esporte que desperta a paixão popular ao redor do mundo. A perda de um ente querido é obviamente motivo de muita tristeza, muito profunda se for em circunstâncias particularmente difíceis e inesperadas ou, mesmo, trágicas. “Regozijai-vos sempre?” Nossas relações matrimoniais e nossa vida em família são sempre motivo para regozijo? Em nosso trabalho tudo é sempre descontração e maravilhas? Em nosso país, vai tudo muito bem, obrigado? Entre as igrejas o entendimento e a cooperação são de tal ordem que sempre tenhamos só alegrias? E em nossa própria igreja, podemos dizer que sempre nos alegramos com suas reuniões e seus programas? Para este Concílio, que ora iniciamos, creio que viemos todas, todos animados, mas também na expectativa de alegrias de começo ao fim? No mínimo, ela veio mesclada de preocupações quanto à responsabilidade e às decisões que aqui devemos tomar.

Como pode, então, o Apóstolo Paulo exortar a que nos regozijemos sempre? Por certo, ele não era tão ingênuo que não soubesse que temos em nossa vida dissabores, tristezas e sofrimento. Aliás, a própria Comunidade à qual ele escreve estava também acossada por causa de sua fé. O próprio Paulo tinha se visto obrigado a de lá sair quando de sua segunda viagem missionária, por causa da oposição de quem via na fé cristã uma forma de religiosidade contrária à ordem do Império Romano. E Paulo, com sua carta, pretende exatamente animar os irmãos e as irmãs na fé a que perseverem, se mantenham confiantes no Senhor.

Que queria, então, o Apóstolo Paulo dizer quando exortou a Comunidade a que se regozijasse sempre? Ele quis dizer simplesmente que em Deus temos sempre motivos para nos alegrar, ainda quando passamos por momentos difíceis e somos tentados a abandonar a fé por causa das tribulações que sofremos ou pelas quais passamos. Há momentos alegres que se alternam com momentos de tristeza, mas em Deus podemos confiar sempre e, nele, portanto, podemos ter uma alegria muito maior do que as alegrias momentâneas que possamos ter, mas também profundamente sanadora das tristezas que sempre de novo temos. Quando escreveu aos filipenses, Paulo formulou assim: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegrai-vos.” (Fp 4.4) Há uma diferença muito grande em conhecer essa alegria maior que como um manto de regozijo encobre todas as outras alegrias, mas também as tristezas que temos. Ela é uma alegria no Senhor. Portanto, uma vez mais: “Regozijai-vos sempre.”

Não é diferente também com a exortação seguinte:

Orai sem cessar.”

Quem de nós conseguiria proferir orações intermináveis, que não cessassem? Ou, até mesmo: quem poderia suportá-las? Não foi o próprio Jesus quem, no Sermão do Monte, nos advertiu da prática de quem, orando, emprega “vãs repetições”, para “ser visto” por outras pessoas e na arrogante presunção de que “pelo seu muito falar” será ouvido por Deus? (Mt 6.7) E nos recomendou que entrássemos em nosso quarto, fechássemos a porta e orássemos a Deus que, em secreto, nos ouvirá! (Mt 6.6) A seguir, passou a nos ensinar aquela oração tão breve quanto completa que é o pai-nosso (Mt 6.9-13), que não contém nenhuma palavra vã e que através dos séculos tem unido espiritualmente a família cristã.

Eis que o Apóstolo Paulo nos exorta a orarmos “sem cessar”. Como pode ser? Ora, não quer dizer nada mais, nada menos, do que isto: todas as coisas que nos alegram ou preocupam, todos os nossos planos e sentimentos, nossos pensamentos e nossos desejos, sejam colocados diante de Deus, por assim dizer “despejados” diante de Deus, pois “ele tem cuidado de vós”, como nos é atestado na 1 Pedro (5.7). Orar, portanto, é bem mais do que proferir palavras, em balbucios ou aos brados, ou ainda no silêncio dos pensamentos; é colocarmo-nos a nós próprios com tudo quando somos, confiadamente, nas mãos de Deus. E, ainda que andemos “no vale da sombra da morte”, não precisaremos temer “mal nenhum”, porque “o Senhor é o meu pastor” e “nada me faltará” (Salmo 23). Orar sem cessar é, portanto, entregar sua vida, por inteiro, a Deus.

Que dizer, por fim, da exortação de Paulo a seguir?

Em tudo, dai graças.” (v. 18)

Talvez ninguém de nós ponha em dúvida de termos muitas coisas pelas quais podemos e devemos agradecer, a começar pela vida que nos foi dada e que ninguém pôde produzir e se conceder a si mesmo. Desde o início, como criatura de Deus, feita à sua imagem, encontramo-nos no âmbito da graça divina. Como não agradecer? No entanto, não passamos por muitas provações e tentações, não sucumbimos muitas vezes, não fraquejamos, não sofremos ofensas e muito mal? Sofremos e causamos! Em nosso mundo, não há tanta violência e injustiça, tanta ganância e corrupção, tanta pobreza e miséria? E em nossa igreja, junto a mui belos testemunhos em palavra e ação, não há por demais apatia na vida comunitária, frieza para a missão, avareza na contribuição financeira, tensões e divisões internas, indiferença para com o próximo?

Dar graças em tudo? Sim, dar graças em tudo. Pois Paulo não nos exortou a agradecermos pelos males do mundo, da própria igreja e de nossos corações, mas a que em tudo déssemos graças. “Pelas dores deste mundo, ó Senhor, imploramos piedade”, como diz o belíssimo Kyrie composto por nosso pastor Rodolfo Gaede Neto. No entanto, dai graças não por tudo, mas em tudo. Não por tudo, mas em tudo. Há uma enorme diferença. “Não vos conformeis com este século”, também disse Paulo (Romanos 12.2), num capítulo que encerrou com a exortação de que “não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem” (v. 21). Paulo sabe até mesmo que “toda a criação, a um só tempo, geme e suporta angústias até agora” (Romanos 8.22), mas o diz “na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus” (Romanos 8.21).

Assim, não damos graças por acontecimentos que nos sucederam, aqui e ali, frequentemente quem sabe, espetaculares até, mas sempre ocasionais. Não, damos graças pelo que somos, porque somos criatura de Deus, pelo fato de que, bem certo, em todas as situações, em todos os momentos e em todos os lugares, podemos contar com Deus, nele confiar. Nada do que nos sucedeu ou possa ainda nos suceder está ou estará fora do âmbito da graça divina, que nos criou, nos salvou em Cristo e nos conduzirá à glória eterna. Por isso, em tudo – repito uma vez mais: em tudo –, dai graças.

Portanto, em nossa vida pessoal, familiar e em sociedade, em nosso trabalho e lazer, em nossa comunidade e igreja, também neste Concílio da Igreja, “regozijai-vos sempre”, “orai sem cessar” e “em tudo, dai graças”. “Porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco”.

Amém.


Autor(a): Concilio da Igreja
Âmbito: IECLB / Instância Nacional: Concílio
Testamento: Novo / Livro: Tessalonicenses I / Capitulo: 5 / Versículo Inicial: 16 / Versículo Final: 18
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 8896
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