O contraste entre a cruz e a ressurreição
Há pouco mais de um ano tivemos a nossa vida drasticamente abalada pela pandemia global da Covid-19. Nossas rotinas precisaram ser adaptadas. Também a nossa vivência de fé passou por transformação. Na Páscoa do ano passado, não tivemos cultos presenciais. Foi estranho, sentimos falta. Este ano, porém, vivenciamos um cenário ainda mais difícil. Muitas vidas foram ceifadas. Outras tantas atingidas direta ou indiretamente pela pandemia.
A própria forma como nos vemos mudou. A humanidade que caminhava a passos largos na sua pretensão de poder absoluto, de suficiência e do poder de autocontrole, agora se dá conta de sua fragilidade. Mais do que nunca nos percebemos vulneráveis. A morte está exposta bem diante de nós. De todos nós, aliás. Não mais apenas nos lugares longínquos ou nas periferias do mundo.
Cercados da realidade amedrontadora e desesperadora da morte, cá estamos nós, celebrando a Páscoa, a festa da ressurreição – o triunfo da vida! Parece ser contraditório celebrar a alegria pascal em meio a tanta dor e sofrimento. Parece estranho exaltarmos a Deus com expressões de louvor, quando a nossa volta o mundo em dores por piedade – Kyrie eleison!
Mas a Páscoa é justamente isso. É o contraste, a contradição existente entre a morte e a vida. É olhar para uma cruz e uma sepultura – signos de morte – e nestes sinais encontrar alento, alegria e esperança. É perceber que por mais rude que tenha sido a cruz, por mais grossas que tenham sido as suas vidas, por mais fortes que tenham sido os cravos, e, por mais pesada que tenha sido a pedra que tampava a sepultura, nada disso conseguiu segurar na morte o autor da vida.
Naquela primeira manhã de Páscoa a morte também escancarava o seu poder. Tomados pela tristeza da morte, as mulheres, que se tornaram as primeiras testemunhas da ressurreição foram surpreendidas com o totalmente extraordinário: a ressurreição de Jesus Cristo. A reação de assombro, medo e temor destas mulheres é perfeitamente compreensível. Afinal, elas não viram Jesus ressurreto. Viram somente o sepulcro vazio. Elas receberam o anúncio da ressurreição, mas, diante dos seus olhos ainda estavam os cenários de morte. Mais tarde, porém, elas puderam crer e se alegrar.
Não é possível separar a Páscoa da cruz. Não é possível falar de vida sem falarmos de morte. Somente compreenderemos a alegria da Páscoa quando compreendermos o terror da sexta feira santa. Lá, nossos pecados foram cravados na cruz. Lá a nossa culpa foi inteiramente castigada em Jesus. Lá na cruz o próprio Deus, eterno, Todo-Poderoso se fez vulnerável. A fonte da vida se torna mortal. E morre de fato! Mas na manhã de domingo seguinte, o totalmente extraordinário acontece. A vida irrompe da morte. As portas da eternidade são escancaradas para o mundo.
Por isso, estimada irmã, estimado irmão, é tempo sim de se alegrar. É tempo de fortalecer a nossa fé. Pelos nossos olhos vemos muitos sinais de morte a nossa volta. Pela fé, porém, vemos a vida que triunfa. Vemos o pecado que foi pago. Vemos a salvação para a humanidade. A partir desta certeza, podemos, ainda que em tempos tão sombrios e tenebrosos ver brilhar a luz da esperança. Lembremos nesta Páscoa que, em Jesus Cristo, Deus se fez vulnerável para nos fazer indestrutíveis. Este é o contraste entre a cruz e a ressurreição. Amém.