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Novas demandas após profunda tristeza - Mt 14.13-21

O que aprendemos com a reação de Cristo Jesus diante da morte injusta

02/08/2020

Novas demandas após profunda tristeza

Prezada Comunidade distante, mas junta em meio a incertezas e forte na esperança..

Nem sei quantas vezes já preguei sobre este texto. Em grupos de jovens, de senhoras, para lideranças, em retiros… Mas nunca falei deste texto em meio às incertezas de uma pandemia, incertezas causadas pelo isolamento social, incertezas econômicas e politicas, incertezas e dúvidas como as que hoje o planeta Terra vive. E isso muda tudo.

Ocorre a desgraça

Jesus está profundamente entristecido porque ele perdeu seu provável primo, João Batista (este relato não faz parte do texto que aqui lemos). Acontece que o poderoso Herodes, seguido pelo fantasma da culpa que atormentava sua consciência, prende João. Este sabia demais. Herodes estava cercado por denúncias de adultério e incesto. Junto com Herodes Antipas, estavam na trama Herodias, esposa do tio Herodes Filipe, e sua filha dançarina Salomé. João Batista chama ao arrependimento, mas quando pessoas estão comprometidas em uma trama diabólica e envoltas por uma “nuvem carnal” (Curt Grigull), não pensam duas vezes em usar a solução final: matar. Quando pessoas estão envolvidas nesta nuvem do mal, produzem como fruto justamente aquela carnalidade denunciada por Paulo em Gálatas 5, contrapondo com o fruto do Espírito Santo.

O Messias se apequena em sua tristeza de forma profunda. Jesus busca o deserto, com seu silêncio, seu sofrimento, refúgio para o luto. Deserto é o lugar para onde perseguidores — especialmente os fariseus, esses acusadores terríveis — dificilmente se aventuravam a ir. Este fato é tão marcante que os quatro evangelhos se referem ao que aconteceu depois. Mateus, Marcos e Lucas dizem que as multiplicação de pães e peixes acontece apesar de Jesus ter buscado isolamento para viver seu luto e distanciamento do conflito. João coloca a multiplicação de pães e peixes no contexto da explicação da missão de Cristo, embora também comece seu relato com um lacônico “depois destas coisas”.

Dor que causa consequências afirmativas

A profunda dor de Cristo vai resultar em atitude prática, ou seja, algo útil a tantas outras pessoas que, de forma diferente, também vivem profunda dor.

Embora quisesse — até precisasse — se isolar e descansar, Jesus não consegue. O luto poderia ser resolvido com um retiro na outra margem do pequeno mar da Galiléia após um breve e relaxante passeio de barco. A multidão de andarilhos desalentados, porém, não permite o Mestre descansar. A multidão frustra os planos de Jesus. As urgências entre Jesus e as muitas pessoas que o seguiam, eram outras, desiguais entre si.

A verdadeira empatia

O Mestre, assim diz Mateus, εσπλαγχνι’σθη (esplagchníste), ou seja, “seus intestinos de moveram” diante do sofrimento e necessidades daquelas pessoas que O seguiam. Exatamente isto: Jesus passa por mais um momento de mal estar diante da cena triste que vê à sua frente.

Jesus mostra compaixão. Exercita empatia. O que ele faz? Cura. Cura física e cura d’alma. Ele não é um curandeiro que faz seu show particular — de tal forma impactante que Herodes até pensou que João Batista tivesse ressuscitado — mas aquele que cura salvando a pessoa, ou salva curando. Age de forma a alcançar as emoções das pessoas necessitadas. Com olhos nos olhos usa de compaixão, de amor, de simpatia, de afeição, de misericórdia. Jesus sabe que, alcançando a alma e o espírito da pessoa, transforma também seu lado físico e ajuda a se erguer do medo. Sua agenda era propositiva e afirmativa.

Alimento para a vida

Jesus multiplica o pão. Nas línguas originais do Antigo Testamento, o hebraico e o aramaico, a palavra pão se refere a todos os tipos de alimento, e não só o assado da massa de trigo. Tudo o que sustentasse era, portanto, pão. Já no Novo Testamento o pão, isto é, a massa de trigo assada, era praticamente a única refeição dos pobres.

Pão era tudo. Não havia para eles outra fonte de alimentação. Por isso, no Novo Testamento, pão passa a significar tudo aquilo que é necessário para a vida. E, como vimos recentemente no estudo bíblico sobre o Pai-Nosso, pão é algo sagrado, no entendimento dos escritos bíblicos.


Pão...

... é o próprio Deus cuidando e dando condições para o crescimento dos alimentos.

... é o alimento que supre as necessidades básicas das pessoas.

... é aquilo que sacia o faminto, saciando com isso ao próprio Deus.

... é o Corpo de Cristo da Ceia do Senhor, esta sagrada refeição que nos lembra da obra de Jesus e nos compromete com ela.

... é o que será servido na Última Ceia, na festa nos céus.

Tudo isso associado à rica fonte de proteína na pesca fácil do lago de Genesaré, pães e peixes representam a oportunidade de saciar fome e ressuscitar a esperança.

Engajamento de todas as pessoas

Mesmo que sempre busquemos encontrar um ensinamento doutrinário atrás de cada milagre de Jesus, é muito sensato aqui olhar tão somente para Sua atitude pró-ativa de compaixão. E o resultado desta compaixão é o envolvimento de todas as pessoas: dos discípulos atônitos que não tinham a minima ideia de onde poderiam comprar alimento para toda aquela gente, até os inquietos ouvintes que não poderiam ser despedidos para sua jornada até em casa — se as tinham — sem terem algo no estômago.

Dentro dos padrões humanos é absolutamente razoável olhar para uma situação de extrema dificuldade — como uma multidão que corre atrás de pão — e dizer: vão embora, não temos nada para vocês! Mas Jesus usa a situação para demonstrar a importância daquilo que os discípulos julgaram desprezível. Jesus engaja as pessoas. Usar o que se tem para aliviar a dor e sofrimento alheio, foi o que Jesus comprovou ser possível. Afinal, o que são cinco pães e dois peixes nas mãos de um menino indefeso para uma multidão?

O milagre: solução ao alcance de todas as pessoas

Prezada comunidade. Concluindo podemos observar: Absolutamente não duvidamos de nenhuma possibilidade de milagre. Impressionante saciar uma multidão! Isso até merece dois relatos distintos da multiplicação de pães e peixes. Milagre também é conseguir organizar as pessoas em grupos de 50, fazendo-as sentar no pó e conversar enquanto aguardam algo. E, segundo a teologia materialista de Fernando Bello, milagre é também fazer com que não apenas o menino exponha seu farnel, mas todos tirem de suas mochilas o pouco pão — cobiçado pão — e o repartam com todos.

Os milagres não precisam sempre ser transformações atômicas e moleculares inexplicáveis, mas podem acontecer no coração das pessoas. E isso que, de tal forma, ainda abunde muito mais alimento do que faltava no início.
Diante das urgências de nossos tempos e, ao percebermos cada vez mais o que apenas as pessoas responsáveis não veem — a profunda desigualdade social que provoca desigualdades dramáticas na qualidade de vida entre as pessoas —, somos desafiados a ter atitudes práticas e afirmativas. O Evangelho pregado acompanhado do gesto de amor não pode ser impedido por uma pandemia ou o medo de ser contaminado.
Jesus nos deixa o exemplo e as leituras bíblicas ouvidas antes da pregação acompanham este pensamento propositivo: a Palavra do Senhor não volta vazia a ponto de termos o exemplo de darmos a nossa vida pelos irmãos.
Amém.

OBS.: Leituras bíblicas associadas — Isaías 55.1-5 e 1 João 3.16-20. 


Autor(a): Pr. Rolf Rieck
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste / Paróquia: Rio de Janeiro - Martin Luther (Centro-RJ)
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Testamento: Novo / Livro: Mateus / Capitulo: 14 / Versículo Inicial: 13 / Versículo Final: 21
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 58514

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