Texto-base do Tema e Lema de 2015
Fundamentação bíblico/teológico/confessional
O Tema do Ano de 2015 integra o conjunto de Temas que têm por foco a comunidade. Em 2012 (Comunidade jovem - Igreja viva), trabalhamos a importância do diálogo entre gerações como um dos desafios para a comunidade se manter jovem. Em 2013 (Ser, Participar, Testemunhar - Eu vivo comunidade), fomos desafiados a perguntar pela nossa identidade, a participar e a testemunhar como pessoas e como comunidade. Em 2014 (viDas em comunhão), o nosso foco se dirigiu à cidade, com o desafio de perceber novos modelos de vida em comunidade. Implícitos nos Temas desde 2012 estão a comunicação, o diálogo e a interação.
Em 2015, o Tema do Ano propõe que aprofundemos a questão da comunicação, que é componente tão central para a vida comunitária quanto o é para a vida em sociedade. Em razão disso, a IECLB definiu para 2015 o Tema Igreja da Palavra - chamad@s para comunicar, iluminando-o com o Lema, baseado em Lucas 24.17: Então, Jesus perguntou: sobre o que vocês estão conversando pelo caminho?
Olhando mais de perto o Lema para 2015, podemos identificar alguns componentes essenciais para a Igreja da Palavra.
- Antes de perguntar aos dois caminhantes sobre o que conversavam, Jesus se aproximou deles (v. 15). A comunicação inicia antes da pergunta. Inicia no momento em que Jesus se aproxima e caminha com eles, escutando o que dizem. A boa comunicação pressupõe esse passo inicial: aproximar-se, escutar, perceber, sintonizar, interessar-se, conhecer o assunto. Quem não observa esta dimensão, termina comunicando-se apenas consigo próprio. Esse ingrediente inicial da comunicação requer colocar-se ao lado da pessoa ou da comunidade a quem a mensagem é dirigida.
- Jesus inicia a sua comunicação com uma pergunta. Dessa forma, ele abre espaço para que os seus interlocutores sejam os primeiros a se expressar, a falar sobre o que os move e comove, a expor a sua visão das coisas. Jesus não chega com o discurso pronto, embora tenha bem claro para si a mensagem que quer transmitir. Ele ouve pacientemente as impressões das duas pessoas sobre os últimos acontecimentos. A boa comunicação requer um ouvido paciente e uma percepção acurada para compreender o ponto de vista do outro.
- Com a pergunta dirigida aos dois caminhantes, Jesus demonstra seriedade. Um importante pressuposto da comunicação é que o interlocutor perceba: quem está falando comigo me leva a sério, ouve e escuta os MEUS problemas, as MINHAS preocupações. Essa atitude de abertura para o outro é pressuposto para que este também se disponha a ouvir o que – depois – nós temos a dizer.
- As duas pessoas deixam transparecer para Jesus a sua tristeza e a sua incompreensão com relação aos relatos sobre o túmulo vazio. Depois de entender a razão da sua aflição, Jesus se manifesta. A sua mensagem fundamenta-se na Palavra de Deus (v. 25-27) ao recorrer aos profetas e à Escritura. A boa comunicação vai ao encontro das pessoas, filtra informações e dados, confere sentido a informações, antes, dispersas, mostra tendências, alerta para engodos e, acima de tudo, apresenta conteúdos qualificados.
- Ao fazer como quem ia para mais longe, Jesus não impõe a sua presença nem as suas palavras. Ele “caminha com”, “fica junto de”... pelo caminho. Com esse reconhecimento, dá-se o convite para que fique. A boa comunicação é aquela que edifica, em que se assume que se é responsável por aquilo que se transmite e que se tem compromisso em manter atualizadas as informações.
- Com o convite, Jesus participa da refeição. Ali, ao partir o pão, revela-se às duas pessoas. Essa verdade surge a partir de uma prática: a partilha do pão. No partir do pão, Jesus Cristo comunica e se comunica de forma plena, palpável, profunda. É Palavra encarnada. A palavra dita, pronunciada, nem sempre é suficiente para abrir os olhos. Vinculada a ritos, gestos, atos e símbolos, torna-se compreensível em sua plenitude. É Palavra celebrada na liturgia. É rito que facilita o reconhecimento da comunicação que Deus estabelece conosco e da nossa intenção de responder a este diálogo.
- Ao repartir o pão na refeição, Jesus une o seu discurso à prática. A boa comunicação requer coerência entre discurso e vivência. Pessoas, comunidades e Igrejas que são coerentes têm maiores chances de conseguir que a mensagem seja acolhida. Esse é o seu compromisso perante o Evangelho.
- As duas pessoas reconheceram Jesus, deram-se conta de que algo na comunicação de Jesus já mexia com elas pelo caminho. Essa revelação é tão intensa que elas se levantam imediatamente e voltam para Jerusalém com a mensagem de que Jesus está vivo. O que as leva a se mobilizar é a ótima notícia que carregam. Como Igreja, temos conteúdo de excelente qualidade. Não podemos guardá-lo somente para nós. Temos necessidade de sair para repartir essa informação tão valiosa com o mundo inteiro.
O Lema que ilumina o Tema de 2015 é uma pergunta de Jesus a dois caminhantes desolados por causa da crucificação do Nazareno: Sobre o que vocês estão conversando pelo caminho? (Lucas 24.17). Os desdobramentos dessa pergunta impressionam. O diálogo que a pergunta proporcionou aproximou pessoas aparentemente estranhas e afastadas entre si, criou o ambiente para que seres humanos pudessem externar a sua desolação, a sua dor e a sua falta de perspectivas. A comunicação clara e relacionada às perguntas existenciais fez com que vias paralelas entre desconhecidos se cruzassem e os conduzissem à comunhão de mesa. Neste momento, houve revelação! O que parecia estranho e oculto ficou desvelado. Distâncias foram encurtadas. Criou-se comunhão de vidas. A chama da fé foi reacendida e reafirmada. Tamanha experiência precisou ser noticiada. Foi o que moveu os dois caminhantes a se colocarem a caminho e procurarem outras pessoas para comunicar a ressurreição de Jesus.
O que significa, nos dias de hoje, ser Igreja da Palavra e sentir-se chamad@ a comunicar em uma realidade de inflação de informação, reforço do individualismo, enfraquecimento da noção de comunidade, relativização de valores e aumento de sinais de desesperança? Somos Igreja da Palavra, somos Igreja que tem palavra. Somos Igreja da Palavra. Somos chamad@s para comunicar. Como Igreja da Palavra, somos desafiados e desafiadas a analisarmos o quanto e como comunicamos a mensagem do Cristo que está vivo e quer manter diálogo constante conosco por meio da pregação e dos Sacramentos. Ser Igreja da Palavra, hoje, requer análise crítica das atitudes, dos conteúdos e dos valores comunicados para terceiros, além do nível da comunicação que ocorre internamente.
Para comunicar a Palavra, importa que, a exemplo de Jesus, primeiro avaliemos o quanto caminhamos ao lado das pessoas, ouvindo-as, procurando compreender as suas angústias e os seus temores – e elas se expressam!
Em setembro de 2003, por iniciativa da Secretaria Geral da IECLB, foi realizada uma pesquisa junto à Ordem Auxiliadora de Senhoras Evangélicas (OASE). Partindo da pergunta de Jesus O que vocês estão conversando no caminho? (Lc 24.13ss), o propósito da pesquisa foi verificar quais eram as questões que preocupavam e permeavam o dia a dia das mulheres que integravam, na época, as comunidades da IECLB. A leitura do conjunto dos depoimentos evidencia uma angústia profunda e generalizada diante de uma realidade socioeconômica que vai dificultando e, em certa medida, desacreditando o vislumbre de horizontes de paz. Também revela uma impotência assustadora diante dessa realidade. No seu diálogo, as mulheres expressam as suas preocupações, os seus medos e as suas dúvidas.
Vivemos em um mundo com muitas cobranças.
O que será, no futuro, das comunidades nas pequenas cidades?
Na nossa OASE, nós comentamos sobre o afastamento das pessoas da Igreja.
O que será da nossa família, com tanta violência, drogas e assaltos?
A violência contra mulheres.
Temos medo... Que Deus nunca nos abandone e não nos deixe faltar
água nem o ar que respiramos. Como podemos colaborar para
que os nossos netos e bisnetos tenham água?
Nos cultos, as prédicas deveriam ser mais simplificadas...
Muitas vezes, as pessoas saem do culto sem entender o que os Pastores falaram.
As dúvidas, as preocupações e os medos expressos pelas mulheres entrevistadas são os mesmos que afligem toda a sociedade, são manifestados pelas mães e avós, mas também por estudiosos de variadas áreas das Ciências Sociais. Diante desse quadro, há uma tarefa inadiável e intransferível para a comunidade, a Igreja como um todo, lideranças, Ministros e Ministras, a saber: ouvir as pessoas, compreender os seus medos e temores e comunicar, com fundamento, que há motivo para esperança.
A referência para essa comunicação é o Evangelho. Disso somos bem lembrados no contexto da aproximação ao Jubileu da Reforma, a ser comemorado em 2017. O movimento da Reforma, particularmente Martim Lutero, desmascarou mitos, desnudou medos criados e impostos, revelou – comunicou – o Deus que nos é próximo, que já nos deu as condições para viver em comunhão e encontrar a paz, a sua paz. Isso é o que comunica o Evangelho. Isso é o Evangelho! Nele encontramos o conteúdo da nossa comunicação. Ele é o conteúdo da comunicação.
O Evangelho traz o Deus da graça. A comunicação de Deus e a respeito Dele é a expressão da Sua graça nos dias de hoje. Em meio a um contexto saturado de notícias ruins, no qual, ainda hoje, há quem apresente um Deus cobrador, sisudo, com dedo em riste, que nos deixa com sentimento de estarmos sempre devendo, nós podemos nos comunicar e nos reunir à mesa da comunhão com aquele Deus que, sendo Palavra, se tornou carne e habitou entre nós (João 1.14), que se deu por nós. A nossa comunicação se dá no tempo pós-pascal! Aquele que foi morto, ressuscitou. Nós o sabemos. Nós o cremos, por isso comunicamos e dialogamos com esperança, em perspectiva e com liberdade.
Esse mesmo Evangelho da graça, se auscultado na sua profundidade, é suporte suficiente para que a Igreja não enverede pelo caminho da glória ou cultive teologias que oferecem sucesso. “A vida de fé não é sucesso, mas alegria apesar do sofrimento. A descoberta de que somos contraditórios (simul justus et peccator) não se elimina com êxtase e não se exorciza com palavras de efeito, mas com gestos, na comunidade. No centro do Evangelho está o Cristo crucificado e ressurreto. Nele vemos para onde Deus olha (Mateus 25) e aprendemos a mudar a orientação do nosso olhar. Isso gera comunhão que expressa sinais do Reino” (Pastor Dr. Martin Dreher).
A comunicação prioritária de Deus aos seus filhos e às suas filhas ocorre na fragilidade. O próprio Deus se revela na fragilidade. A comunicação de Deus e a comunicação sobre Deus se dão no caminho da cruz. Isso é comunicação diaconal. Está no gesto, no toque, no abraço, no sentar junto. Torna-se palpável no amor solidário. Fica palatável na comunhão de mesa: Este é meu corpo. Este é o cálice da nova aliança.
A Ceia do Senhor, que nós, hoje, celebramos em memória de Jesus, não foi uma refeição como as anteriores, foi única, porque ali foi celebrado o benefício de Deus na cruz por nós. É o benefício que pode ser assim definido: a Ceia do Senhor reafirma o perdão dos nossos pecados, que leva à reconciliação, que recria comunhão, que impulsiona para, livremente, nos empenharmos na busca pela paz na comunidade, no lugar onde vivemos.
Em meio aos medos que sentem, as pessoas podem encontrar espaços para não ficarem sozinhas e isoladas. Onde o Evangelho é anunciado, criam-se espaços e oportunidades ímpares para falarmos sobre o que sentimos, para dialogarmos sobre o que nos pesa no coração. O Evangelho joga luzes que ajudam a entender essas manifestações e a dar rumo para uma vida em comunhão e confiança. Comunicação é, por si só, meio para terapia. Sendo comunicação que se ancora no Evangelho, é meio de resgate da nossa humanidade. O nosso ideal, portanto, é uma comunidade que consegue, em meio às dores, comunicar, e comunicar o Evangelho.
O que se está comunicando nas nossas comunidades? A respeito do que nós estamos falando nas nossas comunidades? Com base em que nós estabelecemos e conduzimos os nossos diálogos na Igreja? Como os diferentes setores estão dialogando? Os jovens estão se comunicando com os Presbitérios e vice-versa? A nossa comunicação cria relação de confiança entre interlocutores? Quando comunicamos e quando nos comunicamos, o que desejamos e onde queremos chegar? A quem pretendemos alcançar? A nossa comunicação promove a comunhão entre nós, entre nós e Deus, promove a “paz da cidade”? Como queremos que a IECLB seja vista e recebida pelas pessoas alcançadas pela comunicação da missão e da visão da nossa Igreja?
A IECLB é uma Igreja de comunidades. O conjunto das comunidades é a Igreja. A Igreja são as pessoas, os membros, mulheres, homens, crianças, jovens, pessoas idosas, filhos e filhas de Deus, por isso, se o Tema de 2014 colocou em destaque a cidade, com os seus prédios, e convidou para que se busque a paz da cidade, o Tema de 2015 convida para que encontremos os rostos das pessoas que vivem nesse emaranhado urbano – e também no meio rural. Nesse sentido, como Igreja, convém refletir se conseguimos contribuir para que ali, bem ali, pessoas estranhas umas às outras, mas que caminham lado a lado, se virem, se olhem e comuniquem o que estão fazendo, o que estão vivendo, para onde estão se dirigindo. Igualmente, convém avaliar se conseguimos comunicar a mensagem que lhes seja oportuna, mensagem ancorada na Palavra e que faça diferença na sua vida, no seu diálogo e, sobretudo, que contribua para o fortalecimento da vida em comunidade.
No contexto da IECLB, podemos e precisamos falar sobre a forma como evangelizamos, como exercemos a diaconia e como é nossa pedagogia educacional. Cabe-nos divulgar as tantas pastorais de consolação, as ações desenvolvidas nos centros sociais e nas creches, os cursos de capacitação de lideranças para a visitação, os programas de educação cristã continuada, a ação das organizações identificadas confessionalmente, a Campanha Nacional de Ofertas para a Missão Vai Vem e as tantas outras iniciativas que promovem vida. Podemos nos alegrar diante da consciência crescente em relação à contribuição financeira espontânea, ancorada no tripé fé-gratidão-compromisso. São promissoras as iniciativas que envolvem e engajam a nossa juventude. Há avanços no cuidado ministerial. Cultivamos um jeito próprio de acompanhar as pessoas idosas, as pessoas com deficiência, as pessoas enfermas, as pessoas vítimas da violência. Somos herdeiros de jeitos de celebrar (culto e ofícios) significativos, envolventes e participativos. Carregamos a marca do reconhecimento de sermos uma Igreja histórica e séria.
O Tema da IECLB para 2015, Igreja da Palavra - chamad@s para comunicar, e o Lema que o acompanha, Então, Jesus perguntou: sobre o que vocês estão conversando pelo caminho? (Lucas 24.17):
- convidam para comunicarmos mais e melhor a nossa Teologia, os seus pontos centrais, como a justificação por graça e fé, o que nós somos e cremos como pessoas luteranas;
- estimulam para comunicarmos melhor as decisões na Igreja, o que acontece no grupo, no setor de trabalho, na comunidade, na paróquia, no sínodo e nas instâncias nacionais;
- permitem sairmos de trás da cortina e usarmos melhor as nossas fachadas de templos, bem como os meios impressos e eletrônicos, como as nossas páginas na Internet, além dos audiovisuais, para que as pessoas vejam e sintam a presença da IECLB por este Brasil afora;
- instigam-nos a assumirmos, com orgulho e gratidão, o nosso modelo de Igreja, que passa pelo diálogo, pelo debate, pela decisão construída por meio da representação, como é o caso das Assembleias e do Concílio;
- pedem para comunicarmos melhor nosso jeito luterano de participar da Igreja de Jesus Cristo, dialogando com outras Igrejas e organismos ecumênicos, procurando reforçar ações conjuntas em favor da paz, da justiça e do cuidado com a Criação.
O Lema de 2015 é um convite insistente para criarmos formas e espaços para ouvirmos as nossas comunidades, a nossa gente. É um impulso para que se escute. É uma declaração de que a Igreja – enquanto comunidade – caminha com as pessoas e quer ouvir as suas perguntas. Diante dessas perguntas, justamente, o Tema 2015 é categórico: a Igreja da Palavra tem o que comunicar: a Palavra de Deus revelada na Sagrada Escritura! É essa comunicação que fará diferença para uma vida digna. Sentir-se parte dessa dinâmica é ser partícipe de uma comunicação que fortalece a vida, em comunidade, em comunhão.
Presidência da IECLB