Prezada Comunidade
Estimados Rádio-ouvintes
O texto do Evangelho de Lucas 4.14-21 fala da missão de Jesus. Jesus proclama que sua missão é fazer uma diferença positiva nesse mundo. Ele não veio para castigar, condenar, ameaçar as pessoas com o fogo do inferno. Nada disso. Jesus veio para transformar esse mundo de maneira positiva. Jesus anuncia que ele sabe muito bem o que Deus espera dele.
- Evangelizar os pobres
- proclamar libertação aos cativos
- restaurar a vista aos cegos
- colocar em liberdade os oprimidos
- anunciar o ano aceitável do Senhor – isso é – anunciar um tempo de transformação, um tempo de reconstrução.
Jesus foi enviado por Deus para ser o Salvador do Mundo. Por isso ele diz que ele foi ungido. Ungido é uma pessoa que recebeu claramente uma missão e vai cumpri-la em nome de Deus. Nesse sentido, creio que esse texto da missão de Jesus pode nos auxiliar a entender também a nossa missão como igreja luterana e como cristãos, nesse momento em que todos estamos chocados com os acontecimentos do drama, da tragédia, da catástrofe que aconteceu na sexta feira passada dia 25 de janeiro aqui em Brumadinho.
Mais uma vez vemos imagens de destruição massiva do meio ambiente, escutamos vozes angustiadas de familiares que não sabem de seus parentes e amigos. Mais uma vez vemos pessoas que perderam tudo que tinham na vida e agora não sabem que caminho seguir. Brumadinho que é conhecido pelo Instituto Inhotim, o maior museu a céu aberto. Felizmente a lama da barragem não afetou Inhotim. Mas agora será conhecida também como palco de uma das maiores catástrofes do Brasil. O rompimento da barragem não se pode atribuir a Natureza, porque faz já três semanas que não chove. A responsabilidade por essa tragédia é da empresa VALE do RIO DOCE. . Todos nós concordamos que se a responsabilidade é da empresa, então ela deve assumir a indenização das famílias e a reparação do estrago feito nomeio ambiente. Mas pela experiência em Mariana (2015), onde as famílias afetas ainda hoje esperam alguma indenização, o sofrimento dessas famílias de Brumadinho também pode se alongar por anos em sua luta pela reparação de suas vidas.
Todos nós também concordamos que os minérios são necessários para o desenvolvimento econômico de Minas Gerais, do Brasil e do mundo. As prefeituras das cidades com exploração mineral necessitam das empresas para gerar empregos e impostos para o município. Assim é também com o Estado e o Pais. Mas catástrofes como de Mariana e agora de Brumadinho podem ser evitadas. Nós temos vários engenheiros em nossa Comunidade e eu gostaria de perguntar: Não existe possibilidade de evitar o rompimento de uma barragem? Não existe possibilidade de reduzir o impacto humano e ambiental – na suposta eventualidade – de uma barragem dessa se romper?
Não se trata de ser contra o desenvolvimento do município, do estado ou do país, mas por que as empresas poderosas são tão negligentes com o cuidado da vida e da Criação de Deus? Todos nós sabemos que uma das razoes é a impunidade. Quem tem dinheiro encontra um jeito para estender juridicamente qualquer punição. E os poderosos também sabem que podem contar com o nosso esquecimento como sociedade. Hoje multas pessoas ainda estão indignadas, mas daqui a 15 dias a vida de todos nós terá seguido em frente, as vítimas já não estarão nas manchetes dos jornais. Ou seja, a certeza da impunidade conta com a nossa colaboração, com o nosso esquecimento. Daqui a um mês – ou menos - a prefeitura, as pessoas que não foram atingidas diretamente e outras pessoas mais vão dizer que é importante que a empresa que agora está suspensa juridicamente volte a funcionar, porque sem isso o município ficará sem dinheiro e as pessoas precisam trabalhar. Daqui a um mês as vítimas vão estar lutando sozinhas.
Será que Deus tem alguma a dizer sobre isso?
Primeiro, Deus é o Criador dos céus e da terra. Não importa se você acredita que o Planeta Terra foi formado a 4,5 bilhões de anos atrás e não em 6 dias. O cientista francês Louis Pasteur, cujas descobertas tiveram enorme importância na história da química e da medicina e graças a essas descobertas hoje temos várias possibilidades de prevenir e tratar doenças, ele disse uma vez, sobre esse conflito entre Ciência e Religião: “Um pouco de ciência nos afasta de Deus, Muita ciência nos aproxima de Deus.” Portanto, pessoas da ciência ou da religião temos uma coisa em comum. A Natureza precisa ser cuidada, a vida é algo frágil que desaparece com um sopro.
Segundo, Jesus nos chamou a viver o amor. O amor não deixa ninguém sofrendo sozinho. O amor se solidariza. Portanto, Jesus nos chama a não abandonar as pessoas em seu sofrimento. Mesmo que a catástrofe esteja já fora das notícias da mídia, deveríamos nos interessar por acompanhar a luta dessas vítimas – como um mandato de Jesus.
Terceiro, catástrofes como essas podem ser evitadas. Elas não precisam acontecer. Elas só acontecem por causa da negligência, por causa da falta de fiscalização, por causa do abrandamento de leis ambientais para não prejudicar o desenvolvimento econômico. O nosso pais precisa de empregos – são 12 milhões de desempregados e outros 24 milhoes vivendo por conta própria. Mas as empresas precisam ser mais fiscalizadas com o cuidado da vida. Tem muita empresa que joga água contaminada nos rios. Tem muita empresa onde respirar é uma coisa difícil por causa do resíduos que elas jogam no ar. E tem muitas outras barragens aqui em Minas Gerais e outros estados do Brasil que já foram declaradas não seguras e com alto risco de romper – e mesmo assim, as empresas não tomam nenhuma providência. É claro que precisamos de desenvolvimento econômico, mas com segurança.
Portanto, penso que as igrejas cristãs e todas as religiões – devemos assumir nosso papel de ser mais vigilantes com o cuidado da vida. Nós perdemos muito quando os conflitos políticos partidários nos colocaram uns contra os outros. Isso não deve continuar assim. Acima de nossas preferencias políticas deve estar o nosso compromisso com a vida e o cuidado da criação de Deus. Devemos deixar os conflitos de lado. Aos governantes compete governar pelo bem de todos e a nós como igreja compete estar alertas para que a vida não seja colocada em risco por interesses econômicos particulares. Pois, a catástrofe de Brumadinho não foi vontade de Deus. A morte e o sofrimento dessas pessoas não foi vontade de Deus. Não foi Deus que quis assim.
Essas mortes, essa destruição ambiental e esse sofrimento é responsabilidade da empresa Vale do Rio Doce, com a omissão dos governos, dos organismos de fiscalização que foram negligentes em seu trabalho.
Mas não adiante apenas chorar sobre o leite derramado. Chegou o tempo da solidariedade – de não deixar as famílias lutando sozinhas. Se elas tiverem que protestar pelas ruas pelos seus direitos, deveríamos apoiá-las e protestar junto com elas se for possível. E também devemos ser vigilantes para não deixar que outras catástrofes como essa não venha a acontecer em outros lugares – com a desculpa que precisamos do desenvolvimento econômico. É possível ser um pais mais desenvolvido, é possível viver melhor sem matar ou destruir. Portanto, independente de nossa preferência política partidária, somos todos e todas filhos e filhas de Deus, e Jesus nos diz de maneira muito clara - que nós também devemos fazer uma diferença positiva nesse mundo - que nossa missão é nos unir na defesa da vida e de toda a Criação de Deus.
Como igreja luterana, nós insistimos em nossos cultos que a Palavra de Deus não pode ser semeada e ficar estéril dentro do nosso coração. Se a Palavra de Deus ficar apenas no nosso coração, ela murcha, seca e morre. Portanto, a Palavra de Deus - para permanecer viva - ela precisa de ar livre, ela precisa ser aplicada no dia a dia. Deus nos chama a viver a sua palavra em solidariedade na luta pela justiça e no cuidado com a sua Criação. Esse é o chamado para cada um(a) de nós.
Amém.