Oito de março foi convencionado como o Dia Internacional da Mulher. Refletir sobre a situação das mulheres tem a ver, também, com a Igreja? Vamos dar uma “espiada” na história?!
Muito tempo antes de Cristo, ainda em ambiente judaico, a religião determinava o dia-a-dia do povo de Israel. Entre tantos âmbitos possíveis do cotidiano (econômico, jurídico e político, por exemplo), a religião também fundamentava as relações entre homens e mulheres e determinava, para cada sexo, lugares específicos de atuação. Nesse contexto histórico-cultural, salvo exceções, cabia aos homens estar à frente das decisões e ocupar o espaço público; as mulheres deviam obediência aos seus pais, maridos ou filhos mais velhos e o seu espaço, por excelência, era o espaço privado (ambiente doméstico). A religião servia como instrumento de marginalização e inferiorização das mulheres, especialmente através das leis de pureza e impureza que determinavam, por exemplo, que a menstruação, o parto, o cuidado com pessoas doentes, deficientes e moribundas tornavam uma pessoa impura. Sendo estes acontecimentos e ações pertinentes às mulheres, elas viviam em constante estado de impureza.
Com o evento do cristianismo abriu-se novas possibilidades para as mulheres. Jesus Cristo lhes concedeu dignidade e lhes proporcionou espaços de atuação até então muito distantes do que as mulheres haviam experimentado. Lembro de algumas situações:
· Conforme Marcos 10.43-45, Jesus revestiu de um novo significado a diaconia, ou seja, o serviço que, até então, era executado mormente por mulheres e escravos/as. Jesus ressaltou a ação diária das mulheres de prover a alimentação e cuidar de tudo o que envolvia o “servir à mesa”, ampliando o conceito de serviço, como a ação de toda pessoa cristã que almejava segui-lo (também dos homens). Assim, se opôs a toda forma de dominação (também no ambiente doméstico) e chamou seus seguidores e suas seguidoras à prática da diaconia (“...quem quiser ser importante, que sirva aos outros...”) e a viver a partir de uma nova ordem social e comunitária.
· Lucas 10.38-42: Jesus legitima que também as mulheres possam aprender dos Mestres. (A possibilidade de ser instruído era privilégio masculino!)
· Marcos 7.24-30: Jesus se deixa convencer por uma mulher a estender a salvação também a pessoas de outros povos.
· Lucas 13.10-17, Marcos 1.29-31, Marcos 5.25-34: Jesus cura mulheres e as reintegra à vida em sociedade.
· Marcos 14.3-9: Jesus se deixa ungir pela mulher de Betânia (essa função era somente masculina) e chama a atenção para o seu feito.
· Marcos 16.1-11, Lucas 24.1-10: As mulheres se tornam as primeiras testemunhas da ressurreição.
A partir dos espaços concedidos por Jesus, mulheres se tornaram diáconas, apóstolas (testemunhas da ressurreição), pregadoras, líderes de comunidade, sendo, inclusive, responsáveis pela celebração da Ceia ali onde sua casa acolhia uma comunidade que se reunia para orar, meditar e se fortalecer no Evangelho de Jesus. Ao longo da história da Igreja, no entanto, foi sendo negado às mulheres a atuação em ministérios cristãos que envolviam atividades para além do espaço da casa. Mulheres foram sendo excluídas, gradativamente, de uma participação reconhecida no âmbito comunitário confessional e institucional.
Em toda a era cristã, cá e acolá, houve mulheres e grupos de mulheres reivindicando direitos e espaços de atuação diferenciados dos vigentes até então também para as mulheres, dentro e fora da Igreja. Marco desses movimentos de mulheres foi, sem dúvida, a reivindicação por melhores condições de trabalho de 129 mulheres que morreram assassinadas numa fábrica de tecidos em Nova York/Estados Unidos, no dia 08 de março de 1857. Em 1910, durante o primeiro Congresso Internacional de Mulheres realizado na Noruega, este dia foi instituído como o Dia Internacional da Mulher. Especialmente a partir do século XIX, muitas mulheres se uniram em diferentes movimentos, reivindicando melhor qualidade de vida para si e sua família, direito a licença à maternidade, à educação formal e ao voto, entre outros.
Em geral, ao longo da história do cristianismo, a Igreja (institucional) não se mostrou aliada das mulheres na busca por outros espaços de atuação, que não o da casa. Algumas mudanças significativas para a vida das mulheres (e também dos homens, certamente), em âmbito eclesial, encontramos na Reforma, no século XVI. Martim Lutero entendia, a partir da compreensão do sacerdócio geral de todas as pessoas crentes, que homens e mulheres batizados encontram-se aptos para servir a Deus. Martim Lutero também valorizou o matrimônio (e não apenas a vida no convento), tornando-o espaço reconhecido de atuação cristã. No século XIX, no seio da Igreja da Alemanha, o exercício do diaconato feminino, profissional ou voluntário, que procurou fazer frente ao pauperismo alemão, possibilitou a atuação de mulheres evangélicas solteiras como diaconisas em espaço público (hospitais, por exemplo); além dessas, também outras mulheres evangélicas casadas e solteiras se envolveram em iniciativas assistenciais, como no Auxílio de Mulheres (Frauenhilfe). No Brasil, no ano de 1899 surgiu o primeiro grupo formalmente organizado de mulheres dentro da Igreja Evangélica (IECLB) que, mais tarde, se constituiu em Ordem Auxiliadora de Senhoras Evangélicas (OASE). A OASE possibilitou às mulheres, efetivamente, um espaço onde elas puderam atuar de forma organizada para além de seus lares: na Igreja e, muitas vezes, através dela, na sociedade, ainda que, apenas por volta da década de 1980 encontremos mulheres evangélico-luteranas, com freqüência, também em outros espaços de direção como, por exemplo, em presbitérios (diretorias) e no exercício de um dos ministérios ordenados. Na IECLB, a OASE não é o único grupo organizado de mulheres, mas, o maior deles.
Entre as Igrejas históricas (entre elas a Igreja Católica Apostólica Romana e a Igreja Evangélica de Confissão Luterana) vemos variados movimentos e iniciativas de mulheres: desde aqueles que buscam ampliar os direitos das mulheres - inclusive revisando a forma como alguns textos bíblicos foram interpretados ao longo da história de modo a desvalorizar as mulheres - até aqueles que têm como centralidade o exercício da diaconia. Esse leque de movimentos e iniciativas tem enriquecido a vida da Igreja e proporcionado, sem dúvida, maior participação também das mulheres na vida comunitária, em todos os seus âmbitos e, por tudo isso, requer continuidade continuidade . Entre as iniciativas de mulheres no âmbito eclesial está o Culto do Dia Mundial de Oração.
Pa. Scheila dos Santos Dreher
Pastora na comunidade Evangélica em Lajeado.
Papua Nova Guiné convida, neste ano, para o Culto do Dia Mundial de Oração
Desde 1887, mulheres cristãs em mais de 170 países passaram a realizar, em caráter ecumênico, o Dia Mundial de Oração, previsto, anualmente, para a primeira sexta-feira de março. A cada ano, mulheres cristãs de um país diferente assumem a elaboração desta celebração. Através desse movimento, culturas, raças e tradições se aproximam em torno de um objetivo comum. Neste ano, mulheres de Papua Nova Guiné compartilham conosco suas lutas, conquistas, esperanças, histórias e sua fé e nos convidam à oração e à ação. Estendemos esse convite a toda comunidade lembrando o Culto do Dia Mundial de Oração na Igreja de Cristo/Centro, no dia 06 de março, às 20h, sob a coordenação da OASE Centro e no dia 05 de março, às 15h, no Ponto de Pregação Gustavo Adolfo, sob a coordenação da OASE daquele Ponto de Pregação. “Em Cristo somos muitos membros, mas um só corpo.”
Pa. Scheila dos Santos Dreher