Cada qual segundo o dom que recebeu

Estudo

30/04/2006

Qual é nossa propriedade ao nascermos? Nascemos com o quê? Nossa família? Um código genético? Bens herdados? Os dons são definidos como qualidades inatas. Paradoxalmente um dom também é definido por mérito. Surge a questão: os dons são nossos desde que nascemos, recebemos como dádiva ou eles são adquiridos por merecimento?

A curiosidade sobre as origens impulsiona o desenvolvimento do conhecimento científico. Esta é uma curiosidade nunca totalmente satisfeita. O momento em que recebemos os dons com o qual se nasce, portanto, é sempre enigmático. Conhecer, porém, quando os tornamos parte de nossa identidade é possível.

A partir do desejo de alguém pela nossa vida recebemos um nome. Nascemos com um nome, com uma referência pela qual somos chamados e convocados a viver. Mas, é somente aos poucos que tomamos posse de nosso nome, que ele realmente nos pertence. Algo semelhante se passa com os dons. Uma herança que precisa de uma assinatura particular para pertencer a alguém.

Dom = Qualidade inata. Qualidade é atributo das coisas ou das pessoas que as distingue das outras e lhes determina a natureza. Nós nos acostumamos a pensar em qualidade de vida como sinônimo de vida boa, com possibilidades de realização de nossas necessidades. Quando escutamos com atenção a definição de qualidade, percebemos que uma qualidade define uma identidade a partir de uma diferença. Tecidos de diferentes texturas são tecidos de qualidades diferentes, seda, lã, algodão.

É difícil em uma sociedade competitiva, abandonarmos a idéia do melhor e do pior, do bom e do ruim, de uma avaliação quantitativa, e nos concentrarmos nas qualidades. Muitas vezes, qualidade de vida é confundida com quantidade de bens materiais e de tempo. O tempo não possui significado se não for qualificado. Uma vida com qualidade é uma vida que faz diferença. A vida de cada ser possui um sentido próprio que precisa ser revelado.

Todos recebem dons, qualidades inatas. E com eles se passa algo interessante. Para um dom tornar-se propriedade de uma identidade ele precisa ser doado. Dom, doar, doação de dons. Parece uma brincadeira com as palavras, mas recordando as palavras de Goethe: ‘o que herdaste dos teus pais, conquista-o para fazê-lo teu’. Os dons só possuem uma qualidade, um sentido, se quem o recebeu puder possuí-lo. Entregando-o. É uma conquista de entrega.

O dom de alguém, a qualidade de alguém está definida pela diferença, pela sua marca. A diferença, o sentido particular e especial da vida de cada um está naquilo que cada um pode acrescentar na vida dos outros, no que pode doar. A qualidade é definida pela comparação, não de melhor ou pior, mas pela descoberta das especificidades de cada indivíduo.

Os dons mais valorizados numa sociedade de espetáculo são aqueles que colocam a pessoa como número ‘um’ em um show. Da platéia, ficamos maravilhados diante do belo. Um acréscimo aos nossos sentidos. É preciso perceber, porém, que cada um é o número ‘um’, não no sentido de primeiro, mas de único e especial na simplicidade de cada momento.

Ao percebermos a beleza e o espetáculo de um ato de amor e doação, deparamo-nos com os dons recebidos, com o sentido de cada vida. Só é possível estarmos diante de cada dom recebido se estivermos diante de um dom doado. Cada um segundo o dom que doou.
Psicóloga-psicanalista Simone Engbrecht


Autor(a): Simone Engbrecht
Âmbito: IECLB
Natureza do Texto: Estudo/Pesquisa
ID: 13657
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