Diaconia e Pessoas Idosas (Instituições)


ID: 2803

A velhice

Auxílio Homilético

27/11/1980

A VELHICE - Lothar Hoch

I — Preliminares

O presente auxílio homilético não parte de um determinado texto bíblico. Ele tem em vista uma prédica temática sobre a pessoa idosa. A escolha de um texto ou de um versículo bíblico fica a critério do pregador que, deste modo, tem a liberdade de dar a ênfase que julgar oportuna dentro da sua situação específica (culto dominical, culto familiar, culto num ancionato ou estudo bíblico para pessoas idosas). Como possíveis textos bíblicos, apesar de a escolha não ser muito ampla, entram em cogitação Ec 12.1-8, alguns salmos, como p.ex. o Sl 6 ou o SI 41 (em especial o v. 12), além das passagens bíblicas mencionadas a seguir nas considerações bíblico-etimológicas.

II - Considerações bíblico-etimológicas

Tanto no mundo grego o termo PRESBYTEROS quanto no mundo hebreu o termo ZAQEN confere à pessoa idosa um alto grau de dignidade e de respeito.
Frequentemente o termo é usado em combinação com o conceito da sabedoria (Pv 20.29; Lv. 19.32). Sapientia Salomonis 2.10 admoesta a temer os cabelos grisalhos dos anciãos. Jesus Siraque 6.34 conclama os jovens: Onde muitas pessoas idosas estão reunidas, junta-te a elas; quem é sábio a eles se una. Jesus Siraque 25.4-6:

V.4: Como fica bem a capacidade de discernimento aos cabelos grisalhos; e aos velhos o saber dar bons conselhos.

V.5: Como é bela a sabedoria dos anciãos e o discernimento e a admoestação dos homens de boa reputação.

V.6: A coroa dos anciãos é a sua rica experiência; e o temor a Deus aquilo no qual podem se gloriar.

Tanto o termo grego quanto o hebraico tem um significado duplo.

Eles podem referir-se à idade de uma pessoa e também a um cargo ou uma função. É tão estreita a ligação entre estes dois significados que o ser idoso chega a ser quase idêntico com o desfrutar de uma posição honrosa e de destaque na comunidade. Assim os cargos de liderança, tanto no judaísmo quanto no cristianismo primitivo, estavam entregues a um colegiado de pessoas idosas - o Sinédrio ou Conselho dos Anciãos, respectivamente o Presbitério ( l Tm 4.14).

O acima exposto demonstra que a conotação negativa que hoje se associa à palavra velho carece de qualquer base bíblica e etimológica.

III - Considerações de natureza psicológica

O envelhecer não é apenas um processo físico-biológico. Tem também uma dimensão psíquica. O processo de envelhecimento psíquico não coincide necessariamente com o de envelhecimento biológico. Há pessoas de meia idade que se sentem velhas e há pessoas idosas que demonstram uma vitalidade e uma iniciativa admiráveis. A pessoa pode ser considerada psiquicamente velha quando não consegue mais entender as gerações mais jovens, quando se isola das demais pessoas, quando não tem mais ambições na vida, quando não encontra mais um alvo pela qual vale a pena lutar, quando vive tão somente de recordações do passado. Não obstante o envelhecimento é um processo irreversível que representa uma crise para a pessoa humana.

Um dos fatores que mais contribuem para a crise da velhice é o fato de a pessoa ter que parar de trabalhar. Desde a idade escolar a maioria das pessoas está acostumada a deixar a casa pela manhã e, juntamente com um grupo de outras pessoas, desempenhar uma atividade fora do lar. É inegável que para um grande número de pessoas o trabalho representa um dos conteúdos mais importantes da vida. Ao chegar a velhice e com ela a aposentadoria, está-se subitamente diante de um grande vazio de tempo que não se consegue preencher de forma satisfatória. A postura que se assume perante a aposentadoria serve para ilustrar muito bem toda a ambivalência que caracteriza esta faixa etária. Para muitas pessoas a aposentadoria representa uma crise de sentido para viver. Outros vêem na aposentadoria uma oportunidade para realizar velhos sonhos. Ambas as atitudes podem, no entanto, revelar certos problemas. No primeiro caso, o excesso de pessimismo pode levar à depressão e com isto se desperdiça a chance de viver o que a vida oferece no presente. No segundo caso, o constante adiamento da decisão de viver uma vida plena depois da aposentadoria gera expectativas acumuladas que não poderão jamais ser realizadas.

Cada faixa etária é simultaneamente uma despedida da fase anterior e um preparo para a que se segue. Mesmo assim cada fase da vida tem a sua característica própria que quer ser encarada de frente e vivida no presente. Isto é, a pessoa humana não pode ser compreendida tão somente a partir do passado nem tampouco a partir do futuro. A pessoa humana é um ser aberto para — apesar das limitações impostas pelo seu passado e apesar das restrições que estão pela frente - transcender-se a si mesmo e realizar as suas aspirações maiores no presente. Isto também vale para a velhice. Onde a velhice não for encarada como uma fase que, além das dificuldades, também oferece oportunidades, o sentido de viver desaparece por completo. Entre as oportunidades podem ser mencionadas o viajar, a visitação a amigos e doentes, o desempenho de uma atividade em benefício da comunidade, os trabalhos manuais ou hortigranjeiros, etc.

O perigo da velhice consiste, por um lado, no prender-se ao passado e viver tão somente de recordações. Isto leva fatalmente ao isolamento, pois nem sempre a pessoa idosa encontra ouvidos atentos entre as gerações mais jovens para as suas longas narrativas de épocas passadas. Por outro lado, o perigo reside num olhar fixo para o futuro cheio de incertezas, que culmina fatalmente na morte. Esta atitude é favorecida pela perda de amigos, vizinhos e parentes da mesma faixa etária. Quantas vezes, ao acompanhar o féretro de um conhecido, a pessoa idosa se confronta com a apreensiva pergunta: quem será o próximo?

Por tudo isso, a atitude psicologicamente mais sadia é procurar despertar na pessoa idosa a fantasia e a força necessárias para descobrir as suas possibilidades e as suas oportunidades no presente. O que a pessoa idosa mais necessita é sentir-se útil e importante. O que ela menos precisa é de paternalismo.

IV — Considerações sociológicas

A distinção entre a situação da pessoa idosa no meio rural e no centro urbano, ainda que seja parcialmente justificada, tende a diminuir cada vez mais. Isto se deve principalmente ao processo de nivelamento a que está sujeita a sociedade brasileira de alguns anos para cá. Os valores do sistema capitalista, a técnica e a urbanização estão fazendo com que as tradições e os costumes do meio agrário estejam passando por uma transformação muito acentuada. O êxodo rural e os meios de comunicação de massas estão contribuindo decisivamente para o aceleramento deste processo.

As gerações mais jovens conseguem absorver melhor este impacto do que as gerações mais idosas. Estas se sentem muitas vezes deslocadas e até marginalizadas tanto pelo rumo que as coisas estão tomando, quanto pela rapidez com que elas se processam. A sociedade atual tende a julgar as pessoas pelos seus feitos e pela sua capacidade produtiva. No momento em que de-cresce a capacidade de produção de uma pessoa, ela passa a encontrar dificuldades, p.ex., de conseguir um emprego. Não raro a pessoa idosa é considerada à semelhança de um móvel fora de moda que se guarda no sótão da casa. Um sintoma disto é a constatação de que se procura cada vez mais ocultar a própria idade, tão logo as primeiras rugas apareçam no rosto. Existe uma verdadeira indústria de cosméticos que vive e floresce a serviço do encobrimento dos sinais da velhice.

Por outro lado, o avanço da medicina permite que a expectativa de vida esteja se elevando constantemente nos últimos anos entre as classes mais favorecidas. Este aumento quantitativo dos anos de vida, não vem acompanhado de um aumento qualitativo de vida de modo geral. A preocupação da igreja e da pregação deverá partir da premissa de que não basta adicionar anos à vida, mas . . . adicionar vida aos anos (R. Droste,Jorev, Nov. 1979).

Dentro da IECLB, temos que nos dar conta de que a situação em nossas comunidades não reflete a realidade das pessoas idosas de modo geral no Brasil. Os idosos que temos em nossas comunidades, via de regra, têm um teto sobre suas cabeças, um filho ou um parente que os acolha ou então a comunhão de outras pessoas idosas num asilo. Muitos recebem amparo previdenciário e assistência médico-hospitalar. Assim sendo, apesar de todas as dificuldades inerentes à idade, não podemos deixar de reconhecer que as pessoas idosas em nosso meio não deixam de ser, dentro do contexto brasileiro, um tanto privilegiadas. O que dizer, todavia, da leva daqueles idosos desamparados, pobres e doentes, que não têm assistência médica e previdenciária nem um aconchego familiar?

O envelhecer no Brasil é um privilégio de poucos. A grande maioria dos brasileiros não atinge idade avançada devido às privações de toda ordem a que estão sujeitos. Não é, pois, sem razão que se diz que pobre não fica velho.

V - Pensamentos a caminho da prédica

A pregação deve levar em consideração que a velhice é uma fase de reexame de valores. O que é vida? Por que vivi? Que fiz com minha vida? O que ficará de tudo o que fiz? Qual o sentido da vida?

No auge das forças a pessoa humana luta pela realização de seus ideais. Em meio a esta luta poucos são os que param para refletir. Agora, na velhice, há um questionamento de tudo o que se fez e deixou de fazer. Os valores pelos quais se lutou com todas as suas energias são reexaminados. Isto pode gerar uma crise e uma tendência a atribuir valor relativo às coisas. Esta crise, porém, pode levar a uma busca por valores mais duradouros. A vida passa a ser encarada a partir de uma dimensão mais abrangente que transcende os altos e baixos da transitoriedade. A preocupação pelo ter e o fazer cedem espaço ao ser.

Com a decadência das forças físicas e psíquicas ficam igualmente restringidas a autonomia e a confiança no seu próprio eu. A necessidade de confiar num tu, em cujas mãos se tem a sensação de estar bem guardado, que dá sustento e serve de ancoradouro, se torna algo existencial. Não é por acaso, pois, que na velhice muitas pessoas tornam a voltar-se para a igreja em busca de consolo, paz e sentido para a vida. A velhice é, via de regra, um período de grande receptividade para a pregação.

A pregação deve evitar o consolo barato e resistir à tentação de apresentar as coisas como insignificantes e pintá-las de cor-de-rosa. A pessoa idosa quer ser levada a sério. Os problemas não devem ser encobertos, mas encarados com realismo. Isso evitará que sejam reforçadas as tendências de fugir da confrontação com a realidade, que muitas vezes acompanham o processo de envelhecimento.

Outro perigo consiste em se pintar um quadro por demais negro da situação. Neste caso a pregação torna a forma de uma lamentação desesperançada que gera depressão.

A tarefa da pregação evangélica consiste em deixar transparecer a esperança no Deus que se solidariza com a fraqueza humana.

VI - Bibliografia

- Adicionar vida aos anos. Jornal Evangélico. São Leopoldo, 2ª. quinzena nov. 1979. p.7.
- BORNKAMM, G. PRESBYS. In: Theologisches Wörterbuch zum Nenen Testament. Vol.6. Stuttgart, 1956.
- BROCHER, T. Stufen des Lebens. Stuttgart, 1977.
- TOURNIER, P. Die Jahreszeiten unseres Lebens. Gütersloh.1977.
— Velhice é um problema da sociedade. Jornal Evangélico. São Leopoldo, 2ª. quinzena. 1979. p.6.


Autor(a): Lothar Carlos Hoch
Âmbito: IECLB
Área: Missão / Nível: Missão - Diaconia / Subnível: Missão - Diaconia e Pessoas Idosas (Instituições)
Área: Missão / Nível: Missão com Pessoas Idosas
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1980 / Volume: 6
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18243

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