Lucas 5.36 Jesus fez também esta comparação:
— Ninguém corta um pedaço de uma roupa nova para remendar uma roupa velha. Se alguém fizer isso, estraga a roupa nova, e o pedaço de pano novo não combina com a roupa velha. 37 Ninguém põe vinho novo em odres velhos. Se alguém fizer isso, os odres rebentam, o vinho se perde, e os odres ficam estragados. 38 Não. Vinho novo deve ser posto em odres novos.39 E ninguém quer vinho novo depois de beber vinho velho, pois diz: “O vinho velho é melhor.”
PRÉDICA INAUGURAL DO ANO DE 2019
“Dói meu coração ao ver que o maldito pagão arrogante tem enganado e feito de tolos com suas palavras falsas tantos ótimos cristãos”.
Martin Luther
Prezada comunidade.
2019 entra em cena na nossa vida.
Sempre que o novo acontece, além daquela sensação de desconhecido, novas expectativas surgem. Nosso desejo é que sempre sejam as corretas e agradáveis. Novo ano é também a oportunidade de ser igreja nova. Pontuando a sociedade como sendo a IGREJA DA PALAVRA, podemos falar palavras para a edificação do novo. Podemos usar todas nossas palavras de forma adequada sabendo que elas sempre vão trazer consequências.
A PALAVRA, segundo entendo e estou convicto, nos mantém alertas contra a arrogância do engano. O engano faz com que bons cristãos facilmente se tornem tolos. No entanto, a fundamentação da PALAVRA ✈verbo✉ encarnado, Jesus Cristo, faz nosso coração novamente encontrar o equilíbrio no ritmo, para que seja esperança para o novo.
NÃO SE REMENDA ROUPA VELHA COM PANO NOVO BEM COMO NÃO SE ARMAZENA VINHO NOVO EM RECIPIENTE DE COURO VELHO
Colocar remendo novo em pano velho causa uma rasgadura ainda maior. Pano que já encolhei sendo remendado por um ainda não incolhido aumenta duplamente o prejuízo. Por isso se remendava camisa velha com pano velho. Caso contrário, estragaria também uma camisa nova. Algo insenstato.
Precisamos de remendos para nossa vida em sociedade? Estamos buscando soluções. Corremos sério risco de errarmos – e colheremos consequências de nossos erros – quando não observamos os primeiros movimentos dos novos governantes. E qual nossa forma de agir neste momento? O que se espera de nós? Da Igreja de Cristo e do povo cristão? São questões pertinentes, afinal, fomos convocados a tratarmos do tema IGREJA, ECONOMIA e POLÍTICA por mais um ano.
Foi para abraçar estas questões que escolhi o texto de Lucas 5 onde se descreve uma rotina caseira de remendar vestimentas ou de armazenar vinho em odres. (Quando se abatia, por exemplo, uma cabra, tiravam-se a carne e os ossos com cuidado para não furar o couro. Desta forma se obtinha um recipiente para líquidos, como o vinho. No início esses odres eram bastante elásticos. Com o passar do tempo, tornavam-se rijos. O vinho novo, ao fazer pressão em odres velhos, facilmente o romperia.) Estou bem ciente de que estou tirando o texto do seu contexto – não trataremos aqui da questão do jejum, assunto que mereceu a ilustração da pequena parábola aqui usada –, e o faço utilizando o texto como fruto da sabedoria popular da época de Jesus. Assim me parece ser.
EVANGELHO NÃO É REMENDO
Embora em outro contexto, Jesus claramente quer dizer que a mensagem do Evangelho não está aí para colocar remendos em velhas tradições, nem para satisfazer os gostos e preferências de alguns. Mesmo que um vinho velho possa parecer excelente, Jesus convida para que experimentemos algo novo, algo que possa nos surpreender neste novo ano. O que é novo, definitivamente não serve como remendo. Tudo deve ser novo.
Vamos tentar ver como?
GRAÇA E FÉ QUE RESGATA A CONFIANÇA
Quem não crê não compreende o Evangelho.
Somente por graça e fé é possível ver além e perceber as maravilhas divinas. Pelo fato de o Evangelho ser tudo o que a igreja tem a oferecer ao mundo em que estamos inseridos, tratamos o Evangelho não como um mero remendo, mas sim como algo surpreendentemente novo.
Por estarmos envoltos em tanta escuridão de pecados – lembremos que hoje o calendário litúrgico nos diz que é domingo de Epifania, revelação de nosso Senhor Jesus Cristo através de estrela brilhante – significa que o Evangelho ainda permanece obscurecido em boa medida.
Repito a frase de Martin Luther: “Dói meu coração ao ver que o maldito pagão arrogante tem enganado e feito de tolos com suas palavras falsas tantos ótimos cristãos”. Ou seja, a ação de Jesus é tremendamente renovadora ao apresentar a toda pessoa que crê na graça de Deus a gratuidade do perdão e da justificação. E isto não tem preço, não tem custo por ser graça divina – mesmo onde a igreja acaba fazendo a vez de uma organização da economia de livre mercado, fazendo do evangelho uma mercadoria.
Mas há uma condição a cumprir nesta compreensão do que é evangélico: acolher o que Deus oferece. É tomar posse deste presente de Deus, agarrá-lo e não mais abrir mão desta graça a partir da fé.
É um ato de confiança no presente de Deus voltar a fazer o que Ele deseja que seja feito de fato e de verdade: amar a Deus acima de todas as coisas e amar a pessoa ao seu lado, assim como cada pessoa também se ama.
Esta novidade tem consequencias não apenas espirituais ou emocionais. Ela repercute em seu corpo físico e na sociedade onde se convive e interage. A fé no Evangelho, na boa-nova de Cristo, se articula na confissão, se exprime numa correta visão da realidade e têm atitudes concretas da expressão do novo – Evangelho – na sociedade.
A SOCIEDADE NÃO PRECISA DE REMENDOS
A vida das pessoas que compõem a igreja traz a realidade obscura da sociedade para dentro da convivência cristã. E, podem crer, isso é muito bom. Bom porque não podemos dar as mãos a uma cosmovisão dualista. Somos pessoas chamadas para sermos autênticas em todos os lugares, protaganistas do Evangelho dentro e fora dos muros da Igreja. Não podemos “espiritualizar a instituição eclesiástica e o que lá acontece para não corrermos o risco de colocar o ser humano no lugar de Cristo.
“Se a Trindade [na sua integralidade] é negligenciada, a humanidade de Cristo é espiritualizada e a criação é reduzida a uma mera experiência emocional” (Schwarz, Christian A. Mudança de paradigma ne Igreja. Editora Evangélica Esperança. 2001). Em outras palavras, a sociedade humana com sua cultura, arte e ciência precisa fazer refletir sua realidade e sua posição diante da Trindade. E esta realidade precisa ser confrontada com a vontade santa de Deus para com toda criatura com sua cultura, arte e ciência.
A sociedade precisa da Trindade. A unidade de Pai, Filho e Espírito Santo é a revelação completa de Deus a partir da Cruz de Cristo; um Deus relacional entre si para que cada uma de suas partes se relacione com as pessoas de tal maneira que promova transformação profunda e duradoura.
O TIPO DE CRISTÃO QUE A SOCIEDADE NECESSITA
Normalmente se entende que a pessoa cristã está caracterizada por um certo número de limites a que está submetida. Esta é uma visão externa. Internamente, ou seja, dentro do convívio cristão, também são colocadas linhas demarcatórias. Se a pessoa apresentar uma vida dentro da doutrina correta + comportamento correto + visão política correta = faz parte do nosso time. O esquema do limite acaba definindo que é e quem não é cristão.
A sociedade obscurantista definitivamente não precisa do tipo de cristãos que se submete e submetem outros a certos critérios morais. A sociedade precisa de pessoas cristãs que espelham as atitudes integrais de Cristo, que espelhem a Trindade. A sociedade precisa de pessoas cristãs que experimentaram a mudança de direção em sua própria vida – conversão –, ou seja, ao invés de se dirigir para longe de Jesus, passar a se mover para cada vez mais perto dele. A sociedade precisa da pessoa cristã liberta da lei e do pecado que abraça e arrasta consigo outras pessoas para uma vida de justiça e paz.
A pessoa cristã escolhe a transformação do estado atual das coisas com o bom senso da PRUDÊNCIA porque considera que aquilo que faz agora terá consequências no futuro. Faz suas escolhas com a mente alargada. A pessoa cristã age com RECATO porque sabe que é livre para ser e viver, e vê o 'tu' como mais importante que o 'eu', sem se rebaixar. Ama o próximo como a si mesmo. Usa de moderação e temperança. Usa de respeito para com a tradição cristã porque foi edificada e consolidada por gerações. Toda pessoa cristã tem anseio pela JUSTIÇA. Por ser balizada pela pessoa que está ao meu lado, pelo próximo, a JUSTIÇA deve incluir a honestidade, o respeito, a verdade, a fidelidade para com o outro. Por fim a CORAGEM, a fibra de enfrentar o momento com determinação cristã a fim de que, no futuro, ainda seja mantida a liberdade de servir ao Senhor do Evangelho, Jesus Cristo, proclamando a justiça a partir do Seu amor (de minha carta enviada às lideranças da Paróquia em 0utubro de 2018).
A NATUREZA DO PENSAMENTO EXISTENTE NA SOCIEDADE
É necessário aprofundar um aspecto.
Vivemos com muita intensidade a polarização ideológica. Ainda! São remendos e mais remendos usados sobre outros inúmeros remendos ✈as pessoas que não concordam filosoficamente comigo, por favor, permitam-se avaliar minhas palavras✉. São os remendos ideológicos usados e abusados em nossos dias.
Um definição que parece cabível para o assunto é:”Ideologias são estruturas sofisticadas que pretendem justificar alguns pensamentos e algumas ações e têm a capacidade de blindar estes pensamentos contra a própria precariedade e contra suas mentiras (de minha carta enviada às lideranças da Paróquia em 0utubro de 2018).
No sentido contrário, a liberdade do Evangelho que, repito, não é remendo, mas é o novo, declara que a pessoa cristã não depende da submissão a critérios morais, institucionais ou ideológicos. Cristã é a pessoa que se submete ao Evangelho de Cristo Jesus, com todas seus nuances fundantes.
Desta forma, podemos declarar a nossa libertação dos “-ismos” vigentes. Individuaismo. Fundamentalismo. Tradicionalismo. Liberalismo. Conservadorismo. Espiritualismo. Relativismo. Clericalismo. Quietismo. Legalismo. Separatismo. Isso para ficar na esfera eclesiástica e sem entrar na área ideológica partidária. Por mais que alguns desses “-ismos” possam representar nossa forma de pensamento, sempre vão ocasionar polarizações desnecessárias. Elas ajudam muito mais a perder o senso de realidade do que resgatar a objetividade da fé e ação baseada no Evangelho. Sim, os “-ismos” possuem a capacidade de tornar a realidade obscura e embassada; a forma de ver a realidade, o empírico, é prejudicada pela nuvem da imprecisão. Pior que isso, as premissas filosóficas por detrás das ideologias acabam promovendo exclusão. Isso não é Evangelho!
Embora este tipo de pensamento esteja regendo as relações em nível mundial, na Igreja é diferente. Enquanto pessoas - também entre aquelas que “vão à Igreja - estão batalhando umas contra as outras, o desenvolvimento saudável e orgânico do Evangelho de Cristo fica prejudicado ou até totalmente fora de cogitação. Mas na Igreja é diferente, repito.
O CENTRO DE TODA ATUAÇÃO EVANGÉLICA
Igreja é a reunião ativa em amor das pessoas que creem no Evangelho. ”Quem não crê, não compreende o Evangelho”, disse acima. E quando não compreendemos o Evangelho, não compreendemos a natureza de Deus e Sua ação em nossos dias, em nosso contexto. Não entendendo isso, também não entenderemos a natureza da Igreja.
A partir do ferramental que se chama Evangelho, e no seu propósito de indicar e elucidar a Trindade, Igreja é o lugar onde o novo torna tudo novo, de novo. E mais, a Igreja Cristã é protagonista no ineditismo. No culto da véspera de Natal, dizia: “O conceito revolucionário que o Natal de Jesus Cristo traz ao mundo é que a Palavra Criadora se encarna na humanidade. (…) Isto implica em reconhecer que Jesus é o fim das especulações sobre a nossa existência. Deus está concretamente entre nós. Recria a nossa vida a partir da fé!
E é isso que queremos buscar neste novo ano. Aprofundar nossa fé na graça renovadora de Jesus Cristo, o Verbo-Deus-Emanuel entre nós.
Podemos juntos sonhar e agir?
Atentando ao exemplo de Jesus, vamos colocar vinho novo em odres novos, sabendo que a sociedade não sobreviverá com remendos, e sim com o novo; sejamos o tipo de cristão que a sociedade precisa ver, usando as palavras de forma saudável e agindo com modéstia, prudência, justiça e coragem; cuidando para não nos deixar iludir pelos “-ismos” que segregam e abafam a vontade do Evangelho; simplesmente deixemos Jesus Cristo ser o centro de toda a atuação em nome do Evangelho.
Prezada comunidade,
Conclamo para sermos Igreja com um posicionamento responsável e maduro diante dos desafios que temos à nossa frente. Juntos poderemos fortalecer o testemunho evangélico da reforma nesta cidade. Também aqui a promessa de Jesus - “Deixo com vocês a paz, a minha paz lhes dou” - está em pleno cumprimento.
E que a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e vossa mente em Cristo Jesus.
Amém!