Neste final de 2011, fui visitar meu cunhado em São Gabriel (RS). Gosto muito daquela região da fronteira e tenho admiração pelo sotaque que transparece nas vozes daquela gente gaúcha. Foi na tarde do dia 31 de dezembro que me sentei debaixo da bergamoteira, na companhia da minha sobrinha Paola.
- Tio! A mãe disse que o senhor é pastor e que pode me dar uma “mãozinha” sobre a “palavra da Bíblia” que a professora de religião pediu para interpretar...
- Legal Paola! E que palavra bíblica é esta?
- Aqui ó Tio... Está escrita em Filipenses 3.13-14. Já li umas seis vezes, mas não entendo muito não: “Uma coisa eu faço: esqueço aquilo que fica para trás e avanço para o que está na minha frente. Corro direto para a linha de chegada a fim de conseguir o prêmio da vitória. Esse prêmio é a nova vida para a qual Deus me chamou por meio de Cristo Jesus.”
- Hummm! Interessante...
Ali, bem à minha frente, estava uma menina com olhos negros, cheia de curiosidade e expectativa para ouvir explicações de um tio pastor em férias num recanto gaudério. Acomodei-me na cadeira preguiçosa, sorvi mais um gole do verde chimarrão e reli o texto de Paulo. Ela, a minha sobrinha, me olhava, esperando resultados...
- Vamos lá Paola... O Natal passou – certo?
- Certo tio!
- Agora há pouco vi tua mãe jogando os restos dos ramos de cipreste que formavam a coroa de advento que estava sobre a mesinha da sala de vocês no lixo – certo?
- Certo tio!
- Os presentes que você recebeu no dia 24 já perderam um pouco do encanto – certo?
- Os senhor está certo tio!
- Agora, reflete comigo. O novo ano de 2012 já começa hoje à meia-noite. Sabe Paola! Por um lado eu me sinto um pouco entristecido pelo fato de já ter passado mais um ano de vida. Por outro, me sinto animado em relação ao futuro que vem aí.
- É! Eu já notei que o senhor tem certa dificuldade de se desfazer daquilo que conquistou. Ouvi a tia dizendo pra minha mãe que o senhor sofre com mudanças; que é meio conservador.
- Você é uma menina perspicaz. Sim, é verdade. Gosto de segurar algumas das minhas conquistas. O problema é que a “roda do tempo” continua girando implacavelmente e, tanto eu como você, nós não temos a mínima chance de ficarmos parados.
- Minha professora falou que precisamos dar passos à frente; deixar coisas velhas para trás; articular novos começos.
- E ela está certa Paola. O problema de quase todas as pessoas é que elas gostariam muito de fazer as duas coisas: Abraçar-se ao que deu certo e não poupar esforços no sentido de continuar conquistando o que lhes agrada.
- Tio! Ainda não estou entendendo o texto de Filipenses 3.13-14...
- É verdade Paola. Ficamos filosofando e tudo continua um pouco obscuro... O Paulo escreve que “esquece aquilo que fica para trás e que avança para o que está à sua frente.” (Filipenses 3.13)
- Será que daria para se dizer que o apóstolo está se declarando uma pessoa aberta para novas idéias e, ao mesmo tempo, focado no seu objetivo?
- Muito bem Paola! Paulo deixa claro que o passado não é capaz de detê-lo. Essa palavra sempre me impressiona.
- Por quê tio?
- Porque nela Paulo mostra toda a força; toda a energia que ele aplica para enfrentar os fatos que ainda virão pela frente. Nada pode detê-lo no seu intento.
- Acho que entendi. Quando o apóstolo escreve que “esquece”, ele não está comunicando o “esquecimento” dos fatos passados, mas deixando claro que estes fatos ocorridos não vão impedí-lo de continuar nos seus propósitos.
- Ótimo Paola. Paulo está abdicando dos acontecimentos passados e, ao mesmo tempo, avançando; investindo todas as suas forças e energias naquilo que, para ele, vale a pena.
- Tenho a impressão que o apóstolo esteja se mostrando um tanto ansioso para “mergulhar de cabeça” no novo projeto que tem pela frente.
- Isso! Isso Paola... Tua conclusão se mostra correta na leitura de Paulo: “Corro direto para a linha de chegada a fim de conseguir o prêmio da vitória.” Explique assim o texto na aula de Religião e vais te dar bem - odes ter certeza.
- Mas ainda falta alguma coisa tio...
- Você ainda pode colocar uma “cereja no bolo”.
- Como assim?
- Desafia tua professora e teus colegas a se perguntarem: Como é que isso é comigo? Onde é que eu me seguro para sobreviver no dia-a-dia? Quais são os meus objetivos? Eles perderão sua validade em um, dois ou 10 anos? Persigo um objetivo que valha a pena ser perseguido?
- Nossa tio... Deixa eu anotar isso...
- Sabe Paola. O Paulo sempre foi um sujeito que perseguiu “o prêmio da vocação celestial de Deus em Cristo Jesus” (Filipenses 3.14 b). Ou seja, ele sempre foi em busca da vida eterna que Deus reservou para ele. Esse sempre foi o seu foco de vida. Para ele, os outros objetivos se mostravam pequenos, quase inúteis. Paulo queria viver ao lado de Deus, o resto era história.
- Tio! Também tenho vontade de fazer isso: viver minha vida com Deus e gastar meu tempo; minha energia para alcançar este “prêmio”. É sério... Eu gostaria de investir tudo de mim para alcançar este objetivo. Como eu faço?
Eu estava estupefato. Ali, diante de mim, estava uma menina de 13 anos de idade, inteligente como ela só. Por um momento imaginei-a teóloga, atuando numa das Comunidades da IECLB como missionária; como catequista; como diácona ou como pastora. Neste instante nosso diálogo foi quebrado pela sua mãe, minha comadre que, mesmo simpática, acabou quebrando nosso diálogo.
- Paola! O tio está de férias. Vá terminar as tuas tarefas.
- Vá Paola! Continuamos a nossa conversa amanhã...