Paróquia Ferrabraz

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Quem são @s chamad@s? | Lucas 5.1-11

16º Domingo após Pentecostes

12/09/2021

 

Amados irmãos, amadas irmãs,

Jesus se sente apertado. São muitas as pessoas que desejam ouvir as suas palavras. Não houve outra solução a não ser entrar no barco de um simples pescador e fazer do barco um púlpito, o lugar de seu ensino, de sua pregação. Os discípulos, por sua vez, cansados e frustrados por lançarem as redes por toda a noite e não pegarem nada, param para ouvir o seu ensino. Inclusive Pedro ofereceu o seu próprio barco. Eles mal sabiam que muito lhes iria acontecer naquele dia. Fatos que mudaram as suas vidas, bem como toda a história. Este é o cenário onde o nosso texto se encontra: barcos, o som das ondas do mar, várias pessoas, etc. Mas o que havia de tão especial nesse Jesus Cristo para que as pessoas o seguissem até ali? O que havia de tão inédito e novo em seu ensino? Quem realmente é Jesus Cristo e quem são os pescadores? Que tipo de pessoas Jesus Cristo chama ao seu seguimento? Podemos encontrar vários tipos de pessoas neste texto:

1 PESSOAS SIMPLES

As pessoas cujo texto nos relata são pessoas simples. Possivelmente muitas pessoas seguiam a Jesus, ricas e pobres. No evangelho isso é notado em várias passagens como, por exemplo, Lucas 19.1-10 onde nos é relatada a história de Zaqueu, um publicano e rico. Contudo, o texto lido se refere a um tipo específico de pessoas: as simples.

Essas pessoas são pescadores, trabalhadores braçais que muito provavelmente não possuíam uma renda salarial muito alta. Tudo o que recebiam provinha da pesca. Os seus salários e o sustento de suas famílias dependiam disso. Esse tipo de pessoa era fortemente discriminado na época, e, como hoje se diria, são da classe social baixa.

Lidar com o mar todos os dias não é uma tarefa fácil. É preciso preparar as redes, entrar no mar, com o detalhe de que não havia motores nos barcos como hoje em dia, mas eram impulsionados a mão, na força braçal. Pescar não é algo tão fácil, pois precisa-se esperar que peixes mordam a isca ou caiam na rede. Às vezes o mar não está para peixe e o sustendo das famílias dos pescadores acaba os preocupando. Se não pescam os peixes, não tem sustento para o lar. São pessoas com uma renda baixa, mas que lutavam no dia a dia para o sustento familiar e para a administração da casa.

Jesus, ao contrário de muitos da época, não rejeitou os simples. Mas é exatamente com estes que inicia seu ministério, sua história. Jesus não apanha apenas grandes e bem-sucedidos, mas justamente escolhe os que nunca eram escolhidos, aqueles que se encontravam à margem da sociedade. Jesus sempre estava ao lado daqueles que necessitavam de seu auxílio: o povo que sofria. Para os simples ele compartilha o seu ensino e a estes famintos fornece sua palavra. Ele não pede grandes altares ou púlpitos, mas um barco basta para que possa lhes anunciar a sua mensagem. O simples barco de um simples pescador serve de púlpito ao Deus que se torna simples.

Jesus não faz exclusão. Todos são chamados a ouvir o seu ensino e a segui-lo. Não importa quanto cada pessoa tenha ou o que ele faz, todos são chamados a aceitar o seu convite, a se achegar à sua praia para ouvir aquilo que ele possui para dizer. Ele mesmo foi filho de um carpinteiro, pelo menos de criação. Não nasceu em uma família real com muitos bens, mas Deus escolheu nascer em um simples rancho na cidade de Belém. De uma mulher simples e de um simples carpinteiro. Este Deus carpinteiro se compadece das dores dos que sofrem e das preocupações dos simples de forma que estas pessoas simples também podem seguir a Jesus, também recebem o convite onde quer que estejam. Por nascer em um contexto simples Jesus conhece a situação dos simples.

2 PESSOAS QUE EXPERIMENTARAM FRACASSOS

O mundo de hoje é essencialmente religioso. Porém, o próprio mundo não sabe disso. O sistema religioso está impregnado no modelo de sociedade vivido hoje. Isto pode ser notado muito facilmente.

Fala-se muito na atualidade de sucesso. As pessoas precisam, a todo custo, se dar bem na vida, caso contrário, experimentarão aquilo que chamam de fracasso. Viverão em solidão e serão facilmente descartadas por não serem consideradas úteis. Salvação e céu hoje em dia já não são valores bíblicos da promessa da eternidade, mas, chegar ao céu é já aqui para o mundo atual, chegar ao céu é subir na vida, ser bem-sucedido, ser bem-visto pelos outros, pela sociedade. Inferno, em sua vez, é o fracasso. Quando alguém não consegue alcançar o sucesso, o bem-estar, ele é imerso no inferno social. Céu é sucesso, fracasso é inferno. Conceitos da religião das quais a sociedade se apropriou para a sua organização. Neste modelo, já não existe graça, muito menos perdão. Chegar primeiro se tornou mais importante do que chegarmos juntos. As pessoas procuram seu céu aqui.

Quando Jesus terminou a sua prédica, ele pediu a Simão Pedro que retorne ao mar para pescar. Simão e seus colegas pescadores se encontravam no abismo do fracasso, ou seja, em um inferno social. Tinham pescado toda a noite sem pegar um peixe sequer. Eles sabiam que o trabalho foi em vão. Estavam, com certeza, cansados, mas ainda trabalhavam para compensar a perda que tiveram, lavando as suas redes.

Jesus se compadece da situação deles. Importa-se com eles como um irmão. Se importar com alguém significa trazer alguém para dentro de mim, importar, ou seja, portar para dentro, trazer para dentro. Jesus os importa, não vê o fracasso que haviam tido, mas vê trabalhados cansados, frustrados que precisavam de ajuda. O Deus cristão não rejeita os fracassados na vida, mas os acompanha de perto. Aliás, é exatamente isso que Deus faz conosco: Deus é Emanuel que significa o Deus conosco, sim, conosco, presente em nossas frustrações, prejuízos, angústias, estresse etc. Mas não somos, muitas vezes, fracassados apenas socialmente ou economicamente, mas também quanto ao pecado. Mesmo que tentemos não pecar, quando nos damos conta, já estamos pecando. Mesmo fracassados quanto ao pecado, o Pai amoroso se compadece de nós e envia seu Filho Jesus Cristo para morrer por nós e nos livrar de nossos pecados. Jesus Cristo assume o fracasso humano na cruz para que nós pudéssemos ser tornados justos. O justo se torna injusto para que nós, os injustos, fôssemos tornados justos.

Jesus Cristo entra no barco da nossa vida, no barco dos fracassados e procura animar o triste com seu amor, sua misericórdia. Este Deus não exige méritos e obras do ser humano para que o ser humano seja salvo, mas o acompanha justamente naquilo que deixa de fazer. Deus ama o ser humano por aquilo que é e por aquilo que não é. Contudo, isso não significa, de forma alguma, permanecer no pecado. O ser humano é convidado ao arrependimento e conversão onde Deus concede nova vida. É com os fracassados e loucos que Deus quer fazer a sua história. Com aqueles que admitem seu fracasso dizendo que não podem se salvar sozinhos, mas que precisam de alguém que está fora: de Jesus Cristo. Dietrich Bonhoeffer, pastor alemão morto na 2ª Guerra Mundial falou sobre a “graça barata”. Isto significa pecar porque Deus vai perdoar mesmo. Isto é baratear a graça de Deus, baratear o alto preço pago na cruz. Arrependimento é pedir perdão a Deus na convicção consciente de que não quero mais cometer aquele pecado. Graça barata, porém, significa pedir perdão pelo pecado de amanhã.

Enfim, também os fracassados são chamados. Embora a sociedade atual se chame de democrática, é notável que uns sejam chamados úteis e outros inúteis, ou seja, úteis e descartáveis. Mas, como os pescadores, o ser humano vale apenas por aquilo que pode produzir? Ou, é o trabalho que faz digno o homem? Não, o ser humano é digno por ser criado a imagem e semelhança de Deus. Os fracassados também podem seguir a Jesus, eles são dignos também. Jesus chama estes a tentar mais uma vez, a entrar no mar e pescar. Jesus as incentiva a não se entregarem ao fracasso, mas a lutarem pela vida. Uma luta que não se faz sozinho, mas unidos com outros cristãos. Nós somos chamados a ver os fracassados do mundo e falar a estes de Jesus Cristo. Talvez muitas pessoas tenham enfrentado o fracasso nestes tempos de pandemia. Também a estes Deus convida a não desistir, mas a tentar novamente.

3 PESSOAS OBEDIENTES E ENGAJADAS

Embora o cansaço e o fracasso, os pescadores eram trabalhadores que decidiram obedecer àquilo que Jesus os havia ordenado. Sabemos que a fé vem pelo ouvir da pregação e, com certeza, já brotava a fé nos corações dos discípulos de modo que creem e obedecem às palavras que Jesus ordenou. Não olharam para o cansaço, para o grande mar, mas para a última esperança de ter ainda um bom proveito do trabalho naquele dia: a ordem de Jesus. Não havia por que obedecer. Jesus era carpinteiro e não pescador. O que um carpinteiro iria saber sobre pesca? Algo diferente acontece com Pedro que a partir da ordem dada por Jesus decide ir e lançar as redes. Por que não tentar outra vez? Deve ter pensado. Aliás, Pedro já conhecia um pouco mais de Jesus, pois alguns versículos antes do nosso a sua sogra foi curada por Jesus. Pedro sabe que algo é diferente neste Jesus e que ele é a única esperança para que a família tenha comida naquele dia.

Jesus chama pessoas obedientes à sua voz. Ele deseja que os seres humanos o obedeçam, embora o ser humano nem sempre consiga o obedecer na totalidade. Quando ele ordena algo, ele espera que o ser humano cumpra conforme ele diz. Deus não ordena as coisas como juiz justo, pronto a castigar o ser humano quando não o obedece. Quando Deus fornece leis aos seres humanos deseja antes de tudo preservar a vida em sociedade para que o mundo não seja um caos. A lei é fornecida em amor ao ser humano, para que ele possa viver bem sobre a terra.

Pela fé, vinda da pregação de Jesus, somos todos convidados a obedecer a Jesus, deixar que ele conduza o barco de nossa vida, guie o nosso navegar sendo ele mesmo o Senhor. Quando ele chama, ele mesmo é quem conduz. Desta maneira, Jesus quer pessoas obedientes à sua ordem. “Tente mais uma vez”, aceite o meu chamado. Em meio ao fracasso, Jesus fala ao ser humano “tente outra vez”, assim como disse aos discípulos simples, frustrados e fracassados, mas obedientes.

4 PECADORES E INDIGNOS

Pergunto: Nós merecemos a graça de Deus? Não! A partir dos muitos peixes que pegaram ao ponto de terem que chamar outros barcos para auxiliarem no recolhimento de todos aqueles peixes, Pedro sabe quem é Jesus e olhando para si mesmo, não tem dúvida: reconhece-se como pecador. Pedro pede: “Senhor, afasta-te de mim, porque sou pecador”. Em outras palavras: Não sou eu digno de andar contigo. Não pela minha simplicidade, mas por causa do meu pecado. “Afasta-te de mim, porque sou pecador”.

Pedro sabe da sua culpa, sabe que não merece nada e que é pecador. Pedro entendeu que é indigno a qualquer benefício de Deus a seu favor. Ele não procura se auto justificar mostrando uma boa imagem perante Cristo, não procura mostrar o quão bonzinho ele é, mas reconhece a si mesmo como imerecido da graça e dos favores de Deus. Ele se prostra aos pés de Jesus em humilhação, reconhecendo que aquele que está na sua frente, o Cristo, é maior do que ele. Sim, Deus e homem conversam dentro de um barco e diante de Deus todo o pecado humano aparece, todo pecado é revelado.

Por causa disso, Jesus rejeitou Pedro? Não! Pelo contrário, Jesus Cristo é o Deus que desce ao mundo para resgatar o pecador de seus pecados e realizar a obra da salvação. Jesus não veio procurar entendidos da lei e homens que se dizem como exemplos a serem seguidos, mas buscou aqueles que reconheciam seus pecados, se entendiam como pecadores. Aliás, todos pecaram, mas nem todos reconheceram seu pecado.

Jesus deve ter olhado para Pedro para lhe afirmar: “Não tenha medo, estou te escolhendo para ser o meu pescador. Mas que pesca? Jesus, vais abrir um negócio de pesca? Não Pedro, serás pescador de homens!”. Desta forma, o Pedro simples, fracassado, obediente e pecador é chamado para auxiliar a Jesus em seu ministério. Pedro merecia? De forma alguma, da mesma forma como nós não merecemos.

Quando arrastaram os barcos à praia, largaram tudo e seguiram a Jesus. Jesus convidou indignos e pecadores ao seu seguimento. Já não há mais preocupação com o sustento da família, já não há mais frustração no trabalho, mas a entrega completa ao Senhor Jesus Cristo que nem casa e cama tinha, mas que ganha seu sustento na rua. Os pescadores largam tudo para seguirem um mendigo. Isso é o que Jesus Cristo foi: um mendigo a andar pelas ruas de onde vinha o seu sustendo na ajuda que as pessoas lhe davam, anunciando aos mesmos, aos que o convidavam a entrar em suas casas, a sua mensagem. Deus se faz mendigo, se faz homem simples para resgatar pecadores.

Deus não está longe do pecador, mas é com estes que começou a sua história. São estes simples, fracassados, pecadores que escreveram tudo o que viram e ouviram para que hoje pudéssemos ler esse texto, bem como todo o Novo Testamento, para que tenhamos hoje a Bíblia em nossas mãos, para lê-la e estudá-la. Jesus chama o considerado inútil e pobre. Os discípulos muitas vezes, em sua humanidade, passaram angústias, mas não deixaram de seguir a Jesus. Apenas Judas se afastou. Estes considerados fracos e indignos mais tarde defenderam a causa do evangelho com toda a sua força, engajando-se a levar esta mensagem aos povos vizinhos, estes que construíram as Igrejas e que inclusive foram mortos por causa da sua fé.

Nós também somos chamados. Não merecemos, pois também somos pecadores e possuídos de dores e tristezas diárias. Mas saiba que Deus olha para ti com compaixão. Quer fazer de ti um seguidor seu para proclamar sua palavra. Seja qual for a situação em que você se encontra, Jesus te convida e te acompanha. Jesus convida a ti para segui-lo, aliás, ele já fez tudo por ti. A graça é de graça. Que Deus em seu Espírito Santo te conduza ao reconhecimento do pecado e à necessidade de Jesus.

Amém!


16º DOMINGO APÓS PENTECOSTES | VERDE | TEMPO COMUM | ANO B

12 de Setembro de 2021


P. William Felipe Zacarias


Autor(a): P. William Felipe Zacarias
Âmbito: IECLB / Sinodo: Rio dos Sinos / Paróquia: Sapiranga - Ferrabraz
Área: Confessionalidade / Nível: Confessionalidade - Prédicas e Meditações
Área: Missão / Nível: Missão - Coronavírus
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 5 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 11
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 64270
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