Amados irmãos, amadas irmãs,

o Espírito Santo sopra onde quer (cf. João 3.8). Não! Não podemos controlar o agir do Espírito Santo. Não podemos determinar o que ele deve ou não fazer. Onde Deus quer agir, ele age! O Espírito Santo é dinâmico, criativo e surpreendente. Onde menos imaginamos, Deus sopra seu Espírito – Espírito de vida, o mesmo Espírito que já pairava sobre às águas antes da Criação de todas as coisas (cf. Gênesis 1.2). A terra era vazia e sem forma; as sombras das trevas cobriam tudo; mas o Espírito de Deus já estava presente, assim como o Filho, Jesus Cristo (cf. João 1.1ss).

No fim das contas, o Deus-Trindade é o único ser que é realmente livre. Deus age onde quer, quando quer, com quem quer e onde quiser. Deus é livre! O Espírito Santo nos faz esse lembrete! E quando Deus sopra seu vento, nada o pode conter! Contudo, Deus é coerente: Deus nunca irá agir de maneira contrária à sua própria Palavra! O Espírito Santo é o “Espírito da verdade” (João 14.17). O Espírito Santo não irá agir para a produção da mentira, do ódio, da vingança ou da violência. O Espírito Santo não é um vento destruidor, mas um vento inspirador: inspirador de vida, inspirador da verdade, inspirador de esperança, inspirador para a paz, inspirador para a unidade – na diversidade, não uniformidade; inspirador para o conhecimento de Deus; inspirador para a interpretação correta da Palavra de Deus. Eis o maravilhoso agir do Espírito Santo – fogo que aquece, que ilumina, fortalece e anima; vento que anima, que empurra, que preenche, que sussurra.

E o mais importante: o Espírito Santo nunca irá contradizer Jesus! A função do Espírito Santo é a de glorificar a Jesus e de levar a Igreja a glorificar a Jesus – tal qual Jesus é, verdadeiramente Deus e verdadeiramente humano! Assim nos diz 1 João 4.1-3: “Amados, não deem crédito a qualquer espírito, mas provem os espíritos para ver se procedem de Deus; porque muitos falsos profetas têm saído mundo afora. Nisto vocês reconhecem o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa isso a respeito de Jesus não procede de Deus; pelo contrário, este é o espírito do anticristo, a respeito do qual vocês ouviram dizer que viria e que agora já está no mundo.” Se algum espírito não afirmar a encarnação de Deus em Jesus Cristo, então não é o Espírito de Deus! O Espírito Santo não irá agir de forma contrária aos ensinamentos de Jesus; ao contrário, o Espírito Santo é que inculca em nossos corações os ensinamentos de Cristo. É ele quem nos convence do pecado, da morte e do inferno e da necessidade de arrependimento, mudança de vida e conversão.

Nesse sentido, o texto de Números 11.24-30 é muito importante. Moisés e o povo de Deus estão em peregrinação pelo deserto. A liderança do povo estava pesando nas costas de Moisés. Ele precisava de ajuda – partilhar as cargas. Então, sob a direção de Deus, Moisés reuniu setenta anciões entre o povo para que fossem reconhecidos como líderes do povo e como seus ajudantes. Quando Deus enviou o seu Espírito sobre eles, aqueles anciãos começaram a profetizar. Porém dois deles, chamados Eldade e Medade, não estavam presentes na tenda onde os outros sessenta e oito anciãos estavam. A distância, porém, não impediu que também Eldade e Medade recebessem o Espírito Santo. Josué, aprendiz e futuro sucessor de Moisés, pediu que Moisés os proibisse de profetizar. Moisés, porém, recusou, pois reconheceu o agir do Espírito Santo naqueles homens.

Sim! O Espírito sopra onde quer! Não o podemos tomar em nossas mãos! Não podemos o isolar com nossas próprias ideias! Não o podemos segurar e dizer ao Espírito Santo em quem ele deve agir. Na História da Salvação, Deus Pai e Filho sopram o Espírito Santo onde querem! É o mesmo Espírito Santo que desceu sobre os apóstolos no dia de Pentecostes em Atos 2, capacitando-os para a missão de pregar a mensagem da ressurreição de Jesus a “todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer” a tudo que Jesus lhes havia ordenado, confiantes da presença de Jesus entre nós até o fim dos tempos (cf. Mateus 28.18-20).

No livro de Números, o Espírito Santo é enviado para que Moisés fosse auxiliado na liderança do povo de Deus e para que a tarefa fosse partilhada; em Atos dos Apóstolos, o Espírito Santo é enviado para que todas as pessoas possam proclamar da ressurreição e da vida em abundância que há somente em Cristo Jesus! E o Espírito Santo – que já desceu, pois assim como a cruz e a ressurreição são eventos únicos na História da Salvação e não se repetem, da mesma forma o Pentecostes é um evento único que não é repetido – também hoje quer nos capacitar para que todos sejamos hábeis na proclamação da Palavra e à liderança comunitária! Sim! Todos nós! Vamos aos pontos:

 

1                ESPÍRITO DE TODOS/AS

 

O Espírito Santo não é dado a partir de méritos humanos, pois já nascemos no pecado e não possuímos mérito algum (cf. Salmo 51.5; Romanos 3.23). Mas o fato de sermos pecadores não significa que não possamos receber o Espírito Santo de Deus. Ao contrário, é a pecadores que ele é concedido – para o arrependimento, mudança de vida e conversão.

Josué quis ser seletivo ao agir do Espírito Santo. Sim, o futuro sucessor de Moisés queria controlar o agir de Deus a partir dos méritos e das obras: estar presente na reunião. Deus, porém, mostrou que não pode ser controlado pelos desejos humanos. É preciso deixar Deus ser Deus para que possamos ser humanos – parafraseando Lutero.

A partir do Pentecostes, o Reino de Deus é para todas as pessoas! Sim! Aqui você tem lugar! É o próprio Espírito Santo quem testifica isso. O Espírito Santo não fez distinção entre os setenta anciãos. Mesmo Eldade e Medade estando distantes, também eles receberam o Espírito e profetizaram. Logo, a graça de Deus é um convite a todas as pessoas, concedida livremente por Deus, independentemente dos méritos humanos.

Por isso, o Pentecostes – de maneira prática – é um convite amoroso para que a Igreja Cristã hoje busque a igualdade, a fraternidade, a unidade na diversidade e o reconhecimento de que o Espírito Santo está presente onde menos imaginamos. Somos convidados/as a sermos Igreja que caminha na construção de pontes e não de muros, uma igreja descentralizada, diaconal, envolvente, que convida a todas as pessoas – sem distinção ou preconceitos – para comporem um grande mutirão pela vida e vida em abundância! Igreja que valoriza os diferentes; Igreja que promove a paz; Igreja que age com amor; Igreja que vive como Jesus viveu – afinal, ela mesma é Corpo de Cristo!

Deus chama a gente pr’um momento novo de caminhar junto com seu povo. É hora de transformar o que não dá mais; sozinho, isolado ninguém é capaz. Não é possível crer que tudo é fácil. Há muita força que produz a morte, gerando dor, tristeza e desolação. É necessário unir o cordão. A força que hoje faz brotar a vida atua em nós pela sua graça. É Deus quem nos convida p'ra trabalhar, o amor repartir e as forças juntar. Por isso vem Entra na roda com a gente, também. Você é muito importante.^[1]

 

2                ESPÍRITO DE COLABORAÇÃO

 

O Espírito Santo descentraliza o poder. A graça de Deus não está limitada a uma elite espiritual de certos líderes religiosos “aparentemente superpoderosos”. Através do agir de Deus na história do seu povo em Números, aprendemos que todo o povo deve ser profético, ou seja, deve falar da Palavra de Deus – e não apenas o líder religioso. A tarefa da missão não é uma tarefa restritamente pastoral, mas comunitária! É a comunidade quem faz missão através dos seus gestos, palavras e ações; ou, pra ficar com o Planejamento de Ação Missionária da IECLB, o PAMI, a Igreja faz sua missão através da evangelização, comunhão, diaconia e liturgia. Vamos às definições:

Evangelização: é a exposição de que Deus ama e aceita o ser humano de forma incondicional e deseja relacionar-se em termos pessoais e comunitários. A dimensão da evangelização nos coloca diante do objetivo de testemunhar o Evangelho de Jesus Cristo a todas as pessoas no contexto de sua vivência.

Comunhão: é a vivência da fé em Jesus Cristo na vida comunitária. A dimensão da comunhão nos coloca diante do objetivo de proporcionar espaços de convivência, aceitação e valorização de todas as pessoas em nossa vida comunitária.

Diaconia: Diaconia significa serviço. A dimensão da diaconia nos coloca diante do objetivo de praticar a misericórdia e a justiça, concretizar solidariedade com pessoas em situação de necessidade e de crise, sempre em busca da transformação.

Liturgia: é a celebração do amor de Deus. Ela é o conjunto de elementos e formas utilizados para a realização do culto. A dimensão da liturgia nos coloca diante do objetivo de oportunizar a celebração do amor de Deus no mundo.^[2]

 

Não existe Igreja sem a colaboração entre seus membros. Igreja não vive competição, mas colaboração. Um irmão ajuda a outro irmão; uma irmã ajuda a outra irmã, e assim, o peso se torna mais leve para todos/as. O pastor não deve agir sozinho e carregar as comunidades/paróquia nas costas; o presbitério não deve agir sozinho levando as comunidades/paróquia nas costas! É preciso colaborar! É preciso contribuir! É preciso colocar mãos às obras! Sim, é preciso também colocar a mão no bolso!

Vem ajudar! Há lugar pra você! Há algum grupo em que você pode participar e colaborar com a Missão de Deus – que é nossa Paixão! Venha como estás e serás recebido/a e bem acolhido/a. Venha fazer missão! Venha participar!

 

3                ESPÍRITO E PROCLAMAÇÃO

 

Como pessoas batizadas, somos chamados/as a falar e agir de acordo com a Palavra de Deus – Palavra que sempre aponta para a justiça, a misericórdia e a esperança. A verdadeira profecia não é ter uma “vidência” do futuro, mas a leitura com discernimento do nosso contexto para que possamos agir contra a injustiça e pela transformação do mundo. É o Espírito Santo concedido em Pentecostes que nos capacita para essa tarefa.

Assim, podemos todos proclamar do amor de Deus. Lembro aqui das metas missionárias da IECLB: “META 1 – Uma Igreja que valoriza o sacerdócio geral, capacita as pessoas e aprofunda a fé para seu testemunho na Igreja e no mundo”^[3]. Ou seja: através do nosso batismo, todos somos vocacionados ao sacerdócio através das nossas profissões. Assim, servimos a Deus por meio do próximo! A missão da Igreja é sua missão e sua paixão? “META 2 – Uma Igreja aberta que proclama o Evangelho contextualizado em favor de todas as pessoas e da Criação de Deus”^[4]. Ou seja: comunicação eficaz do Evangelho para a evangelização daqueles que estão distantes do Evangelho e que em nossa vivência evangélica todas as pessoas têm lugar. “META 3 – Uma Igreja atraente e acolhedora, que reflete e inclui a diversidade em suas Comunidades”^[5]. Isso significa a capacitação de pessoas batizadas para o exercício prático do acolhimento diante da diversidade étnica, cultural, social e de gênero. “META 4 – Uma Igreja comprometida com a justiça, a paz e a reconciliação que promove vida digna”^[6]. Isso significa agir além das paredes ou das cercas das comunidades, buscando justiça econômica, de gênero, étnica, socioambiental e diálogo ecumênico. “META 5 – Uma Igreja sinodal bem conduzida, democrática, transparente, conectada e sustentável”^[7]. Isso significa uma Igreja em que todos tem voz e em que os membros têm parte nas decisões da vida comunitária. Na IECLB, as coisas não vêm “de cima para baixo”, mas “de baixo para cima”. Somos uma igreja democrática!

A partir da vinda do Espírito Santo, sejamos voz que denuncia injustiças e que anuncia a esperança de um mundo transformado – novos céus e nova terra, o Reino de Deus!

 

Amados irmãos, amadas irmãs,

o Espírito já está entre nós! Que o Espírito Santo nos inspire a sermos uma igreja missionária; que o Espírito Santo nos inspire a sermos uma igreja com voz profética, mesmo que sejamos ameaçados ou perseguidos; que o Espírito Santo nos dê coragem para o testemunho e para a ação; que o Espírito Santo aqueça o chamado em nossos corações de sermos sal da terra e luz do mundo na medida certa; que o Espírito Santo nos ajude a sermos propagadores não da mentira, do ódio, da violência, mas do amor, da justiça e da paz; que o Espírito Santo nos impulsione para que a vida seja sempre mais criativa que as forças que produzem a morte; que o Espírito Santo nos anime a vivermos humanidade, empatia e solidariedade contra a desumanidade, antipatia e egoísmo; que o Espírito Santo nos toque para ofertarmos com alegria e não por obrigação.

Para terminarmos, convido a lermos juntos essa oração ao Espírito Santo escrita de maneira poética por Christina Rossetti (1830-1894):

Ó Deus, o Espírito Santo,

que és luz aos teus escolhidos,

sempre nos ilumine.

Tu que és o fogo do amor,

sempre nos incendeie.

Tu que és Senhor e Doador da Vida,

sempre vivas em nós.

Tu que concedestes a graça de Cristo,

sempre nos preencha.

 

Tal qual o vento é teu símbolo,

assim impulsione nossos passos.

Como a pomba, nos lances rumo aos céus.

Como a água, purifique nossas mentes e corações.

Como a nuvem, suavize nossas tentações.

Como o orvalho, reavive nosso ânimo.

Como o fogo, purifique-nos de nossas impurezas.^[8]

 

Amém.

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DOMINGO DE PENTECOSTES | VERMELHO | CICLO DO TEMPO COMUM | ANO A

16 de Abril de 2023

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P. William Felipe Zacarias