Amados irmãos, amadas irmãs,
estamos diante de uma das parábolas de Jesus mais conhecidas em todo o mundo. Em todos os séculos, cristãos têm sido impactados pela dramática história do filho que se perdeu dos braços do seu pai. E por mais que essa história seja bastante conhecida entre os cristãos, sempre que nos deparamos novamente com ela encontramos novas lições e novos aprendizados. A parábola do filho pródigo é uma fonte inesgotável de lições sobre o amor de Deus pelo ser humano. Por isso, é com muita alegria que teremos a oportunidade de nos debruçarmos sobre o mesmo texto bíblico por três domingos. A nossa oração é que o próprio Espírito Santo de Deus nos abençoe nessa jornada.
O capítulo 15 de Lucas é central no seu evangelho. Poderíamos dizer que as três histórias que o compõem são a obra-prima do evangelho de Lucas. Aqui encontramos o pastor que deixa noventa e nove ovelhas para ir atrás daquela que se perdeu (cf. Lucas 15.1-7), a mulher que com muita perseverança não desiste de encontrar uma moeda de muito valor (cf. Lucas 15.8-10) e a história de uma família onde dois filhos estavam perdidos do amor do seu pai (cf. Lucas 15.11-32). São três histórias onde pessoas amadas e uma moeda de muito valor estão perdidas, mas são encontradas.
A quem Jesus dirigiu estas palavras? Aos escribas e fariseus, ou seja, aos “religiosos” do seu tempo. Eles queriam mostrar a si mesmos como padrão de moral para a sociedade. Na sua visão, o Reino de Deus era constituído de pessoas que seguiam o rigor da lei e praticavam todos os rituais religiosos rigorosamente. Além disso, o cumprimento exagerado das leis não era apenas um motivo para agradar a Deus, mas para que pudessem fazer a sua reputação diante daqueles que não conseguiam fazer o mesmo. Cumpriam o rigor da religião por mera aparência. Porém, em seus corações havia apenas orgulho e podridão. Eram sepulcros caiados: bonitos por fora, mas podres por dentro. Seus corações estavam contaminados pela arrogância, pela indiferença e pela prepotência. Nos fariseus e escribas, não havia amor algum.
Qual era a acusação destes “religiosos” contra Jesus? “Os fariseus e os escribas murmuravam, dizendo: – Este recebe pecadores e come com eles.” (Lucas 15.2). Qual era o “problema” de Jesus? Ele recebia e comia com os pecadores. Os fariseus não poderiam aceitar isso de maneira alguma. Na mesa de Jesus estão incluídos os marginalizados da sociedade, aqueles que todos querem que estejam bem longe... Jesus inclui os excluídos, escolhe os que nunca são escolhidos e ama os odiados. Os fariseus não poderiam aguentar algo assim. Isso era algo totalmente contra os seus padrões morais. Enquanto os “religiosos” repelem para longe de si os pecadores, Jesus os traz para perto; enquanto o “religiosos” querem que os pecadores estejam o mais distante possível deles, Jesus os traz para uma refeição; enquanto os “religiosos” queriam ser aceitos e amados pelo que faziam, Jesus ama e aceita quem não tem nada a oferecer. Para os “religiosos”, aquelas pessoas seriam indignas do amor de Deus, o que Jesus – a Segunda Pessoa da Trindade – provou não ser verdade.
É nesse contexto que surge o lindo capítulo de Lucas 15. Jesus conta as suas três parábolas para desconstruir a religiosidade dos fariseus e escribas. As três parábolas mostram o amor que Deus tem pelos perdidos e indignos. Mais do que isso: Jesus demonstra claramente que nem sempre os que estão dentro da igreja são salvos e que nem sempre os que estão fora estão perdidos. A parábola da ovelha perdida demonstra isso com muita clareza. As noventa e nove ovelhas que estão dentro não se importaram com aquela única que se perdeu. Ah se não fosse o bom pastor!
Aliás, precisamos notar que ela não foi perdida, mas que ela mesma se desgarrou do rebanho, sendo atraída por novos horizontes, novas pastagens, novas aventuras, afastando-se do convívio das outras ovelhas, sem perceber o risco que corria de cair no abismo. As outras noventa e nove ovelhas poderiam julgá-la de diversas formas, fazer acusações duras e culpá-la por toda a sua desgraça; as noventa e nove ovelhas poderiam sentir orgulho por estarem dentro do aprisco enquanto aquela única decidiu sair do cercado; porém, onde está o bom pastor? Ele não está onde noventa e nove ovelhas sentem orgulho e arrogância por estarem dentro das tradições religiosas; ao contrário, o bom pastor deixa as noventa e nove para ir atrás daquela que se perdeu. Se ela não pode andar, ele a toma no colo; ele não a sacrifica, mas preserva sua vida. Da mesma forma o Senhor faz conosco ao não desistir de nos amar e abrindo mão da sua vida para que possamos viver com alegria e dignidade.
Só no pouco que ouvimos já percebemos o quanto Lucas 15 é um texto profundo, mas também provocador e que causa uma grande mudança de paradigmas. Ao entendermos esse texto, deveríamos experimentar uma profunda mudança espiritual, pessoal, profissional em toda a nossa vida.
A última história contada por Jesus neste capítulo é a parábola do filho pródigo. Ela se divide nos seguintes pontos: 1) a partida (cf. Lucas 15.11-13); 2) a miséria (cf. Lucas 15.14-16); 3) a contrição (cf. Lucas 15.17-19); 4) o retorno (cf. Lucas 15.20-21); 5) e a aceitação (cf. Lucas 15.22-24)1. Vamos começar a estudar essa história a partir de hoje. O que vamos fazer? Vamos olhar com mais atenção para as ações dos personagens da história, um por domingo. Começamos hoje com o filho mais novo; no próximo Domingo, olharemos para o filho mais velho; e então, no último domingo da série, olharemos para o pai amoroso. Vamos lá!
A partir do texto bíblico, quais são as características do filho mais novo?
1 ELE ERA FELIZ SEM SABER
O filho mais novo vivia na casa do pai com muito conforto. Nada lhe faltava. Na casa do pai, tinha tudo o que precisava à disposição. Além disso, todos aqueles bens já eram seus, pois tudo o que pertencia ao seu pai, também lhe pertencia. Além dos bens materiais, o filho mais novo tinha a sua disposição o grande amor do seu pai. Jesus nos traz esses elementos na história para que possamos entender aquele contexto familiar.
Porém, o filho mais novo era feliz, mas não sabia que era feliz. Embora estivesse satisfeito, sentia-se insatisfeito. O jovem cavou em seu coração um grande poço de insatisfação, sentindo-se infeliz dentro da própria casa do pai. Quem sabe, ele esticou o pescoço, olhou pela janela da cobiça e viu, além do muro, um mundo colorido, atraente e cheio de emoções. E se ele pudesse “curtir” um pouco mais a vida? Que futuro havia para ele morando com o seu pai? Será que tentar algo por aí não seria muito melhor?
Essa é a primeira lição sobre o filho mais novo: insatisfação. Tudo começou quando ele se sentiu infeliz dentro da própria casa do pai. A comunhão do pai e do irmão mais velho já não satisfazia a sua vida. As coisas que possuía não eram o suficiente. Precisava de mais! A cobiça invadiu a sua vida, assim como foi com Adão e Eva no jardim do Éden. O pastor presbiteriano Hernandes Dias Lopes diz: “A insatisfação é a tola ideia de que do lado de lá do muro existe a felicidade, de que Deus está nos privando de alguma coisa que nós merecemos”2. Quando a cobiça invade a nossa vida, podemos ter a certeza de que nada será capaz de nos preencher plenamente. Continuaremos buscando algo que nunca encontraremos distantes do amor de Deus.
Então, vem a rebelião. Sua insatisfação o tornou ousado o suficiente para pedir a herança do pai mesmo que o pai ainda estivesse vivo, o que poderia ser considerado uma grande ofensa. O filho mais novo estava mais interessado em “curtir” a vida do que a agradar o pai. Prefere imaginar seu pai como alguém morto do que adiar a sua busca pelos prazeres da vida.
É muito interessante como nós reencontramos em Lucas 15 a mesma história de Gênesis 3. Assim como Adão e Eva estavam insatisfeitos com Deus, da mesma forma o filho mais novo não estava mais satisfeito em viver na casa de seu pai; também, tal qual Adão e Eva desobedeceram a Deus e se rebelaram contra ele, da mesma forma o filho mais novo se rebelou contra a autoridade do seu pai. Em Lucas 15 temos a presença daquela velha e conhecida história. Porém, agora é o próprio Jesus quem está contando a história. Mas o desfecho nós deixaremos para mais adiante. Agora, vamos à segunda característica do filho mais novo:
2 ELE ERA INFELIZ SEM SABER
O filho mais novo partiu para um lugar distante onde as atrações do mundo borbulhavam por todos os lados. O que ele fez? Mergulhou de cabeça em todas as aventuras possíveis. Tomou das taças de prazer que o mundo pode oferecer. Enquanto tinha dinheiro, tinha amigos. Gastou a herança do seu pai com tudo e com todos. Achava que nesta vida estaria vivendo a verdadeira felicidade. Acreditava que em uma “vida louca” ele havia descoberto o sentido da sua existência. Pensava que conseguiria ser feliz longe da casa e da presença do pai.
O engano do filho mais novo logo é revelado. A crise chegou, o dinheiro acabou e os “amigos” foram embora. Quando ele não tinha mais nada a oferecer, ficou sozinho, mesmo tendo um pai que o amava como ele era e não pelas coisas que possuía. Passou a cuidar de porcos, uma terrível humilhação, pois a carne de porco era considerada imunda pelos judeus. A lei dizia, conforme Levítico 11.7-8: “Também o porco, porque tem unhas fendidas e o casco dividido, mas não rumina; este será impuro para vocês; não comam da sua carne, nem toquem no seu cadáver. Estes animais serão impuros para vocês.” Era o que dizia a lei. Onde o filho mais novo estava? Na situação mais desgraçada possível diante da religião dos judeus. Os fariseus e escribas devem ter estremecido quando Jesus chegou nessa parte da história.
O filho mais novo caiu em profundo sofrimento. Descobriu que a felicidade que buscava não foi encontrada e que a vida fora da casa do pai não era o que imaginara. Agora, mesmo sendo herdeiro de um pai amoroso, está humilhado e cuidando de porcos. O pecado é uma fraude que promete tudo, mas não concede nada. A liberdade que o filho mais novo tanto ansiou se transformou em escravidão. Hoje é só um trago, apenas uma cheirada, só uma noite na prostituição; amanhã virá a escravidão cruel, o vício e a degradação, o vazio da alma, a seca do coração e uma vida que não se interessa mais por Deus.
Isso me lembra um artigo que li na revista National Geografic Brasil de Setembro de 2017 sobre o cérebro e os vícios. Nela, há um pequeno texto com o título “uma nova chance” onde Gabriela Di Bella relata o drama dos viciados em drogas na Cracolândia/SP. Marivalter de Oliveira, um dos entrevistados e que tem 43 anos, disse: “A coisa mais cara que eu vendi um dia na Cracolândia foi a minha liberdade”3. A assistente social Carmen Lopes de 46 anos que trabalha no local, diz: “não há milagre: esse é um território em que as esperanças estão mortas”4. A busca pela liberdade pode conduzir a uma verdadeira escravidão. A Bíblia não é contra o prazer, mas, para o bem do próprio ser humano, ela coloca paradigmas para que o prazer seja uma bênção e não uma maldição.
E assim, como nessas histórias, primeiramente o filho mais novo era feliz e não sabia disso; depois, ele se tornou infeliz, mas também não sabia disso. Então, ele toma uma decisão:
3 ELE ERA FELIZ E SABIA DISSO
Quando ele chegou ao fundo do poço, caiu em si, arrependeu-se e tomou a decisão de voltar para a casa do Pai. Ele descobriu que sua verdadeira felicidade não poderia ser encontrada longe do amor do seu pai. Ele se arrependeu e admitiu o seu fracasso. O arrependimento exige mudança! Ele não vai ao pai para pedir dinheiro, mas misericórdia.
Então, ele age. São muitas as pessoas que decidem, pensam, refletem, mas não agem, não se levantam. Não é o caso desse filho mais novo. Ele pensou e agiu. É a hora de voltar para a casa do pai. Mesmo que pudesse estar se sentindo profundamente envergonhado, frustrado e triste, ele decidiu que era o que deveria fazer. Ele não apenas tomou consciência do buraco em que se encontrava, mas decidiu sair dele.
Ao chegar diante do pai, ele é surpreendido: Ele descobre que antes de ir, o pai já o procurava. Antes de encontrar o pai, foi o pai quem veio ao seu encontro. Não houve julgamentos sobre o seu passado e suas atitudes, mas apenas abraços e beijos, como Deus bem sabe fazer a todo pecador que se arrepende. Os trapos de roupas do filho mais novo são trocados por roupas novas. Assim como Deus fez novas roupas para Adão e Eva em Gênesis 3, da mesma forma o pai amoroso cobre a vergonha do filho e devolve a sua dignidade. O filho mais novo é revestido pelas roupas do pai.
Na sequência, é preparada uma festa para celebrar a volta do filho que havia se perdido. Cumpre-se, assim, o que Jesus disse pouco antes em Lucas 15.7: “Digo a vocês que, assim, haverá mais alegria no céu por um pecador que se arrepende do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”. Quando alguém – que está com a vida desgraçada – aceita o arrependimento e volta para o Pai, há festa no céu. Não há festa quando cristãos orgulhosos acham que são melhores que os outros. Não! A festa dos anjos nos céus é por causa de pecadores que se arrependem e mudam de vida. Os pecadores são aceitos por Deus. São eles que Deus quer.
Essa é uma maravilhosa história. Encontramos a história da salvação de Deus ao ser humano em toda a parábola. Nela, encontramos um resumo claro de toda a Bíblia: o ser humano é criado por Deus, se rebela contra Deus, vive em dissolução, é salvo por Jesus e um dia celebrará a Ceia do Senhor no Reino dos Céus. Provavelmente, a parábola do filho pródigo é o melhor resumo da Bíblia encontrado na própria Bíblia.
Deus tem pressa em nos perdoar. Ele está também a sua procura. Então, confesse hoje mesmo a Deus os seus pecados. Se você se identifica com o filho mais novo, faça como ele: caia em si, ajoelhe-se na presença do Senhor em arrependimento. Você será feliz e saberá disso! Hoje, Deus está dizendo a você: volte, meu filho. Eu amo você. A casa já foi preparada, a mesa já está posta e o Cordeiro foi sacrificado por você.
Por que você continua buscando aceitação nas coisas do mundo? Por que você continua achando que a felicidade está nas curtidas nas redes sociais? Por que você continua achando que a felicidade está em fazer tudo o que os outros querem? Por que você continua vivendo longe de Deus, da igreja e achando que é possível ser feliz assim? Por que você teima em buscar a felicidade e a liberdade longe da Palavra de Deus?
Hoje, o Senhor está falando com você. Ele quer te libertar verdadeiramente, transformar a tua vida, te abraçar, te revestir com roupas novas. Então, aceite o chamado. Faça uma oração de arrependimento. Não tenha vergonha de hoje mesmo se prostrar na presença do Senhor pedindo por perdão e misericórdia. Hoje é o dia da salvação. Se deixar para amanhã, pode ser tarde. Decida hoje por Cristo e receberás dele o melhor abraço da sua vida.
Se você está do lado de dentro e já ama a Jesus, Domingo que vem temos uma palavra para você. Por enquanto, Deus te chama a também confessares os teus pecados, a abandonares os teus pecados, mas a sempre acolheres o pecador. Então, venham todos com a gente que no próximo domingo continuaremos aprendendo o quanto somos aceitos e amados por Deus.
Até lá, você tem uma missão: compartilhar o trailer da série e o culto de hoje com o maior número possível de pessoas que conseguir. Há muitos que estão precisando exatamente desta palavra. Então, vamos agir para espalhar o amor de Jesus.
Amém.
2º DOMINGO APÓS EPIFANIA | VERDE | CICLO DO NATAL | ANO C
16 de Janeiro de 2022
P. William Felipe Zacarias
Pregações da Série Amados & Aceitos:
#1: O filho mais novo - 16/01/2022
Link: https://luteranos.com.br/conteudo/ofilhomaisnovo
#2: O filho mais velho - 23/01/2022
Link: https://luteranos.com.br/conteudo/ofilhomaisvelho
#3: O Pai amoroso - 30/01/2022
Link: https://luteranos.com.br/conteudo/opaiamoroso
1 Cf. DIAS LOPES, Hernandes. Lucas. São Paulo: Hagnos, 2017. p. 461. Edição do Kindle.
2 LOPES DIAS, 2017. p. 463.
3 DI BELLA, Gabriela. Uma Nova Chance. National Geografic Brasil, São Paulo, n. 210, p. 50, set. 2017.
4 DI BELLA, 2017. p. 50.