Ninguém sabe efetivamente a sua capacidade de perdoar até ela ser posta à prova. Por mais bondade que alguém possa nutrir em seu ser, na hora da decepção os olhos enxergam com pouca luz. Não se apaga uma memória dolorosa, aprende-se a viver com ela. Penso que o perdão abre a possibilidade de olhar para a pessoa que te feriu com um salvo conduto: a esperança de que as pessoas podem mudar, mudar para melhor é claro.
A passagem de Marcos 11.25 nos diz: “E, quando estiverdes orando, perdoai, se tendes alguma coisa contra alguém, para que vosso Pai, que está nos céus, vos perdoe as vossas ofensas”. Essa fala de Jesus tem um paralelo muito próximo ao quinto pedido do Pai nosso: “E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós também perdoamos aos nossos devedores”. Lutero aponta para a ideia de um perdão que não se barganha, mas de um perdão que é recebido e deve ser dado de Graça. Nas palavras de Lutero: “Pedimos que Deus nos conceda tudo por graça, já que diariamente pecamos muito e nada merecemos a não ser castigo. Da mesma forma queremos nós perdoar de coração e de boa vontade e fazer o bem aos que pecam contra nós” (Catecismo Menor).
Não somos feitos a priori para o perdão. Nossa cultura ocidental e nossos “valores” pós-modernos impulsionam-nos para o lado oposto: Deixar quebrados e até descartar relacionamentos. Olho com carinho para a cultura japonesa, que nos ensina que restaurar é algo fundamental para não sucumbirmos às mágoas que a memória nos lega. O kintsugi é uma antiga técnica japonesa para consertar objetos de cerâmica quebrados usando resina de laca e pó de ouro. Preenchem-se as rachaduras com ouro. A lição é simples: Vale a pena consertar – vale a pena perdoar e preencher de “ouro” o que estava quebrado. Não se esquece a rachadura, mas agora pode-se olhar para ela com valor e brilho.