Êxodo 16.1-21
Querida Comunidade:
Hoje vamos refletir sobre uma história Bíblica muito conhecida. Todos nós sabemos da história da libertação do povo de Israel do Egito, que envolve as 10 pragas, a travessia do mar vermelho, a peregrinação de 40 anos no deserto, as tábuas dos 10 mandamentos e a chegada à terra prometida de Canaã. O líder escolhido por Deus para guiar e manter esse povo firme em seu propósito foi Moisés.
Para que tudo isso se desenrolasse, foram necessários quase 100 anos. Não aconteceu do dia para noite. Foi um longo processo histórico de Deus com o povo de Israel. Só no deserto o povo vagou por 40 anos. E é lógico que, as pessoas que passaram por todo esse processo, queriam ver resultados. Queriam viver na terra prometida. Saíram do Egito com essa esperança. E talvez tivessem em seus corações que o tempo passaria rápido, que logo, logo teriam acesso à promessa de Deus.
Dois meses após a travessia do mar vermelho, as pessoas começam a desconfiar da promessa de Deus. Estão no deserto e vida de deserto é dura: sem água, os animais e os seres humanos padecem; não dá para plantar, o deserto também era o lugar de ladrões, meio assim, terra de ninguém.
O povo começa a reclamar e a praguejar: Teria sido melhor que o Senhor tivesse nos matado no Egito! Lá, nós podíamos pelo menos sentar e comer carne e outras comidas à vontade!
E a história nos conta que Deus ouviu a reclamação do povo e mandou maná e codornas. Mandou também que se pegasse o alimento necessário para um dia, mas a desconfiança, levou pessoas a acumularem (e o maná apodrecia e cheirava mal, quando guardado de um dia para o outro.)
O que este relato Bíblico tem a dizer para nós hoje em dia? Quais são os desertos das nossas vidas que nos levam a desconfiar das promessas de Deus?
O deserto, na Bíblia, também é local de meditação, de purificação e de aprendizado. Jesus vai ao deserto para orar; o povo de Israel passa 40 anos no deserto aprendendo a se organizar. No deserto da vida, não há somente coisas ruins. A diferença está se, nos momentos de dificuldades, conseguimos ouvir o que Deus está nos propondo ou só sabemos reclamar e praguejar contra o poder de Deus. (é como se um jardineiro cortasse todas as rosas do jardim, porque tem espinhos; esquecesse de ver a beleza da flor; não deixasse o broto tomar força, porque poderia criar mais espinhos).
O ser humano é engraçado. Quanto tudo vai bem, dificilmente reconhece que é bênção de Deus em sua vida. Deus, fé, participação comunitária, tudo isso pode ficar para depois, para quando tiver tempo e coisas menos importantes para fazer. Parece que tudo o que somos e o que temos, são frutos exclusivos de nossas próprias mãos e pertencem totalmente a nós, que podemos usar e abusar dos bens, do tempo, da vida. O sucesso, especialmente em nossa sociedade, nos enche de poder. (Não é que) não é bom que na nossa vida os nossos projetos dêem certo. Isso nos anima, nos motiva, nos lança otimistas para o futuro. Era isso que Deus desejava fazer com o povo de Israel: colocar no horizonte de vida deles, uma terra de onde manava leite e mel. Mas não disse que viria de mão beijada, que era para ser esbanjada, ou que não necessitasse de comprometimento de vida com a promessa de Deus.
Quando eram escravos, choravam pedindo liberdade, quando Deus os colocou no processo de libertação, começaram a sentir saudades da escravidão! Vai entender!
E como nós agimos diante da vida? Como nos portamos como povo de Deus? Onde estamos depositando nossa confiança? Estamos buscando aprender com nossas experiências no deserto, resistimos às tentações, ou queremos também soluções mágicas para a nossa vida, como se Deus fosse um tipo de Mr. M?
Querida Comunidade:
Em meio às dificuldades da vida temos necessidade de soluções rápidas. Queremos afastar o problema, mas infelizmente, nem sempre isso é possível. É muito difícil se manter fiel a Deus no deserto, mesmo que em meio a aridez, ele nos mande alimento. Reconhecer a presença de Deus em nosso sofrimento,( não de um Deus que solucione os problemas num passe de mágica, mas de Deus que se coloca ao lado do sofredor, que se entrega na cruz) é difícil de entender. Maná e codornas não eram lá um prato “fino”. Era comida muito simples. Não eram como as frutas e o gado do Egito. Mas era a comida que Deus enviou e que o povo não soube reconhecer e agradecer. O suficiente não era bom, tinha que haver mais e mais.
Se prega muito hoje em dia sobre o Deus do sucesso: o Deus que cura num passe de mágica; o Deus que te tira da falência financeira; o Deus que conserta teu problema familiar; o Deus que te torna importante. Há uma grande dificuldade de aceitarmos história de vida oferecida por Deus, história muitas vezes, de deserto, de aprendizado, de compreender que há muitos caminhos a trilhar na vida, caminhos que muitas vezes são caminhos de sofrimento, onde precisamos de um alimento especial das mãos de Deus.
O que a história do povo de Israel nos ensina é que, mesmo debaixo de nossas reclamações, da nossa incompreensão, da nossa infidelidade, Deus continua querendo nos alimentar, continua nos dando forças para resistir. Coloca na frente de nossos olhos o futuro, futuro diferente do presente; futuro da promessa de Jesus Cristo de um novo céu e uma nova terra, onde habita a justiça e a paz.
E para que possamos desejar que esse futuro aconteça, temos que pensar para além de nós mesmos. O projeto de vida de Deus, não é simplesmente um projeto particular para mim, mas é para o mundo. Mundo do qual eu faço parte e por isso, a minha história de vida se liga à tua história de vida e a tua e, especialmente, é história de Deus conosco. Deus atravessa conosco o deserto, mesmo que ali caminhemos por 40 anos. Essa é a nossa esperança. A nossa força. O que mantém o nosso olhar em frente, para Canaã.
Muitos dos que saíram do Egito, não viram a terra prometida. Foram seus descendentes que a ocuparam. Isso significa que o que fazemos hoje enquanto pessoas cristãs talvez só possamos avaliar numa próxima geração – o resultado de nossa fidelidade, da nossa persistência, talvez não nos pertença. Mas se não o fizermos, se não quisermos caminhar com Deus, não podemos chorar pelas gerações que virão, que estarão dentro de nossos lares, liderando nossa nação. Não poderemos criticar dizendo que as pessoas perderam os valores éticos, porque não se perde algo que não se recebe, que não se tem. É Deus que é o Senhor da história; mas a história do mundo é uma história de Deus conosco e nós fazemos parte do projeto de vida de Deus; do projeto de terra prometida.
O que nós queremos fazer? Queremos nos agarrar às dores do espinho – reclamar, praguejar, maldizer a época em que vivemos - ou queremos nos alegrar com a surpresa que encontramos na beleza da rosa, quando, vencendo os espinhos, aparece a flor como resultado do cuidado, da paciência e do carinho do jardineiro? Agradecemos o maná, ou maldizemos a Deus? Só vemos sofrimento em nossas vidas, ou também sentimos o cuidado de Deus, mesmo nos nossos desertos?
Graças rendamos ao Deus da vida, que nos mantém e nos sustenta firmes na fé, na esperança e no amor, amém!
Pastora Cristina Scherer
Palmas-TO
Publicado originalmente no site Grupo Emaús