Os dias passam muito depressa!
Os apelos por coisas novas – novos produtos, novas tecnologias, nova forma de se vestir, nova maneira de se portar, novas gírias, nova dieta... – inundam nossas mentes e aceleram nossos desejos.
Mudar é bom, é necessário. Ficar sempre na mesmíce, envelhece, deixa a gente insensível para as coisas novas que as novas pessoas podem nos ensinar.
A Páscoa, com a história da paixão e morte de Jesus, Sua ressurreição e vitória sobre a morte, pode ter o mesmo efeito sobre nós. Para algumas pessoas é história velha e repetida à exaustão. Para outras é fonte de mudança e tomada de decisão.
Quero ilustrar este pensamento com uma história que um Pastor da nossa Igreja escreveu certa vez.
É uma história, uma história de Páscoa. Ela se dá no mundo animal, num lamaçal, onde morava uma libélula e uma sanguessuga. O inseto e o verme não conheciam outro mundo. Eles estavam restritos ao local onde moravam. Era tudo o que conheciam.
A libélula nadava sobre a água lodosa e observava o que se passava. Não, não que estivesse insatisfeita, estava tudo bem normal assim. Mas parecia pressupor que existia um mundo melhor. Ela percebia, sobre a água, uma sombra em movimento. Concluía haver algo além do ambiente no qual vivia.
No mesmo lamaçal também estava a sanguessuga a nadar. A libélula a interpelou:
– Eu estava observando aquela sombra que vem lá de cima e chego à conclusão que existe algo além da lama na qual vivemos. Olhe lá. Dê só uma olhada!
– Pare com esta conversa. Você está redondamente enganada. Acredite em mim, sou uma experiente sanguessuga. Já andei por muitos caminhos. Este lamaçal é o nosso mundo e o mundo é um lamaçal... e aqui nos resta viver. Às vezes consigo tirar o sangue de uns e outros, afinal também preciso sobreviver. Mas isso é tudo.
– Mas como pode, eu vi a sombra e a luz!, exclamou a libélula.
– Você se engana, não invente coisas, respondeu a sanguessuga. E a vida continuava naquele lamaçal.
Certo dia, quando a libélula estava observando as alturas, teve uma estranha sensação. Ela se retorceu e nela nasceram asas. Embora ainda insegura, começou a voar. As suas asas brilhavam no sol. Deixou para trás o lamaçal, os restos de decomposição orgânica e a influência da sanguessuga. Viu e sentiu um outro mundo!
Esta é uma história de Páscoa. Este mundo é um lamaçal e seguidamente ficamos nele atolados. A libélula vivia no lamaçal, mas pressentia que havia algo melhor. Ela reparava, perguntava e esperava. Esperava! Esperava porque sabia que algo poderia mudar. Esperava!
“... mas os que esperam no Senhor renovam as suas forças, sobem com asas como águias, correm e não se cansam, caminham e não se fatigam” (Isaías 40.31).
Quem tem esperança ingressa num novo mundo. Mas, paradoxalmente, este mundo parece não permitir que alguém continue esperando. O mundo da ação imediata (às vezes, imediatista) não trabalha mais com a possibilidade de olhar para Deus e esperar dEle Sua intervenção milagrosa. O mundo centrado no poder das pessoas não admite a espera que fracassos impõem às pessoas. Não há espaço para aquilo que não signifique prosperidade. A graça da cruz se torna inexpressiva porque tem cheiro de derrota. A libélula observou. Ela esperou, contra todas as evidências. Criou asas e saiu do lamaçal. Quando nascem em nós as asas da esperança chamada Jesus, a esperança da fé e do amor, começamos a voar e agir, libertos da lama que nos cerca.
Páscoa é a libertação dos limites! É um olhar para dentro da esperança!
Não está assim com Deus a minha casa? Pois estabeleceu comigo uma aliança eterna, em tudo bem definida e segura. Não me fará ele prosperar toda a minha salvação e toda a minha esperança? afirma o rei Davi em 2 Samuel 23.5.
O que nos limita? Dificuldades, doença, morte, desespero, miséria? Seriam as falsas promessas e as desilusões? Seriam as traições? Ou a própria falta de fé? Neste lamaçal qual a postura que adotamos? A da sanguessuga ou a da libélula?
Davi, ao fazer um balanço da sua vida toda, ainda acreditou na esperança. Nem todos os seus objetivos haviam sido alcançados, mas esperava que fossem. E assim ficou em paz.
Deus escolheu a vida, a morte e a ressurreição de Cristo para mostrar que esse mundo tem salvação e pode viver da esperança ativa e transformadora. Como o profeta Isaías bem observou, naquele dia, o Renovo do SENHOR será de beleza e de glória; e o fruto da terra, orgulho e adorno, brotando das profundezas da morte e da sombra dos poderes do mal.
Não fiquemos acomodados no lamaçal que pode agora estar nos envolvendo. Esperança não é sinônimo de acomodação nem no dicionário. Contra a pressa impensada do mundo, tenha esperança. Aja com esperança. Semeie com esperança. Existe esperança, existe salvação. Ela se encontra na Páscoa. Ela se encontra na ressurreição de Jesus Cristo.
P. Rolf Rieck
Par.São Mateus