Quando era criança, inventei de contar os dias no calendário começando na quarta-feira de cinzas até o sábado de aleluia. Fiquei muito confuso, pois a soma foi de 46 dias. Anos mais tarde, nova tentativa, e adivinhem: novamente 46 dias. Afinal de contas, a quaresma não deveria ser de 40 dias? Queremos dar uma olhadinha na história deste período que chamamos de quaresma, e como foi sendo a sua evolução e fixação no calendário da igreja.
A quaresma tem como finalidade principal, preparar os cristãos para a Semana da Paixão. O objetivo desse período é de lembrar as pessoas da obra de Jesus Cristo, logo, é tempo de arrependimento, de buscar a Deus através de um exame de consciência, de reflexão e de oração.
Conceder um destaque especial ao período que antecede a páscoa já era um costume dos cristãos do primeiro século, porém ainda não da forma como acontece nos dias atuais, onde são observados 40 dias. Na Igreja do primeiro século, o período de preparação era de apenas 40 horas, que se referiam ao número de horas que o corpo de Jesus permaneceu na sepultura. Esse período de 40 horas se encerrava com a celebração de culto no domingo da páscoa às 3 horas da tarde.
Em torno de dois séculos mais tarde, no século III, este tempo de reflexão e de penitências passou a ser de 6 dias, não mais de 40 horas, sendo esse período conhecido como a Semana Santa. No século IV surgiram as designações específicas para cada dia da Semana Santa, que iniciava com o Domingo de Ramos (Entrada triunfal de Jesus em Jerusalém – Jo 12. 12 -19); Segunda-feira (Purificação do templo – Mt 21. 12 - 13), Terça-feira (Profecia do Monte das Oliveiras – Mt 24. 1 - 30); Quarta-feira (Judas prepara a traição – Lc 22. 48); Quinta-feira (Instituição da Santa Ceia – Mc 14. 12 - 26); Sexta-feira (sofrimento do Gólgota); Sábado de Aleluia (Primeira ressurreição, onde segundo a tradição, Jesus desce ao inferno e resgata todos que já haviam morrido).
No século V, ocorreu mais um acréscimo de dias ao período de reflexão e penitência preparatória da celebração da páscoa. De 6 dias, passou-se a guardar 36 dias. Na verdade já eram 40 dias, porém nos domingos o jejum não era praticado, restando então 36 dias de penitência. Porém no ano de 731, no tempo do Imperador Romano Carlos Magno, foram acrescentados mais 4 dias, perfazendo finalmente um total de 40 dias de jejum e penitências (excluídos os domingos).
O número 40 tem uma simbologia muito profunda: 40 dias e 40 noites do dilúvio – Gn 7. 4 – 12; 40 dias da tentação de Jesus Cristo no deserto – Mt 4. 1 – 2; 40 dias de jejum de Moises no Sinai – Ex. 34. 28; 40 anos de peregrinação do povo hebreu no deserto – Ex 16. 35; 40 dias de Jejum de Elias – I Reis 19. 8.
O número 40 indica um tempo necessário de preparação da pessoa que se dispõe a jejuar para se preparar para algo novo que vai acontecer. Portanto a compreensão e o significado do número 40 não está literalmente em quarenta, mas num tempo necessário para que a pessoas se prepare para a tarefa que tem a cumprir. Por exemplo: Jesus não começou sua atividade pública de evangelização antes de se preparar durante 40 dias em jejum e oração.
Pelo fato de os domingos não estarem incluídos na quaresma, a forma correta de nos referimos a eles é “domingo na quaresma” e não “domingo da quaresma”.
No ano de 325, durante o Concílio de Nicéia, a igreja decidiu que a Páscoa seria celebrada sempre no primeiro domingo após a lua cheia a partir 21 de março. O primeiro dia da Quaresma era chamado de Início da Quaresma até que o Papa Urbano II, no ano de 1099, determinou que este dia seria chamado “Quarta-feira de Cinzas.
Conhecer detalhes tão importantes da história da igreja, faz com que a própria história do cristianismo seja valorizada e faz com que também possamos conhecer melhor e valorizar as nossas tradições. É importante aprendermos que a nossa fé não é fé de modismos, mas que está alicerçada na história e na tradição, pois tudo tem uma explicação e uma finalidade.