Amados irmãos, amadas irmãs,
continuamos hoje a nossa série de pregações chamada “Epifania: quem é o menino que nasceu em Belém?” Na semana passada, nós falamos sobre o Batismo de Jesus e sua tentação no deserto pelo diabo após quarenta dias e quarenta noites de jejum. Vimos que Jesus É Rei. É Senhor. É humilde. É sábio; enfim, é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem. Em tudo igual a nós, exceto no pecado. E quanto mais conhecermos sobre Jesus, mais seremos impactados pelo seu amor a nós pecadores; amor que foi capaz de o levar para morrer na cruz em nosso lugar; amor que foi capaz de o fazer trocar a sua justiça pelo nosso pecado; amor que foi capaz de o ressuscitar ao terceiro dia para que tenhamos a esperança da vida eterna. Que maravilhoso amor!
No texto de hoje, Jesus nos é apresentado como um Cordeiro. Devemos confessar que essa é uma representação estranha para alguém que é o próprio Deus. Um Cordeiro? João não poderia ter chamado Jesus com algum símbolo mais forte como leão, ou talvez um urso, ou quem sabe um leopardo? Não. Deus não é encontrado na fome e na ambição por poder, prestígio, fama e notoriedade. Na sua encarnação, Deus não se colocou no “topo da cadeia alimentar”. Ao contrário, fez-se um humilde Cordeiro que nasceu com a missão de ser sacrificado na cruz para o perdão dos nossos pecados. É por isso que João Batista anuncia: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1.29).
Para entender essa afirmação de João Batista, precisamos voltar ao Antigo Testamento. No Antigo Testamento, anualmente se ofereciam em sacrifício o sangue de um cordeiro numa sala do Templo chamada “Santo dos Santos”. Apenas o Sumo Sacerdote poderia entrar nesta sala apenas uma vez por ano para realizar esse sacrifício. Outro ritual era o cordeiro que era afugentado para morrer no deserto que simbolizava o levar dos pecados do povo para bem distante deles. É exatamente isso que João Batista tem em mente quando afirma que Jesus é o Cordeiro de Deus.
O sacrifício de Jesus eliminou a necessidade dos sacrifícios anuais. Seu sacrifício vale perpetuamente. Aconteceu apenas uma vez e não precisa ser repetido. E quem crer no sacrifício do Cordeiro terá a vida eterna. É importante mencionar que Jesus não foi assassinado. Ao contrário, ele, por livre vontade e em amor aos seres humanos, decidiu se entregar em sacrifício para o perdão dos nossos pecados. É assim que ele cumpriu a vontade do Pai. Por mais trágico e fatalista que isso possa soar, é para isso mesmo que ele nasceu: para posteriormente morrer na cruz. João Batista ainda não sabe da cruz ao dizer que Jesus é o Cordeiro e nem mesmo chegou a ver a crucificação, pois foi decapitado um tempo antes. Mas João Batista, o precursor, já pode encher seus pulmões e testemunhar que aquele a quem estava vendo diante dos seus olhos não era apenas mais um homem, mas um enviado por Deus.
O cordeiro de Deus converteu-se em um dos títulos mais apreciados para designar Jesus: resume o amor, o sacrifício, o sofrimento e o triunfo de Cristo. Ele é o que tira o pecado do mundo (v. 29): Jesus é o “cumprimento” daquilo que os cordeiros sacrificiais de Israel prenunciavam. Ele é o cordeiro que o próprio Deus oferece e, por isso, ele é capaz de realizar o que nenhum sacrifício humano consegue: levar embora o pecado.1
Podemos até imaginar as longas conversas que Jesus tinha com João Batista. Após o maravilhoso anúncio, Jesus começa a ter seguidores. Mas não são seguidores de redes sociais que seguem e deixam de seguir com apenas um clique; não são seguidores para disseminarem o ódio e a “cultura do cancelamento”; não são seguidores digitais, mas reais! E olha, dizendo o que Jesus dizia e fazendo tudo o que ele fez, eu tenho a impressão de que ele não teria muitos seguidores se vivesse hoje entre nós e tivesse talvez um facebook ou instagram. Talvez até seria duramente cancelado, como são muitos que seguem a Jesus na vida real.
O texto bíblico nos diz: “No dia seguinte, João estava outra vez na companhia de dois dos seus discípulos e, vendo Jesus passar, disse: - Eis o Cordeiro de Deus! Os dois discípulos, ouvindo-o dizer isto, seguiram Jesus”. (João 1.35-36). Aquelas duas pessoas são seguidores de João Batista. Um era André; o segundo não tem o nome escrito porque é o próprio João, autor do evangelho. Com toda a humildade, ele oculta seu próprio nome em toda a carta. E é interessante que João Batista não fica bravo por seus seguidores começarem a seguir a Jesus. Muito ao contrário, desde o início João Batista sabia quem era Jesus. O próprio João Batista disse: “Ele vem depois de mim, mas não sou digno de desamarras as correias das suas sandálias.” (João 1.27). Por isso, João Batista não se incomodou “nadinha” por seus dois seguidores passarem a seguir a Jesus, pois o próprio João Batista se tornara seguidor do Cristo, o Messias enviado por Deus.
Interessante é que imediatamente se iniciou a evangelização. André chega para seu irmão Simão Pedro. O que André e João, escritor do evangelho, disseram a Simão Pedro? “ – Achamos o Messias”. (João 1.41). Então André levou Simão Pedro a Jesus. O texto nos diz em seguida: “Jesus olhou para ele e disse: - Você é Simão, filho de João, mas agora será chamado Cefas. (“Cefas” quer dizer Pedro”). (João 1.42).
O próprio Deus é quem toma a inciativa. Na Pessoa do Filho, Deus, a segunda Pessoa da Trindade, se fez gente como a gente. Agora, iniciou-se o seu ministério. E ele já tem alguns seguidores. Não irá querer ter centenas ou milhares instantaneamente. Na verdade, doze lhe serão mais que suficientes para que o mundo seja possa ouvi-lo e ser impactado pela sua mensagem.
Jesus conhecia aqueles seguidores. Sabia que eram pecadores e que iria morrer também por eles. Mesmo assim os chamou a seu seguimento. Não porque tinham um currículo exemplar; não porque eram santos; não porque eram pessoas boas. Jesus os chamou por causa da sua graça. Somente pela graça é que Deus aceita para si os pecadores.
O seguimento a Jesus não seria nada fácil. Aqueles homens nem imaginavam o que lhes estava aguardando naquele início dos três anos de ministério de Jesus. Porém, Jesus logo lhes alertou: “ – As raposas têm as suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça”. (Mateus 8.20). Quem quisesse seguir a Jesus precisava estar disposto a renunciar a sua vida e disposto a viver um dia de cada vez.
Mas não esqueçamos das mulheres. Também elas foram importantes no ministério de Jesus. Assim nos diz o teólogo católico, Romano Guardini:
No grupo de discípulos há também algumas mulheres (...): Maria [Madalena], Maria de Betânia e sua irmã Marta. Na verdade, as duas últimas não pertencem ao grupo itinerante, mas aparecem somente em sua casa, embora façam parte do círculo de amigos íntimos do Senhor. Há ainda outras, das quais nada se diz, a não ser que seguem o Senhor e velam por ele e pelos discípulos, servindo-os.2
É preciso lembrar também da importância das mulheres no dia da ressurreição de Jesus, pois “serão elas as primeiras a conhecer a mensagem da ressurreição pela boca dos anjos; entre elas se menciona também Salomé (Mc 16,1)”3. Enquanto aqueles homens “seguidores” duvidaram da notícia da ressurreição, achando que era fake news, as mulheres logo acreditaram que Jesus realmente estava vivo.
Desta forma, “em torno de Jesus se reúne um grupo de pessoas que querem pertencer-lhe mais intimamente”4. Muitas histórias irão acontecer com aqueles seguidores e aquelas seguidoras. Pedro andará sobre as águas, afundará e será resgatado por Jesus (cf. Mateus 14.22-31); a mãe dos filhos de Zebedeu, João e Tiago, irá pedir quem poderá se sentar à direita e a esquerda de Jesus em seu Reino (cf. Mateus 20.20-28); os homens tentarão impedir as crianças de chegarem a Jesus, e o Messias, em oposição a eles, as receberá de braços abertos (cf. Mateus 19.13-15); Pedro tentará afastar Jesus da cruz e por isso será chamado por Jesus de Satanás (cf. Mateus 16.13-23); enfim, são muitas as histórias. Jesus teve muita paciência com aqueles “seguidores de meia tigela”.
Amados irmãos, amadas irmãs,
eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Também os seus pecados; também os meus pecados. Vamos segui-lo? Estamos vivendo com Jesus em intimidade? Ou só o buscamos quando precisamos de algo? Jesus faz realmente parte da sua vida ou é só um acessório que você usa quando quer? Se você não suporta viver com Jesus e com a Igreja de Jesus neste mundo por apenas alguns minutos ou horas, seja nos cultos ou grupos de trabalho, como você suportará uma eternidade inteira ao lado de Jesus?
Seguir a Jesus não é uma tarefa fácil. Na verdade, seguir a Jesus significa percorrer um caminho perigoso. São enviados “como ovelhas para o meio de lobos. Portanto, sejam prudentes como as serpentes e simples como as pombas”. (Mateus 10.16). Quem segue a Jesus fielmente será perseguido, debochado, chamado de fanático, retrógado, antiquado. Bastará dizer que segue a Cristo que, conforme disse o próprio Jesus, “todos odiarão vocês por causa do meu nome; aquele, porém, que ficar firme até o fim, esse será salvo”. (Mateus 10.22). Seguir a Jesus poderá levar ao sofrimento de violência verbal e física e inclusive à morte. Por isso, Jesus disse: “quem perde a sua vida por minha causa, esse a achará”. (Mateus 10.39).
Seguir a Jesus requer humildade para ouvir e obedecer ao Mestre. Guardini nos diz:
Mas deve ser difícil viver assim, não sendo nada ao lado de Cristo que é tudo; uma existência marcada pela imperiosa necessidade de levar um conteúdo precioso num recipiente sempre inadequado; ter de ser apenas mensageiro, ao preço do aniquilamento do próprio “eu”; renunciar radicalmente, se assim se pode dizer, à simples unidade do próprio ser, onde o corpo, o coração e o espírito são uma só coisa com o que se faz e se representa.5
“Brincar de igrejinha” é uma coisa; ser uma pessoa religiosa é uma coisa; ser cristão por tradição é uma coisa; já seguir a Jesus é bem outra coisa! Requer humildade, abnegação e obediência; esse seguimento precisa de muita oração e muita meditação na Palavra de Deus; é necessário conhecer a Jesus para segui-lo na própria vida contra as tentações do mundo.
Portanto, siga a Jesus. Ele é o Cordeiro de Deus que tira e perdoa também os teus pecados. Aceite hoje esse convite. Hoje Jesus te chama pelo teu nome para que você o siga e viva os valores do Reino de Deus. Quais valores? Aqueles encontrados em Mateus 5.3-11: “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus. Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus. Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus. Bem-aventurados são vocês quando, por minha causa, os insultarem e os perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vocês”.
Quem vive com Jesus, vive os valores do Reino de Deus e descobre que a felicidade não estar em ter coisas ou em viver momentos, mas justamente na busca pela justiça, pelo amor e pela paz. Ainda iremos falar mais sobre as bem-aventuranças nessa série de pregações.
Aceite o convite de Jesus. Faça hoje mesmo – com toda humildade e suas palavras – uma oração de confissão e se comprometa a viver e a seguir a Jesus com mais compromisso e dedicação. Venha mais aos cultos. Aqui você tem lugar! Participe da Igreja. Há grupos onde você poderá colocar seus dons à serviço do Reino. Venha! O convite está feito! Venha.
2º DOMINGO APÓS EPIFANIA | VERDE | TEMPO COMUM | ANO A
15 de Janeiro de 2023
P. William Felipe Zacarias
1 ALBRECHT, Astor. “Surpreendidos!” in: HOEFELMANN, Verner (ed.). Proclamar Libertação. v. 47. São Leopoldo: Sinodal; Faculdades EST, 2022. p. 55.
2 GUARDINI, Romano. O Senhor: reflexões sobre a pessoa e a vida de Jesus Cristo. São Paulo: Cultor de Livros, 2021. p. 92.
3 GUARDINI, 2021. p. 93.
4 GUARDINI, 2021. p. 93.
5 GUARDINI, 2021. p. 101.