Quando ouço a palavra “jejum” me vem à mente “exame médico”. Ou seja, deixar de comer para que a amostra coleta seja mais pura. Abrindo um pouco mais minha reflexão, percebo que, em busca de saúde, algumas pessoas precisam limitar a quantia de sal, açúcar ou gordura. É um jejum parcial e focado. Algumas pessoas, por conta própria ou por indicação médica, fazem um “regime”. De novo, o objetivo é cortar ou corrigir a alimentação em busca da saúde. A IECLB promove, de tempos em tempos, um retiro de desintoxicação. Como? Será que todo retiro precisa ser sempre de cunho espiritual? Ou, será que o corpo afeta o espírito? Por aqui, devagar, vamos entendendo o jejum bíblico. A questão principal é sempre caminhar em direção à saúde, tanto física, quanto espiritual. Nosso estilo de vida, que envolve a espiritualidade, bem pode estar contaminado por valores inversos ao Evangelho. Por isso, é bom e necessário jejuar. Eis um tema adequadíssimo à Quaresma. Mas, não devemos esquecer de refletir constantemente sobre a razão do jejum. Caso contrário vamos estar somente cumprindo um rito tradicional, sem saber o real motivo.
No segundo capítulo do Evangelho de Marcos, Jesus conheceu e chamou Levi para ser seu discípulo. Agradando ao Mestre, Levi o convidou para um jantar em sua casa. Além da família dele e dos demais discípulos, estavam presentes os publicanos e algumas figuras meio suspeitas da sociedade. Prontamente, os fariseus questionam Jesus: Como é que você se senta à mesa com esse tipo de gente? O Mestre responde que está oferecendo uma alternativa de vida àqueles que eram malvistos. Na sequência, diante da mesa farta e comilança, os fariseus voltam ao ataque: Até mesmo João Batista incentivou o jejum. Mas, vocês aí estão na maior farra! Então, Jesus “ensina” por intermédio de três pequenas parábolas. Ouçam o que diz...
OS DISCÍPULOS DE JOÃO E OS FARISEUS ESTAVAM JEJUANDO. ALGUMAS PESSOAS VIERAM A JESUS E LHE PERGUNTARAM: POR QUE OS DISCÍPULOS DE JOÃO E OS DOS FARISEUS JEJUAM, MAS OS TEUS NÃO? JESUS RESPONDEU / (01) COMO PODEM OS CONVIDADOS DO NOIVO JEJUAR ENQUANTO ESTE ESTÁ COM ELES? NÃO PODEM, ENQUANTO O TÊM CONSIGO. MAS, VIRÃO DIAS QUANDO O NOIVO LHES SERÁ TIRADO. NESSE TEMPO JEJUARÃO / (02) NINGUÉM PÕE REMENDO DE PANO NOVO EM ROUPA VELHA, POIS O REMENDO FORÇARÁ A ROUPA, TORNANDO PIOR O RASGO / (03) NINGUÉM PÕE VINHO NOVO EM VASILHAS DE COURO VELHAS. SE O FIZER, O VINHO REBENTARÁ AS VASILHAS. TANTO O VINHO QUANTO AS VASILHAS SE ESTRAGARÃO. PELO CONTRÁRIO, PÕE-SE VINHO NOVO EM VASILHAS DE COURO NOVAS (MARCOS 2.18-22).
Toda religião tem seus ritos. Não há nada de errado nisso. Os fariseus eram rigorosos nas visitas à Sinagoga, nas esmolas, nas orações e nos jejuns. Além dos momentos marcados no calendário religioso, dois dias por semana eram dedicados ao jejum. Não é uma questão de certo ou errado. É necessário saber se o coração está somente no rito que é uma obrigação ou de fato há uma busca interior por intimidade com Deus. Expandindo a reflexão, devemos nos perguntar: Porque afinal eu venho ao Culto? As minhas ofertas e contribuição não serão meras obrigações? Porque deixar de “curtir” certos alimentos? Há razão para jejuar?
Biblicamente, a prática do jejum está relacionada à busca ao Senhor. Mesmo sendo pagãos, os ninivitas proclamaram jejum e buscaram a Deus, clamando pelo perdão. O Senhor ouviu as suas preces e lhes deu redenção. O jejum ajuda na concentração espiritual. A energia dispensada à digestão é encaminhada à reflexão espiritual, avivando a consciência, intensificando a comunhão com Deus, lembrando-nos de nossas fraquezas e, obviamente, da dependência ao Senhor. O jejum nos coloca em sintonia com Deus. Então, deixando de lado a questão de o simples deixar de comer como “regime”, o foco do material passa ao espiritual. É um exercício de aproximação a Deus.
Mas, Jesus não responde desta forma aos fariseus. Ele questiona o motivo do jejum ao narrar a primeira parábola, que lembra em parte a história das irmãs Marta e Maria. Marta queria trabalhar e insistiu com sua irmã. Jesus, entretanto, elogiou Maria que estava dedicando tempo para ter comunhão com ele. Ele não despreza os afazeres de Marta. Antes, elogia a escolha de Maria. O momento não é de jejum. Jesus se identifica como sendo o noivo. É tempo de festa. Precisamos aproveitar o banquete oferecido. Depois da festa, a vida corre normal. O foco agora é “ouvir” o que o Mestre tem a dizer. É sintonizar na vontade de Deus por intermédio de Jesus, presente em carne e osso.
Quaresma é sim tempo de jejum. É tempo de deixar de lado aquilo que nos impede de refletir com maior intensidade no sacrifício de Jesus. É tempo para reparar o quão distante estamos do Senhor e, por intermédio de Jesus, nos aproximarmos do Pai. Jejum de comida? Sim! Para aguçar o espírito. Jejum de TV, de internet, de diversões para dedicar mais tempo à palavra? Sim! Para descobrir o Deus quer de mim. Há vários jejuns. Pense e opte. Mas, sem ficar se promovendo como “mais” crente que os outros.
Por fim, Jesus conta duas parábolas correlacionadas. Não há colocar remendo novo em pano velho. Não há como colocar vinho novo em recipiente velho. Não assenta. Um desmerece ao outro. Com Jesus, há uma nova aliança. Não é que a lei não tenha mais validade. Não é que os ritos e festas deixam de existir. Os fariseus e a religião judaica continuam valendo. Mas, de nada adianta se não houver a descoberta do amor de Deus que envia seu único Filho como sacrifício pelo mundo. Não basta mais a religião sem Jesus. Isso vale lá, há dois mil anos e, também, hoje. A graça de Deus nos alcança por meio de Jesus. O caminho é colocá-lo em nosso coração, aceitando-o como Salvador e Senhor. Tudo passa e ter um novo significado, inclusive o próprio jejum. Não é um rito. É intimidade com Deus. Amém!